Este é o terceiro dos seis contos morais de Eric Rohmer. E basicamente a cena em que Vidal deixa o protagonista no apartamento de Maud representa o ponto de inflexão dos contos morais. Um homem, apaixonado por uma mulher, que encontra-se e passa tempo com uma segunda mulher extremamente atraente trocando confidências, mas com que não consegue superar a barreira platônica da contemplação. Neste ambiente estóico, o mais interessante em Rohmer, neste e nos outros contos morais, é a possibilidade de colocar quatro personagens articulados, interesantes, educados, vulneráveis e totalmente livres. A única objeção é como irão desempenhar suas identidades afetivas. Rohmer é um cineasta realista, trata os personagens como invenções sem pretensão, ainda que algumas vezes os diálogos reenforcem algum ar de artificialismo, já que falamos de personagens um tanto reais. Há algo relativamente probo nos desfechos que Rohmer dá a seus contos morais. Como por exemplo, no final, após cinco anos desde a última vez que encontrara Maud, chega a praia com sua esposa e um fliho pequeno e a encontra fortuitamente. Conversam brevemente sobre generalidades. Despedem-se e ele corre em direção ao mar. Há algo que não me agrada em Rohmer e que certamente tem alguma relação com sua forma de fazer arte, concentrando-se mais na tentativa de transmitir a compreensão ao sentimento. Salvo ledo engano, essa negação epicurista é de uma caretice cretina.
Contentemo-nos com a Ilusão da Semelhança, porém, em verdade lhe digo, senhor doutor, se me posso exprimir em estilo profético, que o interesse da vida onde sempre esteve foi nas diferenças,
Ma Nuit Chez Maud
Este é o terceiro dos seis contos morais de Eric Rohmer. E basicamente a cena em que Vidal deixa o protagonista no apartamento de Maud representa o ponto de inflexão dos contos morais. Um homem, apaixonado por uma mulher, que encontra-se e passa tempo com uma segunda mulher extremamente atraente trocando confidências, mas com que não consegue superar a barreira platônica da contemplação. Neste ambiente estóico, o mais interessante em Rohmer, neste e nos outros contos morais, é a possibilidade de colocar quatro personagens articulados, interesantes, educados, vulneráveis e totalmente livres. A única objeção é como irão desempenhar suas identidades afetivas. Rohmer é um cineasta realista, trata os personagens como invenções sem pretensão, ainda que algumas vezes os diálogos reenforcem algum ar de artificialismo, já que falamos de personagens um tanto reais. Há algo relativamente probo nos desfechos que Rohmer dá a seus contos morais. Como por exemplo, no final, após cinco anos desde a última vez que encontrara Maud, chega a praia com sua esposa e um fliho pequeno e a encontra fortuitamente. Conversam brevemente sobre generalidades. Despedem-se e ele corre em direção ao mar. Há algo que não me agrada em Rohmer e que certamente tem alguma relação com sua forma de fazer arte, concentrando-se mais na tentativa de transmitir a compreensão ao sentimento. Salvo ledo engano, essa negação epicurista é de uma caretice cretina.
toda a vida que levara vai refluindo, aos pedaços, como um filme enevoado que na tela projetasse as imagens ao contrário.
Eu?
Peace
A patuléia, evidentemente, a malta aplaudiu quando foi dito, “we lose ourselves when we compromise the very ideals that we fight to defend,” mas eu vi com os olhos que a terra há de comer a hesitação do Secretário da Academia, que engolia em seco e mostrava com olhos relutantes a besteria que fizeram ao nomear o puérpere Nobel da Paz. Os pormenores lhe escaparam e ele se deu conta tarde demais pois a pessoa que recebeu o Nobel desse ano, ainda que tenha evocado a Liga das Nações, a Convenção de Genebra e a Cruz Vermelha, fez um discurso duro e usou a palavra Diplomacia apenas uma vez. Preferiu desviar das razões do Just War para enfatizar uma tal de Just Peace. Por quê? Simples. O discurso da justificação moral da guerra não foi um discurso para o mundo e sim o de um presidente que, pressionado pela direita feroz, já dá sinais de fraqueza perante seu povo. Ora, caso contrário, não justificaria a violência com a retórica do princípio da auto-defesa, que serve, nas atuais circunstâncias, aos que já estão armados. E bem armados no sentido lockeano. Just War para mim tem o odor similar do caldo requentado do Preemptive strike.
O Secretário e a Comissão julgadora da Academia não sabiam disso? Logicamente que sabiam. E é bem verdade que o Nobel da Paz, ou seja, a pessoa agraciada com o Prêmio Nobel da Paz, chegou ao poder não com a promessa de acabar com a Guerra, é bem verdade. Mas, com a vaga promessa de tornar o mundo mais justo perante o mundo sem regras criado por seu antecessor. Entretanto, não o fez.....
Foi lúcido, entretanto, ele, inopinado, ter evocado Kant ao dizer que há duas verdades irreconciliáveis em sua ação política para a Guerra: A Necessidade da Guerra x A Guerra como Expressão da Decadência Humana. A diferenciação serviu para ilustrar a angústia e o peso de decisões difíceis. Sua decisão de enviar mais tropas para o Afeganistão. Uma decisão que no fim das contas não apaga as evidências contidas nos fatos.
Evidências: Passou um ano. A retórica bondosa e evangelista continua. Não há um acordo mínimo para a violência entre Israel e as autoridades palestinas. A América Latina continua sendo nada para governos Democratas – vide Honduras. O Afeganistão agoniza com a chegada, hoje, de mais 7 mil soldados da OTAN - 30 mil no total. Guantanamo não fechou, e se fechar só muda de CEP, pois os suspeitos de terrorismo continuarão presos sem a protecção da lei e à margem dos tribunais. Ou seja, tudo do mesmo.
Por fim, entre enganos e arrependimentos, o discurso agradará certemente aos cientistas politicos, com a frase: “The non-violence practiced by men like Gandhi and King may not have been practical or possible in every circumstance, but the love that they preached – their faith in human progress – must always be the North Star that guides us on our journey.” O discurso também agradou a plebe presente que aplaudia entusiasmada, fez tremer as princezinhas e dormir os bois e as crianças. Mas não havia nada de ingenuidade, pois mirando em Clausewitz, acertou em cheio no bom senso. Fidel pode não estar totalmente enganado....pois afinal não foi Cesar quem proclamou a Paz através da Vitória?
