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O Ouro de Nápoles


Este filme de
Vittorio De Sica é sem dúvida uma homenagem existencialista, sem os idiossincráticos desvios da angústia existencial, modelado pelo bom humor, a Nápoles. Vittorio De Sica passou seus primeiros anos na cidade e pôde capturar com maestria o roteiro traçado a partir do livro de Giuseppe Marotta, de mesmo nome. Trata-se de  uma coleção de 6 episódios napolitanos:  "Il guappo", "Pizze a credito", "Funeralino", "I giocatori", "Teresa", e "Il professore". A versão americana omitiu, por algum motivo que ainda vou descobrir, 2 dos vignettes. Justamente, o terceiro -  Funeralino - e o sexto -  Il professore

O filme chegou a fazer parte da competição de Cannes em 1955, junto com outros incríveis filmes como Rififi, que levou o prêmio de melhor direção, como o magnífico East of Eden do Elia Kazan, que levou o prêmio de melhor filme dramático;  Marty, de Delbert Mann, que ganhou a Palma de Ouro; e Marcelino pan y vino, que não levou prêmio nenhum, mas é um desses filmes com cães tristes e criança órfã, que são sempre tocantes. Uma curiosidade é que L´Oro di Napoli competiu com um filme brasileiro também: Samba Fantástico de Jean Mazon e René Persin. Para quem não lembra do Mazon, segue um refresco para a memória. Um dos fotógrafos mais emblemáticos do fotojornalismo brasileiro, que formou uma geração de fotógrafos, inclusive guerra. Sempre oportunista, chegou no Brasil na década de 40 e logo se enroscou com o pessoal do DIP do Vargas. Do Departamento de Imprensa e Propaganda, a censura do Vargas, foi trabalhar na Cruzeiro, do Diários Associados, do famigerado Assis Chateaubriand, com David Nasser. O francês, operando as objetivas, e o libanês, textos rocambolescos de dar inveja a qualquer palimpsesto do realismo mágico latinoamericano,   tornaram-se mitos em pouco tempo. Chegaram até a forjar a morte de Mazon para aumentar as vendas da Cruzeiro, e claro, tudo com a aprovação de Chatô, que nunca foi flor que se cheirasse mesmo.  

Por falar em realismo mágico, o que me levou a assistir L'oro di Napoli foi justamente o elogio desvelado que Gabriel Garcia Marques faz ao filme no livro, meio biográfico, meio ficcional e cheio de indiscrições e cabotinagens, do jornalista, diplomata, e amigo pessoal de Gabo,  Plinio Apuleyo Mendoza, La llama y el Yelo - que acabei de folhear estes dias. No livro, disque Marques revela a Mendoza, numa das andanças por Paris, sem testemunhas oculares - como quase tudo que o tal do Plinio revela - seu fascínio pelo filme roteirizado pelo Giuseppe Marotta. Fui atrás do filme, diga-se de passagem, dificílimo de encontrar. Mas encontrei. Assisti. 


Filmaço. Pelo menos para mim, que existencialmente falando é o que importa!


O problema, é que nos dez anos que separam A Culpa dos Pais - filme meio chato pra dedéu - de L´oro di Nápole, o camarada faz Ladrões de Bicicleta e Umberto D. Dois clássicos que facilmente obliterariam qualquer coisa que o De Sica fizesse nesta década. Afinal, L´oro di Nápole nem sequer tinha uma linha de coerência argumentativa, tratando-se apenas de seis episódios da vida cotidiana de uma cidade. Aparentemente, por que alguns dos short movies da série, são absolutamente fantásticos.


Na véspera do Natal de 1953, Saverio Petrilho (o comediante Toto - chamado príncipe da risada italiano), encontra-se em frente ao túmulo de Maria Javarone, que havia morrido em 21 de novembro de 1943. A morta, na verdade, era a esposa de Carmine, amigo explorador e aproveitador, amigo dos tempos de escola, que ocupa sua casa de Saverio, faz de empregada sua mulher, e passa até mesmo a educar seus filhos. O protagonista se sente mais que angustiado com toda aquela situação sem saída. E se aproveita de um mal súbito de Carmine para expulsá-lo de casa. Os amigos resgatam Carmine e chamam o melhor médico da Itália para saber qual seria o mal de Carmine, que após os resultados médicos retorna à casa de Saverio, na noite de natal para lhe dar a notícia que o mal não passava de gazes presos. Saverio, abraçado a sua família, reitera sua posição de mandá-lo embora. E fiel à epígrafe do filme, em que são infinitas as características esplendorosas e mesquinhas das vielas napolitanas, Carmine parte não sem antes esmagar o bolinho das crianças sobre a mesa.


Logo em seguida,  uma vendedora de pizza, voluptuosa  e infiel  - Sofia Loren - perde a aliança de casamento numa das escapadas que dá à guisa de ir à missa, escapa para a loja do sapateiro. A cena final é fantástica: Depois de procurar na igreja, na casa do guarda noturno, e sabe la mais onde, Don Rosário, o marido corno, quase já desiste da busca, e eis que surge o sapateiro com o anel e um papinho mole de que tinha engolido o anel numa das pizzas que comprara com Don Rosario - que se gabava de vender fiado a todos. A essa altura já tem as rezadeiras, o padre, os vizinhos, um velho desdentado, e uma renga de gentes a procura do tal anel, seguindo-os pelas vielas de Napoles. Enquanto todos celebram o reaparecimento do anel, Don Rosario volta a conferir e não encontra o nome do sapateiro no caderninho da pindura. Vendo que a situação já se enrolava, São Pedro manda um chuvareu, e o velho desdentado grita: Olha a chuva! E aí foi cada um pro seu lado, pensando numa mulher ou num time... mas todo mundo feliz, ou pelos menos conformado com a explicação.


Num dos episódios mais  emocionantes e poéticos, uma criança morre numas das casas de cômodos da cidade. O coveiro baixas as inumeráveis escadas do sobrado com um caixãozinho branco. A mãe, massacrada pela dor da perda, ainda mantém a altivez de organizar o cortejo do funeral que atravessa toda a cidade,  adentra pela Vila Marina, sendo conduzido por cavalos. Ela faz questão que o cortejo desvie do mofo da obscuridade das vielas. E neste momento a estória se torna esplendorosa,  desprendendo toda uma cadeia de sentimentos dos mais desconhecidos em quem assiste esse episódio, quando a mãe do defunto começa a arremessar doces e balas para as crianças que assistem o cortejo, tornando-os solidários à sua incomensurável dor da perda. E só então ela chora incessantemente.


Os dois últimos episódios são igualmente inusitados e fantásticos a vez. 


O empobrecido e já meio tereré das idéias, o jogador inveterado Conde Prospero B. obrigando o filho pré-adolescente de seu porteiro a jogar cartas com ele, e perdendo todas. O casamento inesperado e inusitado de Teresa, uma prostituta, que é apresentada ao noivo no dia do casamento, já preparado para que tudo se parecesse a um casamento normal, com bolo, noivos, festa, padrinhos, convidados e votos de felicidades aos noivos. Aos poucos Teresa se vê numa espécie de cilada , farsa ou realidade paralela, quando Teresa passa a perceber uma certa esterilidade enjoativa no homem que está substituindo uma outra mulher, recentemente morta, e que tem próprios os pais da morta como convidados desse casamento surreal, feito as pressas, estão presentes apenas para receber uma espécie de indenização do noivo, futuro marido de Teresa. O episódio é extremamente surreal, mas de uma familiaridade arrebatadora apenas para os que crêem que a realidade e a ficção não passam de uma troca de sinais da alegoria. 


O último episódio trata das façanhas do “professor” Ersilio Miccio, um “vendedor de sabedoria” que “resolve problemas” das pessoas que o procuram, com conselhos certeiros sobre tudo. Ersílio, sabia que se conselho fosse bom se vendia, e portanto os vendia, e com grau de assertividade elevadíssimo. Apenas não o entendi o assovio que Ersílio aconselha, ao final da estória, e que supostamente seria o antídoto contra a tirania. Na certa, coisa de italiano que só os de Nápoles vão entender, mas certamente algo que não altera em nada o conjunto de um filme muito belo.


O filme, aparentemente despretensioso, é digno de aplauso. As estórias estão recheadas de personagens bufos, acintosos, parciais, mesquinhos, intrometidos, frágeis, grandiosamente compassivos e de uma disparidade interna desconcertante. Isso é De Sica, né?


