os culpados pela música brasileira ser o que é...


Brasileirinho Encontros do Choro Contemporâneo
Lida - Yamandu Costa
Yamandu Costa + Dominguinhos
Violão Brasileiro - Rogério Souza
Brasilianos 2 - Hamilton de Holanda
Intimo - Hamilton de Holanda

Orlando Henriques:Gaudí, una altra mirada


 Fotografia é realmente algo que me atrai, e quando associada a uma web ou um blog, mais ainda. E numa cultura onde o texto vale cada vez menos, o sujeito como eu que se dedida diletantemente a ambas formas de comunicação que estão a caminho do fim da linha, encontra consolo no fato de que o mundo da web e da imagem digital sejam facilmente redutíveis ao texto e à vã prevalência daquela sobre o texto. Orlando resiste e esconde narrativas de amor a suas imagens em suas images TIFF e JPEG.

Orlando Henriques

Os Dragoes Escandinavos


É provável que a minha simpatia pela trilogia de Stieg Larsson tenha sido reforçada pelo meu caro apreço compartilhado pelo universo que raquers e que o uíquilíqui mostrou em toda a sua extensão nessas semanas – aliás, sem trocadilho, tá engraçado pra caramba ver todo mundo tentando explicar o embaraço causado pelo lEiTe DerRRaMadO, após Rílari ter ignorado o presbiterianismo intenacionalista dos 14 pontos do camarada Woodrow Wilson - falo do que ninguém fala, aquela espionagenzinha boba na ONU, tipo assim, aquela que fizeram na época para invadir um determinados país vizinho de um outro país que ao que tudo indica sera a bola da vez....


Por mais ridículo e cambaio que tenha sido meu mês de novembro, dividindo meu tempo entre a abrasiva realidade da violência no Rio de Janeiro e a leitura de uma trilogia sobre um jornalista oportunista fazedor de chalchichas e uma haker débil mental, valeu a pena. Afinal, citando Pessoa, tudo vale apenas quando a alma não é de menas.


Não se trata de literatura, longe disso. As mais de 2100 páginas da trilogia escrita pelo sueco são um puro entretenimento que nos leva a crer que - citando Hamlet, obviamente - há algo de podre no reino da Suécia. Mesmo assim há técnica narrativa. Acho que é isso. Trata-se de uma técnica de não deixar espaços vazios ou fios do enredo soltos, muito mais que uma preocupação com o texto. Para preencher esses espaços vazios ele evoca os fatos, apenas fatos.


O primeiro livro (Men Who Hate Women) talvez seja mesmo o melhor da trilogia. Como nos melhores contos policiais, pouco dos investigadores-protagonistas e muito do enredo é revelado. O livro começa com uma intrigante cena. Henrik Vanger, um empresário aposentado, desses podres de ricos, recebe um quadro com uma flor. No seu escritório há 43 dessas flores secas. As sete primeiras foram dadas por sua sobrinha Harrier Vanger. As demais são enviadas anonimamente todo o ano de diferentes parte do mundo, certificadas pelo carimbo dos correios, sempre no dia do aniversário da sobrinha, que desapareceu há mais de trinta e seis anos da ilha onde a família Vanger vive até hoje. As investigações policiais nunca deram em nada. Jamais conseguiram chegar a uma conclusão sobre seu assassinato pois nunca encontraram seu corpo. No dia em que ela desapareceu havia uma celebração cívica e um acidente, e a única ponte que ligava a ilha ao continente estava interditada. O que eliminava a hipótese de que o suposto assassino tivesse sumido com o corpo. Desde então, o tio Henrik Vanger é obcecado pela solução deste caso.

Mikael Blomkvist é um jornalista de meia-idade que anda na lona após ter denunciado, difamado e caluniado um empresário, meio no estilo Veja, sem ter provas – mais tarde acaba-se sabendo por um enredo secundário que o tal de Hans-Erik Wennerstrom é verdadeiramente um mau caráter que se dedica à lavagem de dinheiro. Mas nessa altura, Blomkvist ainda é um jornalista desacreditado e sem muitas opções profissionais, por esse motivo ou apesar dele, acaba por aceitar o convite de Henrik para desvendar o desaparecimento de sua sobrinha.

Henrik contrata a empresa de investigações de Dragan Armanskij para fazer um levantamento da vida de Blomkvist. Na empresa trabalha uma das investigadora esquisitona chamada Lisbeth Salander, uma moça meio punk, meio pan, meio cheia de peircings e tatuagens, meio totalmente anti-social, meio toda magrela e vista assim a distancia meio retardada. Ela é a responsável pelo dossie a respeito de Blomkvist que Dragan entrega ao advogado de Henrik antes que este o contrate.

Por conta dessa investigacao, os dois acabam se encontrando. Ou melhor, Blomkvist descobre que havia sido investigado por Salander por encomenda de Henrik. Fica indignado, mas como eh compulsivo e nao consegue mais se livrar da investigacao, que se entranhou em seus poros, nao desiste do caso. Ainda assim vai ateh a casa de Lisbeth para tirar uma saxtixfacao com a moca. Os dois acabam se entendendo e vindo a trabalhar juntos. Ela com suas habilidades de haker vai a procura dos detalhes que Blomkvist não consegue desvendar apenas com a lógica.

Evidentemente que não vou revelar os detalhes mais importantes da trama que é otima, mas depois desse livro, quando você vir um Volvo passando pela rua ou uma estante da Ikea, você vai ficar pensado nas, vamos chamar assim, virtudes da convivência familiar escandinava. E olha, meu amigo, a família Vanger e podre. Mas como no meu caso, tendo Nelson Rodrigues, Carlos Zéfiro e acima de tudo Jenival Lacerda como figuras tutelares para minha moral - em lugar de Lia Luft - nem fiquei tão impressionado assim com o livro.

The Girl with the Dragon Tattoo, o segundo livro da série, é mais centrado em Lisbeth Salander. Ela agora vai ganhando contornos mais humanos e percebe-se mais seu entorno e suas reações. Acima de tudo, descobre-se sobre seu passado e sobre o acerto de contas com seus, diríamos assim, fantasmas.

No início da estória Lisbeth desapareceu. Com a grana que ‘ganhou’ em suas atividades de ráquer no caso Hans-Erik Wennerstrom, se mandou da Suécia para esquecer a relação com Blomkovist. Está numa praia do Caribe curtindo a vida, estudando equações matemáticas – coisa boba, puff, tipo teorema de Fermat e aritmética de Diofantos. De quebra ajuda uma mulher a se livrar, ainda que acidentalmente, do marido canalha, durante um furacão e usa o tempo livre para fazer operções finaceiras on-line.

Mikael Blomkvist, livre da cadeia, tendo desvendado o paradeiro de Harrier Vanger, e tendo seu nome limpo ao desvelar a verdadeira face criminal de Hans-Erik Wennerstrom, volta à Millenium fortalecido. Nas mãos tem uma reportagem sobre tráfico de drogas (que na Suécia, ainda é um escândalo!) e prostituição de mulheres procedentes do Leste Europeu. O responsável pela investigação jornalística é Dag Svensson, um jovem jornalista, e sua esposa Mia Bergman, especialistas em criminologia.

O aprofundamento das investigações jornalisticas levam a uma máfia encabeçada por um homem misterioso chamado Alexander Zalachenko, ou apenas Zala, um ex-dissidente soviético, que pediu asilo político na Suécia nas vésperas do Social-Democrata Olof Palme deixar o poder. Meio X9, meio alcaguete, Zalachenko, a princípio, seguindo-se a linha de investigação de Blomkovist, acredita-se que ele só tenha alguma conexão com a investigação de Dag Svensson sobre prostituição e cafetinagem. Entretanto, há muito mais coisa feia. Várias vezes há insinuações sobre a suposta relação da chegada de Zalachenko à Suécia e o assassinato de Palme – principalmente no terceiro livro, quando ele está na berlinda e começa a ameaçar Säpo, a puliça secreta sueca, com a velha máxima “vô contá tudo que eu sei”. Fato é que a Zalachenko, não apenas por ter vindo de onde veio, numa época que um comunista e soviétivo era mais temido que um javali contrariado, mas por que trouxe com ele segredos, já que era da inteligência militar russa, contava com uma proteção especial.

Neste terceiro e último volume da série, The Girl Who Kicked the Hornet's Nest. Lisbeth está chumbadona. Literalmente. Tomou um monte de tiros e um deles justo na cabeça. Está entre a vida e a morte internada num hospital. No quarto ao lado, seu maior inimigo, Zala – não posso revelar por razões ético-carnavalescas quem é o tal de Zala pois e nesse fio que se sustenta tuda a trama do segundo volume. A moça está em apuros. Está internada, e assim que sair do hospital – se sair – deve responder por um processo de tentativa de triplo assassinato de Zalachenko.

Mikael Blomkvist evidentemente não crê nas acusações e vai a procura de respostas para limpar o nome da moça. Para isso, conta apenas com a ajuda da equipe de Millenium - agora sem sua editora chefe, centrada em sua ambição, que foi para outra revista maior –; de Annika Giannini, irmã de Mikael, advogada especializada em defender vítimas de crimes contra a mulher; e o inspetor Jan Bublanski, que começa a investigar o caso seguindo uma linha distinta da promotoria liderada por Eriksson se eu não me engano, já que a quantidade de personagens nos três livros deve ser duas vezes maior do que o número que pessoas que já passaram pela minha vida, contando aí o seu Bijú, temido inspetor do CEFET, o mudinho Hélio com quem eu trabalhei muitos anos, e muitos outros.

Enquanto Erika Berger está totalmente imersa numa luta pelo poder e estratégias comerciais em seu novo jornal, o Svenka Morgon-Postenm Mikael está só e desorientado na investigação daquilo que começa a se conigurar como um complô contra Lisbeth. Confiar no Estado – no Aparelho do Estado como diria o bão e véi Althussé – não é uma saída muito lógica, já que as acusações que pairam sobre Lisbeth são graves.

O segredo comercial de Stieg Larsson? Para mim são dois, além do talento apenas de ser um bom e competente contador de estórias. Primeiro, os desdobramentos a trama principal. São inúmeros (perdão da má palavra!) sub-plots, que ele vai abrindo e fechando com precisão milimétrica. Ele absolutamente não deixa nada de fora, mesmo criando uma in-fi-ni-da-de de personagens que circundam a trama principal. O cara se dá ao luxo até de tornar um faxineiro, um neuro-cirurgião, e um cidadão com síndrome de imunidade a dor, personagens fundamentais em determinada parte da trama. Segundo, os detalhes. Mesmo com essa quantidade imensa de personagens, ele detalha-os de maneira precisa, dando-lhes individualidade. E as sequencias de fatos, sem divagações sobre a psicologia dos personagens, afinal cada livro tinha apenas 700 páginas. Não dá tempo...