Fogo Amigo
Eu os tranquilizei: na Frei Caneca, para onde iria, estavam os meus antigos companheiros de militância, que reencontraria tantos anos depois. Descumprindo o regulamento, os guardas permitiram que eu entrasse em todas as galerias para me despedir afetuosamente de alunos e amigos. O Devagar ia embora.
Nesse contexto, deixei trabalho e família no
Dizia-me da importância do primeiro encontro, em que tentaria formatar a psicologia de Lula, saber o que lhe passava na
Na mesa, estávamos eu, o americano ao meu lado, Lula e o publicitário Paulo de Tarso em frente e, nas cabeceiras, Espinoza (segurança de Lula) e outro publicitário brasileiro que trabalhava conosco, cujo nome também esqueci. Lula puxou conversa: "Você esteve preso, não é Cesinha?" "Estive." "Quanto tempo?" "Alguns anos...", desconversei (raramente falo nesse assunto). Lula continuou: "Eu não aguentaria. Não vivo sem boceta".
Para comprovar essa afirmação, passou a narrar com fluência
Foi um dos momentos mais kafkianos que vivi. Enquanto ouvia a narrativa do nosso candidato, eu relembrava as vezes em que poderia ter sido, digamos assim, o "menino do MEP" nas mãos de criminosos comuns considerados perigosos, condenados a penas longas, que, não obstante essas condições, sempre me respeitaram.
O marqueteiro americano me cutucava, impaciente, para que eu traduzisse o que Lula falava, dada a importância do primeiro encontro. Eu não sabia o que fazer. Não podia lhe dizer o que estava ouvindo. Depois do almoço, desconversei: Lula só havia dito generalidades sem importância. O americano achou que eu estava boicotando o seu trabalho. Ficou bravo e, felizmente, desapareceu.
*
Nelson, que amava os Beatles, não conseguiu ser o rei do
Neguinho Dois também morreu na prisão. Sapo Lee foi transferido para a Ilha Grande; perdi sua pista quando o presídio de lá foi desativado. Chinês foi solto e conseguiu ser contratado por uma empreiteira que o enviaria para trabalhar em uma obra na Arábia, mas a empresa mudou os planos e o mandou para o Alasca. Na última vez que falei com ele, há mais de 20 anos, estava animado com a perspectiva do embarque: "Arábia ou Alasca, Devagar, é tudo as mesmas Alemanhas!" Ele quis ir embora para escapar do destino de seu melhor amigo, o Sabichão, que também havia sido solto, novamente preso e dessa vez assassinado. Não sei o que aconteceu com o Formigão e o Ari Navalhada.
A todos, autênticos filhos do Brasil, tão castigados, presto homenagem, estejam onde estiverem, mortos ou vivos, pela maneira
O homem que me disse que o atacou é hoje presidente da República. É conciliador e, dizem, faz um bom governo. Ganhou projeção internacional. Afastei-me dele depois daquela conversa na produtora de televisão, mas desejo-lhe sorte, pelo bem do nosso país. Espero que tenha melhorado com o passar dos anos.
Mesmo assim, não pretendo assistir a "O Filho do Brasil", que exala o mau cheiro das mistificações. Li nos jornais que o filme mostra cenas dos 30 dias em que Lula esteve detido e lembrei das passagens que registrei neste texto, que está além da política. Não pretende acusar, rotular ou julgar, mas refletir sobre a complexidade da condição humana, justamente o que um filme assim, a serviço do culto à personalidade, tenta esconder.
CÉSAR BENJAMIN, 55, militou no movimento estudantil secundarista em 1968 e passou para a clandestinidade depois da decretação do Ato Institucional nº 5, em 13 de dezembro desse ano, juntando-se à resistência armada ao regime militar. Foi preso em meados de 1971, com 17 anos, e expulso do país no final de 1976. Retornou em 1978. Ajudou a fundar o PT, do qual se desfiliou em 1995. Em 2006 foi candidato a vice-presidente na chapa liderada pela senadora Heloísa Helena, do PSOL, do qual também se desfiliou. Trabalhou na Fundação Getulio Vargas, na Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, na Prefeitura do
Música do dia. Profecia Final (ou No mais Profundo). Cordel de Fogo Encantado
Aceitai minha despedida
Fico governando essa zona de cá por inteiro até a ponta dos trilhos em Rio Branco
e o senhor por sua vez governa
do Rio Branco até a pancada do mar
Espinhos soltos no chão
Mistérios presos no ar
Não desejei carregar esse cajado infinito
Anuncio a tua vinda
No silêncio dos cocões
Já vou, meu primeiro trago
Longe da terra primeira
A nitidez se acentua
O nevoeiro se engole
Minhas raízes caminham
Queimai vossa história tão mal contada
Na mais alta casa do mundo
Na vastidão do teu olho
Na pancada do segundo
Suor de santa vela acesa
A língua hóstia consagrada
Sangue vinho do meu peito
Pés andor da dor cansada
Fora das Margens
Programa de Rádio de Ophir, um de meus amigos mais talentosos. Arranjador e maestro, Ophir estuda piano desde os 5 anos de idade e recentemente teve aulas - e brigas - com Michael Finnissy. Está terminando um doutorado na University of Southampton, já passou pelo The Royal Conservatory em Haia e pela The Guildhall School of Music and Drama in London. Em todo o caso, na minha opinião, não precisa de vida acadêmica para nada. Está muito bem onde está, transmitido seu programa de rádio via internet e produzindo composições sem parar, ultrapassando o limite da margem do papel. Na última vez que nos vimos, em Bruxelas, o cara sentou ao piano e tocou música brasileira a noite toda. Literalmente, pois deixamos o bar as seis da manhã, quando o cruzamento do santo do Sinatra com o Fred Astaire baixou num inglês magricela e narigudo que resolveu nos alugar, bravos biriteiros. Só para constar, as preferências do Ophir vão de Jacques Brel, Montiverdi e Sibelius a Tom Jobim - evidentemente -, Tom Zé - para ele um gênio - e Egberto Gismonti.