TORQUATO NETO


 

Título: Torquato Neto
Dimensões: 9x9cm
Data: Fevereiro de 2022
Técnica: Linoleogravura

 

Filho único de um defensor público e uma professora, passou sua infância em Teresina até os 16 anos, mudando-se para Salvador no intuito de complementar os estudos secundários. E todo o brasileiro sabe que quem tem Neto no sobrenome, tem algo de diferente da pirâmide social Brasileira. A mãe, Salomé, provavelmente mesmo que intuitivamente sabia disso e queria a carreira de diplomata para o filho. O piauiense Torquato Pereira Araújo Neto, apesar de ter Neto no nome, deu voos em outras direções. 

Tudo ia bem até o primeiro vôo em sua ida para a Bahia. No Colégio Nossa Senhora da Vitória, o Marista, passava a maior parte das aulas rabiscando poemas. E ali conheceu Gilberto Gil. Não demorou e já estava colaborando com o jornalzinho da escola e participando das atividades estudantis. Foi no Centro de Cultura Popular da UNE (União Nacional dos Estudantes), que conheceu, também, Caetano Veloso, Duda Machado, Gal Costa, Capinam, Maria Bethânia dentre outros. Nesse início dos anos 1960, passou também a assistir filmes e ler compulsivamente sobre a sétima arte, chegando a trabalhar como assistente no filme Barravento, de Glauber Rocha.

Dois anos depois, o segundo voo, rumo ao rio de Janeiro. Lá termina o científico e, por dois anos, cursa jornalismo na Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil.

Ainda no Rio de Janeiro foi apresentado a Edu Lobo, pelo cineasta Rui Guerra, formando imediatamente uma das melhores uma parcerias musicais da música brasileira que, apesar de curta, foi marcante, para ambos. Em três meses, trabalhando intensamente, fizeram Veleiro, Lua Nova, Pra Dizer Adeus, que Edu Lobo diria anos mais tarde, se tratarem as suas melhores músicas.

Além de poeta, inicia também sua atividade jornalística, trabalhando para diversos veículos da imprensa carioca, com colunas sobre cultura no Correio da Manhã, Jornal dos Sports e Última Hora.  Trabalha também em agências de propaganda e na gravadora Philips.

Por sugestão do parceiro Edu Lobo, foi para São Paulo, em 1966. Nessa época, Gilberto Gil morava na cidade, no bairro de Cidade Vargas, e hospedava frequentemente os amigos de fora. Na “Pensão dos Baianos”, como foi batizada, passaram Ruy Guerra, que era mais ou menos baiano, Capinam, Torquato e um monte deles.

Um ano depois, em 1967, Torquato Neto decide casar-se com a baiana Ana Maria dos Santos e Silva. Três anos depois nascia seu único filho Thiago, atualmente piloto de aviação civil.

Durante toda essa década de 1960, o Brasil viveu um turbulento período político e iniciou-se um Ditadura Militar, com um golpe de Estado, dado por militares e apoiado pelas classes médias brasileiras. Torquato, através de seus artigos de jornal, atuava como agitador cultural, polemista e defensor de manifestações culturais de vanguarda, como Tropicália, o Cinema Marginal, a Poesia Concreta. Nesse período, passou a defender ardentemente o Tropicalismo, tendo escrito uma espécie de breviário, onde defendia a necessidade de criar uma cultura pop genuinamente brasileira, baseada numa estética dos trópicos, que em suas palavras seria mais ou menos algo como uma cultura sem preconceitos, sem mau gosto, sem cafonices.

Nesse momento iniciava meios sem querer uma carreira como poeta, jornalista, letrista de música popular e de um supostamente  experimentador ligado à contracultura.

Com amigos como Décio Pignatari, Waly Salomão, os Irmãos Augusto e Haroldo de Campos, Ivan Cardoso, e Hélio Oiticica, Torquato Neto, puxava a brasa para sua sardinha, já que tinha sido um dos principais letristas de músicas icônicas do Tropicalismo.

Sua grande contribuição para o movimento não foram apenas as letras da canção-manifesto “Geléia Geral”, de “Marginália 2”, de Gilberto Gil, e de “Mamãe Coragem” e de “Deus vos salve esta casa santa”, de Caetano Veloso.  Em suas colunas jornalísticas, defendeu com veemência a contracultura, além disso compôs em parceria inúmeras músicas. Com Gilberto Gil compôs sucessos como, "Louvação", "Domingou", "Zabelê", "A Rua" ou "Encarnada" em que dividiu a autoria com Geraldo Vandré. Com Caetano Veloso ainda compôs "Deus vos salve a casa Santa", "Ai de mim"; "Copacabana", "Nenhuma Dor". Com Jards Macalé: "Lets Play That. Com Carlos Pinto: "Todo dia é dia D". E "Três da Madrugada".

Em 1971 e 1972, Torquato escreveu a polêmica coluna no jornal Última Hora, intitulada Geléia Geral. A essa altura, Torquato já era um alcoólatra inveterado. Nesse espaço, Torquato defendeu desesperadamente o cinema marginal, combateu o Cinema Novo e a música comercial e lutou pelos direitos autorais. Ele defendia que o cinema deveria ser contra-hegemônico. 7 de fevereiro de 1972, Torquato afirmava aos seus leitores da Geléia Geral – coluna que posterior ao Plug – que o cinema não se resumia à produção.  Tinha de ter invenção, uma ação guiada pelo “coração selvagem” – que ele usa entre aspas, por provavelmente usar a expressão de Clarice Lispector. Nesse caminhar pelo cinema, Torquato iria expressar uma maior afinidade com os cineastas ligados ao grupo que ficou conhecido como Cinema Marginal.

O biógrafo Toninho Vaz, narra que essa ruptura com o Cinema Novo tinha nome e endereço. Torquato se aproximara de Ivan Cardoso e de Luís Otávio Pimentel, que segundo o poeta realizavam cinema de forma independente. O afastamento e a divergência com Glauber Rocha, manifestado numa carta, estavam ligados ao fato do Cinema Novo ter capitaneado a nova política cinematográfica ligada à Embrafilme. No fundo, Torquato não engolia bem essa história de se fazer filme com o dinheiro do governo.

Além dos sintomas evidentes, decorrentes do álcool, o poeta sempre teve temperamento difícil, com vários episódios de crises emocionais, consideradas pelos psicólogos como "surtos psicóticos". Por conta disso, foi internado oito vezes em hospitais psiquiátricos do Piauí e do Rio de Janeiro, incluindo o hospital de Engenho de Dentro, de Nise da Silveira. Tentou o suicídio por quatro vezes, e não foi por falta de aviso quando "Pra Dizer Adeus" de Edu Lobo, foi lançada e encarada como uma lírica de separação de uma casal. Ao final, na última tentativa, nem família e nem os antigos amigos conseguiram conviver com seus humores.

Toninho Vaz – que fez mais de setenta entrevistas com parentes, amigos e inimigos do letrista -  também desconstrói a imagem de Torquato como poeta tímido, reservado, introspectivo, melancólico. A biografia revela uma personalidade diferente: abrangente, expansiva. Resgata entrevistas antigas, uma delas com Nana Caymmi que comenta não sem uma dose de malícia: "Pra mim, ficou claro que era uma paixão pelo Caetano. Todos ali falavam disso". Caetano Veloso, outros entrevistado para a biografia, foi categórico. "Se você me perguntar se nós éramos namorados, amantes ou coisa assim, eu posso garantir: não!"

A polêmica fez com que a viúva de Torquato, Ana Maria Duarte processasse o biógrafo impedindo que o projeto fosse adiante pela editora Record. Mantendo a aura do "maldito", a biografia desse maldito foi publicada pela Casa Amarela, braço editorial da saudosa revista "Caros Amigos".

No início dos anos 1970, já tinha brigado com as esquerdas e com o pessoal do Cinema Novo, já afastado dos colegas tropicalistas, chegou a queimar quase todos os originais inéditos. Passou a frequentar novos grupos, como o pessoal do underground carioca (da Zona Sul, é proprio dizer), o pessoal do cinema Super8, e os malditos da MPB, como Jards Macalé, João Bosco e Luis Melodia, estes em quem focou últimos trabalhos. 

