Ilusão da Semelhança
Contentemo-nos com a Ilusão da Semelhança, porém, em verdade lhe digo, senhor doutor, se me posso exprimir em estilo profético, que o interesse da vida onde sempre esteve foi nas diferenças,
FIM DE TARDE no fiM dO mUnDO
Lola Ridge, Mooney and Sacco e Vanzetti
Rosto de Pedra
Eles te esculpiram em um rosto de pedra, Tom Mooney,
Você, lá erguido alto na Califórnia
Sobre a agua salgada do Pacífico,
Com seus olhos chorando... em muitas línguas,
Incitando, inúmeros
Olhos das multidões,
Sujeitando neles todas as esperanças, medos, perseguições,
E disparatadas assinaturas estão rabiscadas em seu rosto de pedra
Em que todos tocaram com seus dedos, para dizer quem te fez durante anos
Para balbuciar como as ondas balbuciam nas pedras... você, um homem
rude,
Educado rudemente, casualmente carregado
Por uma multidão de Primeiro de Maio em São Francisco,
Para ser lançado fora da massa cinzenta - terrivelmente gestada,
fervilhando sem carater,
E criado com torção para a identidade.
Agora eles — que descreveram você claramente, com Sacco e o peixeiro (*),
Na onda dos pergaminho da República —
Olham para cima, com uma irritação confusa, para seu rosto fechado,
Exposto à vista de todos sob o vasto
Olhar das gerações — para ficar lá
Abatido ao nascer do sol, quando a Prisão de San Quentin
Capitular e suas costelas de aço
Alimento para a ferrugem... e o Governador Rolph²
Não passar de mero grão de poeira entre os arquivos.
* Bartolomeu Vanzetti, condenado a morte em Massachusetts em 1921, e executado em 1927, era peixeiro de profissão
Lola Ridge
Rose Emily Ridge foi uma poeta irlandesa que adotou o nome Lola Ridge. Teve uma existência combativa e uma biografia que beirou o infortúnio. Apos a morte do pai, aos três anos de idade, emigou para Nova Zelandia com a mãe, onde casou-se em 1895 com Peter Webster, um dono de uma mina de ouro, e com quem teve um filho. O Casamento durou pouco mais de sete anos. Arrumou a malas, pegou o filho de 3 anos e se mandou para Sidney estudar arte. De la pegou a mãe, entregou o filho para adoção e rumou para Nova Iorque. Na cena novaiorquina, já com 34 anos, como todo o poeta, fez de tudo um pouco, trampando em trabalhos mal remunerados seja nas linhas de produção de fábricas, seja em restaurantes, ou como modelo vivo, para descolar algum extra, num ambiente de extrema pobreza e trabalho duro por muitas horas, ao qual imigrantes eram submetidos. E são.
Apesar de nunca ter militado especificamente em nenhum movimento politico, sua poesia sempre foi marcada pelo envolvimento constante com os movimentos anarquistas e feministas do início do século XX, com a descrição empática das massas urbanas e comunidades de imigrantes da América, cerrando fileiras contra as execuções de Sacco e Vanzetti em 1927, tendo sido inclusive presa por isso. Na década de 1930, ela apoiou a defesa de Tom Mooney e Warren Billings, que foram incriminados por um atentado a bomba em 1916 na Parada do Dia da Preparação, um movimento que protestava contra a entrada dosUsa na Primeira Guerra, em San Francisco.Também foi editora de livros de vanguarda, feministas, e publicações marxistas. Ela é mais conhecida por seus longos poemas e sequências poéticas, publicados em inúmeras revistas e reunidos em cinco livros de poesia.
As longas estradas vazias, Fogos sombrios do pôr do sol, desaparecendo, O céu eterno e indiferente - Willa Cather
Prairie Spring
Evening and the flat land,
Rich and sombre and always silent;
The miles of fresh-plowed soil,
Heavy and black, full of strength and harshness;
The growing wheat, the growing weeds,
The toiling horses, the tired men;
The long empty roads,
Sullen fires of sunset, fading,
The eternal, unresponsive sky.
Against all this, Youth,
Flaming like the wild roses,
Singing like the larks over the plowed fields,
Flashing like a star out of the twilight;
Youth with its insupportable sweetness,
Its fierce necessity, Its sharp desire,
Singing and singing,
Out of the lips of silence,
Out of the earthy dusk.
Pradaria Vernal
O entardecer e a terra plana,
Rico e sombria, sempre silenciosos;
Os quilômetros de solo recém-arado,
Pesado e negro, cheio de força e aspereza;
O trigo em crescimento, o mato em crescimento,
Os cavalos labutando, os homens cansados;
As longas estradas vazias,
Fogos sombrios do pôr do sol, desaparecendo,
O céu eterno e indiferente.
Contra tudo isso, Juventude,
Flamejante como as rosas selvagens,
Cantando como as cotovias sobre os campos arados,
Brilhando como uma estrela no crepúsculo;
Juventude com sua doçura insuportável,
Sua necessidade feroz,
Seu desejo agudo,
Cantando e cantando,
Ausente dos lábios do silêncio,
Ausente do crepúsculo terrestre.
