La Notte


Antonioni adicionou o La Notte ao que chamou de Trilogia da Incomunicabilidade - composta pelos L’Aventura e L’Eclisse. Para mim esse filme é de longe o mais efetivo dos três, apesar de ter gostado muito do L’Aventura e L’Eclisse, também. Talvez por que Jeanne Moreau tenha sido, certamente com algum exagero de minha parte, a mais autêntica e honesta representação feminina na obra de Antonioni.

O filme se passa em Milão. Giovanni Pontano, um bem sucedido escritor, está ali para o lançamento de seu último livro, ao lado de Lydia, sua esposa. Antes da festa de lançamento, dois visitam um amigo de longa data, também escritor, internado em estado grave, num hospital. Após a visita, ainda abalada pela iminente perda do amigo, Lydia preferre caminhar pela cidade. Visita lugares de sua infância e juventude, e presencia um algumas cenas absurdas do cotidiano. Mas não importa, ela só tenta ganhar tempo. Se livrar de fantasmas e evitar Giovanni a todo o custo. Caminha pelas ruas de Milão atrás de alguma coisa que a distraia e que a faça esquecer seu casamento, seu cotidiano matrimonial, tributável, fútil e repleto de lacunas.

Giovanni é do tipo passivo e reticente. Um homem em busca de soluções intelectuais às suas questões. Nesse universo idealizado, até suas conquistas são circunstanciais, tal como a que acontece na saída do quarto do hospital, quando uma das paciente se insinua de maneira estranha e irracional – e diga-se de passagem com um certo exagero por parte do Antonioni, convenhamos. Ao ser convidado à casa de Gherardini, rico industrial interessado em que ele escreva a história de suas indústrias, conhece sua filha Valentina e flertam. Flertam descaradamente, sem pudor de Lydia.

Na festa, Lydia também deixa-se envolver pelo ritmo da noite e se abre as insinuações de um desconhecido. Ambos, Giovanni e Lydia, buscam de alguma maneira escapar de um certo vazio existencial por onde a angústia penetra, instala-se e, acompanhada pelo contraponto do medo da solidão e do erro, impele-os contraditoriamente a buscar novas experiências. O problema é que essas novas experiências os tornam mais arrependidos e doloridos.

Antonioni tem uma maneira especial de abordar dramas psicológicos com a economia própria nos diálogos. Até mesmo em situações em que os conflitos da trama não sao aparentes, estica ao máximo a corda da tensão, sem a resolução simples para os paradoxos que ele mesmo cria. No La Notte, Antonioni retrata com imagens a instituição casamento. Retrata o desconfortável silêncio a separa Lydia de Giovanni, como se estivessem fartos um do outro. O casamento é retratado nesse imenso tédio de arrependimento e dor onde a convivência a dois é permeada pela rotina da divisão da mesa de jantar, do carro, do banheiro, da cama, e de alguns outros bens materiais.

La Notte termina de maneira enigmática. Giovanni se despede de Valentina, acariciando seu rosto, em frente a Lydia. Esta, se aproxima de Valentina e a beija. Ambos Giovanni e Lydia deixam a festa. Vão embora. A noite se acaba, mas seus dilemas não. Isso é Antonioni.

Carajos -, suspiró. - !Cómo voy a salir de este laberinto !




Em “El general en su laberinto,” Gabriel Garcia Marques relata os últimos meses da vida de Simon Bolivar e sua viagem até a cidade de Santa Marta. No trajeto, um Bolivar velho, acabado, demasiadamente humano com seus defeitos, arrogâncias, paixões e deseganos de amor, desvela-se e desmonta-se o mito calcado em façanhas militares. Exausto fisicamente, aos 47 anos de idade, Bolívar é uma sombra.

É uma novela narrada em terceira pessoa com idas e vindas a eventos específicos da vida de Bolívar. Começa em Maio de 1830 em Santa Fé. O general se prepara para uma viagem a Cartagena das Índias e posteriormente para a Europa. Domingo Cayedo, seu então vice-presidente, tarda em autorizar a viagem e a cada cidade em que chega, é recebido como herói pelos seus seguidores políticos. Os flash-backs, mesclam-se com um certo sentimentalismo típico das reminiscências ansiãs.

O panorama psicológico que Marques traça de Bolívar não é menos complexo. Situa o homem num labirinto interminável criado por ele mesmo e pelos que foram pouco a pouco desconstruindo sua obra frágil e ousam desventar sua alma. Um homem cínico e amante das mulheres, pois por cada cidade que passava, apaixonava-se, fazendo-as sentir, a cada uma e a todas, como únicas. Um homem de poucos amigos, taciturno e de um silêncio forjado pelas mortes em campos de batalhas, porém retórico. Um homem compadecido de cães vadios, os quais recolhia pelas ruas, onde os encontrasse. Enfim, um tipo autoritário e combativo na juventude, dando lugar a um ser doente e auto-inflectivo.

Entretanto, esse herói, com traços de inconsequência, era já um herói desiludido nesses últimos meses de vida. Desiludido com a idéia de unir uma América perdida na luta entre Federalistas e Separatistas. Um homem que, em virtude destas desavenças, deixou pelo caminho o difuso – para ele mesmo - objetivo Federalista, que de tão visceralmente defendido, acabou por criar inimigos em todos os lugares. Um destes foi Santander, ou Cassandro, um então amigo de longa data, e que tinha sido seu vice-presidente desde o Congresso de Cúcuta e a Assembléia Constituinte, que em 1821 quando se estabeleceu a Gran Colômbia, e que anos depois mesmo exilado em Paris detratava-o com a intenção de anulá-lo politicamente. Bolívar desconfiava, desde então, que Cassandro tramava para assassiná-lo.

“La prensa adicta al general Francisco de Paula Santander, su enemigo principal, había hecho suyo el rumor de que su enfermedad incierta pregonada con tanto ruido, y los alardes machacones de que se iba, eran simples artimañas políticas para que le rogaran que no se fuera”.

“-La verdadera causa fue que Santander no pudo asimilar nunca la idea de que este continente fuera un sólo país--, dijo el general”.
Alguns personagens secundários como o mordomo José Palacios, a quem Bolívar tinha confiança plena, era um homem analfabeto, porém segundo Bolivar, um homem de grande sabedoria e com uma memória inqualificavel. Atedia a Bolívar em todos os momentos, velava suas noites de crises hepáticas, enfim um homem de completa confiança para um homem que “Siempre tuvo a la muerte como riesgo profesional sin remedio. Había hecho todas sus guerras en la línea de peligro, sin sufrir ni un rasguño, y se movía en medio del fuego contrario con una serenidad tan insensata que hasta sus oficiales se conformaron con la explicación fácil de que se cría invulnerable”.