Elegy
O filme trata da adaptação de "The Dying Animal”, de Philip Roth. (Favor, ver a resenha do Alexandre Kovacs). Roth revivera neste livro David Kepesh, personagem que já fizera parte de dois de seus livros da década de 1970. Kepesh é um homem culto, na faixa dos 60 anos, que leva uma confortável vida de divorciado. Vive em Manhattan como escritor, crítico e professor universitário requisitado para programas de televisão e rádio. Apesar de seu verniz intelectualizado, Kepesh é um tipo que se cerca de um universo de relativo encapsulamento sentimental. A relação com o filho médico, inconformado com a comodidade do pai, é abrasiva pois o filho se recusa a admitir que o pai, livre das responsabilidades familiares possa viver sem culpa. Com Carolyn – aliás Patricia Clarkson! - , sua amante por mais de 20 anos, mantém uma relação de se reduz à cama. Com seu amigo, o poeta George O'Hearn, mantém uma relação utilitária de camaradagem de botequim, sem que isso implique em maiores compromentimentos intelectuais.
Tudo esta ordenado em compartimentos até que, eis que surge de repente Consuela Castillo, interpretada por Penélope Cruz. A moça jovem, culta e por cima de arriba cubana (!), vira a cabeça de Kepesh a ponto deste, pressionado por aquele papo-pra-boi-dormir de que a Consuela é moça séria parará-pão-duro, quase embarca nessa estória.
Há evidenteente alguns aspectos que condizem como o que esperaria de um protagonista de livro de Roth. Neste, no David Kepesh da tela há a culminação de um tom que já se pressente em outras obras do autor. É de certo um demolidor do establishment conservador, mas sua ação me passou mais a impressão de um ser auto-centrado em seu mundo academicista que um inconveniente propriamente dito – apesar da cena em que sutilmente destrói o amigo George O'Hearn, em pleno habitat intelectual, frente a um auditório inteiro. Enfim, não me deixou a sensação de limite do intolerável vista e sentida nos protagonista de Pastoral Americana, e muito menos de um David Lurie.
O grande problema. O grande problema, para além de NÂO TER LIDO O LIVRO, é que na tela a atuação Ben Kingsley me pareceu auto-indulgente em demasia para um sexagenário tipicamente predador, cínico e viciado em sexo. Afinal, Kepesh não perde em momento algum sua aura professoral, de superior conhecedor do espaço e tempo que habita, do seu – voilá – habitus envolto em altos valores culturais ao som de Satie e das Diabelli Variations de Beethoven. Sendo assim, alguma coisa não se encaixou. Algo ficou de fora. Talvez o tempo da narrativa. Ora, não ficou muito claro para mim como Consuela, que a princípio era apenas mais uma de suas conquista de colecionador, consegue torcer a tal ponto cabeça de Kepesh tornando-o um obsessivo ciumento. Logo ela, Consuela, que me pareceu extremamente passiva e sofisticada.... E nem estou me referindo àquela remissão meio calhorda do final com a notícia do câncer, que no fundo Roth botou ali para o leitor sentir pena do "compassivo" Kepesh – mas o que estou dizendo, eu NÂO LI O LIVRO?
E para terminar... Deixo a pergunta que não quer calar... Como é que a dona Isabel Coixet escolhe para o papel de um autêntico americano novaiorquino o Ben Kingsley? Até uma criança de 5 anos sabe que um cidadão com a cara do Mahatma Gandhi não pode ser personagem de Philip Roth! Até o Danny De Vito se saíria melhor...
Enfim, parafraseando o Drummond, de tudo sempre fica um pouco... é sempre bom admirar os detalhes da beleza da Patricia Clarkson.
O Bom Velhinho
A Arte de Andar nas Ruas do Rio de Janeiro.
http://www.oseminaristaolivro.com.br/default2.asp
Shhh!
Walter Benjamin, um dos "Homens de Tempos Sombrios", de Hannah Arendt
Grândola, Vila Morena
Toda a vez que ouço a música me emociono verdadeiramente.
The Examiner
A legislação imigratória é o passo seguinte que os conservadores querem concatenar, através de lobbies e analistas políticos desonestos, para bloquear no Senado as negociações para a reforma da saúde. Mas o que uma coisa tem com a outra? Simples. Os conservadores argumentam que Obama usa clichés do credo social-democrata, que obviamente não se ajustam à tradição liberal americana, para minar as bases de sustentação da tradição liberal americana. Pode até ser. Mas como esse argumento é um tanto vago e impreciso, argumentam que a dívida pública já ultrapassa 12 trilhões de dólares e que o sistema de saúde almejado por Obama e pelos democratas, onera ainda mais os cofres públicos. O fato é que tal política favorecerá uma faixa social com renda familiar de 30 a 50 mil dólares anuais. Nesta faixa de renda se incluem os imigrantes (legais ou ilegais, com mão de obra especializada ou não...).
Não custa perceber o porquê do embaraço de Obama com o Nobel nas mãos. E olha que nem estamos falando de política externa, ainda.
Um artigo do de hoje do The Examiner, um jornal local de circulação livre apenas nos arredores da capital de Vanuatu, muito me deixou intrigado sobre os propósitos deste tal de M.B., autor do artigo.
Is Congress, behindhand on Barack Obama's deadlines on health care and cap-and-trade legislation, and flummoxed by the failure of the stimulus package to hold unemployment below 10.2 percent, prepared to address the immigration issue next year?
Homeland Security Secretary Janet Napolitano says it better be. The current situation, she told the Center for American Progress on Nov. 13, "is simply unacceptable." We need a "three-legged stool," with provisions to strengthen enforcement, legalize some illegal immigrants and improve "legal flows for families and workers."
This sounds a lot like the comprehensive legislation, backed by the Bush administration, that never came to a vote in the Republican House in 2006 and was rejected by the Democratic Senate in 2007. But, as Napolitano correctly noted, the facts on the ground have changed in the last two years.
Ironically, the push for legalization in 2006-07 resulted instead in stronger enforcement measures. Some 600 miles of border fence have been built, the Border Patrol has been vastly expanded and the E-Verify system for determining whether job applicants are legally in the country has shown its worth.