Melhores leituras de 2024, segundo o Mundo de K
"Francisco Rogido - Náufragos do Escolho
O título desta coletânea de contos de Francisco Rogido é apropriado porque os personagens se assemelham realmente a náufragos, perdidos e perdedores na vida, ousando nascer no lugar e no momento errados; gente simples que sobrevive a cada novo dia e em todo lugar à nossa volta sem nem mesmo percebermos. Para esses homens e mulheres, resta apenas a teimosa persistência na busca de uma felicidade possível em meio à pobreza, violência e falta de perspectivas de um cotidiano digno nos grandes centros urbanos. Apesar de tudo, notamos os rastros de uma humanidade difusa que permeia todas as narrativas, afinal, "não há ninguém que não seja estranho a si mesmo", como nos lembra a epígrafe certeira ao citar Nietzsche.
Esses traços de humanidade podem estar presentes nos protagonistas mais improváveis, como no ótimo "5x7", cuja narrativa é conduzida por um cachorro do além, relembrando momentos de sua convivência pregressa com alguns humanos, nem tão humanos assim, diga-se de passagem. Este mesmo cachorro volta a ser citado em "...dente por dente", estratégia utilizada pelo autor ao conectar personagens em diferentes contos, estabelecendo assim uma estrutura fragmentada em forma de quebra-cabeças que renova o interesse na leitura, caso da cuidadora Cecília, protagonista em "Planta exótica em solo frívolo" e que, contudo, participa também como uma personagem secundária em "Cenários de uma gênese" e "O homem que virou suco".
"Janela de terceiro andar, com luz acesa, às duas e quarenta e cinco da manhã, num conjunto habitacional de subúrbio, é uma coisa muito rara de se ver. Principalmente se é de uma segunda para uma terça-feira. Dá para ver do outro lado da linha do trem que naquela janela tem alguém com insonia. O que aquele passageiro do Uber não sabe é que Cecília já se revirou na cama várias vezes, ajeitou o travesseiro, tentou de tudo, suspirou não como náufraga submersa por embalagens de comprimidos, olhou para o lado, deitou de bruços, de barriga para cima, e pensar que chegou às onze da noite da faculdade, cruzou as mãos no peito, fechou os olhos, cataplasmas, chás medicinais e orações ao Divino Espírito Santo, tipo morta, e nesse instante os intestinos de gatos no cio começam a chiar do lado de fora. Agora, não ia dormir mesmo. Nesse instante Cecília aproveita para se levantar e vai até à janela. Olha para a linha do trem, para a luz dos postes, para os carros estacionados lá embaixo, para a rua vazia. É uma noite sem estrelas. Quente. Respira fundo e pensa com resignação que em duas horas tem que acordar, pegar um trem e um ônibus cheios para ir trabalhar do outro lado da cidade. Uma brisa leva lentamente dois sacos plásticos. [...]" (p. 18) - Trecho do conto Planta exótica em solo frívolo
Mesmo seguindo referências literárias famosas tais como Julio Cortázar e Augusto Monterosso, assim como citações a clássicos do cinema de diretores como Alfred Hitchcock, Jim Jarmusch e Robert Altman, o autor consegue manter um estilo próprio e original que se caracteriza por uma linguagem direta, sem floreios, e uma condução narrativa extremamente visual que surpreende pela segurança em experimentar, sem menosprezar a inteligência do leitor, exemplo no conto "Números" com sua hilária protagonista idosa e sagaz ao descrever um típico dia de sábado na pracinha local, certamente tem uma praça assim bem próximo à sua casa: "malandro junto com trabalhador", onde "a merda dos vira-latas fica aí, misturada com as fezes dos pedigrees".
"A pracinha está calma, na verdade está mais para uma rotunda que para uma praça; hoje é o dia do presente, tudo bem normal na vida humana em suas insignificâncias; bom dia... bom dia dona Ana Neri, enfermeira heroína da Guerra do Paraguai, te picharam de novo! Sim... Somente eu devo saber disso no meio dessa praça infecta, sim, hoje é sábado, olha aí, casa cheia, malandro junto com trabalhador, olha lá no boteco, da esquina que nunca fecha, ainda os resquícios daqueles homens vazios, resquícios da sexta, movimento perpétuo, porque hoje é sábado, amanhã é domingo, hoje dia de feira e tem gente à beça, gente a dar de pau, tipo as moscas de Monterroso; xadrez, ronda, dominó, carteado à vera, nas mesas de cimento, a merda dos vira-latas fica aí, misturada com as fezes dos pedigrees. E esses velhos babões, cruz-credo, deus me livre, alimentando pombos; olha lá o Pastor... Pastor à paisana parado na frente de um poste, pensa que ninguém vê, anúncios de 'Juma, Mulher' e 'Verônica Travesti, superativa', as babás cuidando dos filhos-de-alguém, cuidadoras cuidando dos pais de alguém; sim, manhã amena, tudo bem normal, ó tudo doido para descolar algum, os craquelados acordando com fome, olha ali, daqui a pouco começam a pedir dinheiro, puxam até caco de vidro, tudo por causa de uma pedrinha, já até deixo 10 merréis separados na bolsa, tudo em moedinha, documento, tudo xerox, celular esse do mais baratinhos mesmo, aí vem um eu dou, vem outro dou, assim eles vão te conhecendo, mas sabe que eu gosto daqui... Cenário perfeito... [...]" (pp. 37-8) - Trecho do conto Números
No conto "Amar é..." um lutador de MMA brasileiro enfrenta a luta da sua vida em Las Vegas mas, no decorrer do combate, as lembranças do relacionamento com Rute podem comprometer o seu desempenho no ringue. Já em "Os falsos profetas", um pequeno papel distribuído na Central do Brasil oferece os serviços da Vovó Margarida do Amor que garante a volta da pessoa amada e ainda uma defumação completa, incluída no preço da consulta, para abrir os caminhos. Assim tem início a saga de João para reconquistar a mulher que termina com uma caixa de bombons recheados com um estranho licor. "Náufragos do Escolho" comprova a força da literatura brasileira contemporânea que se renova nesse conjunto de contos perturbadores.
