Una Breve Vacanza


Vittorio de Sicca fez o filme “Una Breve vacanza” em 1973, já quando o Neo-realismo italiano era uma sombra estilística apagada na memória de cinéfilos fiéis à temática dos problemas sociais, das crianças lacrimosas, dos atores desconhecidos e da ambientação hiper-realista... É a estória de Clara Mataro, uma mulher metalúrgica, de poucas posses, com 3 filhos que ama, e uma horrenda família composta por um marido embrutecido, o cunhado tão rude estúpido e grosseiro quanto ao irmão, com o adendo de uma leve marca do mau-caratismo, e uma sogra exemplarmente sofredora e por isso, sintomaticamente latina – com o detalhe de todos viverem sob o mesmo teto, e apenas Clara a trabalhar. Após uma síncope de exaustão no trabalho na fábrica onde trabalha, Clara, sob orientações médicas, é recomendada a seguir para uma clínica de repouso no norte montanhoso de Dolomites. A família – não sei se ja disse, ‘horrenda’ - insiste que ela está bem e que não precisa do tal tratamento. Apesar de amar aos filhos, a insatisfação no casamento não a faz titubear e parte para as “férias forçadas.” Chega à clinica e logo percebe que dependendo da classe social, os tratamentos são diferenciados. Mas independente da discriminação entre pacientes nababos e remendados, a experiência da recuperação de Clara não é apenas física, mas emocional. A famosa consciênça de crasse passa longe daqui. Aos poucos Clara torna-se amiga de outras internas, independente de quanto levam na carteira, e adquire novas atitudes frente a sua feminilidade, a leitura, à solidariedade e ao amor. Sua vida muda. Torna-se confidente de mulheres - como a interpretada por Adriana Asti no papel de Scanziani, uma doente mental em estado terminal, um dos pontos sensíveis do filme - que talvez jamais as encontrasse em seu dia-a-dia. Aliás as mulheres que encontra são interessantíssimas...

Todos os estágios de sua feminilidade são expostos, independente da dimensão de sua felicidade frágil e por que não dizer, perturbada pela presença do marido. De Sica impõe um diálogo de sombras com o espectador através da alternância de cenários entre os Alpes oníricos ensolarados, a fábrica opressora, e a casa escurecida – onde quase não é possível distinguir os rostos - , compondo nessa reprodução de fragmentos um quadro onde o tema do, voilá, o adultério, esta tão batida carta, é reinventado. Na clínica, reencontra um jovem mecânico que a convidara a um café no dia da consulta, antes da viagem. Clara, uma mulher de invulgar modestia, deixa-se levar pela atração e nós acabamos torcendo por ela quando o drama vira dramalhão e a paixão entra na veia. Supostamente, no filme, que é uma espécie de dramalhão romântico, mas cheio da sensibilidade, De Sicca nega-se à farsa exuberante ou ao drama existencial que, por exemplo, Antonioni enveredou após deixar os neo-realistas. Supostamente, o filme foi baseado no adágio de Appollinaire, “Só na doença, os pobres tem férias” – o que não deixa de ser uma verdade.

E o bom dos filmes do De Sicca é o final: nunca feliz, mas não menos verosímil. Clara, retorna a casa, após ter a alta antecipada pelo médico – resignado, mas sem deixar de ser delicadamente vingativo - que tentara discretamente porém sem sucesso, seduzi-la. A emoção produzida pelo amor dissolvido que sentira por Luigi torna-se evidente, em toda a sua amplidão, na viagem de retorno de trem para casa. De Sica nos deixa a amarga imaginação da extensão das perdas de Clara.

Tudo bem. Acredito que grandes obras literárias ou filmicas não necessitam nem de longe finais nem de longe felizes. Mas o título que o português deu a esta, francamente, é de uma boçalidade hermenêutica: "Amargo Despertar"


Musica do dia. Age Maria (Guinga e Aldir Blanc)
Age, Maria

Rasga o teu véu de virgem

Tinge tuas mãos na vertigem do pecado

Maria, ateu ao teu lado

Lanço em teu ventre

A língua que te consagre

Milagre é ser pura em plena incontinência

Sacra é a vida da incoerência

Não quero ser carpinteiro

Pra esculpir cruz que imortalize:

Que não seja eu

Que ao te amar

Te martirize



Le Scaphandre et le Papillon


Tive um breve, mas intenso contato com meu avô. Nesta breve estada em minha casa, o velho alfaiate - dizem que dos bons - ao inventar estórias sobre caça a perdizes, vaticinava. Falava que não somos nada nesse mundo ao referir-se a dois dos netos - um que ele nem chegou a conhecer. Eu, um guri na época, mais preocupado com meus times de botões, imaginava uma carga de fatalismo um tanto exagerada nas palavras do velho e o tomava como um gárrulo.


Ontem lembrei do meu avô, e de muitos outros fatos da infância, e de gente querida que foi ficando para trás...


Julien Schnabel fez um filme belissimo que numa tradução para o português seria mais ou menos “O escafrandista e a borboleta,” baseado na história de Jean-Dominique Bauby, ex-redactor-chefe da revista francesa Elle. Bauby, nascido em 1952, pai de três filhos (Théophile, Céleste e Hortense), era redactor-chefe da revista francesa Elle quando foi vítima de uma doença rara, uma espécie estranha de AVC.