Em seu último ano de vida -  já com 34 músicas lançadas -, e escreveu artigos para jornais marginais como Flor do Mal e Presença, e organizou, com Waly Salomão, a edição única da revista Navilouca, publicada postumamente em 1974. Logo após sua morte, um material inédito de poemas foi reunido por Waly e pela esposa de Torquato, Ana Araújo, no livro Os Últimos Dias de Paupéria, além disso mais de 100 música de sua autoria seriam lançadas por diversos artistas -  algumas prontas, outras só na letra. Uma centena. 

No dia específico em que morreu, chegou de uma festa organizada por alguns amigos, após longa conversa com sua ex-esposa, deprimido, trancou-se no banheiro, fechou a porta, vedou todas as frestas com lençóis, abriu o gás do chuveiro e, asfixiado, atravessou o espelho do banheiro, aos 28 anos de idade, Exatamente: no dia do seu aniversário.

Na ocasião da morte deixou uma espécie de carta testamento/último poema, chamado "Fico".

"FICO. Não consigo acompanhar a marcha do progresso de minha mulher ou sou uma grande múmia que só pensa em múmias mesmo vivas e lindas feito a minha mulher na sua louca disparada para o progresso. Tenho saudades como os cariocas do tempo em que eu me sentia e achava que era um guia de cegos. Depois começaram a ver, e, enquanto me contorcia de dores, o cacho de banana caía. De modo Q FICO sossegado por aqui mesmo enquanto dure. Ana é uma SANTA de véu e grinalda com um palhaço empacotado ao lado. Não acredito em amor de múmias, e é por isso que eu FICO e vou ficando por causa deste amor. Pra mim chega! Vocês aí, peço o favor de não sacudirem demais o Thiago. Ele pode acordar".

 Nota: Thiago era o filho de dois anos de idade, à época.

 

O Declínio Do Império Americano

Um dos personagens de Oscar Wilde – não lembro qual, agora – dizia que só fala mal da sociedade quem não consegue frequentá-la, e acho que esse poderia bem ser o adágio do filme de Denys Arcand, O Declínio do Império Americano. 

O filme começa com uma entrevista à Rádio CBC da professora de História da Universidade de Montreal, Dominique St. Arnaud, em que conta a Diane sobre seu novo livro, Variações sobre a idéia de felicidade, que discute sua tese: a fixação da sociedade moderna na autoindulgência. 

Na próxima cena, quatro professores universitários conversam animadamente sobre assuntos diversos enquanto preparam um early dinner. Ao mesmo tempo, na academia de ginástica da Universidade, quatro mulheres, incluindo Diane e Dominique, colegas dos professores,  também conversam animadamente sobre os problemas de relacionamento entre homens e mulheres.

 


A partir da metade do filme, as mulheres chegam, e o grupo de amigos inicia um jantar animadíssimo. Todo o filme, extremamente dialógico, gira em torno desses oito professores universitários, Historiadores diga-se de passagem, que num agradável fim de tarde almoçam e conversam sobre seus relacionamentos, o amor, o sexo, as angústias e variações do que seria a tal da Felicidade. 

À medida que o jantar avança, os homens e as mulheres conversam principalmente sobre suas vidas sexuais, com os homens sendo abertos sobre seus adultérios, incluindo Rémy, que é casado com Louise e que já se relacionou com quase todas á mesa. A maioria das mulheres do círculo de amigos já fez sexo com Rémy, embora ele não seja atraente, mas elas escondem isso de Louise para poupar seus sentimentos, afinal todos são mais que amigos, todos pertencem ao mesmo departamento.  

Ainda no ginásio, quando as amigas conversavam, Louise revela que esteve em uma orgia com Rémy, mas acredita que ele geralmente é fiel. Claude é o único amigo homossexual no jantar. Ele também fala abertamente sobre sair com outros homens de maneira imprudente, mas com medo de doenças sexualmente transmissíveis, enquanto secretamente teme estar infectado por AIDS – problema  que ainda assolava a todos na década de 80. Dominique, por sua vez, fala sobre sua teoria que dá conta do declínio da sociedade, com Louise antagonizando-a e  expressando ceticismo. Para contra argumentar contra Louise, Dominique revela que fez sexo com Rémy e seu amigo Pierre, causando um colapso emocional e um mal estar geral no jantar.

A conversa que segue nos faz perceber o clima dos anos 80, onde várias teorias que explicavam o mundo começam a cair por terra. Os protagonistas realizam uma verdadeira auto-avaliação ao discutirem sobre os mais variados temas, entre eles moral, liberação sexual, valor da intelectualidade, e a tendência de todos se desculparem por seus próprios erros ou de aceitar com facilidade os próprios defeitos, principalmente quando a conversa começa a esquentar.

Pela manhã, era como se a noite anterior não tivesse passado de um samba de Paulinho,  um grande pagode na casa do Vavá: “Vi muita nega bonita, fazer partideiro ficar esquecido, mas apesar do ciúme, nenhuma mulher ficou sem o marido”. E Louise se senta ao piano, toca, e todos se abraçam, e os relacionamentos voltaram ao normal, afinal e contas são todos amigos, e acima de tudo, lavou tá novo

A conversa que segue nos faz perceber o clima dos anos 80, onde várias teorias que explicavam o mundo começam a cair por terra. Os protagonistas realizam uma verdadeira auto-avaliação ao discutirem sobre os mais variados temas, entre eles a liberação sexual, valor moral da intelectualidade, e a tendência de todos se desculparem por seus próprios erros ou de aceitar com facilidade os próprios defeitos, principalmente quando a conversa começa a esquentar. No fundo Demy mostra que na prática, a teoria é outra. 

Pessoalmente acho sensacional como Denys Arcand se auto define. Um périmé catholique. Mais interessante, como ele retrata os valores americanos, já que americanos tem um grande preconceito contra os canadenses. Os canadenses não são servis como outros grupos imigrantes, e talvez por isso os americanos os consideram bárbaros caçadores de alces e ursos. Os canadenses por sua vez, não estão nem aí para os americanos. E isso é interessantíssimo quando visto aqui de dentro. Mas no filme Dominique, prevendo um colapso no "Império Americano", baseado na autocomplacência, na condescendência, na tolerância e indulgência consigo,  afirma ironicamente que Quebec, apesar de falar francês e se colocar olimpicamente na periferia, embarca de roldão nessa decadência dos costumes. 

Denys Arcand coloca em xeque os relacionamentos modernos, marcados por problemas amorosos e sexuais. Ele faz um estudo crítico dos anseios e frustrações de uma classe média intelectualizada e escrava dos divãs de analistas. Quatro professores universitários, três deles casados e um gay, preparam um jantar em uma casa de campo. Conversam sobre sexo. Enquanto isso, suas mulheres estão juntas em um clube e, da mesma forma, dividem seus segredos. Quando se encontram no jantar, estão prontos para o embate.

Outro filmaço que preciso rever é o Invasões Bárbaras, 2003, com os mesmo protagonistas, 17 anos depois.


Sam Peckinpah Again!

(Filme e postagem de 2011, mas... me peguei assistindo o Peckinpah again, ontem) 

Western Crepuscular ou Tráiganme la cabeza de Alfredo García 

"El Jefe" é milionário “fazendeiro”,  mejicano e cheio de capangas mejicanos,  descobre que sua filha Teresa está grávida. O cidadão em vez de ficar feliz por ser avô, fica furioso. Primeiro por que por que a criança vai nascer sem pai, segundo por que a menina era virgem – veja bem, estamos falando de caras mexicanos, ano de 1974, com outro diapasão. El Jefe, então, aplica uns safanões na menina para saber quem seria o pai da criança. Entre uma bordoada e outra a moça acaba revelando que o pai é Alfredo Garcia, justamente o homem que El Jefe tinha preparado para ser seu sucessor – ai você pensaria… ahh, Freud explica.

Para lavar a honra tanto da filha como de sua película apassivadora, contrata dois pistoleiros maus e internacionais, que na verdade encontram-se na outra margem do Rio Grande, e oferece 1 milhão de dólares para quem trouxer a cabeça do tal Alfredo Garcia.

Dois pistoleiros chegam a um bar do baixo meretrício mejicano en Ciudad de Méjico, onde encontram o pianista Bennie, um ex militar americano que vendo a pinta dos pistoleiros se faz de desentendido. Eles oferecem um bom tutu pela informação do paradeiro de Alfredo Garcia, mas querem como prova a cabeça de Garcia. O pianista já andava meio na bronca com Garcia pela folga com a cantora Elita, seu trelêlê oficial,  e fica de dar a resposta aos bandidos. Bennie vai atrás de Garcia e se certifica que ele estivera com Elita. Mas a cantora lhe diz que Garcia foi embora para sua cidade no interior do México, onde sofreu um acidente de carro e morreu. 