"PRIMEIRO ROUND. Ali dentro éramos três. Eu, ele e Deus contra nós dois. O russo mastigava o protetor com a boca aberta como um cachorro que não larga o osso. Espalhava os braços, acenava para o pessoal, socava o ar e dava uns saltinhos igual a uma bicha, como se estivesse me desafiando. Como se estivesse dizendo: 'tá vendo seu merda, eles me adoram e você está sozinho'. Eu estava cansado e puto da vida. Na noite anterior a vaca da Rute resolveu brigar e revirar um monte de coisas da minha vida, do passado, sabendo que a luta era hoje. Eu saí do hotel e fiquei andando um tempão por Las Vegas, pensando no tempo em que eu ficava na entrada do Home Depot esperando o trampo do dia, ou lavando prato, lavando carro, todo molhado e tossindo sem parar. Nem dormi pensando que eu tinha vindo pra esse inferno cheio de luz ardendo na minha vista por causa dela, pra juntar um dinheiro e voltar. Eu olhei pra ele e fiquei com medo, dele e de mim, pois no momento que começasse a quebrar aquela cara branca com meu soco eu não ia parar. Sei lá, eu tinha uma coisa meio animal que até me dava medo." (p. 180) - Trecho do conto Amar é...
Onde encontrar o livro: Clique aqui para comprar Náufragos do Escolho de Francisco Rogido"
El Juguete Rabioso
É absolutamente desconcertante pensar que Roberto Arlt escreveu La Vida es Puerca, seu primeiro livro, com apenas 22 anos. E mais incrível ainda é imaginar, caso sua filha Mirta Arlt tenha falado a verdade, que começou a rascunhá-lo quando tinha 18 anos. O livro em tela foi publicado em 1926 com o nome de El Juguete Rabioso, por sugestão do editor e amigo pessoal Ricardo Güiraldes, pensando que com este título alcançaria um público maior. Se estrepou. Arlt nunca vendeu muito, mesmo tendo nascido como Clássico. Antes de El Juguete, houve supostamente um manuscrito perdido chamado Diário de um Morfinômano, que oficializou El Juguete como o primeiro seu primeiro livro.
Imediatamente depois desse, Arlt publicou, o que para mim, seguido ao Facundo de Sarmiento, é o livro que define em alguma medida o que seria a essência da cultura argentina, Los Siete Locos - um livro incrível que li muito antes do surgimento deste Ilusão da Semelhança, assim que cheguei aozuza, e que não apenas me impactou, me arrebatou, sendo que este é um livro que merece o carinho e a dedicação crítica para uma futura resenha muito mais pensada. Durante anos a obra de Arlt foi criticada e o autor considerado um escritor menor no ambiente literário portenho. Apenas nos anos 1950 e com as ponderações de escritores do calibre de um Piglia, e do empenho se sua filha Mirta, este o obscuro escritor ganhou alguma relevância. Curioso é que o próprio Arlt considerava o El Juguete, inferior a Los Siete Locos, comparando este último a uma pistola automática, enquanto o primeiro a apenas uma pistola antiga. Sendo que os dois são, sem dúvida nenhuma contusos, e além disso, esplênicos, traumáticos e perfurantes.
O livro, dividido em quatro capítulos muito claros e bem definidos: Los Ladrones, Los Trabajos y los Dias, El Juguete Rabioso, Judas Iscariotes. Alinhava muitos elementos biográficos da vida do autor e se centra na trajetória de um protagonista chamado Silvio Drodman Astier que no primeiro capítulo é um rapaz de uns 14 anos, e no último ja é um jovem em idade adulta. Astier é um protagonistas que não quer estudar, mas lê desesperadamente. Seu fascínio passa pelos autores literários do banditismo, teorias do eletromagnetismo, pelo jornalismo sensacionalista, que permeia um protagonista imerso na sensação iminente de violência presente nas grande cidades, e mais ainda na classe social à qual pertencia o protagonista.
No primeiro capítulo, intitulado Los Ladrones, o jovem Astier tem 14 anos, é muito pobre e influenciado pela literatura sobre ladrões, bandidos e aventureiros, se junta com alguns amigos, dentre eles Enrique e um outro jovem falsificador para fundar um clube de malfeitores para organizar pequenos roubos e outras falcatruas. Até que decidem alçar um vôo mais alto e assaltar uma biblioteca. A execução do plano fracassa por um vigia aparecer no momento do roubo, e o grupo se dispersa, cada um indo para seu lado em fuga. Enrique, atormentado pelo medo da polícia e mais ainda por suas alucinações persecutórias, vai parar na casa de Silvio pedindo guarida. E no final nada acontece. Mas a intensidade psicológica do episódio impacta de tal maneira os rapazes que decidem pôr um fim naquela ideia. A situação econômica aperta na casa de Sílvio e a família então muda-se para bairro mais pobre.
