L’Eclisse é um filme de 1962 e faz parte da trilogia L'Avventura (1960) e La Notte (1961).
Um das coisas mais importantes nos filmes de Michelangelo Antonioni é a naturalidade com que trata do tema da ausência de afetos, do distanciamento das relações humanas, pela ausência de diálogos. Como ele mesmo costumava a dizer, gostava de contar o filme por imagens. Tanto em Blow up quanto no L´Eclisse – que assisti ontem pela primeira vez graças ao santo netflix - , as marcas do distanciamento entre os personagens exalam um certo sentimento negativo, onde se constata a insistência no vazio das coisas cotidianas. Talvez isso se deva ao excesso de imagens impreganadas de uma fotografia belissima, sem dúvida, mas sem muitos diálogos. Nessa insistência do filme contado por imagens, as personagens são ligeiramente desequilibradas e meio que intencionalmente insensíveis. No L´Eclisse basta atentar no ambiente que rodeia os personagens tanto de Monica Vitti - filha bem criada por uma mãe especuladora da bolsa - como de Alain Delon – um materialista ambicioso, admnistrador de fundos, e corretor da bolsa.
Tanto Pietro como Vittoria, personagens principais de L´Eclisse iniciam uma relação aparentemente sem futuro, onde tanto um quanto o outro não sabem exatamente para onde a possibilidade de uma paixão poderia levá-los. Há neles uma alienação e desconexão contraditória com a realidade. E eu não cometeria a ignominia de dizer que dinheiro e poder determinam suas ações. Um exemplo deste paradoxo é a relação anterior de Vittoria, com um escritor, e o contraponto de seu estranhamento quando o carro de Pietro é içado do rio com o bêbado que o roubara morto, dentro do carro. A única preocupação do personagem é com a carroceria amassada, pouco importando-se com o bêbado que jazia em seu interior. Vittoria não guarda o estranhamento ao ouvir as inquetações de Pietro. Acho que o Antonioni apresenta aqui o aspecto da riqueza e da futilidade, mas não determina as personalidades evasivas e distanciadas do afeto dos personagens pelo viés marxista, como já li com enfado em alguma revista de cinema. Até por que acho esse tipo de redução de uma pobreza brutal- sem trocadilho!
Só para lembrar, estes anos eram os mesmos em que Cassavetes começava a criar uma linha de cinema parecida do outro lado do Atlântico para personagens de classe média, usuários de drogas, anfetaminas e álcool - até com uma certa dose de moralidade meio enfadonha.
Esta falta de direção de uma geração consumista e fashion é bem contada por imagens. É como se Antonioni estivesse convencendo o espectador a assitir um pouco mais – continue vendo... não desista... toda as as cenas aqui contidas tem um significado. Uma cena aparentemente cotidiana - e para um desavisado, até dispensável – é a do vôo de Roma para um destino não claro onde estão Monica Vitti e Rossana Rory. Quando o co-piloto o anuncia o destino há um ruido qualquer que impede a audição. E é aí surge o primeiro dos grandes méritos de Antonioni. O diretor tenta mostrar uma sociedade feita de quotidianos. Várias outras cenas contam o filme por imagens comuns que tem um significado espeical para os protagonistas. Seja na ênfase que Antonioni deposita na babá que passa com um bebê - que ambos protagonistas ignoram -; ou no tonel onde resignada, Vittoria joga um pedaço de madeira num tonel apos beijar Pietro mostrando uma certa desilusão com a ambiguidade do destino ( e seu senso de indefinido). E é essa a força do segmento final de L'eclisse: Antonioni mostra todas essas sequências do quotidiano como uma realidade que se impõe a nossas vidas sem darmos conta. O detalhe do homem que desce do ônibus com a manchete “La Pace è Debocle” indica que este cotidiano esquecido, do qual nos damos conta apenas quando deixamos o habitual de lado, é exatamente o que há de extraordiário e anormal nos eventos banais da vida.
Um pouco antes do final, a cena em que Pietro e Vittoria definitivamente se entregam - para usar um eufemismo barato - numa cena bela e sensual. Aquela dança das mãos talvez seja uma das mais sensuais dos filmes de Antonioni que assisti até agora. Entretanto, ao final, mais um contraponto. Quando Vittoria deixa o apartamento de Pietro, tudo volta ao mais frio cotidiano, com longas sequências e tomadas de árvores, das ruas, dos trabalhadores voltando para suas casas e as inúmeras imagens que já haviamos visto no meio do filme, numa espécie de prelúdio e epílogo simultâneo de tudo que volta à frieza massiva do quotidiano. O filme termina sem resoluções para o romance de ambos, sem resoluções para os dilemas da vida moderna. Por essas e por outras, um grande filme sobre a alienação e a falta de conexão com a realidade.
Contentemo-nos com a Ilusão da Semelhança, porém, em verdade lhe digo, senhor doutor, se me posso exprimir em estilo profético, que o interesse da vida onde sempre esteve foi nas diferenças,
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