Ontem também, assisti o terceiro filme da série. TODOS os três. Péssimos. A impressão que tive em todos os três é que os diretores – diferentes em cada um deles – foram incompetententes e desleixados, deixando um monte de detalhes fora da narrativa filmica. Enfim, acabou.

Filmes de 2010

Lista Parcial dos Filmes, Operas e Documentários de 2010.


The Life of Emile Zola


Orlando


The Girl Who Played with Fire


Greenaway: The Shorts


H

Memories of Murder


The Girl with the Dragon Tattoo


The Secret of the Grain


Cria Cuervos


Henry & June


Henri Cartier-Bresson: The Impassioned Eye


Lady Vengeance


El Bola


Sympathy for Mr. Vengeance


Camille Saint Saens: Samson et Delila


Mamma Roma


Le Corbeau


Elling


Army of Shadows


Il Posto


The Sorrows of Gin


Les Miserables


Elegy of the Land


Sanshiro Sugata


The Men Who Tread on the Tiger's Tail


The Bothersome Man


Golden Door


Junebug


Love and Anger


Disgrace


The Station Agent


Hawaii, Oslo


Fedora (Metropolitan Opera)


Cavalleria Rusticana / Pagliacci


A Girl in Black


Samson et Dalila


Ernani


Thais


Rossini: La Cenerentola


Otello


Donizetti: L'Elisir D'Amore


Don Carlos


Nabucco


Inglourious Basterds


Lucia di Lammermoor


Julia


Adaptation


The Little Foxes


Bye Bye Brazil


Cet Amour-La


Of Human Bondage


To the Left of the Father


Flame and Citron


Blind Chance


Children of Heaven


Ikiru


Grupo Corpo: Dance Theatre from Brazil


The Night of the Shooting Stars


You Laugh


Elective Affinities


The Barbarian Invasions


The Decline of the American Empire


Ginger & Fred


City of Women


Thirst


Quiet Days in Clichy


Orchestra Rehearsal


Crisis


The 3 Penny Opera: Bonus Material


Torment


The Prefab People


Autumn Sonata


Family Nest


Werckmeister Harmonies


Hour of the Wolf


The 3 Penny Opera


Almanac of Fall


The Outsider


Children of a Lesser God


Damnation


Children of Paradise


Therese Raquin


Wagner: Siegfried

As UPPs de Frederick Wensley contra a preguiça Serpico


Sem desconsiderar Scarface e o próprio Poderoso Chefão, ainda penso que Serpico é um dos melhores filmes onde assisti Al Pacino atuando. O Filme é de Sydney Lumet – um dos mais irregulares monstros sagrados do cinema americano de quem Hollywood quase não fala. Nos dividendos de Lumet estão o Assassinato no Expresso do Oriente (uma bomba de filme!), mas no saldo estão obras primas como o 12 Angry Men, com o Henry Fonda, e o The Pownbroker, com o Rod Steiger. Em suma, Lumet tem uma qualidade essencial: sabe escolher a dedo seus protagonistas. Em Serpico, não é diferente.

Hoje, vendo essa realidade do Rio de Janeiro, um filme oportuno para nos fazer refletir sobre o caráter corrosivo da corrupção policial no Rio de Janeiro. O filme é atual, mas  nem é um grande filme, pois é bastante biográfico e linear. Fato é que Al Pacino empresta à pele de Frank Serpico, da Polícia de Nova Iorque, toda a angústia, o desespero e o estoicismo de um policial honesto cercado por corrupção e desonestidade por todos os lados. O filme começa com Serpico coberto de sangue, com as sirenes ligadas e chegando ao hospital. Acabava de ser baleado na cara. O resto do filme conta a história de Serpico, um policial que recusa se misturar com a banda podre da polícia... e por isso paga um preço caro.

O jovem policial é idealista e extremamente frustrado com a política. Sua vida pessoal, por estar sempre meio que exilado de seu meio, acaba por torná-lo um cara meio evasivo até mesmo para a noiva. Ele tem um pouco dos hippies. Carrega todo o peso da aura contracultural, se veste de maneira extravagante, mora no Greenwich Village, num bairro artístico, tem a barba sempre grande e sempre está rodeado de hippies e amigos ligados a movimentos de esquerda. Ou seja, um cara meio maconheiro, mas meio esquisitão. Ao se negar a receber propina e participar dos pequenos esquemas de corrupção, ele passa a se tornar um estranho no ninho do NYPD, levantando a desconfiança de seus companheiros de farda. Em pouco tempo está depondo na temida Knapp Commission, uma comissão de investigação no esquema de Corregedoria policial com o aval do Juiz Percy Whitman Knapp, que apurava casos de corrupção policial na NYPD.

Ainda por conta do teatro mediático dos últimos dias no Rio de Janeiro, eu, um quase agnóstico militante, fiquei pensado em Tomé,  o apóstolo. Tomé NUNCA tocou em Jesus ressuscitado. Ele apenas disse que precisava tocar nas chagas para crer na ressurreição. Muito incauto pensa que tocou pois ficam vendo essas telas do Caravaggio e passam a acreditar que tocou e que a partir daí é que passou a crer na existência da vida nova. Tocou nada! Tomé acreditou na palavra. Imagine, se ia trocar o único bem que tinha - o do benefício da dúvida - pelo bem que imaginava obter - uma hipótese insustentável. Acreditar na palavra, isso é o que se pede de quem confia. A crença na honra da palavra, que gera o benefício da dúvida.

Crer cegamente é confortável. Crer que a polícia está do lado do bem os bandidos do lado do mal, é reconfortante. Folheava eu hoje pela manhã um livro interessante chamado The Scotland Yard Files de Allan Moss. Evidentemente não li o livro todo, pois acho esse assunto para lá de enfadonho, mas de saltos em saltos pude constatar que a história da Scotland Yard, assim como a história da polícia do Rio de Janeiro, está cercada de brutalidade e corrupção. Mas tudo bem, pois o pensamento sempre foi o de: se está funcionando, deixa como está.

A chamada Polícia Metropolitana de Londres surge em 1829 pela aprovação do Metropolitan Police Act. As atribuições dessa nova polícia eram as de prestar proteção a personalidades públicas, comunidades, patrulhas e todas as demais atribuições de uma polícia do século XIX. A partir de 1842 parte da Scotland Yard passa a andar à paisana. Ou seja, os policiais que já não tinham boa fama fardados, não podiam mais reconhecidos. E em poucos anos, a polícia já era um exemplo do que uma polícia não deveria ser. O naipe de irregularidades ia desde a asociação com máfias irlandesas, prostituição, jogo, até crimes de gênero.

Em 1877 a instituição era tão corrompida e desacreditada que 4 de 5 elementos que ocupavam os postos de mais alto escalão na hierarquia são julgados e acusados de conspiração e formação de quadrilha. Dez anos mais tarde acontece o famoso “Bloody Sunday” - imortalizado na música de uma banda que ”existiu” na década de 90, chamada U2 – quando 2000 policiais avançam contra uma manifestação pacífica de trabalhadores da Social Democratic Federation matando 100 trabalhadores.

Foi necessário quase 50 anos para chegar um cara chamado Frederick Wensley. O apelido dele, provavelmente dado por seus detratores, era weasel, ou furão ou fuinha, uma espécie de rato dentuço. Fato é que o homem ficou à frente da Scotland Yard por mais de 40 anos. Foi ele quem implementou a transformação radical da instituição. Primeiro, mudou de prédio de lugar. Segundo, aumentou o número de policiais. Só para se ter uma idéia, em 1890, o número de policiais subiu de 1000 para mais de 13000. Ou seja, injetou uma tropa com sangue novo e transferiu todos os corruptos para funções burocráticas, longe das ruas e portanto longe das atividades ilícitas. Em duas décadas, conseguiu "limpar" a polícia londrina.

Bem, mas resta saber se toda essa política de reestruturação da polícia do Rio de Janeiro, baseada na tomada de territórios, armas e drogas dos traficantes será acompanhada por uma reestruturação geracional da polícia. Sabe-se, por leitura de jornais, que as UPPs usando “mão-de-obra fresca“ procuram suprir e substituir com novos e entusiásticos policiais, uma tropa já viciada em velhas práticas.

Sou muito cético em relação a isso, pois há um componente histórico nisso tudo -  e por favor vejam os trabalhos do historiador Marcos Bretas da UFRJ sobre a formação da Polícia Militar e a história de como se formou a Guarda Nacional do Império.  Curiosamente, a nossa polícia era tão corrupta e brutal quanto a Scotland Yard, e mais curioso ainda é que a nossa, formou suas primeiras tropas incorporando justamente milícias estaduais. Milícias de homens armados que trabalhavam para grandes proprietários de terras, ou o grande capital urbano.

Mas concentrando-se apenas nos fatos... O governo fala de 40 UPPs, ou seja, mais 28 unidades nos próximos quatro anos. Com base em critérios técnicos da Secretaria de Segurança Pública, eles alegam que isso seria suficiente para ocupar todas as comunidades que são controladas pelo poder paralelo.

Um conhecido meu que entende muito desse negócio de UPP, me diz que cada UPP tem atualmente uma média de 150 PMs, o estado precisará de mais 4200 soldados nos próximos quatro anos. No seu argumento, o governo acaba de ampliar a capacidade de formação da academia da PM, que agora poderá recrutar e formar 20 mil soldados no próximo mandato.

Ainda seguindo seu argumento, a média de PMs que deixam a corporação por aposentadoria ou por mudança de profissão mantiver-se constante, ou seja, pouco acima de 1000 ao ano, o Estado vai perder menos de 5 mil PMs nos próximos quatro anos. Assim, o saldo em 2014 pode ser superior a 15 mil novos PMs, bem mais do que suficiente para as UPPs e para o patrulhamento das ruas. Mesmo que as próximas unidades exijam efetivos bem maiores, como será o caso do Complexo do Alemão e da Rocinha, PMs não será um problema.

Essas são as contas deste conhecido, douto em políticas públicas.... ou seja, uma pessoa muito inteligente!

***********

Agora, eu mostro as minhas contas...

Fazendo uma matemática rápida em cima de uma entrevista recente do recente Secretário de Segurança para a recente Revista Epoca, para 10 comunidades, a polícia precisaria de 1880 homens. Ou seja, ele precisa de quase 200 homens para cada favela - dependendo do tamanho de cada uma, obviamente.

No fundo, estamos falando de mais de mais ou menos 800 favelas no Rio de Janeiro, mais de 1.5 milhão de pessoas morando em comunidades pobres. 1.5 milhão de pessoas é mais ou menos 10% da população do estado do Rio de Janeiro. Você pode até discordar do meu ceticismo e das minhas conclusões, mas você há de convir que é gente pra dedéu.