Em Los Trabajos y Los Dias, Silvio tem 15 anos, já não estuda e mora com a família neste bairro mais decadente com uma vizinhança compostas por imigrantes e judeus. Já não tem mais contato com seus antigos amigos e é obrigado pelas circunstâncias a arrumar um trabalho para sobreviver e trazer um qualquer para a casa. Consegue então um trampo na Livraria Don Gaetano, onde Silvio também passa a viver nos fundos do estabelecimento, passando a desempenhar tarefas bastante humilhantes como ir ao mercado com Don Gaetano, suportar suas grosserias, num ambiente tóxico e pesado, ser maltratado pela esposa rude de Gaetano. Desesperado por sair daquela casa, Silvio vai a procura de um homem que tinha oferecido emprego. Enquanto espera a chegada do homem, Silvio conjectura um futuro melhor. Pensa que o tal homem lhe dará um trabalho e que sua vida vai mudar de rumo. Entretanto neste livro, nada que é ruim, não escusa piorar, e para piorar tudo, o homem o expulsa de sua casa dizendo que não o conhecia parando de incomodá-lo.
Aos 16 anos volta para casa da sua mãe com uma terrível sensação de derrota. Aceitando a sugestão de uma vizinha, consegue ingressar na escola de aviação como aprendiz de mecânico onde permanece por um tempo e é admirado por alguns por sua inteligência. É nesse capítulo que se descobre. num diálogo entre Silvio e um superior que o pai de Silvio cometera suicídio. Mas, que tudo se encaminhava, no presente, para a pobre matéria ilusória de futuro sólido, ao menos economicamente. Entretanto, um novo revés. Um dos superiores o dispensou da escola por supostamente ter de acomodar um de seus apadrinhados. Sem aviso prévio, cancelam sua inscrição e o sargento, que trata dos papéis, comunica-lhe que naquele local não precisam de pessoas inteligentes. Ao contrário, precisam de homens embrutecidos.
O mais interessante deste capítulo, justamente chamado El Juguete Rabioso, é a idéia de que a vida do protagonista é brinquedo que passa de mão em mão, útil por um período e dispensado assim que deixa de ter serventia. O rancor de se perceber usado todo o tempo torna-o um camarada diferente. Ao deixar a escola militar, Sílvio sente-se destruído e vagueia pela cidade, instala-se uma pensão e acaba dividindo quarto um rapaz homossexual, que o assedia sem sucesso. No dia seguinte, acaba por entrar em delírio, pensando em ir para a Europa num navio. Compra um revólver para sua proteção, e no auge das alucinações, acaba pensando em suicídio. Quando tenta se matar o revolver falha. Chega a ser engraçada essa sina de nada dar certo…
No capítulo Judas Iscariotes, já temos um Silvio adulto, trabalhando como vendedor para uma fábrica de papéis, trabalho que lhe parece humilhante. Aliás, o adendo de que qualquer trabalho, que não seja o trabalho intelectual e inventivo, tornar-se todo o tempo humilhante para o protagonistas, não deixa de ter um lado um tanto patológico. Passado um tempo ele encontra-se novamente com um companheiro do clube de cavalheiros. O rapaz trabalha como investigador e diz que o velho companheiro Enrique esta preso como estelionatário. Comenta igualmente de um outro amigo, coxo, que trabalha na feira de flores e que ao encontrá-lo sugere que ambos roubem a casa de um engenheiro, Arsenio Vitri. Astier topa, mas entre numa crise de consciência se delata ou não o antigo companheiro.
O livro termina com essa sensação de que o protagonistas se redime por vias tortas, massacrado pela cultura de massa que se personifica nas pequenas tragédias cotidianas, no arrependimento, alimentando o medo, que é o núcleo da paranóia no mundo moderno. Ricardo Piglia dizia que a obra de Arlt “pode ser lida como uma profecia: mais do que refletir a realidade, seus livros acabaram por cifrar sua forma futura”. E realmente é isso! Um livro altamente político, sem ser panfletário onde a manipulação da esperança e da crença, a invenção dos fatos, a fragmentação do sentido, e a lógica do conspiração do andar de cima vai nos iludindo, como na Teoria do Iceberg de Hemingway, onde o mais importante nunca se conta - a história como nos diz o Michael de Certau, é construída em cima do não-dito, da alusão, do apenas ligeiramente sugerido numa desconcertante obra de um autor de 22 anos.
A vida é Sonho
A vida é Sonho… e pode
ser. Mas, aqui trata-se de um clássico da Era de Ouro do Teatro
Espanhol de Calderón de la Barca. O chamado teatro espanhol da Idade
de Ouro refere-se à produção teatral na
Espanha num período que se compreende aproximadamente entre 1590 e
1681, quando a Espanha emerge como uma potência europeia com a
consequência da União Ibérica, depois de ter sido unificada pelo
casamento de Fernando II de Aragão e Isabel I de Castela em 1469.