“Examinó el aposento con la clarividencia de sus vísperas, y por primera vez vio la verdad: la última cama prestada, el tocador de lástima cuyo turbio espejo de paciencia no lo volverá a repetir, el aguamanil de porcelana descarchada con el agua y la toalla y el jabón para otras manos, la prisa sin corazón del reloj octogonal desbocado hacia la cita ineluctable del 17 de diciembre a la una y siete minutos de su tarde final. Entonces cruzó los brazos contra el pecho y empezó a oír las voces radiantes de los esclavos cantando la salve de las seis en los trapiches, y vio por la ventana el diamante de Venus en el cielo que se iba para siempre, las nieves eternas, la enredadera nueva cuyas campánulas amarillas no vería florecer el sábado siguiente en la casa cerrada por el duelo, los últimos fulgores de la vida que nunca más, por los siglos de los siglos, volvería a repetirse”.

O general nunca deixou a América do Sul. Terminou sua jornada em Santa Marta, completamente enfraquecido politica e fisicamente. Marques narrou uma morte pobre e nas sombras e reforçou a idéia de que uma América única, talvez estranha aos brasileiros, que sempre olham para os intuitos de Bolivarismo com uma certa desconfiança, calcada no mito heliodrônico, nasceu fadada.

Foto de Bolívar na Praça Juliano Moreira. Botafogo.

There Will Be Blood




There will be blood é do mesmo cara que fez Magnólia e Boogie Nights. Paul Thomas Anderson é um diretor jovem, mas que faz cinema como deve ser feito, alinhava um bom roteiro a belas imagem – para o bem e para o mal - de maneira impressionante.

O filme conta a história de uma família - os Sunday - envolvida na saga do petróleo e de Daniel Plainview. Plainview torna-se ao longo da estória, de um simples minerador de prata, dono de uma grande companhia de extração de petróleo. O roteiro de Paul T. Anderson utiliza aspectos do livro de Upton Sinclair, Oli.

Começa em 1898 quando Daniel Plainview, interpretado por Daniel Day-Lewis, um homem frio e calculista, movido pela rudeza, ambição e a complexidade dos homens sem qualidades, descobre petróleo nas minas de prata que garimpa e torna-se um prospector de petróleo. De um simples gaimpeiro de prata, converte-se em pouco tempo num extrator de petróleo. Num acidente fatal com um de seus empregados, Daniel adota H.W., o filho do empregado como se fosse seu filho e as poucos sócio.

Certo dia, chega a seu escritório Paul Sunday (Paul Dano) - e estou na duvida ate agora se Paul realmente existiu ou se foi uma invencao de Eli - , que troca a informação de uma reserva prospectiva – por acaso nas terras de seu pai – por 500 dólares em Little Boston, Califórnia. Daniel parte para Little Boston. Chega à propriedade com a desculpa de caçar pássaros e acaba negociando as terras dos Sunday sem o patriarca da família saber. Nesse momento Eli Sunday, irmão gêmeo de Paul, sobre o preço da propriedade para 10 mil dólares convertidos a sua igreja, enquanto Daniel oferece apenas 5 mil.

Nesse momento a história converte-se então numa alegoria sobre ambição e fé, representada pelo garimpeiro que realiza o sonho americano - e é conseqüentemente destruído por ele – e os interesses religiosos manipulativos a serviço da política e da economia.

Com a grana fácil que jorra dos poços, a parceria entre Daniel e Eli tinha tudo para dar certo. Eli era o pastor da Church of the Third Revelation, agora expandida com o suporte financeiro de Plainview. Porém a inimizade entre os dois começa na inauguração do poço de petróleo. Eli exige que ele abençoe a inauguração e Plainview o trapaceia abençoando ele mesmo o produto de seu esforço empresarial.

A partir desse momento a relação entre fé e dinheiro degringola de vez com Eli exigindo cada vez mais dinheiro em nome do Senhor, e Plainview se tornando cada vez mais fdp com tudo e todos. Um momento tocante e determinante na caracterização dos personagens e da estória se passa na explosão do poço de petróleo, quando H.W. cai e perde a audição. Eli insiste que o acidente teria sido causado pela ira do Senhor, por ele, Eli, não ter abençoado o poço. Plainview da-lhe uma sova humilhante na frente dos empregados e Eli, antes de partir em missão, vinga-se.

Plainview necessiatava das terras de Mr. Brandy para construir um oleoduto que ligasse Little Boston ao mar. Voilá. A condição para que conseguisse a terra era de que fosse batizado na igreja do pastor Eli. Uma das cenas mais impressionantes do filme acontece quando o babaca do expectador pensa que Daniel completamente em transe, esbofeteado, humilhado e quase convertido a fe' de Eli esta de joelhos à frente de um Eli espiritualmente forte e vingativo, esta praticamente convertido à Church of the Third Revelation. No fim do carnaval anímico, Plainview olha nos olhos de Eli e diz que aquilo valia o duto!


Daniel Day-Lewis levou o Oscar nessa cena, tenho certeza.


Se tu duvida da uma olhada nisso... http://www.youtube.com/watch?v=QP7lFpPnHg4


Na manhã seguinte Mr. Brandy concorda em alugar suas terras e Eli parte para uma missão. E nesse ponto a estória dá um salto para o ano de 1927 when there will be blood...
Musica do Dia: Brahms. Concerto para violino. Terceiro Movimento

Alocação

É um programa estrutural para criar potencial de grande dinamismo econômico, que requer educação do público. É um grande passo na direção certa.
Edmund Phelps - Prêmio nobel de economia sobre a bolsa família.

Stranger Than Paradise

Stranger Than Paradise
Stranger Than Paradise é uma comédia interessante e meio absurda. É um filme de 1984 feito com sobras de imagens de um filme do Win Wenders chamado The State of Things, para o qual Jarmush havia escrito a trilha sonora.