It's probably not a coincidence that Arizona, where E-Verify is most widely used and where Napolitano used to be governor, had a statistically significant drop in its foreign-born population percentage in 2007-08. The Obama administration may be skinning back on some enforcement procedures. But states and localities are moving forward and the momentum seems to be toward stricter enforcement of existing law.
Even more important, the flow of immigrants into the United States is slowing dramatically, and may be reversing. The Pew Hispanic Center notes that the number of immigrants from Mexico in 2008-09 is down three-quarters from four years before. The Center for Immigration Studies estimates that the number of illegals in the U.S. declined by 1.7 million, or 14 percent, in 2007-08. Government figures show that border apprehensions, a statistic that is often taken as a proxy for illegal crossings, fell 23 percent in 2008-09 from the previous year and was only one-third the number in the peak period of 2000-01.
Those numbers obviously reflect a response to deep recession as well as the effects of tougher enforcement. They suggest a much smaller immigration flow and significant reverse migration back to countries of origin in the years ahead.
The 2006 and 2007 comprehensive immigration packages were premised on different facts. An approach more in line with current realities comes from a bipartisan panel assembled by the Brookings Institution and Duke University's Kenan Institute.
The Brookings/Kenan panel would provide for legalization of less than half of current illegals, with stringent requirements and only after stepped-up workplace enforcement provisions reach stated levels of use and effectiveness. Technology should allow programs like E-Verify to screen job applicants for legal status in a way that was promised but never delivered by previous immigration laws.
In addition, the Brookings/Kenan panel urges a sharp reduction in the number of green cards for relatives beyond the nuclear family of current legal residents and a sizable increase in admissions of high-skill immigrants. This is the approach taken, with good results, by Canada and Australia, which liberalized their immigration laws after our 1965 law opened the floodgates.
These proposals address the political reality that any new immigration bill must have bipartisan support, because the issue poses dangers for both Democrats and Republicans.
Conditioning legalization on more effective enforcement procedures could give Democrats cover from attacks for supporting amnesty. They could argue, accurately, that enforcement has become more effective and that they voted to make it even tougher.
Changing admissions requirements from favoring extended family members to favoring high-skill immigrants could give Republicans cover from charges that they are anti-immigrant. They could argue that, in a time of high and extended unemployment, it makes sense to switch from admitting job seekers to admitting job creators.
The 1965 and 1986 laws resulted in a large illegal immigrant population because they promised things that proved beyond the capacity of government to deliver. Now that a combination of public indignation and high-tech ingenuity have increased government's enforcement capacity, and while the inflow of immigrants is slowing and an outflow of illegals may be accelerating, we may have reached a point when we can put in place immigration laws with enforceable limits and that encourage an influx of the kind of immigrants we need most. Can Congress act?
M. B. The Examiner's senior political analyst, can be contacted at xxx@washingtonexaminer.com. His columns appear Wednesday and Sunday, and his stories and blog posts appear on ExaminerPolitics.com.
Nosso Grão Mais Fino
'Nosso grão mais fino' centra-se na estória de Vicente Campelo e Ana Corama, dois ex-amantes que reencontram-se após longos anos de separação. Ainda que centre seu foco sobre dois personagens somos temporariamente convidados a seguir as ações da memória dos amantes supostamente incestuosos, já que não necessariamente eram relativos sanguíneos. Quando eram jovens suas vidas tomaram rumos distintos. Ana casou-se e tornou-se escritora de livros infantis. Vicente vagou pelo mundo. Agora, quando ela vive um casamento em ruínas, ambos se reencontram e tentam dar sentido às memórias do passado. Memória muitas vezes dolorosas como as da morte do pai de Ana na ocasião da passagem do Zepelim por Recife, quando ele sem razões aparentes, comete suicídio atirando-se do dirigível. Nesse exercício mnemônico de acerto de contas com o passado Vicente também tenta reconstruir a memória de sua decadente família de usineiros. Tudo, a começar pelo título, gira em torno ao processo de fabricação do açúcar, tão intensivamente injusto quanto aquele retratado nas vigorosas páginas de Casa Grande e Senzala ou nas metódicas descrições de Stuart B. Schwartz. Em tudo que circunda a usina – mesmo que o leitor jamais tenha pisado numa, como é meu caso - há algo de familiar e estranho na continuidade da força patriarcal. A paisagem canavieira e o laboratório são o pano e fundo para várias estórias rememoradas e complexa história de paixão entre Vicente e Ana onde a dissolução familiar é apenas um apêndice.
Talvez seja um livro, que em minha modesta opinião, esforce-se por criar referências aos amantes que serviram de modelo demorando-se as vezes em algumas cenas e sendo bastante breve em outras – como por exemplo a cena do suicídio de Dahirou. É uma narração que varia entre uma terceira pessoa onipresente e ao menos duas primeiras pessoas. Nos primeiros capítulos, de fato o leitor se sente confuso com a vozes, mas aos poucos vai se familiarizando com as de Vicente e Ana que vão tomando conta da narrativa, e que de fato são distintas em estilo e propósitos.
Apesar de notar que houve a franca intenção de me levar a visitar a consciência dos personagens, suas culpas, seus arrependimentos, suas lutas internas contra a atração incontrolável de um pelo outro, achei insatisfatória a insistência na taxação do affair entre Vicente Campelo e Ana Corama como um incesto. Passos evoca até mesmo Asmodeu para nos convencer do tabu. Por outro lado, este é um livro que põe em xeque qualquer tentativa de crítica, pois é necessário ao leitor contorná-la dela com extrema cautela. Não é um livro fácil, não há didatismos fáceis nas imagens e metáforas. Há nelas sim, uma fascinante pluralidade, uma abiguidade, uma lúdica riqueza que algumas vezes podem até se perder por excesso, mas jamais por imprecisão. Há poucos dias encontrei uma resenha na internet onde o resenhador dizia...”Há sempre uma palavra sobrando: uma mulher não arranha as costas do amante - ela arranha "a pele que lhe recobre as costas". O leitor será capaz de adivinhar o que é a "cicatriz do canal por onde saciou a primeira fome apegada ao fôlego do simples cordão torcido e vigoroso"? É apenas uma perífrase barroca para dizer "umbigo". Poderia até concordar, caso não tivesse acabado de ler há poucos dias um livro de Philip Roth onde o protagonistas não fazia cerimônias, não se perdia nas tais perífrases barrocas alusivas para definir sua predileção
Se não fosse por essa opção, não teríamos trechos belos como este:
Ana Corama me olha com sua visão agravada por olheiras lilases. Seu cabelo espaventoso recusa trégua. Diante dela sou eu quem se emaranha pelos sortilégios que armam à sua volta uma impressão de densa maciez [...].
