(Filme e postagem de 2011, mas... me peguei assistindo o Peckinpah again, ontem)
Western Crepuscular ou Tráiganme la cabeza de Alfredo García
"El Jefe" é milionário “fazendeiro”, mejicano e cheio de capangas mejicanos, descobre que sua filha Teresa está grávida. O cidadão em vez de ficar feliz por ser avô, fica furioso. Primeiro por que por que a criança vai nascer sem pai, segundo por que a menina era virgem – veja bem, estamos falando de caras mexicanos, ano de 1974, com outro diapasão. El Jefe, então, aplica uns safanões na menina para saber quem seria o pai da criança. Entre uma bordoada e outra a moça acaba revelando que o pai é Alfredo Garcia, justamente o homem que El Jefe tinha preparado para ser seu sucessor – ai você pensaria… ahh, Freud explica.
Para lavar a honra tanto da
filha como de sua película apassivadora, contrata dois pistoleiros maus
e internacionais, que na verdade encontram-se na outra margem do Rio Grande, e
oferece 1 milhão de dólares para quem trouxer a cabeça do tal Alfredo Garcia.
Dois pistoleiros chegam a um bar do baixo
meretrício mejicano en Ciudad de Méjico, onde encontram o pianista Bennie, um ex
militar americano que vendo a pinta dos pistoleiros se faz de desentendido. Eles
oferecem um bom tutu pela informação do paradeiro de Alfredo Garcia, mas querem
como prova a cabeça de Garcia. O pianista já andava meio na bronca com Garcia
pela folga com a cantora Elita, seu trelêlê oficial, e fica de dar a resposta aos bandidos. Bennie
vai atrás de Garcia e se certifica que ele estivera com Elita. Mas a cantora
lhe diz que Garcia foi embora para sua cidade no interior do México, onde
sofreu um acidente de carro e morreu.
Mas é claro (!) que Bennie não acredita nessa estorinha fiada
de Elita. E no melhor estilo brasileiro
compra um terçado e parte com Elita rumo à cidade onde Garcia foi enterrado,
para conseguir a prova da morte de Garcia, ou seja, literalmente a cabeça de
Alfredo Garcia.
Mas como isso tudo é uma
estória de western pop crepuscular pensada por Peckinpah, o mais gótico dos
diretores do gênero, os assassinos não confiam em Bennie e sem ele saber o
seguem até a um vilarejo no interior do Méjico, onde então ocorrerá a emboscada
e a pendenga semi-final. Afinal, pensa comigo. Por que eles vão pagar ao cara,
se pode embolsar a grana e ainda matar o infeliz do Bennie, não é mesmo. Isso é
Óbvio. O filme foi um dos mais baratos do Peckinpah, e justiça seja feita, fez
milagres. Se o Peckinpah tivesse metade da grana e dos amigos do Tarantino...
Com orçamento enxugadíssimo e um roteiro barato, não
deu outra, Bennie encontra a sepultura de Alfredo Garcia e ao tentar
desenterrá-lo é atacado pelas costas. Quando desperta, está enterrado. Com
muito esforço consegue se desenterrar, mas constada que sua amante, Elita,
enterrada ao seu lado está morta. Bennie ao ver a sepultura de Garcia
aberta, constata que o corpo não tinha a cabeça, levada enquanto esteve
desacordado e então passa a desconfiar que se os dois assassinos de aluguel o
seguiram até aquele fim de mundo, e levaram a cabeça de Alfredo Garcia, por que
a cabeça do morto vale muito mais na mão dos sicários que na dele.
Enfim, depois tremenda
troca de tiros, ele recupera a cabeça de Garcia e a coloca num saco com gelo e
dirige com a cabeça no banco do lado.
O monólogo de Bennie com a
cabeça morta de Alfredo Garcia é uma cena surreal, mas fantástica. Talvez o
ponto alto do filme seja esse convívio de Bennie com a cabeça decepada.
O filme tem várias
reviravoltas. Os matadores Sappensly e Quill acabam fazendo uma emboscada,
quando Bennie vai devolver a cabeça à família de Alfredo Garcia. Quill mata
toda a familia de Garcia, mas é morto por Bennie. Sappensly, desolado como um
matador olhando para seu parceiro morto, diz que não pagará Bennie, e também
toma um caroço na cabeça.
E nesse meio tempo, Bennie
continua conversando com a cabeça. Chega ao hotel, lava-a e pretende levá-la ao
Jefe, com o pretexto de receber os US$ 10K. Em meio a mais tiros, Bennie finalmente
consegue o endereço do Jefe.
Consegue chegar justo no
dia do batizado do rebento. O Jefe estava até feliz. Bennie se apresenta,
entrega a cabeça e relata quantas pessoas morreram por aquela cabeça. Quando o
Jefe diz para ele pegar seu dinheiro, jogar a cabeça para os porcos e ir embora,
ele lembra que Elita se incluía naquele monte de mortes em vão, e aí é possível
ver como o semblante de Warren Oates muda ao constatar que tudo aqui tinha sido
em vão.
Ai meu amigo... acho que não era nem mais o Beniie que estava ali, e sim o Oates, vaqueiro do Kentucky, amigo do Steve McQueen. Foi tiro pra todo lado. Bennie, enfurecido, mata um monte de capanga do Jefe.
A mocinha entra com o filho
no colo e pede que mate seu pai. Ele pega a cabeça e vai em direção a porteira
da fazenda levando o Jefe, junto a Teresa.
Chegando na porteira, ele
se vira pra Teresa e diz assim mesmo do jeito que eu estou te falando: “Agora,
você coisa da criança, que do
teu pai cuido eu…” UAU ! podia terminar ai
né! Mas não…. Isso é um filme de Sam
Peckinpah.
Como esses mafiosos,
traficantes, milicianos tem sempre capangas pra caramba, surgiu mais um monte
do nada e rasgaram Bennie com rajadas de metralhadoras.
Nota. Sam Peckinpah já foi partícula apassivadora em tiranicídia contenda entre meu concunhado e eu. Enquanto eu dizia que o cinema americano não era autoral, ou seja, não tinha uma linha de cineastas que faziam filmes classificáveis pelo toque de Midas da linha autoral, o concunhado dizia que havia Peckinpah: "brutalidade mimética, estética da violência e ódio fiduciário". Dito assim, de maneira tão bonita, pode até ser.