O filme é dividido em três partes. Na primeira, "The New World", conta a história de um americano que vive num bairro meio barra pesada de NY a espera de uma prima húngara, com quem nunca teve relação. A prima chega, passa uns dias, e parte para Cleveland, Ohio para viver com uma tia velha e peculiar, como se nada tivesse acontecido. Na segunda parte "One Year Later," trata da viagem do primo e se seu amigo a Cleveland para procurar pela prima. De la o filme passa enfocar a viagem dos três de Cleveland para a Florida, "Paradise" – a terceira parte.

Esses road movies, no geral não me atraem, mas há algo da contracultura que no Stranger Than Paradise me atrai, por contrapor-se exatamente à cultura cliche, ao lado comercial do cinema e das estórias que todo mundo que assistir repetidamente. Tampouco, sou totalmente adepto de todas as idéias dos hipsters, até por que estou longe se ser um vegan, mas ainda escuto meus vinis do Parker e do Coltrane e reservo sempre um tempo para filmes independentes.

Acho que não foi à toa que em 2002 o filme foi selecionado para o National Film Registry aqui da Library, por ser um exemplo 'cultural e esteticamente significante da cultura americana.'


Permanent Vacation
Esse aqui é um registro de um Jarmusch jovem e sem refinamento. Permanent Vacation é a história de Allie, jovem fã de Charlie Parker, que vagueia pelas ruas Lower East Side, em Manhattan, num tempo e que por alí não passavam os hipster de bem como se vê hoje. A cidade parece destruida por uma guerra. E tudo se passa num constante vazio existencial com os típicos estranhos personagens pelo caminho.
O filme é chato. Chatissimo. Principalmente por que me faz lembrar que um dia gostei de Smiths, The Cure e Legião Urbana e de todo aquele romantismo urbano pos-punk no qual todos da minha geração perdemos um tempão. O filme, rico em ambientes de desolação, alienação, solidão e busca por contato e afeto, traz já asquestões que Jarmusch tocaria em outros filmes de maneira muito mais fascinante. Mas vou dar um desconto pois ja assistira os outros.

A maratona de Jarmush está quase acabando, e já estou sentindo uma certa nostalgia.

Dead Man


William Blake é um jovem contador que deixa Cleveland com destino a Machine, cidade no meio do nada do cu do Judas - licença poética ao Lobo Antunes - e onde a linha férrea termina. Vai atrás da promessa de emprego numa metalúrgica. Chega, e é comunicado por John Dickinson que a vaga já está preenchida. Sem dinheiro, rumo ou objetivo, envolve-se com a mulher errada, assassina seu ex-noivo – numa tentativa de salvar a própria pele e se mete numa errascada danada. Na verdade, William matou não apenas o ex-noivo da moça. Matou o filho de John Dickinson, o dono da metalúrgica que lhe negou o emprego, e por acaso o homem mais temido da cidade. Baleado, é recolhido por um índio chamado Nobody (Gary Farmer), que acredita ser ele, Blake, o poeta e ilustrador inglês homônimo.

Aos poucos, o Blake pacífico, circunspecto e ligeiramente efeminado, vai cedendo à cirscunstância violenta e caótica do Oeste, no momento que passa a ser perseguido por três pistoleiros da pesada. Ou seja, contrário de sua natureza, vai se transformando, forçado pelas circunstâncias, num matador procurado.

Do encontro de Blake com Nobody, Jarmusch cria situações realmente cômicas e existenciais. Nobody estudara na Inglaterra e por acaso conhecia várias passagens do poeta Blake de memória, as quais declamava para o contador Blake – que por sua vez assimilava-as como um tipo de insight de sabedoria indígena. O problema – ou melhor, a melhor qualidade - é que a ironia de Jarmusch, faz rir na mesma proporção do incômodo que causa. Várias vezes Nobody pergunta a Blake se ele tem tabaco, recebendo sempre a mesma resposta, "não, eu não fumo". Todo o cara que fuma, deveria saber que o tabaco é essencia na medicina, imprescindível em cerimônias religiosas e militares, complemento alimentar que ajuda na digestão, um alucinógeno para lá de eficiente e obviamente uma oferenda aos mortos. O detalhe fica claro no final do filme, quando Blake, flutuando numa canoa que o levará dessa pra melhor, mostra a Nobody o fumo em rolo.

Nota. Mas vamos lá... as poesias que Nobody recita são Auguries of Innocence, The Marriage of Heaven and Hell, The Everlasting Gospel.
Um trecho do Marriage of Heaven and Hell.

Thus one portion of being is the Prolific, the other the Devouring: to the devourer it seems as if the producer was in his chains, but it is not so, he only takes portions of existence and fancies that the whole.But the Prolific would cease to be Prolific unless the Devourer, as a sea, recieved the excess of his delights.

E uma tradução sonora e sem vergonha (perdão, Blake)

Assim uma parcela do ser
é a prolífica, a outra a voraz:
ao que Devora luz
como se quem produz
estivesse em suas correntes,
mas não é assim,
ele toma somente,
da existência, parcelas,
e fantasia nelas
o todo delas.

Shadows

Shadows, primeiro filme do Cassavetes, é aparentemente simples. Um grupo de amigos músicos novaiorquinos, de classe média baixa, se aventuram pela noite em festas, muito jazz e farra. A estória principal fala sobre um triângulo amoroso entre uma moça mestiça - ou como diria o IBGE, parda -, um negro boa-praça e um playboy pilantramente branco que gosta de freqüentar as festas underground para parecer underground. Leila se envolve com o playboy, mas não é o tipo de moça ingênua. Assume o jogo de sedução propensa ao assédio e ao envolvimento com o jovem branco, mesmo que a tal entrada no mundo branco não seja o que realmente deseja. Após conhecer os dois irmãos da moça, o jovem revela sua face racista e se vê diante de um dilema: continuar com a moça ou esquecê-la para sempre. Enfim, Cassavetes foi um realista ao filmar o drama sobre dois negros músicos e sua irmã na busca de identificação numa Manhattan cosmopolita, mas que não foge à regra de qualquer caipiroland americana. Com um elenco amador - Ben Carruthers, Leila Goldoni e Anthony Ray - a trilha sonora de Charles Mingus, e apens 20 mil dólares arrecadados com amigos no bolso, Cassavetes fez de Shadows uma obra definida por ele próprio como experimental, mas que permanece.