Por fim, não vou entrar nas análises sobre se a obra é regionalista, se tem ecos de Freyre ou a densidade de uma prosa anti-cabralina, se a linguagem é experimental, ou se os personagens são plausíveis, pois isso é assunto para a intelligentsia. Termino o livro com a impressão de um amargor, alguma coisa de aspereza mesmo em seus grãos mais finos.
Whatever Works
O enredo é bastante simples. Boris Yellnikoff, representado pelo excelente comediante Larry David, é um homem solitário e misantropo que por pura casualidade começa um romance com uma jovem do sul chamada Melodie – interepretada por Evan Rachael Wood. Boris é, segundo ele próprio, um gênio incompreendido que quase ganhou o Nobel em Física. Em sua arrogância, Boris compra-se pelo que vale e vende-se pelo que pensa que vale. O problema é que vive no prejuizo. Além disso, Boris é hipocondríaco e sofre que crises de pânico no meio da noite. Numa dessas crises tentou se suicidar se atirando de uma janela, por isso claudica. A partir do encontro de Boris e Melodie, a vida do cientista não se trasnforma nem para melhor nem para pior, mas há uma reação em cadeia, quase física ao redor dele. Melodie, que chega a se casar com Boris, encontra um outro homem. A mãe, Marieatta, conservadora e evangélica, que chega para resgatar a filha, acaba virando uma fotógrafa famosa e vivendo com dois amantes. O pai, tão evangélico como a mãe descobre que é gay, arruma um chapa e vai abrir um brechó no Chelsea. Quase previsível. Tudo morno.
Mas, lógico há cenas engraçadas. Uma pessoa mal-humarada tem sempre algo de caricato: Boris dando aulas de xadrez para crianças é algo impagável; tentando explicar coisas para uma Melodie, burrinha como uma porta; a sogra em franco bombardeio contra o casamento – mesmo depois de ter se “liberado geral” para os amigos de Boris.
No entanto, as tiradas de Allen, ditas por Larry David, tornam-se artificiais pois nem Larry David é ator, nem o que Allen escreve lhe cai bem – eu tenho uma teori de que os papéis se encaixam nos atores e não os atores escolhem os papeis. Para quem não sabe, Larry David criou uma das melhores série americanas dos últimos tempos – não, não falo de Sienfield, série da qual nem gostei tanto, falo de Curb your Enthusiasm. Na série representava um personagem chamado Larry David, um homem que se mete numa série de situações embaraçosas criadas por ele próprio. Ou seja, interpreta ele mesmo em frases curtissimas. O que um dia ja me fascinou pela verborragia de Woody Allen, parece agora que não passa de piadas requentadas e com jeito de que já vi em algum lugar, além de ser interpretada por um ator especialistas em sketches. Alias, diga-se de passagem o papel tinha sido desenhado para Zero Mostel.
É exagero dizer que é um filme auto-biográfico por dois motivos. Primeiro, a diferença de idade entre Boris e Melodie não é explorada em nenhum momento, apenas no fim da relação quando ela o troca por um valete de sotaque britânico ou australiano. Segundo, por que, com a chegada de Marietta a estória deixa de enfocar Boris, para falar dos amigos, da ex-sogra...enfim, de tudo, menos de Boris, ou de Allen, como queiram...
Em whatever works, quase nada deu certo nem o esquema de mockumentary. Por isso ainda fico com Annie Hall, Manhattan, Hanna e suas irmãs e Zelig.
Everyman
Não quero divagar sobre o fascínio que Roth exerce, ao narrar fatos tão prosaicos na vida de um homem comum. Mesmo escrevendo um livro apenas razoável - que passa longe da temática da tensão entre as duas américas que o destacou. O livro começa com o enterro do homem sem nome, que poderia ser qualquer homem, pois seguindo a lógica de que a morte iguala todos, o protagonista só pode se chamar Everyman....
Around the grave in the rundown cemetery were a few of his former advertising colleagues from New York, who recalled his energy and originality and told his daughter, Nancy, what a pleasure it had been to work with him. There were also people who'd driven up from Starfish Beach, the residential retirement village at the Jersey Shore where he'd been living since Thanksgiving of 2001-the elderly to whom only recently he'd been giving art classes. And there were his two sons, Randy and Lonny, middle-aged men from his turbulent first marriage, very much their mother's children, who as a consequence knew little of him that was praiseworthy and much that was beastly and who were present out of duty and nothing more. His older brother, Howie, and his sister-in-law were there, having flown in from California the night before, and there was one of his three ex-wives, the middle one, Nancy's mother, Phoebe, a tall, very thin whitehaired woman whose right arm hung limply at her side. When asked by Nancy if she wanted to say anything, Phoebe shyly shook her head but then went ahead to speak in a soft voice, her speech faintly slurred. "It's just so hard to believe. I keep thinking of him swimming the bay-that's all. I just keep seeing him swimming the bay." And then Nancy, who had made her father's funeral arrangements and placed the phone calls to those who'd showed up so that the mourners wouldn't consist of just her mother, herself, and his brother and sister-in-law. There was only one person whose presence hadn't to do with having been invited, a heavyset woman with a pleasant round face and dyed red hair who had simply appeared at the cemetery and introduced herself as Maureen, the private duty nurse who had looked after him following his heart surgery years back. Howie remembered her and went up to kiss her cheek.