Obviamente, Idade de Ouro contou com uma forcinha a mais do nobre
metal vindo das colônias americanas e das crises que se seguiram à
sucessão portuguesa, iniciada em 1578 até aos primeiros monarcas da
Dinastia de Bragança. Vamos combinar que D. Sebastião escolheu uma
péssima hora para morrer na Batalha de Alcácer-Quibir sem deixar
herdeiros, cabendo ao celibatário Cardeal Dom Henrique, já de idade
avançada e mais pra lá que pra cá, elaborar os trâmites
não sem inúmeros conflitos internos,
para entregar a bagaceira para a corte espanhola, na figura de
D. Filipe II – Filipe segundo na Espanha,
e primeiro em Portugal, ou vice-versa, isso é que
menos importa. Ou seja, Espanha tinha ouro vindo da América, um reino português herdado de lambuja e uma economia de meio circulante abundante que permitia o homem comum frequentar o teatro.
A peça, encenada pela primeira vez em 1635, e portanto na meiuca desses acontecimentos históricos para lá de insólitos, influenciou inúmeras obras ficcionais nos séculos seguintes. A Bela e a Fera de Mme. Gabrielle Barbot, esculhambada pela Disney, talvez seria o grande exemplo disso.
Na obra, a vida seria uma peregrinação, um sonho, dentro de um mundo teatral de aparências, onde cada qual representa seu papel. E não há como negar uma fé em Deus, subjacente,própria do Barroco, em que o sentido de angústia de seus personagens, principalmente o pai e o filho, aproximam os personagens de do homem existencialista de meados do século XX. A plasticidade dos personagens de La Barca relaciona-se com o fato de transbordarem à ação estritamente necessária, para um acentuado individualismo da Era de Ouro do Teatro espanhol. Essa plasticidade torna os personagens palatáveis de forma quase assustadora.
Nesse universo, o enredo da obra é meio explicado pela astrologia e pelos presságios: todo o processo ainda é prefigurado por Deus ou pele medo irracional do futuro - como no caso do presságio que afeta Segismundo, o personagem principal, dramatizando questões transcendentes como o embate entre o conceito de liberdade e a consciência da necessidade, que define a própria liberdade, e o poder da Vontade frente ao Destino. Nesse sentido, a peça é uma espécie de precursora do teatro surrealista do Século XX. O autor criou inovações tão radicais que apenas seriam usadas em sua essência de metaficção no século passado com camaradas como Ionesco e seu Rinoceronte, Beckett com seu oculto, premonitórioe cômico Godot, a até os Rosencrantz and Guildenstern de Tom Stoppard, que apesar da inspiração Shakespeariana tem muito do Clotaldo de La Barca … Se contar o clássico de Stevenson, adaptado no Cinema com o Dr. Jeckyll and Mr. Hide.
A história se passa na corte da Polônia onde uma rainha sonha que seu filho, chamado Segismundo, será um monstro de personalidade e logo após morre no parto. O Rei Basílio, consorte, e pai da criança, temendo o presságio, decide aprisionar a criança numa torre, isolando-a de qualquer contato com o mundo exterior. Porém o Rei é fraco e vacilante. Teme pelo que possa passar a seu povo, sectos e suseranos. No fundo o rei tem o famoso cagaço do rompimento dos tais laços sinalagmáticos, aos quais o historiador Hilário Franco Junior definiu como o pacto de solidariedade dotado de lealdade política entre indivíduos e a nobreza na Idade Média. Rompido os pactos, e sem herdeiro, o reino corria o risco de ir para as cucúias. Basílio é um Soberano sábio, envelhecido, dotado de conhecimentos matemático e astronômicos, sem aptidão nenhum para o Poder, mas não era tolo.
Com a idade avançada, reconhecendo suas limitações, e talvez movido por um sentimento de arrependimento, ou apenas perversa curiosidade - naquele negócio de deixa rolar pra ver no que vai dar - , decide testar o filho e libertá-lo, sendo que o rapaz nada sabe sobre o presságio.
Então, o rei, com a ajuda de Clotaldo, seu fiel lacaio, que é o único que tem acesso a cela de Segismundo, droga-o fazendo com que durma profundamente. Quando o rapaz acorda, ele é tratado como o verdadeiro príncipe herdeiro na corte. Entretanto, ele é uma espécie de homem-fera, uma espécie de selvagem indomesticado, afetado pelo anos de reclusão e falta de sociabilidade. Tem uma alma oprimida e ao mesmo tempo violenta, esmagada pelo isolamento. Cercado das atenções que nunca as teve, que edulcoravam a auto-confiança e o excessivo orgulho, e com essa alma indomada e exageradamente cercada de condescendêcia...já viu né... a Hybris do camarada incha. O cara torna-se arrogante e destemido, senhor de suas próprias atitudes, chegando ao extremo de matar um servo, simplesmente pelo fato deste o contrariar, jogando-o pela janela do castelo. E isso só por que o servo lhe sugeria prudência nas suas atitudes – como costumeiramente se faz, hoje em dia, nas redes sociais, quando um discurso de oposição se articula: defenestra-se.