Bom, mas ainda baseado na entrevista do Secretário, para pacificar 800 favelas, ele precisaria multiplicar 188 homens x 800 favelas. No fundo ele precisaria de mais de 150 mil soldados para cobrir todas as favelas. E ele diz que a ACADEPOL pode formar 4000 por ano. Ou seja, o plano é bom mas é eleitoreiro exatamente nesse ponto, pois em 4 - 5 anos ele somente poderá colocar no máximo 20 mil soldados em UPPs. Vamos ser sinceros, isso vai cobrir mais ou menos 15% do total de favelas do Rio de Janeiro.

Por isso, a impressão que me passa é a de que o atual Governador – por mais bem intencionado que esteja e digo desde já que só em ter tocado nesse vespeiro já ganha minha simpatia - está combatendo com recursos parcos e limitados apenas o varejo. O atacado da droga e da arma, não é abalado pois depende de combate nas esferas federais.

Somente para concluir... do que eu estava falando mesmo... ah sim, do filme Serpico.... penso que o atual governo do Estado está incorporando ar proselitista desde que assumiu, dizendo que não pode prender o traficante x y z por preservar vidas… pode ser. A atuação no Complexo do Alemão provou isso. E alguma coisa mudou desde que ele asumiu. Pois o Alemão já tinha sido invadido em meados do primeiro mandato do atual Governador. E foi aquele desastre com 30 mortos repercutindo mal pra caramba - com os traficante trazendo os corpos em carrinhos de mão para a entrada da favela para a policia recolher.

Ainda há as contas que um outro amigo que não entende nada de nada, mas é engenheiro e tem MBA nos Estados Unidos, ou seja, entende de matemática. Ele acaba de me passar dados baseados no blog do Luis Nassif.... e cá pra nós, assustam mais:

[ Fiquei curioso para saber o preço das armas usadas pelo narcotráfico, como a UZI e a AK-47. Eu imaginava que estas armas custariam milhares de dólares -  mesmo no mercado negro.

Para minha surpresa, descobri que o custo é bastante acessível: vai de $400 a $800. (Fonte:http://www.atlanticfirearms.com)

Assumindo uma média de $500, o custo para armar um grupo de 600 homens é de $300 mil.

Parece muito, mas é o equivalente a apenas 6kg de cocaína ($50/g) ou 300kg de maconha ($1/g).

Só para ter idéia dos números do tráfico, a Secretaria de Segurança Pública do Rio informou que, entre domingo e ontem, foram apreendidos 33 toneladas de maconha e 235 quilos de cocaína no conjunto de favelas do Alemão.

Considerando que a demanda por drogas vai seguir existindo (isto é um fato), todo este dinheiro irá para os traficantes de outros morros. Pior: eles ganharão ainda mais devido à escassez temporária.

Dá para entender por que a guerra contra as drogas não funciona?]

Mas voltando a Serpico. Tomé NUNCA tocou em Jesus ressuscitado. Acreditam que tocou. Faz bem acreditar. Mas no fundo ele so creu na palavra. Acreditar na palavra, isso é o que se pede de quem confia. A crença na honra da palavra. Na palavra de honra. Dá pra acreditar? Que dá dá, mas...

En los naufragios, al hundirse la nave, los marineros del Danubio rezaban: “Duermo; luego vuelvo a remar”

Escrevi isso na segunda-feira às seis horas da manhã. Relutei muito em postar isso aqui, por se tratar de um blog de idéias mal alinhavadas sobre literatura e cinema. Mas após assistir a entrevista de Luiz Eduardo Soares no Roda Viva decidi publicar. Afinal, após a entrevista, sempre ponderada, entendo e me certifico de que aquilo que aconteceu na semana passada também é um tipo de ficção. Sendo assim por que não entrar aqui?




Na História da Eternidade, Borges utiliza a metáfora do sono, do sonho, da noite para expressar a idéia da morte – sem obviamente jamais usar a palavra “morte” em sua essência.


En el Antiguo Testamento se lee (I Reyes:2:10): “Y David durmió con sus padres, y fue enterrado en la ciudad de David”. En los naufragios, al hundirse la nave, los marineros del Danubio rezaban: “Duermo; luego vuelvo a remar”. Hermano de la Muerte hijo del Sueño, Homero, en la “Ilíada”; de esta hermandad diversos monumentos funerarios son testimonio, según Lesing. Mono de la Muerte (Affe de Todes) le dijo Wilhelm Klemm, que escribió asimismo: “La muerte es la primera noche tranquila”. Antes, Heine había escrito: “La muerte es la noche fresca; la vida, el día tormentoso...” (…) “Lo que el sueño es para el individuo, es para la especie la muerte” (Weltals Wille, II: 41). El lector ya habrá recordado las palabras de Hamlet: “Morir, dormir, tal vez soñar”, y su temor a que sean atroces los sueños de la muerte. (Borges, 1997:81-82).


Me admirou muito o uso das metáforas nesse episódio lamentável da invasão de das favelas no Rio de Janeiro. Além do uso e abuso das mais ridículas metáforas, me admirou a capacidade de autoridades civis e militares criarem uma espécie de panacéia verbal para contornar as imagens que os canais de tv, com seu sencacionalismo mediático de praxe, exibiam ao vivo.


Mas uma hora tinha que acontecer. A UPP tinha que chegar ao subúrbio do Rio de Janeiro para não se tornar um plano apenas eleitoreiro do governador Sérgio Cabral Filho, que foi empossado em janeiro de 2007 e apenas iniciou o tal plano em fins de 2008. De lá para cá, já há algumas instaladas, evidentemente, mas em comunidades pequenas. O que ainda me fazem desconfiar de se tratarem apenas planos pilotos.


A primeira grande operação começa de forma atabalhoada. Precisava-se dar uma resposta firme à série de ataques a civis na última semana. Uma série de boatos se espalha pela cidade. Alguns dão conta que uma grande quantidade de dinamite estaria em mãos do tráfico e dos paramilitares. E que a ponte Rio-Niterói seria explodida. Outro boato dava conta que a Rede Globo negociara com a Secretaria de Segurança a não divulgação de que o Secretário de Segurança havia sofrido um atentado com carro bomba. Todos boatos, ou não. Então, motivados pela pressão e pela insustentabilidade da situação, a primeira grande operação começa ela Vila Cruzeiro.


Fato. Começa pela Vila Cruzeiro em represália aos mais de 100 veículos queimados na cidade nas últimas duas semanas. Entretanto, há àreas na nesse complexo de favelas que a polícia não conseguia chegar há anos, com barreiras físicas e bélicas que a polícia não conseguia transpor de forma convencional. Precisava-se então de tanques. Aliás, o episódio da entrada das forças armadas nessa ação ainda está MUITO mal contada. A única força que ofereceu apoio logístico inicial foi a Marinha com os Fuzileiros Navais.


“Hora de Show Time”


Entraram os tanques. Tanques de guerra. Tanques que passam por muros de até um metro de altura. Impressiona? Lógico que impressiona! Uma arma que dispara rajadas de balas .50 é algo brutal em zonas urbanas. A expectativa até sábado era a de que haveria um massacre. Constitucionalmente, atirar com um negócio desses em alvos civis em tempo de paz é impossível, ilegal e inconstitucional. Qualquer pessoa sabe disso, até o Governador. Mas os tanques impressionam e geram expectativa.


As imagens de criminosos fugindo da Vila Cruzeiro e migrando para o Complexo do Alemão também impressionou a todos e também está MUITO mal contada. Principalmente pela quantidade. Era muito bandido junto. Por que não havia um cerco esperando? Evidente. Não havia um plano imediato para isso.


Na versão oficial, não havia estrutura para duas operações tão complexas, simultâneas e seguras. E por isso se preferiu a tática de acuamento. Sem dúvida, uma saída negociada, sem sangue, sem perda de vidas. Preferiu-se não quebrar os ovos. No fundo um jogo onde ambos lados ganhavam tempo para minimizar os riscos de mácula nas imagens públicas.


No fundo, o governo do estado do Rio de Janeiro se apóia na errônea idéia de que os recursos do Estado são ilimitados, em comparação com os dos bandidos que sem moeda de troca (que seria na visão do Secretário de Segurança Mariano Beltrame, o território, a arma e a droga) tornam-se frágeis. Errônea idéia, por que: Por que um bandido não deixa de ser bandido da noite para o dia. Por que munição e drogas continuam entrando pela Baía de Guanabara, pelas estradas e pelas fronteiras. Por que já se fala de uma luta de bem contra o mal, como se obtusamente policiais corruptos tenham deixado de existir e de corromper o sistema por dentro.


No fundo, no fundo, a polícia hoje passa e recolhe corpos, bandidos recalcitrantes, drogas e armas. Ou seja, 400 quilos de cocaína, 50 toneladas de maconha e até agora sabe-se muito pouco sobre o armamento apreendido, menos ainda sobre os chefes do tráfico, e menos ainda sobre o apradeiro dos mais de 500 fugitivos. Foi um golpe no tráfico? Claro que sim. Isso deve corresponder a um prejuízo de seis meses nas contas do tráfico. Foi um golpe midiático? Claro que sim, pois cá pra nós, pelas proporções da operação e pelo pequeno número de prisões, tudo não passou de um golpe de vista que durou uns dias e depois será esquecido, pois em fevereiro tem Carnaval, e em dois ou quatro anos temos Olimpiadas, Copa, Visita do Papa, Posse do Sultão da Bessarábia, sem esquecer a Conferência Internacional sobre Entomologia Neurotropical.


O resto são metáforas extemporânea, como a da mãe do bandido Mister M que leva o bandido à delegacia dizendo “Filhinho vamo sintregá cua mamaen” [absurdo: como se isso fosse amor de mãe]; o rapaz da ONG negociadora que se imbui do poder evitar um “extermínio étnico”[absurdo: como se na comunidade apenas negros sofreriam com o desfecho violento]; o Secretário de Segurança chamando o Complexo do Alemão de o “Coração do Mal”[absurdo: como se o coração vivesse sem cérebro]; “vitória da ordem e fim do caos” [absurdo: comos e houvesse dois lados]; a atendente do Disque Denúncia chamando seu serviço de “Bacia das Almas”[ absurso: como se estivessemos esperando apenas os óleos santos]; e a melhor de todas

“Fernand

inho

bera mar” [sic] tatuado no braço de um infeliz.


Nota. Fotografia - Roberto (Bear) Guerra. Complexo do Alemão 2008.

Turn Your Thinking Upside Down

On a very basic level all beings think that they should be happy. When life becomes difficult or painful, we feel that something has gone wrong. This wouldn’t be a big problem except for the fact that when we feel something’s gone wrong, we’re willing to do anything to feel OK again. Even start a fight.

