Os Dragoes Escandinavos


É provável que a minha simpatia pela trilogia de Stieg Larsson tenha sido reforçada pelo meu caro apreço compartilhado pelo universo que raquers e que o uíquilíqui mostrou em toda a sua extensão nessas semanas – aliás, sem trocadilho, tá engraçado pra caramba ver todo mundo tentando explicar o embaraço causado pelo lEiTe DerRRaMadO, após Rílari ter ignorado o presbiterianismo intenacionalista dos 14 pontos do camarada Woodrow Wilson - falo do que ninguém fala, aquela espionagenzinha boba na ONU, tipo assim, aquela que fizeram na época para invadir um determinados país vizinho de um outro país que ao que tudo indica sera a bola da vez....


Por mais ridículo e cambaio que tenha sido meu mês de novembro, dividindo meu tempo entre a abrasiva realidade da violência no Rio de Janeiro e a leitura de uma trilogia sobre um jornalista oportunista fazedor de chalchichas e uma haker débil mental, valeu a pena. Afinal, citando Pessoa, tudo vale apenas quando a alma não é de menas.


Não se trata de literatura, longe disso. As mais de 2100 páginas da trilogia escrita pelo sueco são um puro entretenimento que nos leva a crer que - citando Hamlet, obviamente - há algo de podre no reino da Suécia. Mesmo assim há técnica narrativa. Acho que é isso. Trata-se de uma técnica de não deixar espaços vazios ou fios do enredo soltos, muito mais que uma preocupação com o texto. Para preencher esses espaços vazios ele evoca os fatos, apenas fatos.


O primeiro livro (Men Who Hate Women) talvez seja mesmo o melhor da trilogia. Como nos melhores contos policiais, pouco dos investigadores-protagonistas e muito do enredo é revelado. O livro começa com uma intrigante cena. Henrik Vanger, um empresário aposentado, desses podres de ricos, recebe um quadro com uma flor. No seu escritório há 43 dessas flores secas. As sete primeiras foram dadas por sua sobrinha Harrier Vanger. As demais são enviadas anonimamente todo o ano de diferentes parte do mundo, certificadas pelo carimbo dos correios, sempre no dia do aniversário da sobrinha, que desapareceu há mais de trinta e seis anos da ilha onde a família Vanger vive até hoje. As investigações policiais nunca deram em nada. Jamais conseguiram chegar a uma conclusão sobre seu assassinato pois nunca encontraram seu corpo. No dia em que ela desapareceu havia uma celebração cívica e um acidente, e a única ponte que ligava a ilha ao continente estava interditada. O que eliminava a hipótese de que o suposto assassino tivesse sumido com o corpo. Desde então, o tio Henrik Vanger é obcecado pela solução deste caso.

Mikael Blomkvist é um jornalista de meia-idade que anda na lona após ter denunciado, difamado e caluniado um empresário, meio no estilo Veja, sem ter provas – mais tarde acaba-se sabendo por um enredo secundário que o tal de Hans-Erik Wennerstrom é verdadeiramente um mau caráter que se dedica à lavagem de dinheiro. Mas nessa altura, Blomkvist ainda é um jornalista desacreditado e sem muitas opções profissionais, por esse motivo ou apesar dele, acaba por aceitar o convite de Henrik para desvendar o desaparecimento de sua sobrinha.

Henrik contrata a empresa de investigações de Dragan Armanskij para fazer um levantamento da vida de Blomkvist. Na empresa trabalha uma das investigadora esquisitona chamada Lisbeth Salander, uma moça meio punk, meio pan, meio cheia de peircings e tatuagens, meio totalmente anti-social, meio toda magrela e vista assim a distancia meio retardada. Ela é a responsável pelo dossie a respeito de Blomkvist que Dragan entrega ao advogado de Henrik antes que este o contrate.

Por conta dessa investigacao, os dois acabam se encontrando. Ou melhor, Blomkvist descobre que havia sido investigado por Salander por encomenda de Henrik. Fica indignado, mas como eh compulsivo e nao consegue mais se livrar da investigacao, que se entranhou em seus poros, nao desiste do caso. Ainda assim vai ateh a casa de Lisbeth para tirar uma saxtixfacao com a moca. Os dois acabam se entendendo e vindo a trabalhar juntos. Ela com suas habilidades de haker vai a procura dos detalhes que Blomkvist não consegue desvendar apenas com a lógica.

Evidentemente que não vou revelar os detalhes mais importantes da trama que é otima, mas depois desse livro, quando você vir um Volvo passando pela rua ou uma estante da Ikea, você vai ficar pensado nas, vamos chamar assim, virtudes da convivência familiar escandinava. E olha, meu amigo, a família Vanger e podre. Mas como no meu caso, tendo Nelson Rodrigues, Carlos Zéfiro e acima de tudo Jenival Lacerda como figuras tutelares para minha moral - em lugar de Lia Luft - nem fiquei tão impressionado assim com o livro.

The Girl with the Dragon Tattoo, o segundo livro da série, é mais centrado em Lisbeth Salander. Ela agora vai ganhando contornos mais humanos e percebe-se mais seu entorno e suas reações. Acima de tudo, descobre-se sobre seu passado e sobre o acerto de contas com seus, diríamos assim, fantasmas.