Resumindo, quando acorda na corte, é tratado como príncipe herdeiro para logo depois ser novamente drogado por Clotaldo e reacordar em sua prisão na torre. Quando retorna à torre pensa que tudo se tratou de um sonho e perde a capacidade de distinguir quando está sonhando de quando está vivendo.
No fundo, mesmo para o homem moderno, esse do nosso início de obscuro século XXI, afundado no atomismo da medias sociais, no individualismo da terciarização de si, submergido nos vários níveis de informalidade, letárgico e arruinado em sua saúde mental frente à corrosiva máquina neoliberal… mesmo que tenha perdido todos os ideais iluministas de uma sociedade mais igualitária, e cedido completamente ao inócuo discurso do Agency americano, ainda assim o expectador pode participar intensamente das angústias do personagem Segismundo quando confrontado com a possibilidade perturbadora de que sua vida até então poderia ter sido apenas um sonho fugaz na verdade que a obra de Calderón nos comunica. Nessa dualidade entre livre arbítrio e destino, que é o cerne do dilema de Segismundo, fazendo o personagem se questionar se suas ações são predestinadas ou se tem o poder de moldar seu próprio destino de personagem, Calderón cria um Èdipo incompleto. Explico: o sujeito de Caldero, com um fardo a ser carregado, o qual envolve não somente a si próprio, mas a seus familiares e todo um reino, não concretiza a tragédia, pois o destino não se cumpre. No fim, o presságio se dissolve.
Aí entram vários fatores… o panorama muitas vezes contraditório e edulcorado do Barroco, a necessidade teológica de dar um fim moralmente cristão à obra, e por aí vai…
Mas paremos de divagações e vamos aos fatos.
Segue o monólogo de Segismundo no auge da confusão mental sobre as incertezas que tratam da vida …
É verdade; então reprimamos
esta feroz condição,
esta fúria, esta ambição,
pois pode ser que ao sonharmos,
o faremos, pois estamos
em mundo tão singular
que o viver é só sonhar
e a vida ao fim me mostra
que o homem que vive, sonha
o que é, até despertar.
Sonha o rei que é rei, e vive
com esse engano mandando,
resolvendo e governando.
E os aplausos que recebe,
vazios, no vento escreve;
e em cinzas se lhe converte sua morte
que é a talha de um corte.
E há quem tente reinar
vendo que há de despertar
no sonho da morte?
Sonha o rico sua riqueza
que mais cuidados lhe oferece;
sonha o pobre que padece
sua miséria e pobreza;
sonha o que o triunfo preza,
sonha o que luta e pretende,
sonha o que agrava e ofende,
e no mundo, em conclusão,
todos sonham o que são,
no entanto ninguém entende.
Eu sonho que estou aqui
de correntes carregado
e sei que em outro estado
mais lisonjeiro me vi.
Sei que a vida é um frenesi.
Sei que a vida é uma ilusão,
uma sombra, uma ficção;
o maior bem é a tristeza,
porque toda a vida é sonho
e os sonhos, sonhos são.
PERSONAGENS
Basílio,
rei da Polônia.
Segismundo, seu filho.
Astolfo, duque de
Moscou.
Clotaldo, velho.
Clarim, bufão, criado de
Rosaura
Estrela, infanta.
Rosaura, dama.
Guardas
da torre.
Soldados de Astolfo.
Damas de Estrela.
Séqüito
do rei Basílio.
Criados da corte.
Soldados revoltosos.
Náufragos do escolho
RESENHA
Rogido, Francisco. Náufragos do escolho. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2023. 192 pp.
Há uma novidade de destaque no díspar universo da literatura brasileira contemporânea. A capa neo-surrealista deste livro de contos – tão bela quanto sinistra – tem um piano de calda pairando nas nuvens sobre uma obscura cena de cidade com um cinema ao canto. As pernas do instrumento estão derretendo, e sobre ele se mescla uma imagem de caveiras e bebês mergulhando de cabeça para baixo numa piscina que cai para dentro do piano. A faceta de estranhamento em Náufragos do escolho é reforçada pela epígrafe do volume. Assinada pelo filósofo oitocentista alemão Friedrich Nietzsche, declara: “Não há ninguém que não seja estranho a si mesmo.”
De fato, pode-se dizer que já no título e subtítulo de seu livro de estreia, Náufragos do escolho (ou os 98 infernos possíveis, 63 takes, dois jogos de armar e algumas armas mortais), Francisco Rogido revela dois dos elementos essenciais dessa coletânea. Há, pois, uma relativa, mas inegável, estranheza na escolha do termo “escolho.” Vocábulo um tanto raro na linguagem do dia-a-dia no português do Brasil, ele é derivado de scoglio, em italiano, que significa “espinho”, ou, figurativamente, “dificuldade”, “obstáculo”, “perigo” ou “risco” para os barcos no mar.
Também vemos humor no inusitado catálogo de elementos desiguais que descrevem, entre parênteses, o conteúdo da obra. Exatamente quais seriam, por exemplo, os 98 “infernos possíveis” (talvez haja mais que isso), ou os 63 takes cinematográficos dos contos (será que há tantos)? Tais números talvez não importem, na perspectiva subjetiva de quem lê a obra. Com certeza dialogando com a sétima arte – em particular, nas elaboradas semelhanças estruturais, dialogais, rítmicas e visuais entre filme e literatura – os contos de Rogido proporcionam algum lirismo e alguma crença na bondade humana. É o que se percebe no conto “A falta agrava a tristeza da noite”, onde amor e sexo surgem subitamente entre personagens idosos que se (des)conhecem num hospital sob condições extremamente adversas, inclusive a proximidade da morte (159-165).