According to the Buddhist teachings, difficulty is inevitable in human life. For one thing, we cannot escape the reality of death. But there are also the realities of aging, of illness, of not getting what we want, and of getting what we don’t want. These kinds of difficulties are facts of life. Even if you were the Buddha himself, if you were a fully enlightened person, you would experience death, illness, aging, and sorrow at losing what you love. All of these things would happen to you. If you got burned or cut, it would hurt.

But the Buddhist teachings also say that this is not really what causes us misery in our lives. What causes misery is always trying to get away from the facts of life, always trying to avoid pain and seek happiness—this sense of ours that there could be lasting security and happiness available to us if we could only do the right thing.

In this very lifetime we can do ourselves and this planet a great favor and turn this very old way of thinking upside down. As Shantideva, author of Guide to the Bodhisattva’s Way of Life, points out, suffering has a great deal to teach us. If we use the opportunity when it arises, suffering will motivate us to look for answers. Many people, including myself, came to the spiritual path because of deep unhappiness. Suffering can also teach us empathy for others who are in the same boat. Furthermore, suffering can humble us. Even the most arrogant among us can be softened by the loss of someone dear.

Yet it is so basic in us to feel that things should go well for us, and that if we start to feel depressed, lonely, or inadequate, there’s been some kind of mistake or we’ve lost it. In reality, when you feel depressed, lonely, betrayed, or any unwanted feelings, this is an important moment on the spiritual path. This is where real transformation can take place.

As long as we’re caught up in always looking for certainty and happiness, rather than honoring the taste and smell and quality of exactly what is happening, as long as we’re always running away from discomfort, we’re going to be caught in a cycle of unhappiness and disappointment, and we will feel weaker and weaker. This way of seeing helps us to develop inner strength.

And what’s especially encouraging is the view that inner strength is available to us at just the moment when we think we’ve hit the bottom, when things are at their worst. Instead of asking ourselves, “How can I find security and happiness?” we could ask ourselves, “Can I touch the center of my pain? Can I sit with suffering, both yours and mine, without trying to make it go away? Can I stay present to the ache of loss or disgrace—disappointment in all its many forms—and let it open me?” This is the trick.

There are various ways to view what happens when we feel threatened. In times of distress—of rage, of frustration, of failure—we can look at how we get hooked and how shenpa escalates. The usual translation of shenpa is “attachment,” but this doesn’t adequately express the full meaning. I think of shenpa as “getting hooked.” Another definition, used by Dzigar Kongtrul Rinpoche, is the “charge”—the charge behind our thoughts and words and actions, the charge behind “like” and “don’t like.”

It can also be helpful to shift our focus and look at how we put up barriers. In these moments we can observe how we withdraw and become self-absorbed. We become dry, sour, afraid; we crumble, or harden out of fear that more pain is coming. In some old familiar way, we automatically erect a protective shield and our self-centeredness intensifies.

But this is the very same moment when we could do something different. Right on the spot, through practice, we can get very familiar with the barriers that we put up around our hearts and around our whole being. We can become intimate with just how we hide out, doze off, freeze up. And that intimacy, coming to know these barriers so well, is what begins to dismantle them. Amazingly, when we give them our full attention they start to fall apart.

Ultimately all the practices I have mentioned are simply ways we can go about dissolving these barriers. Whether it’s learning to be present through sitting meditation, acknowledging shenpa, or practicing patience, these are methods for dissolving the protective walls that we automatically put up.

When we’re putting up the barriers and the sense of “me” as separate from “you” gets stronger, right there in the midst of difficulty and pain, the whole thing could turn around simply by not erecting barriers; simply by staying open to the difficulty, to the feelings that you’re going through; simply by not talking to ourselves about what’s happening. That is a revolutionary step. Becoming intimate with pain is the key to changing at the core of our being—staying open to everything we experience, letting the sharpness of difficult times pierce us to the heart, letting these times open us, humble us, and make us wiser and more brave.

Let difficulty transform you. And it will. In my experience, we just need help in learning how not to run away.

If we’re ready to try staying present with our pain, one of the greatest supports we could ever find is to cultivate the warmth and simplicity of bodhichitta. The word bodhichitta has many translations, but probably the most common one is “awakened heart.” The word refers to a longing to wake up from ignorance and delusion in order to help others do the same. Putting our personal awakening in a larger—even planetary—framework makes a significant difference. It gives us a vaster perspective on why we would do this often difficult work.

There are two kinds of bodhichitta: relative and absolute. Relative bodhichitta includes compassion and maitri. Chögyam Trungpa Rinpoche translated maitri as “unconditional friendliness with oneself.” This unconditional friendliness means having an unbiased relationship with all the parts of your being. So, in the context of working with pain, this means making an intimate, compassionate heart-relationship with all those parts of ourselves we generally don’t want to touch.

Some people find the teachings I offer helpful because I encourage them to be kind to themselves, but this does not mean pampering our neurosis. The kindness that I learned from my teachers, and that I wish so much to convey to other people, is kindness toward all qualities of our being. The qualities that are the toughest to be kind to are the painful parts, where we feel ashamed, as if we don’t belong, as if we’ve just blown it, when things are falling apart for us. Maitri means sticking with ourselves when we don’t have anything, when we feel like a loser. And it becomes the basis for extending the same unconditional friendliness to others.

If there are whole parts of yourself that you are always running from, that you even feel justified in running from, then you’re going to run from anything that brings you into contact with your feelings of insecurity.

And have you noticed how often these parts of ourselves get touched? The closer you get to a situation or a person, the more these feelings arise. Often when you’re in a relationship it starts off great, but when it gets intimate and begins to bring out your neurosis, you just want to get out of there.

So I’m here to tell you that the path to peace is right there, when you want to get away. You can cruise through life not letting anything touch you, but if you really want to live fully, if you want to enter into life, enter into genuine relationships with other people, with animals, with the world situation, you’re definitely going to have the experience of feeling provoked, of getting hooked, of shenpa. You’re not just going to feel bliss. The message is that when those feelings emerge, this is not a failure. This is the chance to cultivate maitri, unconditional friendliness toward your perfect and imperfect self.

Relative bodhichitta also includes awakening compassion. One of the meanings of compassion is “suffering with,” being willing to suffer with other people. This means that to the degree you can work with the wholeness of your being—your prejudices, your feelings of failure, your self-pity, your depression, your rage, your addictions—the more you will connect with other people out of that wholeness. And it will be a relationship between equals. You’ll be able to feel the pain of other people as your own pain. And you’ll be able to feel your own pain and know that it’s shared by millions.

Absolute bodhichitta, also known as shunyata, is the open dimension of our being, the completely wide-open heart and mind. Without labels of “you” and “me,” “enemy” and “friend,” absolute bodhichitta is always here. Cultivating absolute bodhichitta means having a relationship with the world that is nonconceptual, that is unprejudiced, having a direct, unedited relationship with reality.

That’s the value of sitting meditation practice. You train in coming back to the unadorned present moment again and again. Whatever thoughts arise in your mind, you regard them with equanimity and you learn to let them dissolve. There is no rejection of the thoughts and emotions that come up; rather, we begin to realize that thoughts and emotions are not as solid as we always take them to be.

It takes bravery to train in unconditional friendliness, it takes bravery to train in “suffering with,” it takes bravery to stay with pain when it arises and not run or erect barriers. It takes bravery to not bite the hook and get swept away. But as we do, the absolute bodhichitta realization, the experience of how open and unfettered our minds really are, begins to dawn on us. As a result of becoming more comfortable with the ups and the downs of our ordinary human life, this realization grows stronger.

We start with taking a close look at our predictable tendency to get hooked, to separate ourselves, to withdraw into ourselves and put up walls. As we become intimate with these tendencies, they gradually become more transparent, and we see that there’s actually space, there is unlimited, accommodating space. This does not mean that then you live in lasting happiness and comfort. That spaciousness includes pain.

We may still get betrayed, may still be hated. We may still feel confused and sad. What we won’t do is bite the hook. Pleasant happens. Unpleasant happens. Neutral happens. What we gradually learn is to not move away from being fully present. We need to train at this very basic level because of the widespread suffering in the world. If we aren’t training inch by inch, one moment at a time, in overcoming our fear of pain, then we’ll be very limited in how much we can help. We’ll be limited in helping ourselves, and limited in helping anybody else. So let’s start with ourselves, just as we are, here and now.

Poema de Pema Chödrön lido pelo Richard no casamento do Alex.

Laranja Mecânica com tofú

Dias atrás, dois chapa, fanáticos por filmes e literatura, e eu, estávamos numa livraria aqui na capital de Vanuatu. Estavamos zanzando pelas estante de DVDs, falando bem e mal de filmes clássicos. Eu podería até dar o nome deles, dos caras, mas acontece que ninguém acreditaria. E ainda me chamariam de mentiroso, maluco e pústula. Enfim, sem tentar cruzar a linha da cabotinagem, vamos aos fatos.

Na livraria, no setor de cds e dvds, os ilustres me indicaram o filme Park Chan-wook, Oldboy. Um deles, me disse que assitira a este filme em Amsterdã, já que tinha sido o roteirista de um dos filmes brasileiros da mostra. Sendo assim tinha direito a escolher, em exibição privada, qualquer filme do festival. Ele escolheu Oldboy. Depois dessa, comprei na mesma hora. E na mesma noite o assisti. O grande problema deste filme é que se trata de uma trilogia altamente viciante. É simplesmente impossível assistir apenas um. Então, obviamente você desesperadamente procurará logo o primeiro filme da série, Simpathy for Mr. Vengence, e o terceiro, Sympathy for Lady Vengeance. Aconselho-o a assistí-los todos no mesmo dia, de outra maneira, assistindo-os em três dias distintos, como foi meu caso, voce terminará a semana no bagaço, pois é simplesmente impossível dormir após tal obra de arte. Repito: obra de arte cinematográfica.

A trilogia é do diretor sul-coreano Park Chan-Wook. Em cada uma das estórias o diretor costura com os fios da vingança, o amor e o ódio desmedidos. Macbeth dizia que “Eles ardem do desejo de vingança, por que seus mais pungentes motivos moveriam até mesmo um eremita ao mais sanguinário e feroz combate.” A frase de Shakespeare, bem podia ser o prólogo da trilogia. Em todos os três filmes, as tramas permeadas sempre pelo desejo de vingança – ou justiça, agora estou confuso - são sofisticadas. No segundo, Oldboy, há além disso intrincadas viradas psicológicas, imagens inteligentes, apoiadas numa estética absolutamente instigante.

Mas vamos por ordem.
Sympathy for Mr. Vengeance trata exatamente desse desejo desmedido de vingança que leva a um pai às últimas consequências para encontrar os assassinos de sua filha.