Na cerimônia, após as elegias de praxe, quando os poucos amigos e familiares lançam as últimas pás de terra sobre o caixão o narrador começa a contar a estória deste herói diferente. Everyman começa com a morte de um homem sem nome e termina com uma ladainha sobre o definhamento senil, o pior dos castigos que as Moiras nos destinam. Mesmo tergiversando e escrevedo sobre temas tão... mórbidos, Roth é ainda o velho Philip Roth. Quando li algumas resenhas sobre o livro, diziam ser Everyman um livro baseado num poema medieval... suspeito que Everyman pode ser qualquer homem por outras razões. Everyman é o nome da joalheria de seu pai erguida após a II Guerra num lugar de New Jersey chamado Elizabeth. Nunca chegou a ser um império a tal joalheria, pois a clientela era composta pelos Bruttis, sporchis e cattivis, por operários e estivadores dos portos de Jersey. Na verdade, o pai nunca se preocupara com as idéias de grandeza. Preocupava-se em fazer amigos, em vender a crédito fácil anéis de noivados com pequenos diamantes, tendo como único prazer ver os filhos crescerem, e ser chamado para os casamentos dos noivos para quem vendia suas jóias. Um homem que fazia da amizade um bem. Sua preocupação era dar aos filhos o exemplo. Os dois irmãos, portanto, como era de se esperar seguiram caminhos opostos. Um, tornou-se banqueiro, outro, nosso Everyman, ainda que não tão bem sucedido economicamente como o irmão, tornou-se publicitário famoso e realizado na profissão.
Sabe-se também que por suas, vamos dizer assim urgências sexuais, pôs por terra três casamentos - e nesse ponto se parece muito com Alex Portnoy e a Jerry Levov, personagem secundário de Pastoral Americana. É um tipo paranóico e hipocondríaco que desde pequeno entra e sai de hospitais passando por cirurgia que vão desde uma hérnia aos 9 anos à uma série de pontes safena já na idade adulta. Em tempo, hodiernamente – eta palavrinha escrota -, um tipo que representa um pesadelo ao bloco “obamacare” no Congresso (risos).
Em suma, Philip Roth insiste no tema do envelhecimento e das urgências sexuais na terceira idade. Cá pra nós uma temática meio recorrente em suas linhas ultimamente. Nesse mesmpo caminho, mantém um leve aroma presente nos livros anteriores ao idealizar a infância e ver na imagem paterna a figura do herói, e na figura do irmão uma espécie de espector protetor que causa conforto inveja ao protagonista. Agora, acrescenta um novo componente, o tema da proximidade da morte. E parece que o principal motivo que levou ao escritor que já passa dos 70 anos a escrever essa obra foi a sucessiva perda de amigos, dentre eles Saul Bellow. Inclusive, o primeiro capítulo foi escrito no dia seguinte ao funeral, onde estavam presentes o próprio Roth e Leon Wieseltier, editor literário da New Republic e amigo de Bellow.
http://www.nytimes.com/2006/04/25/books/25roth.html
O livro é uma espécie de exercício de meditação sobre a morte, e as vezes se torna meio maçante pois na tentativa de escapar do aspecto metafísico da finitude, Roth passa a descrever a morte, e o medo da morte, como um drible na dicotomia entre Tânatos e Eros, realcionando-a a algo essencialemente físico adscrito à mesa de operações. Há uma generalização exagerada na série de inúmeras intervenções cirúrgicas pelas quais o protagonista é obrigado a se submeter. Entretanto, Roth tem uma capacidade incrível de manter o fio da narrativa teso ao retratar um protagonista que chega à terceira idade solitário e frustrado, e com isso sutilmente esmagar qualquer ilusão sobre as opções que uma pessoa toma na vida, mesmo as mais banais como a de ter um caso com uma modelo sueca, sentir inveja dos companheiros de trabalho, mentir para a esposa, ou mesmo tomar um copo d´água.
Enfim, um livro que tenta nos convencer que morremos todos os dias e só nos não nos damos conta disso.
Música do dia. Carmem. Egberto Gismonti. Música de Sobrevivência.
UTNE
No número desse mês dalailama está na capa apenas como eufemismo para mostrar uma lista de 50 pessoas que hoje pegam no pesado para mudar o mundo. A lista começa com o poeta Christian Bök, passando pela ativista Noah Baker que trabalha com ajuda humanitária no Iraque, a Bob Stein co-fundador do Institute for Future of the Book, e terminando a lista com Patricia van Nispen diretora da ILA Microjustice for All.
Além da lista, no mesmo número uma repostagem ótima sobre os médicos que participaram das tortura em abugraibe forjando laudos e prontuários de presos.
Recomendo. As reportagens são curtas, objetivas e bem escritas.
O Ator
dizer: eu tenho um tipo raro de,
estou a beira,
embora não aparente. Não aparento?
Providências: outra cor na pele,
a mais pálida; outro fundo para a foto:
nada; os braços caídos, um mel
pngente entre os dentes.
Quanto à tristeza
que a distância de você me faz,
está perfeita, fica como está: fria,
espantosa, sete dedos
em cada mão. Tudo para que seus olhos
vissem, para que seu corpo
se apiedasse do meu e, quem sabe,
sua compaixão, por um instante,
transmutasse em boca, a boca em pele,
a pele abrigando-nos da tempestade lá fora.
Daria a isso o nome de felicidade,
e morreria.
Eu tenho um tipo raro.
Eucanaã Ferraz. Cinemateca. 2008.
Muros
http://news.bbc.co.uk/2/hi/in_depth/world/2009/walls_around_the_world/default.stm
Matias na Cidade
Ao acorda nauseado, vomitando, mas não necessariamente bêbado, decide procurar Henrique, o médico e amigo, para uma bateria de exames detalhados a saber se havia sido intoxicado. Nesses dias passa por uma via crucis pessoal. Imagina-se gravemente doente, fragilizado, desconhece-se, definha por dentro com a sua própria condição, certifica-se que seu casamento é uma falácia e em meio ao suspense de quem seria aquela mulher misteriosa do motel, busca obsessivamente por respostas, por uma cura talvez.
Aos poucos descobrimos nos detalhes de sua vida que Matias é um cidadão desencantado com a promessa de estabiliade e felicidade conjugal. Uma pessoa distante no trato com a família, com os amigos - que apenas aparecem para fins utilitários ou políticos -, e com os empregados. Nos detalhes. No sexo. Nos detalhes do sexo com a esposa, após um jantar na casa de amigos. Na impaciência. Na relação distante com o filhos e netos. Na distância. No detalhe do bilhete deixado para a mulher anunciando que iria fazer um checkup...