No todo do volume, entretanto, prevalecem as acentuadas doses de angústia, frustração, pessimismo, violência, horror e dor, efeitos quase sempre atenuados por ironia, humor, poesia, e, às vezes, por um sentimentalismo muito discreto. Um exemplo é “Lá não existem flores” (158). Apesar de ser um dos contos mais curtos da coletânea, de apenas meia-página, sua linguagem veloz nos leva muito longe no sentido de questionar a injustiça e o vazio existencial que assolam as vidas de tantos pessoas sem muito tempo para o lazer ou para o convívio com familiares e amigos, pois se ocupam de longas jornadas diárias de trabalho e vivem em bairros muito afastados, o que exige que acordem bem cedo (pelas quatro da manhã, como no caso do protagonista anônimo). Esse vendedor de flores se entristece por nunca ter sido capaz de participar dos eventos e ambientes alegres e festivos do tipo aonde vão diariamente as flores que vende. Entretanto, o que mais o inquieta não é essa exclusão ou a falta de filhos. É uma “ideia fixa”, que na sua idade avançada o faz questionar: “quem iria levar flores a seu túmulo, já que as luzes das estrelas se apagaram?” (158).
Magistralmente desenvolvidas nos limites e poderes da palavra escrita em seus múltiplos e variantes takes e tons, as narrativas de Rogido tanto nos trazem consternação e vergonha da espécie humana quanto nos induzem ao carinho e à compaixão por centenas de personagens que, na sua maioria, são indivíduos pobres, como operários ou pessoas de classe média baixa, cujas existências, sentimentos mais profundos e visões de mundo pouco aparecem nos romances, revistas ou telenovelas. Na maioria das vezes, eles são os indivíduos (des)retratados nas reportagens de crime nos jornais e telejornais. Com certeza, dezenas dos personagens de Náufragos do escolho sofrem com as limitações e contradições de suas circunstâncias cognitivas, existenciais, intelectuais e socioeconômicas. Como cada um de nós, porém, são todos seres humanos e possuem um enorme potencial para inesperada superação e imprevista conformidade com os nossos próprios escolhos, inclusive aqueles que de repente podem empurrar quaisquer pessoas rumo ao delito, mesquinhez ou maldade, ou engendrar uma lição transformadora de empatia, generosidade, e perdão.
A inclusão de crimes na literatura é prática muito mais antiga, naturalmente, mas não há como não ver semelhanças entre as narrativas de Rogido e a abordagem de temas afins em Machado de Assis, especialmente onde o autor de Dom Casmurro explora os mistérios e defeitos morais da mente humana e as camadas invisíveis, capciosas, ou intersecionais do real. Por outro lado, o macabro e o imponderável no submundo dos contos de Rubem Fonseca, a linguagem concisa e popular em Dalton Trevisan, assim como o humor sardônico, sutil e sofisticado em Luis Fernando Verissimo, também têm eco em Rogido.
Em Náufragos do escolho há ainda outras semelhanças com mais vozes de relevo na literatura brasileira. Entre essas marcas, observa-se em Rogido a poesia do cotidiano e das reflexões filosóficas de Ana Cristina Cesar, a coragem estética e a destreza narratológica de Cassandra Rios ao questionar as sombras e os mitos da sexualidade humana (seja ela heteronormativa ou anticonvencional), e a determinação de Márcia Denser para evocar ideologias de gênero e assim contribuir para a emancipação das mulheres. Podemos até mesmo suspeitar da atuação dos princípios conceituais e metodológicos similares aos de Clarice Lispector, aqueles por trás da elaboração e utilização do formato fragmento, que, aliás, nem em Rogido e nem Lispector é exatamente “fragmento”, por se fazer complexo e autossustentável, apesar de seu minimalismo.
Muitas vezes narradas em primeira-pessoa por homens ou mulheres, ou ocasionalmente um animal, mesmo que já defunto, como no desconcertante conto “5x7” (11-14), as histórias de Rogido realmente nos colocam sob a pele de centenas de seres. Eles nos iluminam através das suas perspectivas sobre os desafios do viver e suas necessárias ações práticas, às vezes até mesmo diante de momentos-tabus, como o de quando lidar com o corpo de um (talvez) parente morto. Para ilustrar, vale recordar o comportamento de um cliente de Mateus Araripe, um autodeclarado “esteticista” funerário.
Desde o início do diálogo ligeiro, sem contextualização, que abre o primeiro conto da coletânea, intitulado “Mateus,” perpassamos um estranho humor através de fatos repugnantes e possíveis decisões oportunistas. “O senhor é parente?”, pergunta o esteticista. Evasivo, responde o cliente: “Pode ser” (9). Mateus faz saber: “Vai vazar... [...] Daqui a pouco vai começar a vazar pelo nariz, pela boca, por todos os orifícios. A tendência é que todos os odores seguidos dos líquidos saiam” (9). Após os dois acertarem o preço do serviço (800 reais incluindo a maquiagem do defunto, a venda da roupa, do terço, etc.), o cliente não hesita: “Fechado, vou te dar 900, mas quero o terno e os sapatos de volta” (10). O esteticista se mostra surpreso: “Que é isso, doutor... Que horror... Eu pensei que o senhor...” (10). O cliente não cede: “Pensei... pensei... o mundo está cheio de filósofos, intelectuais e gente que pensa que pensa mais que qualquer outro” (10). Logo arremata: “quem pensa demais acaba se enganando... Não esqueça a aliança, e os dentes de ouro, eu os quero também” (10).