Inquieto e criativo, Cassavetes integrou-se no final dos anos 50 ao chamado movimento dos realizadores dos Free Cinema em Nova Iorque. Este seu primeiro longa-metragem foi realizado em 1959, apenas quatro anos depois de Rosa Parks se recusara a ceder o asento a um branco e dois anos mais tarde que Eisenhower convocara a Guarda Nacional pra baixar o pau no pessoal de Little Rock. A câmera trêmula, os closes sem angulação e os cortes colocam o espectador no centro da narrativa, contada em meio a uma trilha permanentemente de jazzistica. O filme é sem dúvida uma grande experiência para quem por acaso leu o L´Herbe Rouge do Boris Vian.

O que particularmente gosto nos filmes do Cassavetes é que o homem não deixa espaço para a divagação existencialista. E nesse filme ele até dá uma cutucada irônica nos existencialistas quando coloca com ironia uma personagem secundária e fora de contexto para falar numa festa sobre filosofia francesa. Ou seja, em seus filmes não há aquela pausa para chegar à varanda da janela, para o deslumbre pensativo de um olhar vago sobre a cidade, não há a pausa sem diálogos, até por que Cassavetes desnuda a sua galeria de personagens de temperamentos explosivos em permanente motin interno, de maneira cruel, sem chances para qualquer tipo de condescendência. Sem trocadilhos, sem Sombras.

Night on Earth

Night on Earth, filme do Jim Jarmusch de 1991. Assisti esse filme quando estava entrando na faculdade e pra ser sincero nunca consegui definir bem o que da estética do Jarmusch realmente me atrai. Assisti ao Night on Earth pela segunda vez hoje, mas ainda nao descobri o que realmente ficou guardado dele na minha memóra. Só sei que realmente gosto dessa espécie de oceano urbano de formas desfeitas que ele cria. Certifico desde já que um dos 5 vignettes me irritaram profundamente – exatamente aquela bobagem de estória do Roberto Benini, que realmente me irrita como ator e diretor; não sei, acho que é sua figura humana, aquela sua caricatura forçada de seu ser e, por metonímia, da alma italiana. Enfim, tem algo de errado nesse cara. No entanto, gosto do jeito de narrar do Jarmusch com imagens não-familiares mas facilmente identificáveis que tornam até minha animosidade contra taxistas ao redor do mundo, um sentimento mais brando mas não necessariamente passível de uma gorjeta eventual.


Uma vez, assitindo uma entrevista do Jarmusch, fiquei surpreso com seu hábito de assistir a filmes estrangeiros sem legendas. Mesmo que não entenda os diálogos, para ele o filme não é só o diálogo, mas a atuação dos atores, a luz, o contexto... enfim tudo que aparece na cena do taxi onde o ator ebúrneo Isaach de Bankole - alias um ator que ja vi em alguns filmes e que realmente tem uma capacidade mudar de personalidade apenas com um corte de cabelo - e Béatrice Dalle dão seu show particular de interpretação.

Enfim, um filme sobre as relações de taxistas e passageiros. Um filme sobre a idéia de que se está sozinho com uma outra pessoa, num espaço fechado, durante um trajeto definido, e com quem não se tem absolutamente nenhuma relação. De ambos, nada é exigido. Em ambos, nada é investido. Não havendo ganhos ou perdas, pode-se mentir durante todo o trajeto. Pode-se permanecer absolutamente calado. Ou pode-se ser completamente honesto. Enfim, igualzinho ao consultorio do teu analista.

Policial civil é baleado em tentativa de assalto

Policial civil é baleado em tentativa de assalto
Desde terça-feira, é o terceiro policial ferido. Seis agentes morreram em cinco dias.

O policial civil Richard Valença Braga, de 37 anos, foi baleado durante uma tentativa de assalto na saída da Linha Amarela, na altura de Del Castilho, no subúrbio do Rio, na manhã desta quarta-feira (23). Na terça-feira (22) um policial foi morto e dois ficaram feridos. Ao todo seis agentes morreram desde a última sexta-feira (18) vítimas de ataques. As informações são do serviço reservado do 3º BPM (Méier).

Segundo a polícia, Braga seguia em seu carro por volta das 7h quando foi abordado por três homens num veículo e teria reagido. O policial, que trabalha na Delegacia de Repressão a Armas e Explosivos (Drae), foi atingido no abdômen e na perna esquerda. Ele foi levado para o Hospital Salgado Filho, no Méier, no subúrbio. De acordo com informações da Secretaria municipal de Saúde, ele já foi operado, e passa bem. Seu estado é estável. Os suspeitos fugiram sem levar o carro.

Seis mortos e três feridos

Desde sexta-feira (18), seis policiais foram mortos e dois ficaram feridos. Na sexta, morreram o cabo Kleber Amparo foi morto em Niterói, na Região Metropolitana, o soldado Márcio de Oliveira Mendonça, em Bangu, na Zona Oeste, e Paulo Craveiro, que trabalhava no Detran, em Olaria. No dia 19, foram mortos o cabo João Luiz de Souza, em Campo Grande, na Zona Oeste, e o sargento Marcos Patrillo Mercês, em Vilar dos Teles, na Baixada Fluminense. Na terça-feira (22), o sargento Edgar de Freitas Navarro, morreu em Cascadura, no subúrbio do Rio.

Além do policial civil Richard Valença Braga, baleado nesta quarta (23), em Del Castilho, no subúrbio, também foram feridos na terça-feira (22) o sargento Carlos Vargas de Lima, durante uma tentiva de assalto, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, e o cabo Ueslen de Carvalho Guimarães, em Guaratiba, na Zona Oeste.

Breve biografia do Richard:

Eu o conheci antes de entrarmos para a faculdade, e nao por acaso ele é um dos caras que admiro.

Passamos juntos no vestibular. Ele foi primeiro lugar em sociologia na UERJ e UFRJ. Com 18 anos, totalmente auto-didata, e dominando a escrita como poucos, ja conhecia boa parte da obra de Freud e Jung, alem de filosofia classica - acho que até hoje guardo as cartas que ele me enviava sugerindo leituras, dentre elas um livro que guardo até hoje do Ralph Linton. A propósito, foi um dos primeiros lugares no mestrado em antropologia do Museu Nacional. Lembro que quando nos encontravamos para um cafe acabavamos sempre conversando sobre Sergio Buarque e Gilberto Freyre, autores que eu comecava a descobrir e ele ja estava careca de ler. Era tao distinto que inspirava respeito nao so dos alunos, mas dos professores. Mas de repente, decidiu abandonar a vida academica - eu sempre tive a impressao que ele era brilhante demais para essa vida. Penou trabalhando numa livraria até decidir fazer o que queria, ser policial civil. Ha pouco mais de um ano, tomou um tiro de fuzil numa operacao numa favela. Por esses segundos e milimetros controlados por forcas maiores que podemos perceber mas nao entender tampouco ver, a bala nao tocou a arteria femoral.

