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Primer Amor


Primer Amor, é uma novelinha curta e bastante celebrada de Turguenev. Publicado em 1860, o livro é francamente bem escrito, moderno, mas extremamente previsível. Além disso, sofre de um digamos assim pecado original. Se não me engano, por essa época dos inícios dos anos de 1860, Dostoiévski já retornara da Sibéria - já publicara Humilhados e Ofendidos, já traduzira uma penca de novelas de Balzac e andava a escrever o Recordações da Casa dos Mortos. É mais ou menos, mal comparando, como se alguém quisesse publicar um livro nos anos posteriores a 1984, ano de Viva o Povo Brasileiro.

Vladimir Petrovich. 16 anos, ou seja, para bom entendedor pingo é letra. Exalando testosterona pelos poros vai passar umas férias no campo com a família. Lá conhece Zenaida Alexandrovna Zasyekina, uma moça de 21 anos que pertencente a uma família em franca decadência, com uma mãe divorciada, e que ainda mantém algum prestígio por pertencer à nobreza. Mas para Vladimir, que desconhece a palavra pindaíba em russo, isso não importa. O que importa é que mesmo Zenaida tendo um monte de pretendentes, que podem tirá-la da situação de pindaíba financeira, sua paixão arrebatadora, digo, a paixão arrebatadora de Vladimir é maior que tudo.

Não é preciso avançar muitas páginas para perceber que em Zenaida, digo, no ser de Zenaida é cheio de vitalidade e de beleza, e havia neste uma mescla de astúcia e despreocupação, de afetação e sensibilidade, de calma e vivacidade. Ou seja, Zenaida, para além de sua situação calamitante de pindaíba financeira, estava na flor da idade e queria flertar e amar sem preocupação. Pretendentes não faltavam. Belovsorov, a quem chamava de ‘meu animal’ – que para bom entendedor, pingo é letra -, era o que lhe ateva fogo... Maidanov era o poeta que tratava de convencê-la em versos que a adorava... Lushin era um médico, o mais mordaz de todos os pretendentes, o que tinha alguma ascendência sobre ela... e o conde de Malevskiy era o mais escorregadio, cheio de palavras doces e toques sedutores. Zenaida se esbaldava e o pobre do Vladimir sofria às pampas na mão da danada da lúbrica Zenaida que, mesmo tentando, falha na recipocidade do amor ao rapaz.

Falha de maneira brutal, pois usa com Vladimir os mesmo jogos de sedução que usa com os outros homens mais maduros. Usa-os de maneira a não refreá-los ou sublimá-los em tempo algum. Sem reservas de controle sobre si, deixa-se levar por uma paixão altamente combustível e até mesmo trágica.

Vladimir descobre com uma tremenda dor, dentro de sua própria casa, após uma discussão dos pais, que o objeto do desejo de Zenaida é nada mais nada menos que seu pai Pyotr Vasilyevich. A família então decide partir abruptamente de Kaluzhkaya Zastava, deixando para trás o escândalo que começava a se formar. Após um último passeio a cavalo com o pai, este desata numa carreira sumindo na poeira. Vladimir tenta segui-lo, mas não o alcança. Chega então a uma cabana, onde o pai se encontrava perto da janela. Na espreita, observa quem estava na cabana era nada menos que Zenaida. Pyotr a surra com seu chicote. Ela beija os entalhes avermelhados da pele. Não, não se iluda, esta não é uma estória de pornografia. Mais bem uma estória que prova como um enredo pouco construído pode tropeçar no óbvio - do que podería estar implícito no próprio desenrolar da estória e nas obsessões de Vladimir, Pyotr e da própria Zenaida.

Oito meses depois os Petrovich recebem uma carta ameaçadora pedindo alguma recompensa não bem explicada. A Providência faz com que Pyotr morra poucos dias depois de um ataque do coração. Três ou quatro anos depois, Vladimir encontra Maidanov na saída de um teatro. Este revelha que Zenaida casara-se com um tal de Monsieur Dolsky. Quando finalmente Vladimir decide procurá-la, descobre que ela morrera poucos dias antes ao dar a luz. Enfim, uma síntese didática dos males do amor jovem sem a complexidade, sem a força, sem aquela sensação de limite do intolerável, do inapropriado que Dostoievski nos deixa. Ou talvez não tenha ficado satisfeito pois no fundo, o livro - lido numa noite - encaminha uma estória que poderia ser densa em sua paixão destruidora, em sua deterioração, em seu esgaçamento de relações filiais, para um recuo visível e nos proporciona solução decerto conciliadora com a morte de Pyotr e Zenaida. Enfim, talvez eu não tenha entendido Turguenev.

