Mostrando postagens com marcador Literatura Argentina. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Literatura Argentina. Mostrar todas as postagens

O Túnel

El túnel (1947), de Ernesto Sábato, é um desses livros curtos que não chegam a prender o leitor mas o inquietam por passar um certo vazio, uma certa crise da existência que ultrapassa os limites da compreensão. O tema da inadaptação do indivíduo à sociedade contemporânea foi sem dúvida um dos temas prediletos da Escola de Frankfurt, e seria demasiadamente inóspito ambientá-lo no enredo de uma novela até que - primeiramente Camus com L’Étranger(1942) - Sábato se aventurasse a escrever a estória de Juan Pablo Castel e de como este assassinou a Maria Iribarne.

Já na primera página, sem rodeios, ele começa justificar o ato.

Castel é um pintor que desenvolve uma estranha obsessão por uma das apreciadoras de um de seus quadros. Num de seus vernissages, o pintor se admira com a atenção que uma mulher deposita num de seus quadros, ao notar um detalhe que havia passado despercebido por todos os críticos, mas não desapercebido por Iribarne. O detalhe. Uma janela onde uma mulher olha para o mar. Então, o pintor, sem maiores explicações, decide procurar a mulher por toda a cidade numa busca desesperada por não se sabe exatamente o que.

Em meio a procura, traça e fantasia uma série de possibilidades para encontrá-la, abordá-la, puxar um papo e conhecê-la. O mais interessante é que em meio a uma série de suposições e probabilidades quase matemáticas de tão logicamente traçcadas, Castel a encontra por obra exatamente do acaso, numa das ruas de Buenos Aires e a segue até seu trabalho. Dois dias se seguem até que Castel telefone e descubra que há um homem na vida de Maria Iribarne. Telefona novamente e a empregada diz que há uma carta para ele. Castel, desesperado, vai até a casa de Maria e encontra Allende, um homem mais velho e cego, que que se diz seu marido e lhe dá a carta de Maria. Allende diz que Maria esta numa fazenda fora de Buenos Aires com Hunter, primo do próprio Allende.

O que se segue é uma evidente rejeição de Maria a todas as tentativas de Castel em conquistá-la. Confundido e decepcionado, Castel começa a beber e frequentar prosíbulos. Escreve uma carta a Maria e logo em seguida se arrepende do conteúdo pois diz na missiva que não crê que seu amor a ele e a seu marido possa conviver com o amor a Hunter, com que acredita estar alimentando um romance adúltero. Tenta recuperar a carta ja despachada na agência postal sem sucasso. Pede, então, ao telefone, que Maria o encontre pois ameaça se suicidar.

Maria não atende ao chamado de Castel. Quando este novamente chama para sua casa, descobre que ela já havia retornado para a fazenda. Decide então partir para a fazenda armado de uma faca. Já na fazenda, Castel lembra-se dos momentos felizes com Maria. Nesse momento já não se sabe o que é realidade ou absessão em suas discussões absolutamente intelectualizadas e sua cabeça totalemente conturbada, transtornada pela incompreensão dos críticos, o amor não correspondido de Maria, e a indicação de que nem sequer Allende, Hunter ou Lartigue – amigo de Hunter – o levavam a sério. Suas tentativas de justificação dos mínimos atos levam uma certeza ao leitor. A do pessimismo deixado entre as projeções e a realidade. Nesse momento Castel pronuncia a frase que fecha um livro cheio de obsessões e pessimismos: “en todo caso había un sólo túnel, oscuro y solitário: él mío, el túnel en que había transcurrido mi infãncia, mi juventud, toda mi vida.”

Quando chega à fazenda mata a Maria Iribarne. Logo em seguida telefona para Allende e confessa que assassinou a Maria justificando que esta o enganava. Allende de revolta contra Castel , que se entrega a polícia, enquanto Allende se suicida.

Enfim, é um desses livros que não prendem o leitor, mas deixa de alguma forma uma marca incômoda. Aquela da presença de Juan Pablo Castel, assim como Mersault, de maneira análoga, talvez, havia deixado naqueles que leram O Estrangeiro há anos atrás.