Ryu, é surdo-mudo e trabalha numa fábrica para sustentar sua irmã doente e que precisa desesperadamente de um transplante de rim. Cansado de ver a irmã padecer, Ryu tenta doar um de seus rins para sua irmã, mas descobre que seu tipo sanguíneo não é compatível com o da irmã, portanto ele não seria o doador adequado. Após ser despedido da fábrica onde trabalhava, Ryu entra em contato com traficantes de órgãos no mercado negro. Concorda em doar um de seus rins e usar sua indenização para comprar um compatível com o de sua irmã. Os traficantes desparecem com o dinheiro, seu rim e a promessa do rm de sua irmã. Por felicidade ou infelicidade, três semanas mais tarde, Ryu descobre através do médico de sua irmã, que encontraram um doador e que a operação custaria o mesmo valor pago aos traficantes de órgãos que desapareceram.

Cheio de lumbago, sem dinheiro, e meio revoltado com a vida, ele e a namorada, Yeong-mi, uma militante anarquista, resolvem sequestrar a filha dono da empresa. O plano é logo abandonado por perceberem que obviamente as suspeitas recairíam sobre eles. Então decidem sequestrar Yu-sol, a filha do amigo do patrão, Dong-jin, outro executivo da fábrica. A menina fica com a irmã de Ryu, mas que desconhece a origem da menina. Concomitantemente ao pagamento do resgate, recolhido por Ryu, a irmã descobre o esquema e se mata. Ryu, com Yu-sol e o corpo de sua irmã, vão para a beira de um rio enterrar a irmã de Ryu. Enquanto chora Ryu, Yu-sol acidentalmente cai em rio e morre afogada.
Horas mais tarde, Dong-jin vendo o corpo da filha, jura vingança. Enquanto isso, Ryu lança-se numa busca desesperada pelos traficantes de órgãos. Dong-jin, investiga a identidade dos sequestradores e encontra Yeong-mi. Tortura-a até a morte. Antes de morrer, além de se desculpar com Dong-ji, Yu-sol adverte-o que ele está jurado de morte pela sua organização. Ryu retorna para ver Yeong-mi. No prédio, descobre que a polícia retirou de seu corpo em uma maca. (imagem absolutamente impagável quando Ryu, dentro do elevador, pega na mão de Yeong-mi, atada pelos legistas numa maca).

Ryu vai a casa de Dong-jin. Espera. Tocaia-o. Nada. Na verdade, Dong-jin está na casa de Ryu, esperando-o, com um transformador ligado à fechadura. Ryu chega à casa. Abrea porta e recebe uma descarga. Apaga inconsciente. Dong-jin, em seguida, amarra as mãos e pés de Ryu e leva-o para o rio onde Yu-sol morreu. Leva-o par ao meio do rio, com àgua na altura do peito. Dong-jin reconhece que, apesar de Ryu ser um homem bom, ele não tem escolha e deve matá-lo. (imagem absolutamente impagável quando Dong-jin está cara a cara com Ryu, em seguida mergulha, a camera se afasta, Ryu olha ao redor e não entede o que está passando. Por alguns minutos somente a cabeça de Ryu aparece na superfície do rio. Ryu começa a se debater. Dong-jin mergulhou e cortou-lhe os dois tendões de Aquiles de Ryu. A câmera mostra o corte embaixo d’agua com o sangue jorrando aos borbotões). Dong-jin arrasta Ryu até a margem. Cava. Antes de colocar os corpos cortados do irmão e da irmã mantidos em sacos de lixo, o grupo de Yeong-mi chega. Eles cercam e esfaqueam repetidamente Dong-jin, finalmente cravando a nota em seu peito com uma faca. Se identificam como grupo terrorista do qual Yeong-mi fazia parte. O grupo deixa Dong-jin morrer ao lado de seu carro com as ferramentas e os sacos ensanguetados que ele usou para cortar, desmembrar o corpo de Ryu. A nota, by the way, já aparecera numa cena no início do filme, no cumputador de Yeong-mi. Filmaço.

Oldboy talvez seja o mais incrível dos três. Mas vamos por ordem. Fiquei louco pelo Oldboy quando assiti há duas semanas atrás. Com um roteiro primoroso, Oldboy é o melhor dos três.
Um adendo. Sabe aquele pequeno deslize, aquele vacilo cometido com aquele amigo de adolescência? Todo mundo tem um, pelo menos. Pois é. No universo de Park Chan-wook, o amigo vem cobrar a conta 15 anos depois.

Oh Dae-su é um falastrão. Está bêbado e retido numa delegacia, na noite de aniversário de sua filha, esperando pela chegada de seu amigo Joo-Hwan. Após várias horas e o pagamento de fiança é liberado. Oh Dae-su chama à esposa de um telefone público para explicar o acontecido. Quando Joo-Hwan pega o telefone, Dae-su desaparece no meio da noite chuvosa, deixando caídas as asas de anjo que comprara de presente para a filha.

Desde esse dia, fica preso por mais de 15 anos sem a menor explicação. Dae-su nasceu em 1963. Frequentou a escola secundária católica de Sangnok, da qual saiu em 1979. Tornou-se um pequeno empresário. Casado, tinha uma filha, Yeun-Hee. Com os anos tornou-se obeso e alcoólatra. Seqüestrado e confinado, sem nenhuma explicação, a uma espécie de quarto, Oh Dae-su fica alí por tempo indeterminado e incomunicável. A incomunicabilidade é enlouquecedora. Mais enlouquecedora ainda seria a pena. Ele não sabe, mas ficaria preso por 15 anos, sendo alimentado apenas por bolinhos fritos. Suas tentativas de suicídio era contidas com a introdução de gases alucinógenos pelo sistema de ventilação. O contato com o mundo externo é feito apenas através de uma televisão, por onde sabe que sua esposa tinha sido assassinada e que de sua filha se encarragava uma família adotiva. Ele era o principal suspeito do crime.

Um dia Dae-su é subitamente posto em liberdade no último andar de um prédio. Quando ele é liberado, ele é vestido com roupas caras. No alto do prédio há um homem suicida. Ao caminhar pela rua, um desconhecido lhe dá um celular. Ao sair da prisão era um homem revoltado que busca explicações.Ele sente fome e vai a um restaurante local, onde ele encontra a jovem chef Mi-do, que o leva para sua casa e em poucos dias começam um romance. Ela o ajuda a descobrir o porquê de sua retenção e quem era o responsável por sua kafkaniana situação. Tudo ainda parece onírico, ainda, mas Dae-su com a ajuda de Mi-do localiza o restaurante, e por ele o paradeiro de sua prisão. Os dois acabam por se envolverem amorosamente. Dae-su, então, tortura o diretor de informação para obter as gravações de seu raptor, que revelam pouco ou quase nada de sua identidade. Nessa busca, há uma cena interessante, quando os capangas do diretor de informação do cativeiro atacam a Dae-su. Toda a luta se parece a um desses jogos de video-game. Muito bem sacado e irônico nesse contexto do roteiro.

Um homem chamado Woo-jin revela-se algoz de Dae-su e o instrui por telefone que descubra seus motivos para mantê-lo em cativeiro por tantos anos. Woo-jin é aquele amigo que vem cobrar a conta...
Dae-su descobre que Woo-jin e ele freqüentaram a mesma escola e se lembra da relação Woo-jin com sua irmã, Lee Soo. Dae-su, espelhara propositalmente o boato de que os irmãos mantinham uma relação incestuosa. Espalhou o boato antes de se transferir para outra escola em Seul. Durante a peregrinação de Dae-su, Woo-jin mata Joo-Hwan, amigo de infância de Dae-su por este ter insultado sua irmã numa conversa telefônica devidamente grampeada – que havia se suicidado assim que os primeiros sinais da gravidez precoce apareceram.

Dae-su finalmente encontra Woo-jin em seu apartamento. Este lhe dá um álbum de fotos. Dae-su folheia o álbum com retratos de sua própria filha. Ele vê sua filha crescer nas fotos, até descobrir Mi-do. Woo-jin, revela que os eventos em torno Dae-su foram orquestrados com toques de hipnose para provocar Dae-su e Mi-se a cometessem o incesto. Horrorizado, Dae-su implora a Woo-jin para esconder o segredo de Mi-do. Rasteja. Pede perdão, antes de cortar a própria língua como prova de seu sacrifício, oferecendo-a a Woo-jin como um símbolo de seu silêncio. Woo-jin concorda em poupar Mi-do – que naquele instante se encontra sob a guarda de capangas. Ele então telefona para que os capangas a libertem deixando-a em seu apartamento. Sozinho, remoído pela culpa de ter participado no suicídio da irmã – da mesma forma que Dae-su participara na do suicida do alto do prédio -, Woo-jin atira na própria cabeça.

Esgotado, Dae-su se senta num lugar ermo e coberto de neve. Faz um estranho acordo com uma hipnotizadora, para que esta o faça esquecer do segredo. Ela lê uma carta com os fundamentos do esquecimento. Começa o processo de hipnose. Horas depois, Dae-su desperta. A hipnotizadora já se foi. Ele anda sobre a neve. Encontra Mi-do, que diz lhe amar. Eles se abraçam. O filme acaba e não se sabe se Dae-su lembra-se ou não do segredo. Filmaço.

Mas o diretor Park Chan-wook tem outras armas.

Em Sympathy for Lady Vengeance um pequeno coro vestido de Papai Noel espera na saída de uma prisão pela jovem Lee Geum-ja, recém-reformada. Ela tinha sido condenada 13 anos atrás pelo assassinato da menor Won-mo. (corta). O caso, mostrado na televisão, tinha provocado uma comoção nacional, devido à sua pouca idade no momento do assassinato, e a sua aparência inocência. A pena fora reduzida por sua transformação espiritual. Mas isso era apenas uma cortina de fumaça para deixar a prisão.

O crime tinha sido praticado quando ela tinha apenas 19 anos. O país inteiro estremeceu com sua pouca idade e com a brutalidade com que o crime, e os métodos perversos com que fora praticado. Mas o que impressionou mais, foi sua beleza. Alguns diziam que ela se parecia com Olivia Hussey, a Juliete da ópera de Franco Zeffirelli. Um diretor sem escrúpulos disse que tinha planos para filmar a estória de Lee Geum-ja, criando uma reação imediata nos meios de comunicação.

Quando sai da prisão, ela se dirige ao pai, que lhe oferece uma torta de tofú como símbolo de que ela não voltaria a pecar. (corta). Por uma série de flashbacks, sabe-se do processo de arrependimento da moça, dentro da prisão. (corta). Ela derruba a torta de tofú no chão e diz, em coreano, para que o pai fosse tomar no cú, ou enfiasse a torta no orifício supra referido – as legendas em inglês não deixam claras as intenções da moça. O que fica claro é que Lee Geum-ja não está arrependida, que aquele papo de Jesus é pura balela e que ela não vai deixar essa estória barata para com aqueles que a puseram ali. (corta). O filme começa.