E ontem recebi essa nova noticia.

Desde ontem não paro de pensar que nos Estados Unidos - um lugar onde a tensao entre um policial e um bandido não é menor - um bandido não tem sequer a coragem de pensar em atirar num policial. E eh por isso que as vezes penso seriamente em me tornar um ex-carioca.

O Richard vai sair dessa. Só isso.

Ossessione



Se não me engano este foi o primeiro filme do Visconti. É um filme de 1942, portanto, um filme ainda sob a égide do Fascismo. Nele, já demonstra um certo trato com a contestação dos valores morais. Fato que deixou as autoridades fascistas indigadas, levando-as a proibir o filme. Alguns dizem que o filme é o marco zero do neo-realismo italiano, marcado diretamente pela técnica de longas tomadas que Visconti devota a Renoir. Mas não necessariamente por isso que o filme se tornou inconveniente.


O fato de Visconti ter ingressado no PCI, apesar de sua origem aristocrática, não fez dele uma peça essencial no partido, mas serviu para despertar ainda mais a ira das autoridades. Logo, se tornou um maldito no cinema, embora alguns afirmem que por sua origem aristocrática e a teia de relações a que estava imerso garantiram-lhe uma boa dose de paz de espírito. Nesse contexto, Jean Renoir dá a Visconti uma cópia do roteiro de The Postman Always Rings Twice, de James M. Cain.


Mas voltando ao que interessa, Gino é um jovem malandrão e pilantra que chega por acaso a um modesto restaurante de beira de estrada, quando o caminhão em que viaja, escondido na carroceria, pára para reabastecer. Enquanto Giuseppe Bragana, proprietário do local, e marido de Giovanna, atende o motorista, Gino entra no restaurante e vai até a cozinha onde encontra Giovanna, a jovem mulher de Giuseppe. Mexe nas panelas enquanto tenta seduzir Giovanna.


Descontroladamente atraída pela beleza do cidadão, ela, mesmo assim, avisa ao marido que ele se serviu e não pagou pela refeição. O marido tenta cobrar-lhe o valor devido, mas dizendo-se sem dinheiro, Gino propõe pagar sua dívida com trabalho, já que se diz mecânico e sabe que a caminhonete de Giuseppe apresenta um defeito mecânico. Gino convence a Giuseppe a ir à cidade de bicicleta comprar uma peça nova para o caminhão.


Casa vazia, esposa prestativa, boa cozinheira, paz, silêncio... daí pra cama foi um pulo para Gino e Giovanna. Quando o marido dela retorna com a nova peça, Gino a põe o caminhão para funcionar. Giuseppe, então, permite que Gino permaneça alguns dias em seu estabelecimento. No dia seguinte, aproveitando a saída do marido para uma pesca, Giovanna foge a pé com Gino. Após caminharem alguns quilômetros, ela desiste da fuga e lhe propõe que os dois voltem para o restaurante. Gino não concorda e segue sozinho.


Ao embarcar num trem, sem destino, faz amizade com um vendedor ambulante, meio esquisito aos olhos de Gino, que está indo para Ancona. Os dois passam a seguir viagem justos. Certo dia, quando se acham numa praça a vender guarda-chuvas, Gino é encontrado por Giuseppe e Giovanna, que o convidam para voltar com eles e trabalhar no posto de gasolina.


No caminho de volta, aproveitando-se um Giuseppe manguaça, Giovanna e Gino armam acidente com a caminhonete. Giusppe morre e a princípio, a polícia não considera a possibilidade de um crime. De volta ao restaurante, Gino propõe que Giovanna venda tudo recomeçem a vida num outro lugar.


Um mês depois, os dois vão à Ferrara, resolver o problema do seguro e da herança. Enquanto Giovanna vai à Companhia de Seguros, ele fica na praça, onde conhece Anita, uma prostituta. Quando Giovanna retorna, tudo é muito rápido. O temperamental Giuseppe ouvindo-a dizer que iria receber uma nota preta por conta do seguro de vida de Giuseppe, diz que não quer mais vê-la. Giuseppe, malandor e picareta, tem uma recaída de ética e diz que acreditar ter sido usado por ela para pôr a mão no tutu.


Anita o recebe de braços abertos e inconformada, Giovanna retorna ao seu restaurante. Na cena seguinte, dois caminhoneiros que assistiram ao acidente, procuram a polícia onde informam que Gino e Giovanna não se encontravam no caminhão no momento do acidente.


Gino, na boa vida por Ferrara consegue fugir dos policiais que tentam prendê-lo e vai a procura de Giovanna. No restaurante, fala para ela sobre o que está ocorrendo. E aqui, um ponto de inflexão no filme pode tornar tudo um pastelão.


Ao mesmo tempo, Gino toma conhecimento que os dois vão ter um filho. Com a possível chegada da polícia, os dois pegam um carro e fogem. Na estrada, fazem planos para o futuro.


Os policiais chegam ao restaurante. Não os encontrando, seguem em direção à Scatovari possível desitno dos dois. Quando já estão próximos de serem alcançados pelos 'meganha,' Gino perde a direção ao tentar ultrapassar um caminhão, provocando um acidente. Ele sai levemente ferido e Giovanna morre. A tragicidade da cena onde ele a retira das ferragensm no momento em que é abordado pelo policial, é comovente.

Como a escrotidão, entre nós, é um sentimento mais freqüente que a doçura, é provável que haja mais verdades em Ossessione. Esse filme, mesmo que se mova pelo signo do erotismo, é um filme sem vulgaridades, típico dos filmes de Visconti. Enfim, resumindo, na Itália, início dos anos 40, num vale do Vale do Pó miserável, Giovanna (Clara Calamai), dona de uma pensão, é uma mulher frustrada com a indiferença e até mesmo brutalidade do marido. Assim, planeja com o amante Gino (Massino Girotti) o assassinato do marido. Com esse argumento Visconti apresentava uma linguagem direta, sem retoques de roteiro, sem diálogos elaborados, voltada para os pobres, e ao mesmo tempo para o desespero e uma espécie de heroísmo duro e poético.