Irmãos karamazov


Personagens

Aliekisiei Karamazov, o herói do narrador, é o mais novo dos três irmãos. Um cristão fervoroso que mora num mosteiro. Um noviciado nas atividades monásticas que, seguindo as instruções de seu mestre Zósima "volta ao mundo". É um jovem ponderado, equilibrado e justo, que age como o fiel da balança da família, apaziguando os ânimos e animando os irmãos, que viviam à beira da autodestruição. Nesse começo de leitura me parece uma espécie de pessoa rara, extremamente justa e cheia de compaixão.

Ivã Fiodórovit Karamazov, irmão de Aliekisiei, é o mais instruído e cosmopolita, e justamente por isso encarna doses de ateísmo e de niilismo extremo. Chega a exercer forte influência sobre Smierdiakov, criado da casa do pai. Dono de uma ironia corrosiva, era um debatedor nato. Discutia problemas sociais e religiosos, e autor de célebres frases: "Se Deus não existe, então tudo é permitido." Dostoievski o pinta como um imoral que tinha seus mistérios. Vivia às expensas do pai, sem manter bom relacionamento com ele. Na edição da Nova Aguilar há uma introdução à cada romance e novela. Nesta do volume 4, o próprio Ivã é comparado a Dostoievski em vários aspectos. Um deles é o trata de dos aspectos psicológicos da relação entre pai e filho, problema materializado na figura do pai como vítima dos próprios criados. Ivã, tal qual o Dostoievski, não tornara-se cético mas encontrava-se afastado da religião e demasiado apegados aos estudos.

Dimitri Fiódorovich Karamazov, ou apenas Mítia, é o meio-irmão. Retorna a casa do pai para cobrar parte da herança que, segundo lhe disseram, sua mãe deixou para ele. O velho Karamázov finge desconhecer quaisquer valores ou propriedades que tenham sido deixados por sua ex-mulher. Dimitri é na verdade o único com motivos aparentes para matar o pai. Instável e confuso, ora pende à bondade, ora à maldade, que na caracterização de Dostoievski seria o pêndulo que se inclina entre o Cristianismo e o Niilismo. Perdulário, é o principal suspeito da morte do pai, justamente por disputar com ele o amor da mesma mulher, Grushenka. É acusado, preso e julgado por um júri popular, que o considera culpado pelo crime de morte premeditada. Sabidamente, o culpaldo era Ivã Fiodórovit Karamazov – que desejava a jovem prometida a Dimitri - , que tivera a idéia e instigara Smierdiákov a pô-la em prática, mas Smierdiákov estava morto e tudo acaba conspirando contra Mítia.
Smierdiákov, inicialmente, junto a Grigóri Vassilievitch, é um dos criados da casa do velho Karamazov, Fiodor Pávlovich. Foi educado por Grigori e Marfa Ignatiévna. Fiodor o chamava de Besta de Balaão, numa alusão bíblica ao livro dos números, no Pentateuco, quando a tal burra, impedida por um anjo de avançar, recebe inúmeros açoites de Balaão. A besta então, chega a falar repreendendo-o. Crescera selvagem e cético chegando a duvidar de várias passagens da bíblia, sob a tutela de Grigori. Tinha por hábito matar gatos, enterrando-os num ritual inventado por ele próprio. Entretanto, apesar de sua natureza irascível e sociopata, Fiodor, assim que descobriu que era epilético passou a trata-lo com indiferença - o que vindo dele já era meio caminho para a simpatia. Enfim, um tipo frio, honesto e distante que armazenava impressões sem saber ao certo suas razões.
No decorrer da estória desconfia-se que um filho bastardo do velho karamazov. É epilético, asssim como Dostoievski o era.

