O Que Há de Ficar é um curta fresco do diretor Felipe Continentino que assisti ontem. Fresco pois parece que depois do Festival do Rio 2008, este é o segundo lugar onde o doc é exibido. Pode ser impressão minha, pode ser até pretenso de minha parte pensar que o Felipe Continentino teve algumas sacadas boas de Bergman - algo do Persona - e de Antonioni (especialmente contidas no céu de nuvens, as visões repetidas da piscina e no passarinho de madeira na varanda deixando-se ao movimento do vento) estão ali, controladas para o tempo certo de um curta, numa narrativa linear porém atravessada de não-ditos.
A bela Maria Flor protagoniza uma jovem, provavelmente há anos vivendo fora do país que recém chega à casa de sua infância. No início, quando a câmera focaliza a mala e a cama onde a protagonista sem nome dorme, não fica claro se ela está de partida ou chegada. Aos poucos, com a câmera acompanhando-a em todos os recantos da ampla, vazia e intimista casa, percebe-se que aquela era uma casa que guardava lembranças, nem sempre boas, mas aparentemente mais intensas que as más.
Com muito mais silêncios e vazios que razões narrativas, com delicadeza, o curta focaliza a economia de emoções da protagonista no contato com objetos do passado, os discos, os quadros, o sofá preferido, as fotos escolares, os livros prediletos, a piscina, com os pequenos detalhes guardados nos objetos e lugares da casa.
Vera Holtz é a mãe. Só se sabe isso, de sua breve aparição na casa. Ao visitar a filha, numa escolha difícil, nostalgicamente decidem as duas o que deve ser vendido dos discos e quadros, ou levado.
Pelas razões expostas, Viva, Patricia e eu viemos discutindo no metrô sobre esses espaços vazios deixados propositalmente pelo diretor e roteirista, preenchendo-os com várias hipóteses, e uma plausível é a de que Filha e mãe vivem no exterior ou longe uma da outra, talvez em países diferentes, e decidem se encontrar na casa; e a filha decide vir antes para preparar uma surpresa à mãe, arrumando os móveis numa tentativa de prolongar a sensação de pertencer ainda àquele espaço adiando o que há de perda em qualquer partida. Mas evidentemente, essas hipóteses somente fazem sentido aqui, numa quinta-feira chuvosa e paradoxal, após um curta que fala de saudade e por isso propício ao reencontro com uma grande amiga - que não via há mais de três anos.
Um curta interessante para um mundo tão pequeno!
Contentemo-nos com a Ilusão da Semelhança, porém, em verdade lhe digo, senhor doutor, se me posso exprimir em estilo profético, que o interesse da vida onde sempre esteve foi nas diferenças,
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