Le Notti Bianche


Malgrado as adaptações de obras literárias para o cimena sempre incorram nas impreferições e limites naturais das duas artes, ao tentarem dar vida uma a outra, no filme de Luchino Visconti sobre o pequeno livro do Dostoievski, Noites Brancas, há uma exceção. Pois foi brilhantemente adaptado para o cinema em riqueza de detalhes.

Primeiro Dostoievski. Em primeiro lugar, esta é uma das novelas da juventude, autobiografica por natureza ao vermos que a protagonista da estória, Nastienhka, muito se assemelha a sua Avdotia Panaieva. Tudo se passa em quatro noites em São Petesburgo. Inicia-se uma ponte onde a jovem Nastienhka espera pelo namorado que prometera retornar naquela noite. O protagonista, que no livro não tem nome - mas no filme sim -, encontra Nastienhka chorando e compadecido passa a consolá-la e ouvir a inusitada estória de que ela se vê obrigada a estar presa literalmente à saia da avó, que idosa e cega, busca nessa artimanha uma maneira de controlar os passos da neta.

O título do livro é certamente uma alusão ao cenário dos longos dias russos, quando o sol não se põe totalmente mesmo pela noite, e que está presente em outras obras de Dostoievski como o Eterno Marido. Mas no filme Le Notti Bianche, de 1957, Visconti tratou de dar um tom poético ao lançar sob os dois neve. Aliás, Luchino Visconti deu mais aos dois personagens literários. Deu-os por um lado o magnetismo sonhador de Marcello Mastroianni, e por outro, os olhos, a vida sonhadora, suave e idealista de Maria Schell na pele de Natalia. Ao protagonista deu-lhe inclusive um nome, Mario, que Dostoievski omitira no livro. Tudo isso com um importante detalhe: não desvirtuou demasiadamente a obra, apenas tratou de limitar o transe monológico que os personagens de Dostoievski adquirem por vezes. Tudo sob a batuta de Nino Rota.

Interessante, pois nesse filme Visconti reinventava aquela estética neo-realista rompendo com as técnicas telejornalisticas do LUCE, e que muito marcou, por muito que se discuta, filmes como Roma, Cidade Aberta do Rosselini, ou Ladrões de Bicicletas do de Sica. Visconti o reinventava tomando outro caminho pois já tinha despertado a ira dos fascistas quando lançou Ossessione em 1942. Agora, neste filme, parte para um cenário intimista, todo criado nos estúdios da Cinecittá, mantendo a técnica das longas tomadas aprendidas com o amigo Jean Renoir – a quem foi apresentado ainda jovem por Coco Chanel. Pode parecer paradoxal dedicar-se a uma estória de amor quando todos, antes com Rosselini e de Sica e uma década mais tarde com Gillo Pontecorvo se dedicariam a uma estética que desprezava os cenários internos suntuosos, mas vindo de Visconti, tudo ganha um ar glamuroso. Além do mais Senso (1954) e Noites Brancas, propriamente, introduziram uma fase de Visconti fora do comum com Rocco i suoi fratelli (1960) e Il gattopardo (Leopardo de 1963 - um dos melhores filmes historicos que já assiti).
Finalmente, os cenários de Noites Brancas são semelhantes aos de uma ópera, afinal esta sempre foi uma de suas paixões já que ele próprio dirigiu umas 18, se não me engano. Em tudo, o silêncio, o sonho e a realidade se confundem nos olhos de Schell e na esperanca de Mastroianni, que como no livro de Dostoievski tem o final merecido.

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