“S.
Vou fazer uns exames para o meu check-up e passarei a noite na clínica do Henrique. Voltarie amanhã de manhã. Não se preocupe, não é nada sério. Beijo, M.”
Nos pequenos detalhes, em tudo arde as imagens de um para o outro. Assim, sem mais, Matias procura constantemente outras mulheres. Procurando o tempo todo encontrar alguém que bastasse para ele povoar sua solidão, luta paradoxalemente contra a falência dos planos de juventude. A infelicidade conjugal não é uma arma para ferir a mulher, ao contrário, é a maneira que Matias encontra para manter convívio com Susana, sua esposa. No convívio dos dois não há o demoronamento das grandes crises, nem a violência das grande discussões. Ele nem sequer cogita em momento algum deixá-la, e vice-versa. Nenhum dos dois quer ir embora com asco, sem olhar para trás, preferindo a hipótese de que, como diria Lygia Fagundes Telles, o amor apodreça e se torne insuportável seu cheiro. Preferem a hipocrisia da família tradicional brasileira: marido, esposa, dois filhos e respectivos amantes. Tudo em nome da paz conjugal.
Em realidade, a esse pântano conjugal agregam-se outros mistérios no decorrer dos três dias restantes. Matias descobre-se só em seu universo de conforto e consumo onde o que o incomoda de fato é a cor e o modelo de seu carro. Os resultados dos exames parciais não revelam grande coisa. Os exames finais, o autor não nos permite saber aumentando ainda mais a incógnita sobre as neuroses de Matias. Susana descobre-se grávida já perto da menopausa. No enterro de Matias, constam apenas os dois filhos e os netos, Susana, e alguns poucos.
Last but not least, encerro fazendo beiçinho literário de crítico sapiente da Folha Ilustrada dizendo que a terceira pessoa é artifício seguro que o narrador usa para manter a distância tácita entre o desprezo e a compaixão por um protagonista ‘galinha’, hipocondríaco e solitário. Artifício eficiente, também, para exibir o fio condutor do enredo relacionando as personagens a um único vínculo, e por isso talvez apresentando-as um tanto estanques, de fato, como se fossem apenas acessórios da órbita de Matias. Certamente há algum deslize para o pseudolírico nas últimas passagens quando tenta chegar a casa de Orlanda na periferia para o batizado da neta da empregada e pára inopinadamente numa birosca para tomar uma cerveja e jogar sinuca com um desconhecido. Lá encontra uma balconista de com quem transa naquela tarde esquecendo-se de todos os demais compromissos - sem dúvida uma cena inverossímil. Pergunto. Houve ou não certo exagero nessa última possibilidade de felicidade romântica? Alexandre Porto certamente diria que não. Eu acho que sim, que ele aliviou a barra do seu protagonista. Enfim...
Versos de Vida y Muerte
Uns dias após a Organização de Direitos Humanos Anistia Internacional (AI) acusar o governo de Israel de negar aos palestinos o acesso livre à água potável, termino de ler a tradução espanhola de H.aruzei ha-h.ayim ve-ha-mavet de Amos Oz.
Versos de vida y muerte é uma novela onde nada é o que parece ser. O livro inicia com um narrador, que é um escritor, prestes a dar mais uma conferência onde imagina que o público exigirá dele frases de efeito, explicações precisas sobre a alma humana, exposições de seus métodos de trabalho... enfim tudo sobre o que ele não está absolutamente interessado em falar. Na tentativa de postergar o encontro, o autor dá voltas antes de chegar a conferência, e enquanto senta num bar e sorve um café, imagina que as pessoas à sua volta são personagens, tão ficcionais quanto suas próprias invenções. Sem dúvida uma novela muito mais leve, mas nao menos envolvente que A Tale of Love and Darkness, onde narra em forma auto-biogr’afica sua infância em Jerusalem ainda sobre o fim do Mandato Britânico sobre a Palestina e desemboca no fim tragico e chocante que é o livro.
Em Versos de vida y muerte as personagens captadas pela câmera do autor representam figuras urbanas, ao menos me pareceu, com aparência distinta diante da sociedade, mas com dramas e conflitos comuns a qualquer ser humano. Dramas que muitos tentam esconder dentro dos armários ou debaixo dos tapetes. Dessa maneira, no perfil destes é delineada uma temáticas universal, os jogos de poder entre duas pessoas inteligentes, entre um homem mais velho e experiente e uma mulher mais jovem, solitária e fragilizada. Dentre os personagens secundários que vão se formando em sua imaginação, está a garçonete Riki; dois amigos anciãos que sentem a falta do agonizante amigo Ovadia Hazzam; um redundante e infeliz jovem poeta chamadoYuval Dahán Dotán; sua musa inspiradora, uma amante da cultura Miriam Nehorait, a qual as crianças da rua a chamam de Miriam A Terrivel; um jovem da platéia que ironiza uma de suas perguntas, e por fim o próprio mediador da conferência. Para cada qual ele vai criando uma estória, medos, crenças, uma identidade própria e um destino inalienável. Na conferência, que não dura muito, felizmente, falaria de Zefaniah Bet Halahmi, um poeta já falecido que ainda em vida, ainda no tempo do processo de formação do Estado, escrevia para o jornal Davar Hashavwa sobre temas da atualidade tais como a imigração, os campos de refugiados, a conquista do deserto, os incidentes fronteiriços, o terrorismo. Mas o que fascinava o autor em Zefaniah Bet Halahmi era sua obra em si, Versos de Vida e Morte. Na saída de uma conferência da qual não esperava lá grande coisa, encontra Ruhele Reznick, uma mulher real, uma jovem solitária e pouco atrativa que vive com um gato chamado Joselito. O narrador é um homem separado já duas vezes e Ruhele, que apresenta um fresco semblante desprovido de defesas. A ligação entre os dois, em meio a vacilações por parte de Ruhele , acontece intensamente, pois ela revela que conhecera o poeta Zefaniah Bet Halahmi, quando este frequentava a casa de sua família. Podería-se falar muito mais da relação intelectualizada que ambos alimentam um pelo outro. Ela pelo autor famoso que decide abordá-la, e ele pela jovem entusiasta. Mas o narrador é um caso à parte. Cria e se compadece de suas criaturas, por duvidar o tempo inteiro se si, de sua competência como narrador. Prova disso é a primeira página da novela, onde o narrador desenlaça uma série de questionamentos sobre a autenticidade do ato de escrever. Oz põe em cheque aquela velha ladainha que encontramos em algumas entrevistas de escritores, geralmente jovens, que falam da sinceridade e do sofrimento do ato, como se o sofrimento implicasse na sinceridade. Oz ri – imagino. Uma novela de imagens belas que duvido recomendar aos menos sensíveis.