Essa visão do esfacelamento conjugal e de uma sexualidade incontrolavelmente demolidora despertou sentimentos ambíguos tanto dos conservadores quanto dos liberais. No argumento várias questões ficam sem resolução, tal como a dissimulação de Giovanna, que forçando um pouco a barra poderia bem ser uma Capitú trágica. A tristeza final induz o espectador a uma angústia, deixando-o entregue a uma mitologia romântica, muitas vezes ingênua para os dias de hoje, mas também com alguma poesia, de seu enredo.




Conselho


Conselho:
do Lat. consiliu
s. m.,
aviso, opinião que se dá sobre o que convém fazer;
parecer, juízo, ensinamento;
corpo colectivo superior, tribunal;
reunião dos lentes da universidade, escolas superiores ou liceus, presidida pelo reitor ou director, para tratar de questões do ensino;
reunião de ministros;
nome dado a vários corpos consultivos junto de certas repartições de administração pública;
grupo de pessoas que deliberam sobre negócios particulares.



Quando perguntado que conselho daria aos jovens escritores, Júlio Cortazar diz em entrevista a Library of Congress:

Yo les daria un sólo consejo y es que nunca les pidan consejo a otro escritor; que busquen solos su camino leyendo...leyendo libros. Que busquen el consejo indirecto, que les pueden dar un poeta que murió hace diez siglos, o un filosofo que está muy lejos. Ese tipo de consejo, sí – el que sale de los libros. Pero que no vayan a buscar uno escritor y pedirle un consejo por que es una prueba de debilidad, y por que creo que los que piden consejo no llegan a ser buenos escritores.

Meus 15 anos em New Orleans


Duas noites em New Orleans e o encontro com varios amigos, antigos e novissimos, revigoram qualquer alma.
Na primeira noite, ao lado do Quico e da Luciana resolvemos assitir ao velho Ellis Marsalis Quartet no Snug Harbor. Como o plano inicial era o de jantarmos antes do show, resolvemos andar até encontrar algum restaurante próximo à Frenchmen Street, rua do Snug Harbor. Na caminhada, não encontrávamos um restaurante onde pudéssemos comer sem reserva prévia. Pra piorar, ainda encontramos um híbrido de filósofo e músico com um violão no braço, que tentou me convencer, caminando ao meu lado por mais de seis quadras, que uma SUV é apenas uma manifestação do meu pensamento -pois é, eu sei que quem me conhece dirá que eu mereço coisa até pior.
Um detalhe, para jantar no mais simples po' boy da cidade há de se fazer reserva, coisa que evidentemente não conseguimos nem num dos mais autênticos po' boy da Frenchmen Street, que por acaso não exigia reserva prévia. Neste, o problema não foi o da reserva e sim da proximidade da hora do show. E com fome, resolvemos ir direto para o show.
O que nem o filosofo maluco, nem voodoo caribenho, nem a fome, nem os astros, que tentaram em vão conspirar, sabiam é que todos havíamos viajado milhares de milhas e quilômentros para nos encontrarmos ali, em New Orleans. Acho que velho Marsalis e seu filho perceberam nosso perrengue e fizeram o show que fizeram - e que eu não consigo contar com palavras.
A noite, que começou meio torta, foi fechada com o carinho dos amigos ao redor da mesa de um boteco, comendo um maravilhoso, providencial e insequecível misto quente, iguais aqueles que comíamos quando tínhamos 15 anos.
Na segunda noite, na Royal Street, no Preservation Hall, com o Rodrigo e o Jorge, as coisas não foram diferentes. Uma banda clássica de jazz, que da formação original tinha apenas Joe Lastie na bateria.
Penei um bocado para encontrar a letra dessa canção linda, imortalizada pelo Armstrog e que os velhinhos mandaram na noite de sábado, deixando sem palavras a todos os presentes.

Do you know what it means to miss new orleans
And miss it each night and dayI know
Im not wrong... this feelings gettin stronger
The longer, I stay away
Miss them moss covered vines...the tall sugar pines
Where mockin birds used to sing
And Id like to see that lazy mississippi...hurryin into spring
The moonlight on the bayou.......a creole tune.... that fills the air
I dream... about magnolias in bloom......and Im wishin I was there
Do you know what it means to miss new orleans
When thats where you left your heart
And theres one thing more...i miss the one I care for
More than I miss new orleans
(instrumental break)
The moonlight on the bayou.......a creole tune.... that fills the air
I dream... about magnolias in bloom......and Im wishin I was there
Do you know what it means to miss new orleans
When thats where you left your heart
And theres one thing more...i miss the one I care for
More.....more than I miss.......new orleans

Sim On Quase Tudo All

Não entendo praticamente nada de música. Não toco nenhum instrumento musical, sequer uma prosaica e miserável caixinha de fósforos; mas tenho pra mim que o Wilson Simonal, ao lado de Hyldon e Tim Maia - e põe aí também a Banda Black Rio - , talvez tenha sido o cara que mais se aproximou do sabor, do aroma, da etérea essência do Soul Americano. E ao mesmo tempo tornou a música brasileira muito mais rica. Quem escutar o cara cantando terá uma idéia cristalina dessa coisa abstrata do que estou falando.

Por um desses acasos da vida, semana passada, na Toca do Neal, encontrei o "Homenagem à graça, à beleza, ao charme e ao veneno da mulher brasileira." Um vinil de 1969. O cara tem um ritmo que é coisa de maluco. Numa das faixas ele canta um dos clássicos bregas de Johnny Mathis. Impressionante. Pode ser que ele não entendesse xongas de inglês, mas na sua interpretação do Evie, cantando numa língua que não era a sua, me desculpem mas SimOnAu mata a pau. Alem disso, existe um video da TV Cultura dele cantando com a Sarah Vaughan que é dessas coisas que se guarda com carinho http://www.youtube.com/watch?v=8Hc0FGmXONk

Estou doido pra ver esse doc do Claudio Manuel, Micael Langer e do Calvito Leal. Posso até ser levado a concordar que ele pagou um preço pelas suas relações e pelo seu excesso de 'pilantragem', até por que muitos outros não pagaram até hoje. No caso dele, especificamente, tudo revelou que por trás da malandragem e jogo de cintura que ele tinha no palco, no fundo, o sucesso passou por um tiro pela culatra. Pela reportagem da Folha, aí ao lado, já dá pra ter uma idéia do que os livros de História do Brasil dizem há tempos em suas entrelinhas: engana-se aquele que pensa que o Brasil é um pais cruel com os pilantras. Apenas com alguns deles.