Mas é claro (!)  que Bennie não acredita nessa estorinha fiada de Elita.  E no melhor estilo brasileiro compra um terçado e parte com Elita rumo à cidade onde Garcia foi enterrado, para conseguir a prova da morte de Garcia, ou seja, literalmente a cabeça de Alfredo Garcia. 

Mas como isso tudo é uma estória de western pop crepuscular pensada por Peckinpah, o mais gótico dos diretores do gênero, os assassinos não confiam em Bennie e sem ele saber o seguem até a um vilarejo no interior do Méjico, onde então ocorrerá a emboscada e a pendenga semi-final. Afinal, pensa comigo. Por que eles vão pagar ao cara, se pode embolsar a grana e ainda matar o infeliz do Bennie, não é mesmo. Isso é Óbvio. O filme foi um dos mais baratos do Peckinpah, e justiça seja feita, fez milagres. Se o Peckinpah tivesse metade da grana e dos amigos do Tarantino...

Com orçamento enxugadíssimo e um roteiro barato, não deu outra, Bennie encontra a sepultura de Alfredo Garcia e ao tentar desenterrá-lo é atacado pelas costas. Quando desperta, está enterrado. Com muito esforço consegue se desenterrar, mas constada que sua amante, Elita, enterrada ao seu lado está morta.  Bennie ao ver a sepultura de Garcia aberta, constata que o corpo não tinha a cabeça, levada enquanto esteve desacordado e então passa a desconfiar que se os dois assassinos de aluguel o seguiram até aquele fim de mundo, e levaram a cabeça de Alfredo Garcia, por que a cabeça do morto vale muito mais na mão dos sicários que na dele. 

Enfim, depois tremenda troca de tiros, ele recupera a cabeça de Garcia e a coloca num saco com gelo e dirige com a cabeça no banco do lado. 

O monólogo de Bennie com a cabeça morta de Alfredo Garcia é uma cena surreal, mas fantástica. Talvez o ponto alto do filme seja esse convívio de Bennie com a cabeça decepada. 

O filme tem várias reviravoltas. Os matadores Sappensly e Quill acabam fazendo uma emboscada, quando Bennie vai devolver a cabeça à família de Alfredo Garcia. Quill mata toda a familia de Garcia, mas é morto por Bennie. Sappensly, desolado como um matador olhando para seu parceiro morto, diz que não pagará Bennie, e também toma um caroço na cabeça. 

E nesse meio tempo, Bennie continua conversando com a cabeça. Chega ao hotel, lava-a e pretende levá-la ao Jefe, com o pretexto de receber os US$ 10K.  Em meio a mais tiros, Bennie finalmente consegue o endereço do Jefe. 

Consegue chegar justo no dia do batizado do rebento. O Jefe estava até feliz. Bennie se apresenta, entrega a cabeça e relata quantas pessoas morreram por aquela cabeça. Quando o Jefe diz para ele pegar seu dinheiro, jogar a cabeça para os porcos e ir embora, ele lembra que Elita se incluía naquele monte de mortes em vão, e aí é possível ver como o semblante de Warren Oates muda ao constatar que tudo aqui tinha sido em vão. 

Ai meu amigo... acho que não era nem mais o Beniie que estava ali, e sim o Oates, vaqueiro do Kentucky, amigo do Steve McQueen.  Foi tiro pra todo lado. Bennie, enfurecido,  mata um monte de capanga do Jefe. 

A mocinha entra com o filho no colo e pede que mate seu pai. Ele pega a cabeça e vai em direção a porteira da fazenda levando o Jefe, junto a Teresa. 

Chegando na porteira, ele se vira pra Teresa e diz assim mesmo do jeito que eu estou te falando: “Agora, você coisa da criança, que do teu pai cuido eu…”  UAU ! podia terminar ai né! Mas não…. Isso é um filme de Sam Peckinpah.

Como esses mafiosos, traficantes, milicianos tem sempre capangas pra caramba, surgiu mais um monte do nada e rasgaram Bennie com rajadas de metralhadoras. 

Nota. Sam Peckinpah já foi partícula apassivadora em tiranicídia contenda entre meu concunhado e eu. Enquanto eu dizia que o cinema americano não era autoral, ou seja, não tinha uma linha de cineastas que faziam filmes classificáveis pelo toque de Midas da linha autoral, o concunhado dizia que havia Peckinpah: "brutalidade mimética, estética da violência e ódio fiduciário". Dito assim, de maneira tão bonita, pode até ser.






Música do dia. El Justiciero. Mutantes.

Casablanca




Ontem assisti Casablanca pela décima oitava vez, talvez. Estava ali na tela do TCM… eu tava de boréstia, confinado e biritando , pra variar… e por que não? Casablanca. Casablanca é um desses mistérios que a gente não consegue explicar, mesmo. 

Não é um filme bom pra caramba. O roteiro tem um monte de furadas e clichês de filmes pastosos de amor. Não por acaso, Humberto Eco disse certa vez que a fraca verossimilhança psicológica dos personagens e as reviravoltas que ocorrem sem razões plausíveis tornam o filme fraco. Os atores, principalmente os militares, são meio caricatos. Além disso, a Ingrid Bergman, ainda que patinando numa série de filmes medianos, vinha de Intermezzo, e Humphrey Bogart vinha de nada mais nada menos Reliquia Macabra, The Maltese Falcon. 

Ou seja, Aceitar trabalhar em Casablanca, só pela grana mesmo. Por que no fundo, lendo o roteiro, parecia um filme apenas de propaganda anti-nazista.  E era mesmo, por que os produtores de Hollywood nunca estão de bobeira. Nunca dão ponto sem nó. Nunca chamam periquito de meu loro.

O roteiro era de um professor de escola de segundo grau, Murray Burnett,  em parceira com Joan Alison,  que o concebeu originalmente como uma peça de teatro. Isso no começo dos anos 30, quando Hitler nem era Hitler, Franco não era Franco, Mussolini apenas ensaiava ser Mussolini, por isso muitos dizem que o texto foi sendo complementado por 4 roteiristas durante as filmagens. A peça se chamava Everybody Comes to Rick's . Quando a coisa apertou na Europa, Burnett e a mulher se mandaram para lá, para repatriar dólares de parentes judeus para a América, e ali terminaram a peça. Reza a lenda que numa parte da viagem, pararam num bar no sul da França, que tinha ao piano um cantor negro americano, o que pode bem ter bem influenciado na escolha de Dooley Wilson para  o papel de Sam. Detalhe. Wilson era baterista na vida real, e não pianista. Então por que Casablanca se tornou Casablanca?  

Aí entra um conjunção quase aleatória de fatores.  O filme estréia em 26 de novembro de 1942, em Nova York, em plena Segunda Guerra. E antes de mais nada é importante dizer que o filme somente seria exibido na Europa em 1946 na Itália, e na Alemanha Oriental somente em 1983, diretamente na televisão! A première do filme foi antecipada devido a um fato histórico. Alguns dias antes, no dia 8 de novembro, as tropas aliadas (que se opunham à Alemanha de Hitler) invadiram a cidade marroquina de Casablanca que, até então, estava sob o domínio da França de Vichy.

Filmado em 3 meses, Casablanca conta a história de Rick Blaine, um americano amargo, machão, sentimental e cínico que vive e trabalha em Casablanca, onde tem um badalado café. O Rick’s Café é frequentado tanto por nazistas, como por funcionários franceses, estelionatários, compradores de ouro, malfeitores, biscateiros, apostadores, vigaristas, trabalhadoras da noite, biriteiros inofensivos, apontadores de jogo do bicho, dissidentes, maconheiros, músicos, artistas, fumadores de haxixe, Jesus, só coisa ruim. Numa noite, entra Ilsa Lund, o grande amor do passado de Rick, aparece em seu bar ao lado do marido, Victor Laszlo, herói da resistência tcheca. Dois anos antes ela tinha o deixado numa estação de Paris, sob chuva, esperando. La pelas tantas ele se lamenta com Sam…” de todos os botequins do mundo ela tinha que entrar justo no meu?” Está arrasado. E de repente vira-se para Sam e diz, “ se ela aguentou eu também aguento, toca ai Sam!” O reencontro dos ex-amantes reacende o amor entre eles e o sofrimento em Bogart. Mas o cara é foda! É Bogart porra! 

