WANDER PIROLI

 

Título: Wander Piroli
Dimensões: 9x9cm
Técnica: Xilogravura
Data: Janeiro 2022
 
Wander Piroli nasceu em 1931, em Belo Horizonte, e pode-se dizer que Piroli foi um desses mineiros radicais: nasceu e viveu a vida toda em Belo Horizonte. Dali tirou todos os seus contos. Sua mãe morreu quando tinha um ano, e acabou sendo criado, então, pela avó italiana Giovanna e pelo pai operário pintor de máquinas, na Lagoinha, um bairro que era reduto de famílias italianas. Bairro proletário, o Lagoinha também era o lar de marginais, bêbados, vagabundos e criminosos, arquétipos que habitaram a maioria de seus livros. Ao contrário de como Otto Lara Resende definia o típico mineiro, Wander Priroli não falava baixo nem cobrava juros altos. Cursou Direito na Universidade de Minas Gerais e chegou a trabalhar como advogado de causas trabalhistas, mas segundo ele, não tinha coragem de cobrar os honorários dos trabalhadores que defendia. Ainda durante a faculdade, participou de concursos literários em Belo Horizonte, chegando a vencer um deles em 1951 com o conto "O Troco", ganhando alguma fama nas redações dos jornais.

O trabalho em redações jornalísticas apareceu como uma forma de sustentar a família, mas se tornou uma das partes principais de sua vida. Trabalhou incansavelmente como repórter em dezenas de publicações mineiras entre jornais alternativos e da grande imprensa, como Estado de MinasSuplemento LiterárioÚltima HoraO Sol e Binômio. Aliás, como jornalista uma série de episódios folclóricos o cercam. Dizem que nunca faltava uma garrafa de agusrdente Claudionor debaixo da mesa. E que escrevia fora dos padrões jornalísticos: contava as coisas como as coisas realmente tinham acontecido, sem leads ou subleads. Era inimigo da objetividade e compunha matérias e títulos extraordinários como “Cada brasileiro nasce devendo sete salários mínimos”. Isso, em plena Ditadura.

Anos mais tarde, ficaria conhecido como um dos símbolos do boom dos contistas nos anos 1970. Os críticos o incluíram nessa chamada Geração de 1970 que logo cambalearia, como todas as categorizações do tipo. Entre os mortos e feridos dessa geração, alguns como Sergio Sant’Anna, Antônio Torres, Luiz Vilela, chegaram a sobreviver. Outros como João Antônio e o próprio Piroli, caíram em injusto anonimato. Estamos carecas de saber que cada caso é um caso, mas a opção pelo conto, a visão tosca do Mercado que prioriza a novela, mesmo que ruim à narrativas curtas, por considerarem o conto um gênero menor, e a própria necessidade de pagar as contas no fim do mês, dividindo o tempo entre a literatura e o jornalismo, aumentaram a pena de esquecimento desses malditos.

Piroli gostava de cachaça Claudionor, cigarro de palha, briga de galo, pescaria e roda de amigos. Alguns dizem que por isso tinha uma relação descompromissada com a literatura. Como se a lida do jornal, as contas a pagar, e dar de comer a quatro filhos, fosse tarefa fácil para um cidadão saído da Lagoinha.  Publicou seu primeiro livro A Mãe e o Filho da Mãe, aos 35 anos em 1966. E somente foi publicar o seguinte O Menino e o Pinto do Menino, 9 anos depois.

Só quase dez anos depois, o escritor publicaria O Menino e o Pinto do Menino, em 1975 e Os Rios Morrem de Sede, em 1976. Talvez seus trabalhos mais conhecidos, ambos infanto-juvenis, viraram sucesso de público ao propor, pela primeira vez, uma espécie de realismo para crianças.

Seus textos eram tomados por personagens vivendo vidas ordinárias, comuns. Eram os trabalhadores de sol a sol, os malandros, as prostitutas e os “náufragos da noite”, como caracterizava os tipos com que conviveu na infância e juventude. Foi um mestre em criar diálogos secos, diretos e cheios de sensibilidade - e diga-se de passagem, escritores brasileiros não criam diálogos convincentes. Em se tratando de livros infantis, não fez concessões nem ao mercado nem ao gosto da classe média. Quebrou cânones de uma literatura infantil bem-comportada de personagens anódinos, bruxas babacas, duendes chatos, capaz de servirem de modelos bem-comportados. Narrou o que nunca havia existido. Em seus livros infantis, por exemplo, o pai para, toma uma cachaça num botequim, e segue com o filho para casa, já meio cambaleante.

Em vida, Wander ainda publicou cerca de sete títulos, entre infantis, de crônica e contos, como A Máquina de Fazer Amor e Minha Bela Putana. Um tipo alegre, vivia sem chamar atenção, mesmo que corpulento, e que seus blusões largos parecerem já ter vindo com defeito de fábrica: sempre com dois ou três botões da gola para baixo, abertos. Era visto por seus contemporâneos como um Hemingway brasileiro, seja pelo modo de viver, seja pelo estilo seco dos textos. Aliás, crítica nunca chegou a um consenso se Wander Piroli era um João Antônio ou um Hemingway mineiro. Quando morreu, descobriu-se que o descompromissado Piroli tinha mais 18 livros inéditos.


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