Enfim entrar no mérito da questão se ele pagou um preço alto ou não pelo que ele afirma não ter feito ou nega ter feito, ou se ele foi realmente ingênuo, num tempo onde não era permitido, parece uma espécie de acerto de contas com a historia. Enfim, se foi dedo-duro há de se lamentar por sua atitude sem dignidade e pelo que ela impôs a sua voz.

Caras como o Simonal, Bebeto, Tim, Hyldon, mereciam biografias cuidadosas. O Simonal merecia uma biografia.... O Tim Maia também merecia uma melhor... pois essa que saiu há pouco, pode até ser que eu esteja enganado, mas começa com a biógrafo falando dele próprio no primeiro parágrafo. Sem comentários.

Música do dia... Sá Marina, Tributo a Martin Luther King e muitas outras... e junto vai uma de Bebeto, A beleza é você Menina.

Missivas II

Nápoles, 18 de maio de 1910

Querido chefe e amigo,

Por uma carta que acabo de receber do ilustre Alfredo de Carvalho, fiquei sabendo que o general Dantas Barreto desistia de sua candidatura a preencher na Academia a vaga do saudoso Nabuco, reservando-se para uma futura vaga, e, de acordo com aquelle, abrira mão a favor desse concorrente, dos votos de que dispunha, entre os quaes estava o meu; hypothese aliás prevista de ante-mão, quando attendi ao pedido do Coelho Netto. Escrevi immediatamente ao Mario de Alencar, mandando-lhe um novo voto para a eleição do illustre autor da =Prehistória Sul-Americana= e de = =, que acabou de chegar-me às mãos, e escrevi também ao meu novo candidato, para quem de resto para qeum de resto não tem meu voto outra signoficação além de modesto feito ao seu bello talento, pois que a sua victoria era mais que certa.

Preciso rectificar uma informação de pouco valor ou nenhum, mas que está errada na última carta que tive o gosto de escrever-lhe, e vem a ser que, para a vaga do Lúcio de Mendonça não votei, como affirmei, em Eurico de Goes, mas sim em Vicente de Carvalho. A minha memória trahio-me no momento em que lhe escrevi, porque chegaria em com effeito a fazer uma carta destinada ao autor de = Os Symbolos Nacionaes = e contava votar no nome delle, mas nessa ocasião chegou-me às mãos o livro de versos daquelle poeta com um pedido de voto. Esse versos me captivaram a admiração e encheram-me de gosto, reformei a carta destianada ao Goes e entreguei meu voto ao poeta, com a avides de uma loreira que entrega seus lábios a um sedutor. E como tudo isso foi já ha um bom par de mezes e o livro do V. de Carvalho me desappareceu da casa como por encanto (filado talvez por alguma outra victima do sedutor) escrevi no engano que agora rectifico.

E feliz e honrado por irmos juntos à festa do brilhante pernambucano, sou seu affectuoso admirador, repietoso,

Aluizio Azevedo.

Notas.

O militar Dantas Barreto somente seria eleito em setembro do mesmo ano. Meses depois, em novembro, seria nomeado Ministro da Guerra de Hermes da Fonseca. Imbuído do cargo sentaria o pau nos revoltosos da chibata e nos fanáticos do Contestado.

Loreira, provavelmente significa modernamente uma loureira, ou seja, uma mulher fácil que pretende agradar a todos. hum... sei...

Meus problemas acabaram!!

Recebi esse email enigmático hoje pela manhã. Se eu ajudar essa moça, orfã, diga-se de passagem, a retirar 20 milhões de dólares de um banco na Holanda, ela me recompensa com 7 milhões...

Letter from Holly Payne
Hello friend,
My name is Holly Payne, a citizen of wales in the United Kingdom now residing in England. I am contacting you because I need your help to solve a family problem. My family and I need your help to help us as a beneficiary to help us collect our family funds from a security company in Holland. Since the death of my father, we have been unable to do so and the security company wants us to present a foreign beneficiary. The amount involved is Twenty Million Dollars and you shall have Seven Million Dollars, please reply me back at mrshollXXXXXpayne@yyy.com I shall give you the whole details.
Have a nice day.
Holly Payne

Eu so fico intrigado com uma coisa... como é que essa dona Holly, pode subestimar tanto a um incauto...


Música do Dia. Os Direitos do Otário. Bezerra da Silva

Missivas I

Em 1996 o José Guilherme Merquior escreveu "De Anchieta a Euclides" e dedicou a Aluizio Azevedo uma página não muito digna. Disse, mais ou menos, com palavras muito mais rendadas e bizantinhas, que Azevedo, depois de conquistar uma prebenda do Estado - sob o cargo de diplomata - abandonou a literatura.
Desde a morte do pai, em 1879, Aluizio se sustentou com seus desenhos, o que o levou de volta ao Maranhão. Depois de 19 livros, centenas de artigos e caricaturas, ele se mostrou frustrado com a literatura. Sem dar maiores explicações aos amigos, trocou as noitadas, bebedeiras e a inquietação dos autores russos pela tranqüilidade e o conforto de um emprego público. O Livro de uma sogra, último trabalho do escritor, foi escrito em 1895 - exatamente no mesmo ano em que ingressa na carreira diplomática.
Pode parecer uma pergunta ingênua... mas minha única pergunta é... se um escritor com apenas 38 anos - ele é de 1857 - , cria uma obra tão volumosa, com alguns escritos consagrados clássicos, e sabendo que a produção literária não segue uma linha evolutiva, o que o impede de dar seu ponto final na carreira com o Livro de uma sogra?
Além do mais quem disse que em suas missivas não há algo de literario? Pois até agora não descobri o “segredo da caixa”...
Napoles, 19 de Dezembro de 1908

Ilustre e querido mestre Sr. Dr. [ ]