O sucesso de Casablanca pode ser considerado como o resultado de uma combinação de golpes de sorte  do destino ou acidentes de percurso. Além da pressa na filmagem, da questão do roteiro, alterado até o último minuto, a música quase deixa de ser  "As Time Goes By", de Herman Hupfeld, escrita em 1931. Max Steiner. O compositor da trilha sonora do filme, queria retirar a música e substituí-la por uma composição original, depois do filme acabado. Enfim, nesse meio tempo de pós-edição Ingrid Bergman já tinha cortado o cabelo curto, Bogart já ia começar a filmar Passagem para Marselha e enfrentavamais  um problema de separação com a atual mulher… enfim, ficou "As Time Goes By”.

A lenda mais inacreditável sobre o filme, é a que dá conta de que o ator principal, na pré-produção, não seria o Humphrey Bogart e sim Ronald Reagan. Felizmente Reagan teve de cumprir um serviço militar e Bogart pegou o papel.

O filme foi dirigido pelo húngaro Michael Curtiz, que filmou muito, mas um monte de filmes noir, bíblicos, com piratas, foras-da-lei, boxeadoresera considerado um faz tudo em Hollywood. Embrulhava e mandava. Está percebendo por que Casablanca não podia dar certo?

Humphrey Bogart costumava dizer que Casablanca era a melhor obra de sua filmografia. Isso pode ser um exagero. Eu gosto do Bogart, era um cara legal, era meio feio, meio magricela, e com boa vontade podia ser até um carioca do subúrbio. Mas ele as vezes mentia. A vida dele certamente mudou, mas não pelo filme…

Ele vinha de uma série de papéis de gangster e de detetives. A imagem dele era de cara durão e cínico. Tinha acabado de filmar a Reliquia Macabra, do Dasheill Hammett, pra mim um dos  melhores filmes e livros noir de todos os tempos.

Eu posso até concordar que a partir de Casablanca, Bogart se transformou numa espécie de manual, ou gramática expositiva de como um cara cínico e frio pode conquistar uma garota. Aquele cara que quando quer conquistar moça fala pouco, olha logo no olho e dá-lhe logo um beijo de tirar o ar. Todo mundo da minha geração e na anterior imitou alguma vez o Bogart. Quem não sonhou ser Bogart? Quem não? Fala ai? Andar por ai, entrar num bar ao lado de sujeitos meio sórdidos, meio Peter Lorre, que quando falam contigo, baixam os olhos entre medo e respeito. Puxar uma cadeira e estalar o dedo e pedir para o negão do violão, Flavinho, toca um Belchior aí! Depois vir uma garçonete toda derretida, e perguntar o que você quer… tipo, o que você quer ? (toda derretida).

Posso até concordar, mas o homem estava numa m... danada durante as filmagens. Antes de conhecer Lauren Bacall, mas isso foi bem depois, ele era um especialista em casar mal. Era só chave de cadeia que aparecia na vida do infeliz. Em Casablanca ele estava no terceiro relacionamento. Dizem as más línguas que era um cara muito fiel. Mas esse casamento era disparado o pior de todos, mesmo para um cara fiel e família e que dizia que todas as pessoas nasciam com 2 doses abaixo do normal. Casara-se com uma loura nem tão bonita, mas boazuda, alfabetizada e decotada, Mayo Methot. A.M. Sperber and Erick Lax contam em detalhes como essa vida a dois foi um inferno, não por ela ser má, mas é que depois de ¾ de uma garrafa de whisky, ela ficava um pouco alterada, ciumenta, possessiva, e quando esvaziava as garrafas mirava nos 3 Bogarts que via na frente. Por sorte ela sempre acertava o errado. Não bastasse as brigas em casa, Mayo ia várias vezes ao set de filmagem para arrumar quizumba com a Ingrid Bergman, que na época era casada com um dentista e comportadíssima. 

Em meio a esse inferno, ele tinha talvez, o primeiro papel dele que além de arrogante, cínico, feio, magricela, ele poderia finalmente mostrar que dentro do terno, havia um coração (essa frase ficou piegas, depois eu mudo)

Enfim, outro dia falo só de Humphrey Bogart. O que importa é que ainda não sei por que este filme é tão bom de assistir!

Choking Man

Quem chega a Nova Yorque de avião aterrrisa no aeroporto JFK. Muito pouca gente sabe mas o nome  do local onde fica aquele fim de mundo é Jamaica. Muito pouca gente sabe, mas o nome do diretor por trás de muitos do videoclipes de uma coisa chamada Michael Jackson, Dire Straits e um torço chamado A-ha, nos anos 80, era Steve Baron, um irlandês que quando não está fazendo videos para musicais realiza bons filmes independentes. Choking Man é um drama psicológico sobre a experiência do imigrante latino na América, mais especificamente na região de Jamaica, Queens. Jorge é um dishwasher, um lavador de pratos, que quase não fala inglês e que fica enfiado na cozinha de um pequeno restaurante muitas horas por dia. Por não falar inglês, ou em decorrência disso, é um jovem equatoriano isolado, sem amigos, que vive da casa para o trabalho e do trabalho para a casa. Seu trabalho consiste em enxaguar com uma mangueira, pratos, copos, talheres, panelas e artigos de cozinha, colocá-los numa bandeja e enfiá-los numa esteira que lavará com água em alta temperatura os utensílios. Após passarem pela tal máquina, Jorge confere se estão realmente limpos, recolhe-os e os direciona a seus respectivos locais. Pratos e talheres para a parte frontal do restaurante e para a cozinha, de onde saem os pratos prontos, e os demais utensílios para a cozinha. Quando o movimento do restaurante é menor, na entre-hora do almoço e da janta, José limpa o chão do restaurante e recolhe os sacos de lixo. O trabalho de José é monótono e repetitivo e ele o realiza em silêncio absoluto.  Além de pratos, a única coisa que José vê todos os dias à sua frente é um cartaz velho e sujo com instruções para salvamento de pessoas em casos de engasgo.

José é um rapaz calado por natureza, em seu  laconismo consome-se, submerso e contrafeito, numa espiral de obsessivos pensamentos contra seu companheiro de trabalho, Jerry,  que parece estar sempre meio chapadão e viajando, tentando a seu jeito tornar José um cara mais comunicativo Se no trabalho há esse companheiro supostamente  apurrinhando sua vida, em casa  a coisa não é melhor. O fantasma de um tio misterioso o assola a todo o momento com sugestões e pensamentos, geralmente confissões mal escondidas, ressentimentos contra os malogros pessoais. Sua incomunicabilidade, levemente autista, é decorrente, no fundo, mais das expressões de demônios interiores que das ameaças reais. A coisa toda só parece mudar um pouco quando a garçonete chinesa Amy é contratada para trabalhar no restaurante. José, ensaia um pequeno vínculo com o mundo exterior. Entretanto, Jerry está ali rondando a moça como uma ameaça ao amor de José. Consumido por uma espécie de paixão morbida pela moça e ódio visceral pelo rapaz, José, como todo o  homem que não sabe atacar concatena vinganças. Vislumbra assassinar Jerry.

Todo o filme é um tanto claustrofóbico. As cenas mais angustiantes são exatamente as que o protagonista tenta se comunicar, em vão, num ambiente anglofônico. Ou seja, as cenas em que o protagonista comunica menos em palavras, são as mais expressivas.

Caro Francis

“Caro Francis” é um documentário sobre o jornalista Franz Paulo Trannin Heilborn, mais conhecido como Paulo Francis. Se você pensa em encontrar, nesse documentário, respostas para a explicação sobre o sucesso de Paulo Francis, esqueça. O documentário feito por Nelson Hoineff, o mesmo do famoso Documento Especial na antiga TV Manchete, tenta desvelar ainda mais o lado polêmico de Francis, tanto quanto tenta reforçar a veia transgressora do jornalista que um dia escreveu isso.

