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Trilogía Sucia de La Habana

Trechos de Trilogía Sucia de La Habana. Pedro Juan Gutiérrez

Conto:O NATAL DE 94

No domingo, 25 de dezembro, de manhã cedo. Angelito subiu ao telhado. Ele tinha mais ou menos uns sessenta anos e morava num apartamento do quarto andar. Ele com muita parcimônia pediu permissão para verificar a caixa d´água. Mais tarde, eu percebi que confundi a tristeza com a parcimônia. Disse que há dias não entrava água na sua casa. Deixei que ele subisse até o reservatórios e, sem perder tempo, ele se jogou para a rua. Quarenta e cinco metros de voo livre.
[…]

Durante anos, Angelito sempre esteve bêbado. Toda a família se dispersou: uma filha fez de tudo até conseguir se casar, e com uma esposa voluntáriosa foi viver na cidade de Segóvia. O outro subiu numa jangada com destino a Miami. A esposa deste, ao se encontrar sem marido e o filho adolescente nas costas, renasceu como a viúva alegre e começou a cantar e dançar em um grupo de salsa, até que por um golpe de sorte de repente se viu no México fazendo um programa de rárdio. […]

Depois a mulher morreu de um infarte no coração e o velho vivia sozinho com o neto Eduardo, meu amigo. […]

Eduardo foi à Poliícia. Fizeram a papelada. Retornou ao meio dia e foi me encontrar na praça. Eu tinha um carregamento bom de àlcool escondido no meu quarto. E ele estava alegre. - Vamos fazer um tremendo negócio hoje à noite. - Por que? Você não está de luto pelo teu avô? - Não, não. Já terminei. O pessoal do IML me avisa depois de não sei que lá. Tu ainda tens aquele àlcool?

 

Conto:

DUDAS, MUCHAS DUDAS

Aliás, fiz uma conta e nos últimos cinco anos tive relações sexuais com vinte e duas mulheres. Essa média não é ideal para um homem de 45 anos. Não me arrependo, mas fiquei preocupado. Não por causa da interioridade. arrepender-se da AIDS. Eu odiaria me condenar à morte precoce por gozar num buraco errado.

Bem, deixando de lado as promiscuidades, eu tive que continuar. Aguentar. Endurecido, é claro. As pessoas pensavam que eu estava crescendo. Mas não. Eu estava apenas tentando ficar cada vez mais forte e não deixar que eles me manipulassem. Cada um que se foda sozinho. Tive que dosar muito bem o pouco de amor que eu tinha dentro de mim para evitar que o tanque chegasse a zero e o motor parasse. Não perdi a esperança de recarregar em algum lugar. Eu era um utópico de merda.  Muito fodido mas sonhando em encontrar algo lindo dentro de mim que mais uma vez enchesse meu tanque até a borda para repetir tudo e voltar a ser aquele cara generoso e bom amante. Você é idiota?, às vezes eu me perguntava. Em outras ocasiões, mais tranquilo, dizia a mim mesmo: sim, é possível.
[…]

Ele não consegue lidar com sua dignidade, sob pena de morrer de fome. “Se ele me dá um pouco, é bom e eu o amo”, só isso. As mulheres em geral entendem isso desde muito jovens e aceitam. Mas para nós  homens isso fica um pouco mais complicados com a rebeldia, vai contra os nossos princípios e tudo mais. No fim das contas só entendemos isso um pouco mais tarde.

Bem, esse instinto de autopreservação bem desenvolvido é uma das faces da pobreza. Mas a pobreza tem muitas faces. Talvez a sua face mais visível seja a de que nos despoja da grandeza de espírito. Ou pelo menos a amplitude de espírito. Isso transforma você em um cara mau, miserável e calculista. A única necessidade é sobreviver. E o resto vai tudo para o inferno a generosidade, a solidariedade, a gentileza e o pacifismo.

No meio de tantas dúvidas, chegou Alejandro, um velho amigo. Meio bêbado e feliz. Naquele dia lhe contaram que em um sorteio ele ganhou um visto de residência nos EUA. O cara estava exultante. Todos as suas amigas queriam se casar com ele. Ofereciam-lhe dinheiro..