Ano Grotowski
O último número da American Theatre Magazine traz uma reportagem especial sobre um dos diretores de teatro mais importantes e erráticos da segunda metade do século XX: o polonês Jerzy Grotowski. Mais conhecido como o inventor do Teatro Pobre, Grotowski, defendia uma forma de interepretação baseado no trabalho psiquico do ator, mais ou menos como Stanislavski postulara em seu livro A Construção da Personagem. Há certo exagero em afirmar que Grotowski privilegiava a expressão corporal sobre a palavra, o cenário, o figurino, visando o diálogo direto com o público. Há muito exagero, alimentado diretamente pelo próprio diretor que tornava seus retiros com os atores, exercícios quase tção dolorosos quanto os que Artaud proporcionava.
A UNESCO definiu 2009 como o Ano Grotowski. E eu modestamente muito recomendo o documentário With Jerzy Grotowski, Nienadowka 1980 e as partes de Devising Teatre: A Practical and Theoretical Handbook de Alison Oddley, sobre o diretor.
Música do Dia. Yo-yo Ma. Obrigado Brazil. Bodas de Prata & Quatro Cantos ( Gismonti)
Incêndio destrói obras do artista plástico Hélio Oiticica
RIO - Um incêndio na casa da família do artista plástico, pintor e escultor Hélio Oiticica no final da noite desta sexta-feira, no Jardim Botânico, Zona Sul, destruiu 90% do acervo das obras de arte do artista, um dos fundadores do movimento neoconcretista. Segundo o arquiteto César Oiticica, 70 anos, irmão de Hélio, cerca de duas mil peças do artista, morto na década de 1980, foram queimadas, num prejuízo estimado em US$ 200 milhões. De acordo com a família, a coleção não tinha seguro. Ninguém ficou ferido e as causas do incêndio ainda são desconhecidas.
- Não tinha seguro, nem a casa nem a obra do Hélio. Fizemos um estudo, mas o valor era muito alto, não lembro mais qual era a cifra. O valor era tão alto que ficou inviável. Poderíamos fazer seguro contra incêndio que cobrisse só a casa, e não o acervo, mas acabamos não fazendo isso, decidimos arcar com os riscos - disse César.
De acordo com o arquiteto, o fogo começou por volta das 22h. Ele contou que jantava com a mulher e um grupo de amigos quando sentiu forte cheiro de queimado. Bombeiros do quartel do Humaitá foram chamados para apagar as chamas. Abalado, César disse que 90% do acervo do irmão - avaliado em 200 milhões de dólares - foi destruído pelo fogo.
- Qual a justificativa que vamos encontrar para uma tragédia como essa? - lamentou o arquiteto. - Foi a maior tragédia que poderia acontecer para a cultura brasileira. Sem dúvida alguma, a única vítima dessa tragédia foi a cultura brasileira.
O arquiteto, no entanto, descartou a hipótese de um incêndio criminoso. Segundo César Oiticica, no ateliê havia controle de umidade e temperatura para manutenção das obras, além de alarmes de presença e anti-incêndios. O tenente do Corpo de Bombeiros Yuri Manso informou que as chamas consumiram as obras com rapidez. Ainda de acordo com o oficial, só após laudo técnico é que será possível descobrir as causas do incêndio.
Segundo César Oiticica, entre as obras destruídas pelas chamas estavam quadros, documentários e livros. Obras consagradas como Bólides e os Parangolés - a primeira manifestação ambiental coletiva, envolvendo capas, barracas, estandartes e passistas da Mangueira, na mostra Opinião 65 - também foram destruídas. Só se salvaram os trabalhos que estavam armazenados em CDs e no computador da casa. Todo o acervo fotográfico do pai do artista, o renomado José Oiticica Filho, também teria se perdido no incêndio.
Considerado um dos mais revolucionários artistas de seu tempo, Hélio Oiticica nasceu no Rio de Janeiro, em julho de 1937. Ele morreu em março de 1980, após sofrer um AVC. Ao lado de nomes como Lígia Clark, Amílcar de Castro e Ferreira Gullar, Hélio participou do movimento neoconcretista e teve obras expostas em âmbito internacional.
Entre seus trabalhos mais conhecidos estão os parangolés (espécie de capas coloridas, arte para ser vestida) e penetráveis (instalações). É autor da conhecida frase "Seja marginal, seja herói", que escreveu em uma bandeira sobre a foto de um traficante morto publicada em um jornal carioca em 1968, durante a ditadura, e foi um dos grandes inspiradores do movimento tropicalista com sua obra "Tropicália".
O artista viveu de 1970 a 1978, Oiticica viveu em Nova York, onde participou da mostra Information, realizada pelo MoMA (Museu de Arte Moderna).
Em 1981, um ano após a sua morte - em 22 de março de 1980 -, foi criado no Rio de Janeiro o Projeto Hélio Oiticica, para preservar a obra do artista. A Secretaria municipal de Cultura do Rio criou o Centro de Artes Hélio Oiticica em 1996.
Para o diretor da Bolsa de Arte do Rio de Janeiro, Jones Bergamin, o maior legado de Oiticica eram seus projetos e anotações.
- O problema é que as obras dele existem espalhadas em coleções particulares e museus mundo afora, mas seus projetos estavam todos aqui. O valor artístico é muito maior que o financeiro. É uma perda incalculável - disse Bergamin em entrevista à Globonews.
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