A imagem do Francis já velho no Manhattan Connection era uma caricatura gasta do personagem que ele próprio criou para si. Já em meados dos anos 90, Francis passava a imagem de um homem inteligente, arrogante e botocudamente grosseiro. Mas se você pensa que foi sempre assim, esta redondamente certo. O documentário mostra bem, em termos próprios como desde as suas polêmicas críticas teatrais e insultos a Paulo Autran e Tônia Carreiro, até a sua saida do Pasquim, Francis já alimentava essa imagem pública de polemista nem sempre elegante mas incrivelmente engraçado. E um dos seus grandes méritos foi exatamente o de se tornar um fenômeno de comunicação, tanto na palavras escrita como na palavra falada e televisionada, transplantando de um meio para o outro suas características críticas e méritos intelectuais, sempre com uma boa dose bufa.

Se no ambiente público era esse tipo discutível, no ambiente privado, entre amigos, não havia ressalvas. Todos tinham sempre um causo interessantissimo e nunca repetido para contar sobre Francis. Jaguar, se não me engano, certa vez disse que detestava discutir com Francis pois ele sempre escolhia como cenário um taxi sem destino fixo, o que o levava - a Jaguar - sempre a se desconcentrar do bate-boca e desesperar-se com o taxímentro. Lucas Mendes, no documentário, dizendo que certa vez Francis termina um texto, levanta o papel da máquina de escrever com virulência e se vangloria: “nenhum advérbio de modo!” Ou o ataque ao amigo Fausto Wolff, dizendo que um dia escreveria um livro sobre todas as suas ignorâncias. Ou seja, uma figura impagável e divertidíssima. Ou seja, melhorando essa frase, uma figura impagável, por ser cara; incomprável por só trazer problemas; e invendável pois a partir dos anos 90 seu tipo de jornalismo pitoresco, impressionista e irresponsável – criado prêt-à-porter para a televisão - passou a ser um problema para as redações e uma impossibilidade para os canais de TV aberta. Prova disso é que hoje em dia, figuras como Reynaldo Azevedo e Diogo Mainardi transcencem ao espaço das colunas escritas apenas para o universo dos blogues onde encontram o feedback apenas de prosélitos.

O sinal desses tempos que vivemos hoje, é bem mostrado no final do documentários, com a saída de Francis da Folha de São Paulo, sua ida para o Manhattan Connection e sua polêmica com o antigo presidente da Petrobrás Joel Rennó, quando numa edição do programa Manhattan connection, Francis afirmou que os diretores da empresa tinham dinheiro na Suíça, formando “a maior quadrilha que já existiu no Brasil”. Uma absoluta inverdade comparado com os padrões de tamanho, organização e eficiência dos esquemas de corrupção atuais. Mas merecidamente ou não, nesse caso específico, foi processado por tratar uma das empresar mais fortes do Estado brasileiro, bem como a seus gestores, como quem sempre se habituou a tratar a esqueda. E não se deu bem.
O documentário conta ainda com uma irrelevante surreal carta lida pela viúva, sobre a morte de sua gata de estimação, e uma “bombástica” acusação de negligência médica no caso de seu infarte, tratado como bursite ou algo que o valha por insignificante que fosse. Felizmente a viúva trata logo de desmentir o terrível e melancólico fechamento-Conrad Murray-Michael Jackson que Diogo Mainardi calhordamente tenta, com a beneplácito de edição do diretor, imprimir no final. Isso tudo ao som de Wagner.

Música do dia. A Pipa do Vovô não sobe mais. Marchinha de Carnaval.

The Magician


O filme se passa no século XIX, e a estória é baseada num conto de G. K. Chesterton – Chesterton aliás que exerceu grande influência em Jorge Luis Borges e Gustavo Corção, que em Conversa em Sol Menor, cita o homem do nada pelos menos umas dezoite vezes e meia.

O filme é posterior ao Sétimo Selo e ao Wild Strawberries, dois clássicos do diretor. Em The Magician, Bergman oferece as peculiaridades psicológicas, as anormalidades, a contemplação mística que fazem dos hipnotizadores figuras quase transcendentais nos circos de subúrbio. E por falar em magia, Bergman podia não entender bem dessa coisa do Sobrenatural de Almeida, mas era mestre de imagem, montagem e roteiro,  para saber bem que não podia revelar completamente os truques dos mágico protagonista até quase o final do filme. Não chega a ser um filme bom, pois os personagens carregam um certo ar de caricatura e talvez isso fosse o que Bergman queria ao ironizar um pouco a estória de Chesterton.

O filme começa com uma carruagem atravessando uma floresta coberta de névoa. Dentro viaja uma trupe de artistas mambembes liderada pelo Dr. Vogler, um hipnotizador, sua mulher que está vestida de homem, e com ele uma anciã especialista em poções mágicas, e um bufão que se diz porta-voz da trupe, mas que volta e meia mete os pés pelas mãos.

No meio do caminho Vogler recolhe um velho ator bêbado, que está quase morrendo. No meio da viagem o ator morre, mas sem antes revelar a Vogler todos os detalhes físicos do que ele percebe da morte. O fato passa-se quase desapercebido para os demais da trupe, mas nas cenas seguites, Vogler vê o fantasma do homem, e seus significados em todo o canto. Principalmente quando o grupo é obrigado a fazer uma apresentação especial na residência de um nobre, onde estão presentes a esposa do nobre, um militar e um médico, Dr. Vergerus, o qual afirma, os poderes do mágico não passarem de charlatanice. São obrigados a passar a noite da mansão, onde reina uma lobriga atmosfera. Na cozinha, após uma farta ceia, passam-se coisas estranhas. Quem sabe se pelo vinho ou por qualquer outra coisa, um dos empregados tem uma visão do demônio. A velha bruxa põe uma das ajudantes da cozinheira para dormir e tudo vai se passando como se estivesse envolto numa aura de magia.

Nos seus aposentos, o mágico, enquanto prepara seus equipamentos para a apresentação do dia seguinte, é surpreendido pela esposa do Nobre que entra furtivamente, cheia de decotes, com aquela conversinha mole de que se sente só, de que o marido não lhe dá atenção, de que tinha perdido um filho, e por aí vai. A ajudante do mágico, até então, sempre vestida de homem, se retira com um olhar irônico, assim que a nobre entra.


O grande dia chega e o que seria uma simples apresentação mambembe, se torna uma pequena tragédia pois Vogler é estrangulado pelo criador de cavalos Antonsson, que apavorado com os poderes hipnóticos de Vogler, atenta contra o mágico.


O corpo de Vogler é então levado para o sótão da casa e lá Dr. Vergerus começa uma necrópsia.....


Esse é um filme que de alguma maneira põe em jogo a relação entre o artista incompreendido e seu público. Todos que travam contato com Vogler tem uma impressão distinta dele - talvez ajudados por sua suposta mudez, tema aliás que Bergman abordaria também em Persona, retratando a crise criativa da atriz voilá Elisabet Vogler, Vogler! Vogler? Vogler..., e sua relação com a enfermeira Alma.

O moribundo no meio da estrada, é o primeiro a perceber a falsa barba do hipnotizador, duvidando de seus poderes. Já a esposa do nobre o vê como uma entidade mágica. O médico prova cientificamente que Vogler é um charlatão, enfim todos tem uma impressão distinta. Mas isso não explica exatamente por que ele é ora invejado, ora humilhado. Fato é que um pequeno monólogo que ocorre na cozinha, dito por Antonsson... “People like that should be flogged,” expressa bem a incompreensão que cerca o artista. Ottilia Egerman, a esposa do nobre, quando chega ao quarto de Vogler, diz que todos o odeiam por que não o compreendem. Ela o compreende – mas com aquelas segundas intenções supra-citadas.

No fundo, esse pequeno detalhe dito por Ottilia nos remete a um outro tema fundamental da natureza humana. Não, não. Não falo da Vontade de Poder, na qual, de tanto pensar, Nietszche quase destrambelhou. Falo da incompreensão geral sobre a vontade de não ter poder algum, de manter-se crítico e independente. Vogler, o artista, apesar de enigmático e canastrão – e muito canastrão -, assumia essa ausência de vontade, que talvez seja mais ofensiva que a própria Vontade de Poder, frente aos poderes constituidos, os quais no filme se expressam pela Ciêcia que respalda os poderes do Estado - a nobreza e os militares.