No início da estória Lisbeth desapareceu. Com a grana que ‘ganhou’ em suas atividades de ráquer no caso Hans-Erik Wennerstrom, se mandou da Suécia para esquecer a relação com Blomkovist. Está numa praia do Caribe curtindo a vida, estudando equações matemáticas – coisa boba, puff, tipo teorema de Fermat e aritmética de Diofantos. De quebra ajuda uma mulher a se livrar, ainda que acidentalmente, do marido canalha, durante um furacão e usa o tempo livre para fazer operções finaceiras on-line.

Mikael Blomkvist, livre da cadeia, tendo desvendado o paradeiro de Harrier Vanger, e tendo seu nome limpo ao desvelar a verdadeira face criminal de Hans-Erik Wennerstrom, volta à Millenium fortalecido. Nas mãos tem uma reportagem sobre tráfico de drogas (que na Suécia, ainda é um escândalo!) e prostituição de mulheres procedentes do Leste Europeu. O responsável pela investigação jornalística é Dag Svensson, um jovem jornalista, e sua esposa Mia Bergman, especialistas em criminologia.

O aprofundamento das investigações jornalisticas levam a uma máfia encabeçada por um homem misterioso chamado Alexander Zalachenko, ou apenas Zala, um ex-dissidente soviético, que pediu asilo político na Suécia nas vésperas do Social-Democrata Olof Palme deixar o poder. Meio X9, meio alcaguete, Zalachenko, a princípio, seguindo-se a linha de investigação de Blomkovist, acredita-se que ele só tenha alguma conexão com a investigação de Dag Svensson sobre prostituição e cafetinagem. Entretanto, há muito mais coisa feia. Várias vezes há insinuações sobre a suposta relação da chegada de Zalachenko à Suécia e o assassinato de Palme – principalmente no terceiro livro, quando ele está na berlinda e começa a ameaçar Säpo, a puliça secreta sueca, com a velha máxima “vô contá tudo que eu sei”. Fato é que a Zalachenko, não apenas por ter vindo de onde veio, numa época que um comunista e soviétivo era mais temido que um javali contrariado, mas por que trouxe com ele segredos, já que era da inteligência militar russa, contava com uma proteção especial.

Neste terceiro e último volume da série, The Girl Who Kicked the Hornet's Nest. Lisbeth está chumbadona. Literalmente. Tomou um monte de tiros e um deles justo na cabeça. Está entre a vida e a morte internada num hospital. No quarto ao lado, seu maior inimigo, Zala – não posso revelar por razões ético-carnavalescas quem é o tal de Zala pois e nesse fio que se sustenta tuda a trama do segundo volume. A moça está em apuros. Está internada, e assim que sair do hospital – se sair – deve responder por um processo de tentativa de triplo assassinato de Zalachenko.

Mikael Blomkvist evidentemente não crê nas acusações e vai a procura de respostas para limpar o nome da moça. Para isso, conta apenas com a ajuda da equipe de Millenium - agora sem sua editora chefe, centrada em sua ambição, que foi para outra revista maior –; de Annika Giannini, irmã de Mikael, advogada especializada em defender vítimas de crimes contra a mulher; e o inspetor Jan Bublanski, que começa a investigar o caso seguindo uma linha distinta da promotoria liderada por Eriksson se eu não me engano, já que a quantidade de personagens nos três livros deve ser duas vezes maior do que o número que pessoas que já passaram pela minha vida, contando aí o seu Bijú, temido inspetor do CEFET, o mudinho Hélio com quem eu trabalhei muitos anos, e muitos outros.

Enquanto Erika Berger está totalmente imersa numa luta pelo poder e estratégias comerciais em seu novo jornal, o Svenka Morgon-Postenm Mikael está só e desorientado na investigação daquilo que começa a se conigurar como um complô contra Lisbeth. Confiar no Estado – no Aparelho do Estado como diria o bão e véi Althussé – não é uma saída muito lógica, já que as acusações que pairam sobre Lisbeth são graves.

O segredo comercial de Stieg Larsson? Para mim são dois, além do talento apenas de ser um bom e competente contador de estórias. Primeiro, os desdobramentos a trama principal. São inúmeros (perdão da má palavra!) sub-plots, que ele vai abrindo e fechando com precisão milimétrica. Ele absolutamente não deixa nada de fora, mesmo criando uma in-fi-ni-da-de de personagens que circundam a trama principal. O cara se dá ao luxo até de tornar um faxineiro, um neuro-cirurgião, e um cidadão com síndrome de imunidade a dor, personagens fundamentais em determinada parte da trama. Segundo, os detalhes. Mesmo com essa quantidade imensa de personagens, ele detalha-os de maneira precisa, dando-lhes individualidade. E as sequencias de fatos, sem divagações sobre a psicologia dos personagens, afinal cada livro tinha apenas 700 páginas. Não dá tempo...

Ontem também, assisti o terceiro filme da série. TODOS os três. Péssimos. A impressão que tive em todos os três é que os diretores – diferentes em cada um deles – foram incompetententes e desleixados, deixando um monte de detalhes fora da narrativa filmica. Enfim, acabou.

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