Shadows

Shadows, primeiro filme do Cassavetes, é aparentemente simples. Um grupo de amigos músicos novaiorquinos, de classe média baixa, se aventuram pela noite em festas, muito jazz e farra. A estória principal fala sobre um triângulo amoroso entre uma moça mestiça - ou como diria o IBGE, parda -, um negro boa-praça e um playboy pilantramente branco que gosta de freqüentar as festas underground para parecer underground. Leila se envolve com o playboy, mas não é o tipo de moça ingênua. Assume o jogo de sedução propensa ao assédio e ao envolvimento com o jovem branco, mesmo que a tal entrada no mundo branco não seja o que realmente deseja. Após conhecer os dois irmãos da moça, o jovem revela sua face racista e se vê diante de um dilema: continuar com a moça ou esquecê-la para sempre. Enfim, Cassavetes foi um realista ao filmar o drama sobre dois negros músicos e sua irmã na busca de identificação numa Manhattan cosmopolita, mas que não foge à regra de qualquer caipiroland americana. Com um elenco amador - Ben Carruthers, Leila Goldoni e Anthony Ray - a trilha sonora de Charles Mingus, e apens 20 mil dólares arrecadados com amigos no bolso, Cassavetes fez de Shadows uma obra definida por ele próprio como experimental, mas que permanece.

Inquieto e criativo, Cassavetes integrou-se no final dos anos 50 ao chamado movimento dos realizadores dos Free Cinema em Nova Iorque. Este seu primeiro longa-metragem foi realizado em 1959, apenas quatro anos depois de Rosa Parks se recusara a ceder o asento a um branco e dois anos mais tarde que Eisenhower convocara a Guarda Nacional pra baixar o pau no pessoal de Little Rock. A câmera trêmula, os closes sem angulação e os cortes colocam o espectador no centro da narrativa, contada em meio a uma trilha permanentemente de jazzistica. O filme é sem dúvida uma grande experiência para quem por acaso leu o L´Herbe Rouge do Boris Vian.

O que particularmente gosto nos filmes do Cassavetes é que o homem não deixa espaço para a divagação existencialista. E nesse filme ele até dá uma cutucada irônica nos existencialistas quando coloca com ironia uma personagem secundária e fora de contexto para falar numa festa sobre filosofia francesa. Ou seja, em seus filmes não há aquela pausa para chegar à varanda da janela, para o deslumbre pensativo de um olhar vago sobre a cidade, não há a pausa sem diálogos, até por que Cassavetes desnuda a sua galeria de personagens de temperamentos explosivos em permanente motin interno, de maneira cruel, sem chances para qualquer tipo de condescendência. Sem trocadilhos, sem Sombras.

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