Mostrar isso a um sub-chefe, ao redor da mesa de reuniões, em que todos só pensam competitivamente em mostrar suas qualidades extraordinárias para o chefe, é quase que inacreditável. Num ambiente de trabalho muito competitivo isso é quase ofensivo. E pior, suspeito. Pois no momento em que se mostra esse ar displicente, passa-se a levantar as famosas suspeitas conspiratórias... “estará esse ser vil querendo meu posto?”  Nesse meio tempo ainda há as coisas não ditas. Você pode ser considerado um hipócrita e manipulador – mas obviamente ninguém dira isso na sua cara, mas fará chegar aos ouvidos de seu chefe. Seu chefão pode telefonar como quem não quer nada, e cobrar aquela crítica construtiva em bona fide, não só cobrá-la, ameaça-lo por tê-la feito assim em público, e desligar o telefone na sua cara. E no dia seguite, passar por você e lhe dar Good Morning, como se nada tivesse acontecido. Daí para ser encarado como pessoa pouco confiável é um pulinho quase imperceptível quanto a primeira troca de olhares entre Vogler e Dr. Vergerus.

I am Love

De todos os filmes concorrentes ao Oscar deste ano, assisti justamente ao que não tinha a menor chance de levar nada. I am Love. Sinceramente, algumas sacadas boas sobre as pequenas alucinações de butique de Emma – Tilda Swinton -  e mais nada.

O filme, na verdade, conta a estória de uma família milanesa, podre de rica e que tem a fortuna proveniente do ramos da tecelagem. Os Recchi, como já disse são ricos pra cachorro, e o patriarca celebrará seu aniversário. A nora, Emma, mantém tudo neuroticamente organizado dentro e fora da casa. A roupa dos serviçais – rico chama assim a seus empregados -, a disposição dos convivas à mesa, enfim nada escapa. A ocasião é importante pois na celebração o velho Edoardo passará o controle da fábrica para o filho Tancredi. Emma é filha de um dono de antiquario de São Petersbugo que a encontra e a leva para a Itália. Os dois tem três filhos, Edoardo Jr., prestes a se casar com Eva; Gianluca e Elisabetta, que estura arte em Londres.

No jantar, a grande supresa é que o velho passa o controle da empresa para o filho e para o neto Edoardo Jr.. Mas como são podres de ricos, são discretos. O suposto mal estar se filtra pela emoção de ter o velho ainda vivo. Na festa, lá pelas tantas, aparece Antônio, que apesar de cozinheiro e pobretão tem uma inverossimil amizade com Junior, a quem venceu numa corrida naquele dia. Os dois têm inverossimeis planos de abrir um restaurante juntos e quando Junior apresenta o rapaz à mãe, uma gourmet, primeiro ela se sente atraída pela comida e depois pelo rapaz. A paixão há muito reprimida, transforma-a. A mulher entra numa vertigem de despertar sexual, e o vórtice a faz perder os limites. Passa a ir constantemente a San Remo visitar Antônio. E nessas muitas idas, corta o cabelo e  faz revelar o segredo de uma sopa que está no ramo da família russa muitas gerações.

Num dos jantares, no qual Antônio era o cozinheiro principal, o filho de Emma, Junior, que já andava com a pulga atrás da orelha com sua mãe, olha para a sopa de  entrée e lembra-se automaticamente do cabelo cortado da mãe, encontrado na casa de Antônio.  O jantar celebrava a passagem do controle acionário da empresa para um grupo indiano, portanto era um jantar de negócios, onde esse tipo de descontrole não seria aceitável no impertivo categórico que regia os Recchi.

Afastando um pouco a objetiva, vê-se uma Tilda Swinton polivalente, falando inglês, italiano e russo com fluência num papel que exigia a mais absoluta economia de emoções. Exagere os zoom-out e o filme não passa de uma cópia moderna e mal acabada de dois outros filmes, um o clássico  Il Gattopardo do Visconti; e o outro o impagável  The Royal Tenenbaums, do Wes Anderson.

E por falar nisso...


Melhor filme
Cisne Negro
O Vencedor
A Origem
O Discurso do Rei – VENCEDOR
A Rede Social
Minhas Mães e meu Pai
Toy Story 3
127 Horas
Bravura Indômita
Inverno da Alma
Melhor diretor
Darren Aronovsky – Cisne Negro
David Fincher – A Rede Social
Tom Hooper – O Discurso do Rei – VENCEDOR
David O. Russell – O Vencedor
Joel e Ethan Coen – Bravura Indômita
Melhor ator
Jesse Eisenberg – A Rede Social
Colin Firth – O Discurso do Rei – VENCEDOR
James Franco – 127 Horas
Jeff Bridges – Bravura Indômita
Javier Bardem – Biutiful
Melhor atriz
Nicole Kidman – Reencontrando a Felicidade
Jennifer Lawrence – Inverno da Alma
Natalie Portman – Cisne Negro – VENCEDORA
Michelle Williams – Blue Valentine
Annette Bening – Minhas Mães e meu Pai
Melhor ator coadjuvante
Christian Bale – O Vencedor – VENCEDOR
Jeremy Renner – Atração Perigosa
Geoffrey Rush – O Discurso do Rei
John Hawkes – Inverno da Alma
Mark Ruffalo – Minhas Mães e meu Pai
Melhor atriz coadjuvante
Amy Adams – O Vencedor
Helena Bonham Carter – O Discurso do Rei
Jacki Weaver – Animal Kingdom
Melissa Leo – O Vencedor – VENCEDORA
Hailee Steinfeld – Bravura Indômita
Melhor longa animado
Como Treinar o Seu Dragão
O Mágico
Toy Story 3 – VENCEDOR
Melhor filme em lingua estrangeira
Biutiful
Fora-da-Lei
Dente Canino
Incendies
Em um Mundo Melhor – VENCEDOR
Melhor direção de arte
Alice no País das Maravilhas – VENCEDOR
Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte I
A Origem
O Discurso do Rei
Bravura Indômita
Melhor fotografia
Cisne Negro
A Origem – VENCEDOR
O Discurso do Rei
A Rede Social
Bravura Indômita
Melhor figurino
Alice no País das Maravilhas – VENCEDOR
I am Love
O Discurso do Rei
The Tempest
Bravura Indômita
Melhor montagem
Cisne Negro
O Vencedor
O Discurso do Rei
A Rede Social – VENCEDOR
127 Horas
Melhor documentário
Lixo Extraordinário
Exit Through the Gift Shop
Trabalho Interno – VENCEDOR
Gasland
Restrepo
Melhor documentário em curta-metragem
Killing in the Name
Poster Girl
Strangers no More – VENCEDOR
Sun Come Up
The Warriors of Qiugang
Melhor trilha sonora
Alexandre Desplat – O Discurso do Rei
John Powell – Como Treinar o seu Dragão
A.R. Rahman – 127 Horas
Trent Reznor e Atticus Ross – A Rede Social – VENCEDORES
Hans Zimmer – A Origem
Melhor canção original
“Coming Home” – Country Strong
“I See the Light” – Enrolados
“If I Rise” – 127 Horas
We Belong Together – Toy Story 3 – VENCEDOR
Melhor Maquiagem
O Lobisomem – VENCEDOR
Caminho da Liberdade
Minha Versão para o Amor
Melhor Curta-metragem de animação
Day & Night
The Gruffalo
Let’s Pollute
The Lost Thing – VENCEDOR
Madagascar, Carnet de Voyage
Melhor Curta-metragem
The Confession
The Crush
God of Love – VENCEDOR
Na Wewe
Wish 143
Melhor Edição de som
A Origem – VENCEDOR
Toy Story 3
Tron – O Legado
Bravura Indômita
Incontrolável
Melhor Mixagem de som
A Origem – VENCEDOR
Bravura Indômita
O Discurso do Rei
A Rede Social
Salt
Melhor Efeitos especiais
Alice no País das Maravilhas
Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte I
Além da Vida
A Origem – VENCEDOR
Homem de Ferro 2
Melhor Roteiro adaptado
A Rede Social – VENCEDOR
127 Horas
Toy Story 3
Bravura Indômita
Inverno da Alma
Melhor Roteiro original
Minhas Mães e meu Pai
A Origem
O Discurso do Rei – VENCEDOR
O Vencedor
Another Year

Junebug


Junebug é um filme de Phil Morrison, o mesmo cara que criou a campanha massiva da Apple, "Get a Mac". Apesar de um filme de publicitário, é um filme convincente sobre pessoas estranhas e da difícil relação entre esse bando de gente composta por genros, sogros, noras, maridos, sogras, e toda essa faina na qual o conceito de família acaba incorrendo quando dois inocentes pombinhos se juntam. Madeleine é casada com George, um rapaz do qual pouco se sabe no início do filme. Casamento moderno. Na base da Sabe-se sim que Madeleine é uma espécie de caçadora de novos talentos. E numa dessas tentativas, George Johnsten, a serviço da galeria em que trabalham, conhece um artista outsider anormal e maluco que vive em North Carolina, por acaso perto da casa de seus pais. Então essa seria uma grande oportunidade de matar um monte de coelhos numa só cajadada. Nessa esticada de algumas 10 horas de viagem de carro, Madeleine poderia conhecer a família do marido, descobrir um novo artista primitivista e ainda por cima ganhar um monte de dinheiro em cima do pobre do artista.