Estava para escrever-lhe, comuicando que já lhe havia remetido para ahi a caixa do nosso amigo Ferreira da Costa, como verá na cópia que a esta junto, quando tive a satisfação de receber a sua estimável carta que o próprio Costa diz ballotée de Herodes para Pilatos, tem já sua história: um bello dia, 14 de agosto deste anno, ella me surgio aqui no consulado sem vir acompanhada de aviso ou declaração de espécie algumaç ao fim de um mês, em 16 de setembro, receiando em que tivesse havido algum engano na remessa, mesmo por que havia ainda na tampa da caixa mal obliterado o endereço do cônsul em Gênova, escrevi aos agentes que a expediram de Roma, e por estes vim a saber que o remetente da caixa era o Ferreira da Costa, a quem logo escrevi igualmente, dizendo sobre a mysteriosa caixa; só em 28 de setembro recebi um bilhete postal do Costa, dirigido de Berlim, dizendo que eu tivesse paciencia e esperasse mais uns dias pelo “segredo da caixa”, que acrescentava ele, teria de ser expedida para o Rio de Janeiro e a encantada caixa foi ficando por ali no Consulado, até que ultimamente em 14 de novembro, o Costa me escreveu de novo, agora de Varsovia, com outra carta dentro, datada de S. Petersburgo, mas ambas num envelope sellado e carimbado em Roma, declarando que a caixa deveri ser remetida ao Sr., a quem ele me pedia para escrever, perguntando se o Sr. queria que ella seguisse por grande ou pequena velocidade; em fazer a pergunta e receber a resposta se perderia mais tempo talvez do que a differenca entre as duas velocidades. Eu nesse momento estava muito acabrunhado com a sorte de meu irmão e, em vez de fazer a consulta como queria o Costa, tratei logo de despachar a caixa para ahi por pequena velocidade, antes que o Costa me telegraphasse de Yokuhama ou de Honolulu, dizendo que dera a ella a outro destino e a mim novas ordens, reservando-me eu, está claro, para escrever ai Sr., explicando a remessa ao Costa não escrevi já, por não saber ao certo para onde dirigir a correspondencia, é difícil escrever-lhe com segurança, por que as suas cartas são datadas sempre de um novo ponto. A sua legação é em S. Petersburgo, mas ele, creio eu, reside em Roma, e escreve de Berlim e de Varsovia, sem nunca declarar para onde deve ser dirigida a resposta.

Agradeço-lhe do fundo d’alma as palavras de pesames que em mandou pela morte d meu querido Arthur, e desejo ao Sr. o mais feliz anno bom.

Amigo grato e contado
Aluizio Azevedo

Vaselina e Guerra Fria

Sem um log-in o serumanu não vale nada. Ontem fiquei sem log-in, password e tive todos os acessos aos meus arquivos do trabalho negados. O pessoal do centro de tecnologia disse que foi pobrema ténico. Fui do Ser ao Nada num pulo e fiquei indignado comigo mesmo.

Sem p. nenhuma pra fazer, resolvi ler, obviamente. Me caiu nas mãos um livro sobre Dean Acheson. O Acheson foi um advogado e homem de Estado americano. Portanto não foi santo. Colaborou com Roosevelt e Truman. E com o segundo chegou a ser secretário de Estado desempenhando um importante papel na Guerra Fria. Quem for reparar bem, tem dedo dele em basicamente em toda as instituições pós-guerra ( Doutrina Truman e Plano Marshall, OTAN, Banco Mundial e FMI, além de convencer a Truman de mandar tropas para a Coréia).


O calhamaço de Robert Beisner (Dean Acheson: A Life in the Cold War) é de perder o fôlego. São 800 páginas que evidentemente não li nem 10%, mas que tem passagens interessantes. Não deixa de ser interessante quando Beisner fala da animosidade pessoal entre Acheson e McCarthy no episodio da caça às bruxas. Acheson fez de tudo para defender seus subordinados, do Departamento de Estado, contra a fúria obsessiva de McCarthy. Essa briga iria perdurar por anos e determinar a saida dele da admnistração Truman. Obrigado à vida privada abriu um escritório de lobby bem em frente a Casa Branca e, por suas convicções, passou a ser uma eminência parda de Kennedy durante a crise dos misseis.

Somente um tipo como ele poderia lapidar uma frase tão simple e ao mesmo tempo tão defnitiva... "O memorando não está escrito para informar ao leitor, mas para defender o autor."


Os economistas chamam a isso de Risk Averse. Eu chamo de CYA - Cover Your Ass.







Musica do dia:Siegfrield's Death and Funeral March - Wagner - do terceiro anel .

El Aura

Resumindo: Fabián Bielisnky morreu no quarto de um hotel, se não me engano em São Paulo. Vítima de um forte golpe de caratê colombiano. Os jornais noticiaram que havia sido um ataque cardíaco. Perdeu o cinema e, pode parecer piegas, um pouco cada um de nós.

Senti muito a morte do cara que fez Nueve Reinas, um dos melhores filmes argentinos que tinha assitido nos últimos anos.

No El Aura o roteiro também é recambolesco, vendo-se um pouco a marca do maneirismo de Bielinsky, mas que ele conduz com precisão. El Aura é a estória de um taxidermista epilético, taciturno e reservado que tem uma memória imediata fenomenal, chegando a memorizar detalhes que poucas pessoas podem guardar. Depois que a mulher o deixa, sem bem saber por quê, aceita o convite de um amigo para caçar, mesmo que se recuse a matar animais. Nessa viagem se vê envolvido num assassinato acidental - na qual ele mata o dono da cabana onde estão hospedados ele e o amigo. A vítima, é o arquiteto de um assalto prestes a acontecer num cassino que está para fechar.

Aos poucos, o personagem de Ricardo Darín, acaba se envolvendo com os planos de assalato em andamento – contactando os cúmplices e se fazendo passar por comparsa do homem assassinado, mesmo sem ter a noção exata do que acontecia, mas valendo-se de sua prodigiosa memória. Nos detalhes dessa aproximação é que Bielinsky mostrou a sua maestria em conduzir um filme de tensão, pois você, pobre espectador, não sabe qual é o plano para o assalto, nem tampouco se a interpretação que taxidermista – calcado apenas em sua memória das anotações de um caderno que ele encontra com os planos - dá aos fatos é correta.

Nota: abraço pro Vivaldo, que também gostou do filme.

Recapitulando, o maneirismo de Bielinsky cessa exatamente no momento em que Aura se afasta diametralmente de Nueve Reinas. O estilo é parecido – takes incompeltos, cortes rápidos, jogos de memória, um plano último seja ele relacionado a selos ou a um assalto a um cassino - , mas no Aura há vários assassinatos, um clima de suspense e tensão pesados. Ou seja, aquele clima de tensão embaralhada com certa agitação cômica de NR não acontece em El Aura, um filme noir dos bons.


Música do dia. Do You Want to. Franz Ferdinad