Dário Borim Jr.. É tradutor, fotógrafo e professor de Literatura Brasileira na University of Massachusetts Dartmouth.
Trilogía Sucia de La Habana
Trechos de Trilogía Sucia de La Habana. Pedro Juan Gutiérrez
Conto:O NATAL DE 94
No domingo, 25 de dezembro, de manhã cedo. Angelito subiu ao telhado. Ele tinha mais ou menos uns sessenta anos e morava num apartamento do quarto andar. Ele com muita parcimônia pediu permissão para verificar a caixa d´água. Mais tarde, eu percebi que confundi a tristeza com a parcimônia. Disse que há dias não entrava água na sua casa. Deixei que ele subisse até o reservatórios e, sem perder tempo, ele se jogou para a rua. Quarenta e cinco metros de voo livre.
[…]
Durante anos, Angelito sempre esteve bêbado. Toda a família se dispersou: uma filha fez de tudo até conseguir se casar, e com uma esposa voluntáriosa foi viver na cidade de Segóvia. O outro subiu numa jangada com destino a Miami. A esposa deste, ao se encontrar sem marido e o filho adolescente nas costas, renasceu como a viúva alegre e começou a cantar e dançar em um grupo de salsa, até que por um golpe de sorte de repente se viu no México fazendo um programa de rárdio. […]
Depois a mulher morreu de um infarte no coração e o velho vivia sozinho com o neto Eduardo, meu amigo. […]
Eduardo foi à Poliícia. Fizeram a papelada. Retornou ao meio dia e foi me encontrar na praça. Eu tinha um carregamento bom de àlcool escondido no meu quarto. E ele estava alegre. - Vamos fazer um tremendo negócio hoje à noite. - Por que? Você não está de luto pelo teu avô? - Não, não. Já terminei. O pessoal do IML me avisa depois de não sei que lá. Tu ainda tens aquele àlcool?
Conto:
DUDAS, MUCHAS DUDAS
Aliás, fiz uma conta e nos últimos cinco anos tive relações sexuais com vinte e duas mulheres. Essa média não é ideal para um homem de 45 anos. Não me arrependo, mas fiquei preocupado. Não por causa da interioridade. arrepender-se da AIDS. Eu odiaria me condenar à morte precoce por gozar num buraco errado.
Bem, deixando de lado as promiscuidades, eu tive que continuar. Aguentar. Endurecido, é claro. As pessoas pensavam que eu estava crescendo. Mas não. Eu estava apenas tentando ficar cada vez mais forte e não deixar que eles me manipulassem. Cada um que se foda sozinho. Tive que dosar muito bem o pouco de amor que eu tinha dentro de mim para evitar que o tanque chegasse a zero e o motor parasse. Não perdi a esperança de recarregar em algum lugar. Eu era um utópico de merda. Muito fodido mas sonhando em encontrar algo lindo dentro de mim que mais uma vez enchesse meu tanque até a borda para repetir tudo e voltar a ser aquele cara generoso e bom amante. Você é idiota?, às vezes eu me perguntava. Em outras ocasiões, mais tranquilo, dizia a mim mesmo: sim, é possível.
[…]
Ele não consegue lidar com sua dignidade, sob pena de morrer de fome. “Se ele me dá um pouco, é bom e eu o amo”, só isso. As mulheres em geral entendem isso desde muito jovens e aceitam. Mas para nós homens isso fica um pouco mais complicados com a rebeldia, vai contra os nossos princípios e tudo mais. No fim das contas só entendemos isso um pouco mais tarde.
Bem, esse instinto de autopreservação bem desenvolvido é uma das faces da pobreza. Mas a pobreza tem muitas faces. Talvez a sua face mais visível seja a de que nos despoja da grandeza de espírito. Ou pelo menos a amplitude de espírito. Isso transforma você em um cara mau, miserável e calculista. A única necessidade é sobreviver. E o resto vai tudo para o inferno a generosidade, a solidariedade, a gentileza e o pacifismo.
No meio de tantas dúvidas, chegou Alejandro, um velho amigo. Meio bêbado e feliz. Naquele dia lhe contaram que em um sorteio ele ganhou um visto de residência nos EUA. O cara estava exultante. Todos as suas amigas queriam se casar com ele. Ofereciam-lhe dinheiro..
-
Advirto-o a título de informação. Você está entrando na postagem mais visitada deste blog. "Leio os jornais para saber o que eles estão...
-
Ele desempenhou papel fundamental na história do cinema nacionale teve em seus braços as atrizes mais gostosas, como Sonia Braga, Kate Lira ...
-
Das coisas que se procura em vão na web, nem sempre o que debalde se encontra é o que infrutífero resulta. Por diletantismo apedeuta, própri...