Lee Geum-ja era inocente, mas confessa o crime pois o verdadeiro assassino, Sr. Baek, sequestrara sua filha ameaçando matá-la. Na prisão, Geum-ja, com seu comportamento angelical, faz sólidas amizades, chegando a doar um rim para uma detenta, que mais tarde seria assassinada por ela. Em liberdade condicional, Geum-Ja imediatamente visitas outras detentas em liberdade condicional, cobrando favores que incluem abrigo e armas. Distancia-se, assim cada vez mais da imagem criada no cativeiro. Passa a usar salto alto e sombra vermelha nos olhos. Mas por outro lado, também começa a trabalhar numa confeitaria local, onde se torna uma especialista em tortas,sob a tutela de um chef que lhe oferecera trabalho na prisão.

Ao investigar sobre o paradeiro da filha, descobre que ela foi adotada por pais australianos. Jenny, agora um adolescente, não fala coreano. Após convencer sua família a deixá-la voltar para Seul, Jenny segue Geum-ja ao redor da cidade e com ela planeja sequestrar o Sr. Baek, com a ajuda da esposa, outra ex-presidiária. Baek, agora tragicamente, é professor de ensino fundamental e descobre que Geum-ja está em liberdade. Aterrorizado, contrata capangas para emboscar Geum-ja e Jenny. Na luta, Geum-ja mata dois bandidos, enquanto na outra cena Baek cai desacordado devido às drogas que sua esposa colocou em sua comida.

Geum-ja quer matar Baek ali mesmo em sua casa. Entretanto, descobre uns penduricalhinhos de criança presos a seu celular. Uma pequena esfera de âmbar chama sua atenção. Lembra que esta era a mesma de Won-mo. Então associa estes objetos ao modus operandi de Baek e percebe que estes são lembranças das vítimas, deduzindo que Baek é um assassino em série.

Ela o aprisiona. Contacta o detetive do caso Won-Mo, e, juntos, eles se infiltram em apartamento Baek e descobrem gravações em VHS da tortura e assassinato das crianças.

A partir desse momento o filme dá uma virada sensacional.

Geum-ja e o detetive entram em contato com os pais das vítimas e os conduzem para uma escola abandonada na periferia de Seul. Mostram as fitas nas salas de aula. Um por um cada pai desaba em desespero. O grupo, então, delibera sobre o destino do Baek. Decidem coletivamente assassiná-lo. E no sótão da escola encontra-se Baek, que pode escutar todo o teor do julgamento. Vestindo capas de plástico e portando uma variedade de armas - que no jargão legal pode-se dizer - perfuro-contudas.

Todos esperam numa sala, uma ante-sala. Um a um, tendo previamente sorteada a ordem de entrada, entra e dá uma estocada em Baek tomando o devido macabro cuidado para não matá-lo, já que há pessoas na fila ainda. A última pessoa, uma avó, mata Baek com a tesoura de sua neta assassinada.

Ao final, hirtos, perfilados, com a câmera pelas costas, posam para uma foto tirada pelo detetive. Assim que o flash detona, todos caem em pranto amparando-se mutuamente. O grupo assume um pacto de jamais revelar o que se passou ali e enterram Baek.


Geum-ja, o investigador, e os pais vão no meio da noite para a confeitaria, onde Geum-ja serve-lhes uma torta. Um dos momentos mais emocionantes nos três filmes, talvez um pequeno delize de Park Chan-Wook, é quando começam a cantar involuntariamente um parabéns a você pelo aniversário coletivo para seus filhos falecidos. Uma cena sem dúvida de profunda delicadeza. Filmaço.

Os três filmes são de uma beleza estética impressionante. O uso de grandes closes, enquadramentos ousados, cores fortes bem escolhidas e pequenos efeitos especiais inesperados enfatizam as emoções de uma maneira extremamente elegante e única. O roteiro, absolutamente genial, aliado a uma montagem primorosa, fazem desses filmes algo incomum na história do cinema. A sequência prisão, a vingança e a catarse, estão nos três.

Um capítulo à parte neste último filme é a música totalmente barroca de Jo Yeong-Wook que ilustra a ótica feminina da revanche. E por barroca, entenda-se toda a contradição entre bem e mal, entre os desígnios da Providência e a razão dos Homens, enfim as contradições e os mais pungentes motivos moveriam até mesmo um eremita ao mais sanguinário e feroz combate.

Música do dia. Arvo Part. Spiegel Im Spiegel


Podia ser Sergio Leone. Podia ser o The Good, the Bad and the Ugly. Mas, não. Você pega um filme do Tarkovsky. Vamos supor o The Mirror. Tudo onírico, não é? Então. Então você coloca ali um pouco de Faulkner, de De Lillo e de Elmore Leonard. Clica a tecla forward umas duas vezes. O negócio fica muito rápido. Mas no enquadramento dos personagens voce só vê o essencial, mesmo que aqueles seres humanos em conflito não tenham passado e nem futuro, você só vê o essencial. Tudo é tão rápido que as vezes você nem se dá conta que ao ler Faroestes de Marçal Aquino, como bem disse o Cristóvao Tezza você está entrando numa zona franca, onde os 5 sentidos devem estar muito apurados e a tua arma tem que estar sempre carregada e principalmente en-ga-ti-lha-da. Na cidade, na roça, numa rodoviária de interior, num necrotério, onde quer que você esteja, o espaço criado por Aquino é um espaço sem lei e sem ordem.

Além da falta de lei e ordem, eu ousaria dizer que, a exemplo de Faulkner, o Marçal Aquino também penetrar seu cutelo no coração do conservadorismo brasileiro. Num sentido mais prosaico, nesse universo conservador, evangélico e de classe média, é como se o nome de Deus fosse evocado a todo o instante, mas qualquer idéia que o associasse aos atributos de generosidade e solidariedade ficasse de fora, deixando o papo para os mortais. Como se Aquino dissesse a deus, ô cidadão, fica de fora da minha Yoknapatawpha que aqui mando eu mando eu. Se você não tiver safisfeito, eu não vou sujar minhas mãos contigo, mas você toma muito cuidado quando chegar em casa tarde da noite, ou na saída para o trabalho de manhã, pois voce sabe... tem muito coisa ruim acontecendo no mundo...

No espaço geográfico do Aquino tudo é violento, fragmentário e multifacetado tipo filme de Chan-wook Park. O instrumento pérfuro-contuso está ali na tua cara, mas não é ilustrar nada não. Aquilo é pra furar, para sangrar, para foder com alguém. Você tem ainda uma outra certeza, armamento pesado não é só para dar confiança para o cara. Ou seja, a prosa do Marçal Aquino é um problema. E pode ser que as frases curtas, quase metrificadas, sugiram uma espécie de poesia, uma espécie de sonho. Pois tudo é tão real que passa a ser quase irreal, quase um sonho daqueles que você acorda no meio da noite atordoado, enxugando o suor do pescoço, com uma sensação de que se você voltar a dormir o sonho volta, duro e hiperrealista.

E ainda tem uma outra coisa. Como tudo que ele narra é aterrorizantemente familiar, passando no telediário da noite, no cinema, podendo ser ouvido no rádio ou num comentário no boteco da esquina, tudo dá mais medo ainda.

Só um exemplo:

DEZ MANEIRAS INFALÍVEIS DE ARRANJAR UM INIMIGO (PARA FACILITAR O TRABALHO DO LEGISTA)


3 – Você repara como é pernuda a repórter da TV que veio filmar o boteco onde aconteceu a chacina na sexta-feira. De minissaia, uma beleza. Ela começa a fazer perguntas, todo mundo se encolhe. Surdos e mudos. Então você se aproxima, como quem não quer nada além de ver de perto as manchas de sangue no chão, os buracos de bala nas paredes e no balcão. E, é claro, aquele belo par de pernas. Na hora em que surge a oportunidade, você diz a ela que topa contar o que sabe. Desde que seja longe dali e com duas condições: você só aparecerá de costas e terão de mudar sua voz quando a entrevista passar na televisão. Naquela noite, com a família e amigos na sala, é a primeira vez que você vê alguém impaciente com o capítulo da novela. Você se sente meio artista, ganha até um tapinha nas costas. Começa a reportagem, a repórter surge na tela, microfone em punho - e você comenta que ela é mais bonita pessoalmente. Sua voz, alterada, ficou parecida com a de um personagem de desenho animado, você não se lembra qual. Todos se divertem na sala. Menos você, porque acabou de notar que aparece vestindo sua velha jaqueta, que tem nas costas uns desenhos coloridos e manjados. A entrevista dura uma eternidade, mas você já não presta atenção. Está pensando que nunca mais vai usar aquela jaqueta. Gosta muito dela. Seria um pecado ela ficar cheia de furos.

Mas não pára aí não. Os sismógrafos de Aquino resgistram desde o minimalismo do ódio entre os olhares de um padrinho e uma madrinha, observados pelo afilhado, até a angustia de um pai que tem um filho marginal com tudo para acabar morto e acaba mesmo morto.

Ao terminar o livro você tem um dilema nas mãos. Uma sensação de angústia. Voce se sente esmagado, meio que um merda. Mas você tem duas certezas. Primeira, nem sempre quem está a fim de te ajudar é teu amigo – como no conto Tocaia. Segunda, nem sempre quem está afim de te ferrar é teu inimigo – como no conto Clinch, no chute que Abdala deu num cara para que ele aprendesse a nunca mais mexer com mulher alheia. Portanto, se voce está na merda, fica calado.