Catierina Ivanovna, ex-noiva de Dimítri, é na verdade a joven Polina, que Dostoievski conheceu quando se refugiou na Europa dos seus credores. Não são raras as referências a ela em sua vasta obra, cada qual, com um nome diferente.
Grushenka, mulher de 'reputação questionável' pela qual tanto Dimitri como o velho Karamazov se apaixonam.
Sinopse
As ações do livro começam com uma reunião familiar num mosteiro. Numa tentativa de resolver desavenças familiares, o patriarca Karamázov, Dmitri e Ivan vão a um mosteiro ouvir as opiniões de Frei Zossima e Alexi. Uma vez lá, Fiodor Karamazov acusa o filho Dimitri de ser um depravado. Dmitri contesta a acusaçõa dizendo que seu pai tentou seduzir Grushenka, prometendo-lhe uma quantia em dinheiro. Frei Zossima se inclina e beija os pés de Dmitri.

Sentença do Consorte


Voltei ao Dostoievski. Comprei a obra completa, há dois anos, que foi trazida do Brasil pelo meu chapa-xara, o erudito laico Chico Octavio. Deixei-a decantar na estante até outubro passado – por absoluta falta de tempo. Desde então já passaram pelo crivo O Jogador e Crime e Castigo. Mas não estou aqui para falar nem da obsessão de Raskolnikov ao matar não a usuraria mas todo um sistema, nem tampouco da frustração do jogador absorvido pelo o amor não correspondido e a sedução do ganho fácil no bacará e na roleta, e sim do Eterno Marido.

Muitos a consideram um obra menor. André Guide considera a obra curta mais bem acabada de Dostoievski. Acho que tendo a concordar que essa é uma obra-prima pela maestria como constroi a densidade psicológica dos personagens, que nos faz mudar de opinião o tempo todo. Essa cotina de fumaça criada pelo autor é um dos pontos altos do livro, pois num determinado momento pensamos que o eterno marido, Páviel Pávlovitch Trussótzki, é um pobre coitado, condenado a viver só pelo amor devotado a mulher morta, Natália Nassílievna. Noutro momento, pensamos que Aleksiéi Ivânovitch Vieltchâninov, ex-amante da mulher de Páviel Pávlovitch, é um crápula sem sentimentos.

Com o andar da carruagem vamos tendo a sensação de que as coisa não são bem assim... nem Páviel é um corno otário e manso como um bovino, nem Vieltchâninov é o crápula que pensávamos, nem Natália Nassílievna é a Madame Bovary, em versão russo-rodriguana.
A estória começa com o reencontro do dois, numa situação completamente inusitada pois Páviel ronda a casa de Vieltchâninov por vários dias, a procura de respostas, para se certificar de que ele era mesmo o amigo da família com quem convivera há dez anos passados. De posse de umas cartas de amor da viúva, acaba encontrando o paradeiro do suposto amante - que diga-se de passgem naotem a certeza de ser Vieltchâninov.

Entre as incertezas e os delirios de Páviel Pávlovitch Trussótzki, a trama acaba mais complexa pois Natália tivera uma filha, Lisa, logo depois de terminado o caso com Vieltchâninov. A questão de quem seria o pai verdadeiro de Lisa ronda a estória como um fantasma que não aparece mas que todos suspeitam estar naquela casa do passado. De quem seria a filha? De Trussótzki, a quem a menina sempre tratara como pai? De Vieltchâninov, que dera uma rápida e saíra fora? Ou de um terceiro personagem, um jovem militar -se nao me engano - , com quem Natália tivera um relacionamento depois que Vieltchâninov deixara aquela província?

Um toque de humor é dado pelo lado bufo alcoólatra e destemperado de Páviel Pávlovitch Trussótzki, um pouco caricaturado demais pelo autor. Acho que isso se deve a opção de Dostoievski em vê-lo e descrevê-lo sempre pelos olhos do amante como um homem incapaz de ter uma vida paralela, uma aventura, um romance, ja que Natália exercia sobre ele certa ascencência. Enfim, um homem incapaz de ter vida fora do casamento:

”Um homem assim nasce e desenvolve-se unicamente para se casar e para, depois do casamento, se tornar imediatamente num apêndice da sua mulher, mesmo no caso de ter um carácter individual incontestável. A principal característica deste marido é um enfeite bem conhecido. Não pode deixar de ser cornudo, do mesmo modo que o sol não pode deixar de ser brilhante, mas não só nunca sabe disso, como também, de acordo com as leis da própria natureza, é incapaz de sabê-lo.”

Chega a ser ironica a curiosidade de meu concunhado ao me ver com o livro nas maos na semana de seu casamento.... Ah... a familia...
Imagem: Fritz Eichenberg (1901-1990)
Musica do dia: Concerto para Piano No. 3 de Rachmaninoff