Chegando à casa da família de George começa o choque de realidade. Madeleine é uma negociante de arte em Chicago. É moça, dessas que almoça um Activa, desses iogurtes que ajudam, como diz o comercial, na desoneração intestinal, e uma cenoura crua. A mãe de George o oposto, uma fumante convicta, pois afinal estamos falando da Carolina do Norte – terra de tabaco e gente esquisita -, é uma dessas mães à americana que escondem sob a polidez a face dominadora, que impõe ascendência assim sem querer impor, mas impondo. O pai é um taciturno de hábitos esquisitos, que vive pelos cantos da casa trabalhando em algo, consertanto algo, fugindo de algo, se ausentando de algo. Na casa ainda há a incrível presença do irmão mais novo de George, Johnny e de sua inacreditávelmente dependente e ingênua esposa, Ashley, grávida com a barriga à boca prestes a parir mais um Johnsten.

Madeleine, na ausência de George, que herda do pai essa capacidade de se ausentar mesmo estando em corpo presente, começa a interagir com todos na casa, seja ajudando Johnny a conseguir seu certificado de High School Equivalence – uma espécie de supletivo -, seja participando dos preparativos para o chá de bebê de Ashley, seja tentando ajudar a Peg nos afazeres domésticos, seja participando dos cultos evangélicos na igreja.

Mas tudo parece bem, pois todos sabem que a visita é apenas por poucos dias, e que depois disso, tudo voltará ao normal. Madeleine e George voltarão a Chicago deixando para trás os pais de George e seu irmão complexado. É um filme de comicidade tensa, pois apesar de situações levemente engraçadas, sabe-se que tudo pode degringolar a qualquer momento. E a estória começa sua pequena reviravolta de pequenos desentendidos, que abrem ainda mais o fosso entre Madeleine, que provavelmente passa fome e sacrifícios para manter sua beleza urbana, moderna, e vamos dizer assim, e os Johnstens, quando no chá de bebê preparado para Ashley – que poracaso quer botar o nome do filho, Junebug. No meio da reunião, o artista maluco aparece na casa dando sinais de que quer fechar um contrato com a galeria de Madeleine. A atitude desvela as segundas intenções de Madeleine no meio daquele fim de mundo tentando ser acessível e cordial com todos – mesmo que todos soubessem que sua atitude, apesar de polida, fosse forçada.

Dias depois a bolsa estoura. Agua para todo o lado. Correria para o hospital. O artista maluco envia outros sinais de de que vai assinar com outra galeria. Medeleine vai atrás dele. Ashley e toda a família vão para o hospital, menos Medeleine que está na casa do artista negociando as compras e George que tem paradeiro desconhecido. Horas de trabalho de parto. Madeleine desaparecida. O bebê natimorto. George finalmente chega para consolar Ashely. Madeleine volta finalmente para casa com seu quadro. George e Madeleine voltam para Chicago... Get a Mac. O meu chega em outubro.

Música do dia: Himalaya e Solfeggeto. Disco. Sebastião Tapajós & Pedro dos Santos

Hawaii, Oslo



Hawaii, Oslo é um bom filme norueguês de 2004 que segue a linha de outros filmes como 21 Gramas e os clássicos Magnolia e o grande Crash. O filme conta a estória de um grupo de pessoas que não necesariamente se conhecem mas que têm suas vidas cruzadas em algum momento.
Talvez a principal estória seja a de Leon, paciente de um hospital psiquiátrico, que espera pela realização do pacto que fizera com sua namorada, Åsa, dando conta de que quando cumprisse 25 anos, iriam viver juntos. No hospital, Vidar é o trastornado enfermeiro que se torna um bom amigo de Leon. Mais que amigo, se torna uma espécie de protetor do paciente que ao se sentir frustado, ou tomado pela sensação de pânico, começa a correr sem parar. Vidar é transtornado pelos seus sonhos. Até aí Freud riria de minha frívola sentença. Mas literalmente, Vidar acredita ter poderes premonitórios, já que seus sonhos trágicos, de alguma maneira se tornam realidade. Num deles, o jovem Leon é atropelado por uma ambulância e morre. Essa morbidez torna Leon superprotegido por Vidar, que angustiado pela perda do paciente e amigo, passa a não quere mais dormir.
O Filme começa com Frode e Milla com um bebê dentro de uma ambulância. Eles estão tendo seu primeiro filho, e foi dito a eles que não viveria por muito tempo. Em cortes rápidos, Leon corre em disparada pelas ruas de Oslo, à noite. Noutro corte, Vidar corre a procuda de Leon. Uma mulher desconhecida também vaga pelas ruas e cruza com Leon. Toda a sequência inicial é caótica mas determina todas as demais sequências do filme...
No dia de seu aniversário, Vidar, ansioso pelo momento da visita de sua prometida, acba recebendo a visita de seu irmão, Trygve, cumprindo pena por roubo, que pega Leon no hospital psiquiatrico para comemorar seu aniversário, mas que tem planos de usar a saída da cadeia com o irmão para fugir. O irmão tem um novo plano de assalto e pretende envolver Leon no roubo, no mesmo momento em que Leon se desespera com a hipótese de não encontrar Åsa.
Filmezinho bom, filminho bom...

Disgrace

John Malkovich é David Lurie, o professor de poesia romântica que perde sua posição e prestígio, antes de cair em desgraça, pela “relação amorosa” que mantém com uma aluna. Tanto o livro quanto o filme mostram que a reconciliação é um conceito apenas retórico na Africa do Sul pós-apartheid. No filme, Malkovich que já era um especialista em papéis ambiguos, Dangerous Liaisons e Ripley's Game são a prova maior disso, empresta a pele ao David Lurie, personagem criado por J.M. Coetzee.


O filme de Steve Jacobs segue absolutamente linha por linha a trajetória do livro. Para dizer a verdade, tamanho respeito ao original, torna a linguagem filmica um pouco monótona e nos mostra que realmente as duas formas de expressão, o Cinema e a Literatura, são práticas que dialogam mas que antes de tudo são distintas.

Nem por isso deixam de dialogar e esclarecer algo que talvez escapasse até mesmo a uma segunda leitura atenta ao livro.

Um dos pontos que o filme, ou no caso, uma segunda leitura com imagens, Lucy, a filha de Lurie, mesmo depois da violência sofrida, escolhe reerguer a vida exatamente no local onde a mesma havia sido violada e destruída. A decisão da filha não é compartilhada pelo pai, estremecendo mais ainda uma relação que nunca havia sido muito sólida. Um segundo ponto é tentar entender as razões de Lurie não aceitar uma espécie de pacto corrupto, se retratar publicamente e retornar a suas atividades docentes. No livro, o leitor talvez sempre se espere por uma virada, que a cada página se torna mais distante. O filme segue literalmente o livro, mas se Jacobs tem algum mérito, o mérito está em monstrar um David Lurie completamente devoto ao seu estudo intelectual. Enfim, não se pode esperar de um homem que dedica a sua via a ler Byron, Keats e Shelley, essa espécie de remissão. Por isso a estória é demolidora, no papel e na tela.

O filme vai até um pouco mais além. A indulgência nunca chega, e se chega assume uma peculiar expressão de aceitação. A auto-expiação, se caso ela exista, está ali em imagens quando quase no final do filme a câmera em zoom-out se afasta de Malkovich e mostra seu entorno. Ou seja, uma pequena casa, a câmera se afasta, uma pequena fazenda de terra não muito fértil, a câmera se afasta mais, a casa cada vez menor frente a vastidão de uma terra cada vez mais virgem, intocada, bravia. E o filme termina.

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Música do dia. Ne me quitte pas. Jacques Brel
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