Em outras palavras, se você achar Faroestes ruim, você prova uma certa obtusidade. Se você achar bom, você se ferra, pois não dá para fechar o livro em paz. Lógico que não se trata de gostar ou não gostar apenas. Em todo o caso, não fala nada, fica calado e clica a tecla play novamente. The Good, the bad and the Ugly ou The Mirror. Tanto faz. Você não vai conseguir dormir mesmo…

Coices e patadas de gente

Amadores da literatura observam com certa nostalgia a decadência atual do conto, devido provavelmente, pelo menos em parte, ao abuso do coloquial, à frouxidão na construção, às delongas em detalhes inorgânicos, comprometendo por um lado a poderosa visão da realidade e por outro a propria conclusão de uma estoria decentemente contada. eles eram muitos cavalos é um livro com histórias contadas - e bem contadas - em estilo absolutamente fragmetário e inexorávelmente real. Para muitos afundando ainda mais a narrativa moderna breve nessa miríade de decadência. Diga-se de passagem, quando o li há anos atrás, eu que sempre torci um pouco o nariz para a narrativa contemporânea, fiquei surpreso. Tudo se passa num recorte de tempo definido. Tudo se passa num só dia. Por que 9 de maio de 2000? Uma terça-feira? Não dá para saber exatamente o porquê. Poderia ter algo de apocalíptico - mas Ruffato, após o colofão, cita apenas o Salmo 82! Apesar de interagirem no mesmo tempo e no mesmo espaço geográfico, a cidade de São Paulo, as vidas desses personagens não se cruzam, pois vivem em tal estado de isolamento que passam a ser anônimos uns para os outros. Tratam-se de vendedores ambulantes esporrentos, pastores evangélicos histéricos, pedintes sem esperança, motoristas de táxi esquizofênicos, esposas infelizes, idosos redundantemente sem esperança, maridos redundantemente esmagados pelo quotidiano, assaltantes patéticos sem o mínimo poder de organização, ricos e ricaços, e alguma classe-média.... As estórias independentes reforçam no cenário paulistano, uma atmosfera caótica cercada por orações religiosas com ou sem pregação, cenas de amor e violência com engarrafamentos, ódio e paixão com ou sem amor. Os personagens são tão sombrios, por viverem nas sombras, ou seriam marginais (?), por viverem à margem, que aparecem e desaparecem como se num passe de magia. Enfim, no decorrer da leitura, percebemos que tais vidas não se cruzam apenas por um triz. Apenas por um triz. Pois,em vários momentos os destinos trágicos bem que poderiam se cruzar na bala perdida de um tiroteio, na passagem de um taxista falastrão, tão centrado em sua família, passando despercebido pelo local de um crime e associar todos os destinos, ou no destino traçado por uma folha de horóspcopo de jornal. Essa inovação inventiva, foi-me surpreendente na literatura brasileira, pois Ruffato talvez tenha ousado, à sua maneira, em construir uma narrativa que se aproximasse do Rayuela de Cortazar. Tudo bem, pode ser exagero. Mas, afinal, quem há de me impor a leitura da estória de maneira linear?
Mais ainda, quem vai me tirar o direito de, como leitor, eu, associar a Neide Nascimento, do classificado sentimental de jornal da estória 42, com a esposa insatisfeita do marido Foulcaultiano da estória numero 10?
Para quem é chegado na teoria, Ruffato, na prática, com sua fina ironia, ri de todos. Ao todo são 69 pequenas narrativas que por falta de termo melhor chamo, à guisa de um papo mais cabeça, pós-modernas, pois para cada uma delas se abre um universo de conexões sem soluções aparentes. Tudo é problemático, pois tudo e todos perecem já no momento que vem a vida. Ruffato propositalmente deixa tudo em suspenso nessa espécie de darwinismo social. Ou seja: uma proposta de romance que não é romance, uma proposta de conto que não é conto. Como se a única coisa sólida, ou ao menos tangível, como numa pintura de Jackson Pollock, fosse seu fundo a ser preenchido por trajetórias. O pano de fundo, como uma cidade vista de cima, onde as vidas são apenas tinta mosqueada traçando trajetórias variáveis e indefinidas na cidade. Todas as estórias se passam na moldura dada por São Paulo, num intervalo de poucas horas. E mais. O autor, nessa espécie de radiografia dos movimentos e ações dos indivíduos numa megalópole, nos permite apenas acessar contrastes.
Essa fragmentação e falta de precisão está marcada na escrita e na própria diagramação do texto. Ao passo que os narradores formam um mosaico textual composto por cartas, orações, cardápios, previsões meteorológicas, lista de livros, anúncios de classificados; os diálogos, pensamentos, digressões, descrições feitas pelo sujeito oculto, ou pelo narrador onisciente ou não, são separadas pelos diferentes formatos de fontes do Windows. Se isso já não é um problema suficiente, imagine!
Mais difícil ainda é perceber as influências de Ruffato para esse que seria um de seus primeiros livros - com chancela do Sergio Sant’Anna, diga-se de pasagem. Cumpre notar que é fruto de seu tempo. 
Na literatura, não sei. Talvez, como já disse, Cortazar.  Talvez o próprio Sant’Anna de Notas de Manfredo Rangel, repórter - um livro diga-se de passagem tão interessante e inovador quanto o eles eram muito cavalos. Parece que de tudo, há um pouco alí. No Cinema, a fórmula fragmentária já tinha sido tentada meio que de passagem por Haneke em seu 71 Fragments of a Chronology of Chance em 1994, e por David Cronemberg em Crash em 1996. Talvez até o 21 Gramas ou o próprio Babel em escala planetária de Iñarritu. Mas os últimos vieram depois de  eles eram muitos cavalos! Portanto não se pode falar em influência, nesse caso. Seja como for, o livro de Ruffato, fruto de seu tempo, certamente foi inovador e um divisor de àguas na modorrenta literatura brasileira do final do  anos 90. Seja como for, a multiplicidade de vozes, com influência ou sem influência do cinema, é o ponto forte da narrativa. O leitor passa a ser um participante visual de cada breve vida, em cada experiência ali exposta como num flash, como num fotograma; pois o leitor, dotado de uma grande câmera, acompanha passo-a-passo os errantes dessa narrativa. Exagerando: tal como a fotografia expressa a materialização da morte - que Barthes expõe em seu Câmera Clara -, as vidas desse personagens, também poderiam ser reproduzidas mecanicamente numa foto sem a interferência humana. Assim como Barthes procura mostrar que sem a intervenção pessoal e subjetiva do observador a fotografia ficaria limitada ao registro documental, Ruffato desvela que em sua narrativa há também essa manifestação interventora e inexorável no real: no fundo, em todas as estórias há um certificado de presença, pois Ruffato coloca todas essas fotos juntas, embaralha-as, deixando que disputem a atenção do leitor. Presentes enquanto duram, tal como os cavalos corredores no Jóquei.

Música do dia. Is you is or is you ain't my baby? Anita O'Day

Junebug


Junebug é um filme de Phil Morrison, o mesmo cara que criou a campanha massiva da Apple, "Get a Mac". Apesar de um filme de publicitário, é um filme convincente sobre pessoas estranhas e da difícil relação entre esse bando de gente composta por genros, sogros, noras, maridos, sogras, e toda essa faina na qual o conceito de família acaba incorrendo quando dois inocentes pombinhos se juntam. Madeleine é casada com George, um rapaz do qual pouco se sabe no início do filme. Casamento moderno. Na base da Sabe-se sim que Madeleine é uma espécie de caçadora de novos talentos. E numa dessas tentativas, George Johnsten, a serviço da galeria em que trabalham, conhece um artista outsider anormal e maluco que vive em North Carolina, por acaso perto da casa de seus pais. Então essa seria uma grande oportunidade de matar um monte de coelhos numa só cajadada. Nessa esticada de algumas 10 horas de viagem de carro, Madeleine poderia conhecer a família do marido, descobrir um novo artista primitivista e ainda por cima ganhar um monte de dinheiro em cima do pobre do artista.

Chegando à casa da família de George começa o choque de realidade. Madeleine é uma negociante de arte em Chicago. É moça, dessas que almoça um Activa, desses iogurtes que ajudam, como diz o comercial, na desoneração intestinal, e uma cenoura crua. A mãe de George o oposto, uma fumante convicta, pois afinal estamos falando da Carolina do Norte – terra de tabaco e gente esquisita -, é uma dessas mães à americana que escondem sob a polidez a face dominadora, que impõe ascendência assim sem querer impor, mas impondo. O pai é um taciturno de hábitos esquisitos, que vive pelos cantos da casa trabalhando em algo, consertanto algo, fugindo de algo, se ausentando de algo. Na casa ainda há a incrível presença do irmão mais novo de George, Johnny e de sua inacreditávelmente dependente e ingênua esposa, Ashley, grávida com a barriga à boca prestes a parir mais um Johnsten.

Madeleine, na ausência de George, que herda do pai essa capacidade de se ausentar mesmo estando em corpo presente, começa a interagir com todos na casa, seja ajudando Johnny a conseguir seu certificado de High School Equivalence – uma espécie de supletivo -, seja participando dos preparativos para o chá de bebê de Ashley, seja tentando ajudar a Peg nos afazeres domésticos, seja participando dos cultos evangélicos na igreja.

Mas tudo parece bem, pois todos sabem que a visita é apenas por poucos dias, e que depois disso, tudo voltará ao normal. Madeleine e George voltarão a Chicago deixando para trás os pais de George e seu irmão complexado. É um filme de comicidade tensa, pois apesar de situações levemente engraçadas, sabe-se que tudo pode degringolar a qualquer momento. E a estória começa sua pequena reviravolta de pequenos desentendidos, que abrem ainda mais o fosso entre Madeleine, que provavelmente passa fome e sacrifícios para manter sua beleza urbana, moderna, e vamos dizer assim, e os Johnstens, quando no chá de bebê preparado para Ashley – que poracaso quer botar o nome do filho, Junebug. No meio da reunião, o artista maluco aparece na casa dando sinais de que quer fechar um contrato com a galeria de Madeleine. A atitude desvela as segundas intenções de Madeleine no meio daquele fim de mundo tentando ser acessível e cordial com todos – mesmo que todos soubessem que sua atitude, apesar de polida, fosse forçada.

Dias depois a bolsa estoura. Agua para todo o lado. Correria para o hospital. O artista maluco envia outros sinais de de que vai assinar com outra galeria. Medeleine vai atrás dele. Ashley e toda a família vão para o hospital, menos Medeleine que está na casa do artista negociando as compras e George que tem paradeiro desconhecido. Horas de trabalho de parto. Madeleine desaparecida. O bebê natimorto. George finalmente chega para consolar Ashely. Madeleine volta finalmente para casa com seu quadro. George e Madeleine voltam para Chicago... Get a Mac. O meu chega em outubro.

Música do dia: Himalaya e Solfeggeto. Disco. Sebastião Tapajós & Pedro dos Santos

O Pai Goriot



Rapaz da Provença, Eugênio Rastignac é moço ambicioso. Vive numa casa de cômodos onde conhece o Sr. Vautrin que lhe mostra o caminho das pedras a procura de um casamento nobre, passa por humilhações e avanias. O que há de mais terrível nessa sua ambição pela ascensão rápida é a falta de dinheiro que ele tenta contornar aproximando-se de Goriot. Aproximando-se do patriarca Goriot – ex-comerciante, que enriqueceu tremendamente com a especulação de trigo em tempos de crise, inquilino da pensão Vauquer, na zona central da cidade,  o velho é um espectro que havia sido, e no momento do romance não passa de um homem bronco -  humilhado pelas filhas, genros e serviçais -, aproveitando-se da fragilidade e isolamento deste, Rastignac procura se tornar amante de uma das filhas do velho, a Baronesa Nucingen. Sr. Vautrin, nababo de se babar e um dos inquilinos da Pensão de Vauquer, passa a lhe emprestar dinheiro de maneira cordial, e nos diálogos entre os dois Vautrin solta essa pérola tautológica da Literatura Universal....

“Uma fortuna rápida é o objetivo de cinquenta mil rapazes que se acham na mesma situação que você. Você é apenas uma unidade neste número. Avalie os esforços que terá de fazer e a ferocidade do combate. Como não há cinquenta mil bons lugares, vocês terão que devorar-se uns aos outros, como aranhas num frasco. Sabe como se faz uma carreira aqui? Pelo brilho da inteligência ou pela habilidade da corrupção. Eh preciso penetrar nessa massa humana como uma bala de canhão, ou insinuar-se no meio dela como uma peste. A honestidade não serve para nada. Todos se curvam sob o poder do gênio. Odeiam-no, tratam de caluniá-lo, por que ele recebe sem partilhar. mAS curvam-se se ele persiste. Numa palavra, adoram-no de joelhos quando não o puderam enterrar na lama. A corrupção representa uma força por que o talento é raro. Assim como a corrupção é a lama da mediocirdade que abunda, e você sentirá sua picada por toda a parte. Verá mulheres cujos maridos só têm seis mil francos de vencimentos, gastarem mais de dez mil em vestidos. Verá empregados de mil e duzentos francos comprarem terras. Verá mulheres se prostituirem para passear em carruagens dos filhos dos pares de França, que podem correr Longchamps pela avenida do centro. Você viu esse pobre animal do pai de Goriot obrigado a pagar a letra de câmbio endossada pela filha, cujo marido tem cinquenta mil francos de renda. Aposto minha cabeça contra esse pé de alface que você encontrará um vespeiro na casa da primeira mulher que lhe agradar, mesmo que seja rica, bela e jovem. Todas elas vivem procurando iludir as leis, em guerra com os maridos a propósito de tudo. Eu não acabaria mais de falar se fosse preciso explicar-lhe os negócios indecorosos que se fazem por amantes, por vestidos, pelos filhos, pelo lar ou pela vaidade, raramente por virtude, pode estar certo. Assim, o homem honesto é o inimigo comum. Mas que pensa você que seja um homem honesto? Em Paris, o homem honesto é aquele que se cala e se recusa a partilhar. Não falo desse pobres idiotas que em toda a parte cumprem seu dever sem jamais serem recompensados por seus trabalhos, e que eu denomino a Santa Confraria dos Sapatos Velhos de Deus. Eh certo que neles reside a virtude em todo o esplendor de sua estupidez, mas neles também reside a miséria. Já estou vendo as caretas dessas honradas pessoas se Deus nos fizesse brincadeira de mau gosto de não comparecer no Juízo Final. Portanto, se você quiser obter fortuna imediatamente, é preciso já ser rico ou parecê-lo.”

Efemerides, pobre dos que vivem delas...

Carta Testamento do Presidente Getúlio Vargas

 
"Mais uma vez, a forças e os interesses contra o povo coordenaram-se e novamente se desencadeiam sobre mim. Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam, e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes.


Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo. A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do salário mínimo se desencadearam os ódios. Quis criar liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás e, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre.


Não querem que o povo seja independente. Assumi o Governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores do trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano. Nas declarações de valores do que importávamos existiam fraudes constatadas de mais de 100 milhões de dólares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se o nosso principal produto. Tentamos defender seu preço e a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa economia, a ponto de sermos obrigados a ceder.


Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo, para defender o povo, que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso dar, a não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida.


Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no pensamento a força para a reação. Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com o perdão.


E aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue será o preço do seu resgate. Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora vos ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História." (Rio de Janeiro, 23/08/54 - Getúlio Vargas)

AP CS3



O nome do cidadão é Sergey Larenkov. Junta às fotos hodiernas composições em Adobe Photoshop CS3. Coisa do Demo, sem dúvida, e que por isso mesmo muito interessante.

http://sergey-larenkov.livejournal.com/

“Clarice,”

Clarice Lispector é e sempre será um mistério. Falo da literatura experimental de Clarice Lispector. Ao tratarmos da biografia de Clarice, muito bem escrita por Benjamin Moser, percebemos que traz à luz dados novos e interessantes - mais sobre a vida da escritora que da mulher. E ouso dizer que, falha um pouquinho no momento de reconectar as duas mulheres. Explico. Para mim, não revela dados biográficos novos, mas apenas absolutamente previsíveis e já presentes em outra biografia que eu havia lido sobre a mesma autora.

Ao contrário de “Eu sou uma pergunta”, uma biografia que li há anos atrás, sugerida por um amigo que vive hoje em Pretória, esta “Clarice,” mergulha mais nas fantasias de Clarice, em suas tentativa de meditação e mediação entre literatura e realidade, que em sua vida real. Ao menos, esta foi a imagem que tive ao comparar amadoramente as duas biografias. Faltou um pouco pontuar os fatos, desde a imigração dos pais para o Brasil em 1922, passando pelas relações familiares, e até mesmo, por que não dizer, esclarecer como uma pessoa tão confusa - não há pejoração aqui! - conseguia promover seus livros a partir de uma rede de apoio que começava com sua irmã, e passava por Lucio Cardoso e recebia o abraço corporativo de amigos influentes como Alberto Dines.

Na biografia de Teresa Cristina Montero, essas relações estão mais claras, sem dúvida.

Pois mostram que já consagrada no Brasil e no exterior, Clarice ainda se angustiava com a crítica e com a relutância de editores em publicar seus novos trabalhos. A biografia escrita por Moser complementa esse aspecto e mostra, por exemplo, a irritação de Clarice com a crítica de Alvaro Lins (reunida no livro Mortos de Sobrecasaca: Obras, Autores e problemas da Literatura Brasileira, ensaios e estudos, 1940-1960) sobredois de seus livros, Perto do Coração Selvagem e O Lustre. Folheando  Mortos de Sobrecasaca percebi que o crítico realmente começa com uma análise meio datada e até mesmo esdrúxula sobre escrita "feminina" e a aceitação do lirismo como forma de expressão literalmente feminina e inaugurada por Virginia Woolf. E vai além, afirmando que Clarice mimetizava o estilo de Woolf. Clarice se indignara com a crítica e confessara que nunca sequer havia lido Woolf. Lins classifica Perto do Coração... como um livro confuso, tomado pelo caráter do sonho e da super-realidade. Lins na certa ainda sofria o impacto entorpecente de Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues, encenada pela primeira vez no mesmo ano do lançamento de Clarice, obra que aparentemente forjou a forma daquela geração ver a relação entre ficção e realidade. Mas no decorrer da crítica, apesar de menos condescendente com O Lustre, Lins aponta e nos relembra para elementos realmente interessantes. Por exemplo, é claro que para quem já leu o livro, alguns personagens mesmo que secundários, importantes para a trama, aparecem e desaparecem com muita facilidade, numa espécie de mutilação dos antagonistas para dar voz apenas a seus protagonistas. Lins define isso como uma técnica processual. Mas essa mudança de centro de gravidade era comum nos grandes mestres. Balzac e Machado cansavam-se de fazer isso, por outros meios. É, ou não é, meu caro biógrafo do Barão? E por que a Clarice não podería?

Mas por essa biografia, ainda que a biografada saia imaculada pelo respeito do biógrafo, podemos acompanhar claramente a carreira literária de Clarice Lispector: suas estorinhas inventadas quando menina, seu trabalho como repórter de jornal chapa branca, seus traumas, na análise das missivas podemos perceber suas angústias criação literária, um pouco de suas amizades e trocas de favores com os intelectuais e escritores e a paixão platônica e sempre muito mal explicada pelo escritor Lúcio Cardoso, sempre muito mais enfatizada que o suposto romance com Paulo Mendes Campos – nunca claramente investigado para além da forte influência intelectual que Mendes Campos exercia sobre ela, ou para além da maledicência de amigos do meio literário.


Podemos até mesmo perceber que paralelamente à sua carreira literária, Clarice tinha uma vida privada.

Clarice foi casada entre 1943 e 1959 com o diplomata Maury Gurgel Valente. Uma relação, que apesar dos filhos, sempre deixou um certo ar de aparências. Primeiro, pelo cotidiano que é sufocante para qualquer casal - ela chega até mesmo a citar para a irmã, se não me engano, "Nada tenho feito, nem lido, nem nada. Sou inteiramente Clarice Gurgel Valente.". Segundo, pelos desgastantes problemas psicológicos apresentados pelo filho mais velho. Por tudo isso, Clarice nunca escondeu de seu círculo mais íntimo que se sentia sufocada pela vida conjugal, já desde os primeiros anos em Berna, Torquay e mesmo depois no 4421 Ridge St em Montgomery Country. Enfim, na biografia de Moser, ao contrário na de Teresa Cristina Montero, o casamento, instituição difícil para qualquer criatura dotada de mínima racionalidade, não raramente se torna um obstáculo às ambições, sonhos e promessas da escritora. Dessa biografia, no aspecto específico citado,  pode-se concluir que incapaz de elaborar a crise que inventava nas suas linhas escritas, Clarice passou a conviver com sua falta de elaboração, como quem divide a vida com uma pessoa amarga e que tenta temperá-la em vão no dia-a-dia. Aos poucos, de alguma maneira, enquanto Teresa Cristina Montero mostra a face pública de Clarice no papel de esposa de diplomata, recebendo em sua casa, se tornado amiga das esposas de diplomatas, trocando confidências banais e estúpidas, e obviamente se utilizando do prestígio para publicar, Moser mostra o oposto, mostra a sua face de prisioneira que não consegue entender por que Clarice e Maury estão presos, mesmo sabendo, ou desconfiando que a chave da cela está com eles, mas não conseguem localizar. Demorou 16 anos para encontrarem a chave.

Mas nada me tira da cabeça que uma mulher que escreve de tal maneira, ou melhor, depara-se de tal maneira com a força do próprio desejo já desde jovem, sabia ou ao menos suspeitava dos ônus em se casar com um diplomata, de viver fora do Brasil, ou seja, de ser expulsa de seu paraíso imaginário para ganhar a temível e angustiante notoriedade de escritora. Ela assumiu isso em troco de algo. E por isso imagino que a chave estava bem guardada, ao invés de perdida...

A paixão por Paulo Mendes Campos foi secreta. Tão secreta que passa quase incógnita pelas páginas dessa biografia. O caso era tão discreto que não conta com mais de duas páginas em todo o livro e termina com Mendes Campos intimado pela mulher inglesa a partir com a família para Londres. A paixão por Lúcio Cardoso era platônica, mas que não deixava de tera algo de paternal. Ele mostrou-lhe que suas anotações dispersas e que pareciam incoerentes, eram o seu próprio método, além de ter sido ele quem sugeriu o título de seu primeiro romance, Perto do Coração Selvagem. Paixão e labor andavam juntos em ambos os casos.

Enfim, o livro de Benjamin Moser tem muitos pontos muito atrativos. Ao juntar elementos biográficos e espelhá-los na obra ficcional de Clarice. Se é inovador eu não sei. Desconfio que sim. Mas o mistério das duas mulheres não necessariamente se desvela, até por que não há razão nem ontológica tampouco comercial para isso.