Ao acordar, 20 dias depois, no Hospital Marítimo de Berck-sur-Mer, descobriu que perdera a capacidade de se movimentar e de falar. Lúcido, mas paralisado por completo, podendo respirar, comer por meios artificiais e mover o olho esquerdo, Bauby começa a ditar um livro baseado num sistema de comunicação que consistia em piscar uma vez para dizer sim e duas vezes para dizer não. "Ditando", não apenas palavra por palavra, mas ainda letra por letra, recompôs o livro de sua vida mentalmente.
Esse filme talvez tenha sido um dos melhores e mais poéticos filmes dos últimos meses. Julien Schnabel nos faz perceber os detalhes tão inacraditáveis, de maneira tão metafórica, tao densa, tao estranhamente proximos, que ninguém pode passar impassível por determinadas cenas desta estória, pois meu amigo... não somos nada nesse mundo, e vivemos num mundo cheio de escrotidão.

Tempest

Um filme de de Paul Mazursky, 1982.

Phillip Dimitrius, John Cassavetes, é um arquiteto que passa pela crise dos 40 anos. Angustiado, sem uma amante, abusando da birita, desinteressa-se da esposa, Gena Rowlands, que obviamente passa a abandona-lo. Apos uma discussao ruim - como sao todas as brigas de separacao - na frente da filha, separam-se. Ele entao decide viajar para a Grecia em busca de suas raizes. A filha adolescente, chata e no atraso, o segue a revelia. Na Grécia, tentando reencontrar suas raízes, conhece Aretha Tomalin, uma mulher misteriosa, cantora de cabaré e se tornam amantes. Sempre tentando fugir da mulher e de seu (dela) amante, por acaso seu antigo patrão, decide se instalar numa ilha deserta. Aretha e a Filha seguem o Préspero. Chegando a ilha encontram esse pastor de ovelhas de nome Kalibanos, Raul Julia – impagável, engraçadíssimo. Bom, Aretha e Phillip são mais ou menos amantes, pois por razões meio doidas, ele declara voto de castidade, enquanto a pobre Aretha, balzaquiana inopinada, insistentemente filmada sem sutien, com uma camisa branca levemente úmida, gradativamente sobre pelas paredes.

O filme tem umas sacadas que só o Cassavetes poderia ter, pois são dele: A insistência de Cassavetes em ser independente e pagar o preco por isso estão la nas criticas sutis a Coppola e Woody Allen - mas o final é algo decepcionante.

Declaração da inutilidade de meu voto


Falta 3 dias e algumas horas para uma das eleições mais importantes da historia dos Estados Unidos desde, talvez, a de Roosevelt ou quem sabe Lincoln. Não criei este espaço para falar de política. Que Bertold Brecht me perdoe, mas não gosto de politica e nem por isso me considero um analfabeto político. Acredito piamente na máxima do historiador Marc Bloc sobre a qual os eventos políticos estão na epiderme, e portanto, por isso, tornam-se irrelevantes para a história. Mas não posso deixar de comentar este fato importante: Faltam 3 dias para todos se livrarem da ignorância crapulosa, da desgraça invencível, da desmoralização, da penúria absoluta que se abateu sobre as cabeças de todos nós – e aqui incluo você - desde 2001.

A falta de 3 dias para um fato - que fique claro - não é um fato, pois não se pode fazer do apenas iminente um algo concreto. Mas a ansiedade é tamanha, que me deixei contagiar pela ilusão de que a falta de três dias já é sobranceiramente um evento que sintetiza a esperança no futuro e ao mesmo tempo o medo de que a ilusão perdida numa era perdida aprofunde o fosso do obscurantismo oportunista dessa era, que em três dias terminará.

No fundo, pouco importam os três dias, pois qualquer apedeuta que como eu que tenha lido Robert Dahl ou Lijphart sabe que o voto é irracional e que há sempre algo estranho na estabilidade política de regimes bi-partidarios, como este. Eu, particularmente, não acredito no voto por dois motivos muito mais prosaicos e admito um tanto retóricos: primeiro, pelo total desconhecimento como se constrói a imagem de um candidato a presidente; segundo, pelo fato de que a fé na vitória, assenta-se na defesa emocional de ideologias e valores morais apelativos.

Fato é que há 3 dias das eleições, a minha esperança ainda está no ar. É etérea. Democratas e Republicanos não cantam vitória ainda, por um motivo claro. Sabem que as eleições americanas não são simples. A certeza do futuro não existe. Democratas sabem que levam no voto popular California, NY e outros estados ricos e importantes, mas não sabem se levam os voto colegiado dos delegados de estados da caipirolândia. Ainda paira sobre a cabeça dos Democratas a sina dos 5 votos que faltaram para Gore se eleger no Colégio Eleitoral, mesmo que tivesse conquistado meio milhão a mais no voto popular. Ainda paira sobre a cabeça dos Democratas uma coisa pior, o fantasma da fraude eleitoral baseado nos Southern Sheriffs, nos desdentados do Wall-Mart, na felicidade histérica do Good Morning América da ABC, nas notícias manipuladas da Fox News, no assombro dos fantasmas de Cheney e de Edgar Hoover e nos ativistas cristão-pseudo-fascistas que tentam induzir o voto de americanos ignorantes.

Não sei se já disse que não creio no voto, e o proselitismo, é mais um dos motivos que me levam a desconfiar. E um idiota pode até levantar-se e dizer, o Chico não acredita na Democracia! Não só acredito, como considero-a indispensável para perpetuar os princípios democráticos calcados na justiça, na liberdade, na igualdade e na solidariedade. Ideais vagamente defendidos por Obama. São esses mesmo ideais democráticos que alimentam a minha esperança de que o GOP seja derrotado e com ele o eleitor arquetípico conservador, obeso e branco, religioso e obscuro, que defende os valores da família dentro de seu SUV, opõe-se ao casamento de veados, e ao finaciamento do aborto com recursos públicos – valores que por sinal, são defendidos pela última flor do láscio, a calipígia porém palilógica, Sarah Palin.

Barack Obama pode ser eleito em 3 dias. Se eu votasse, votaria, cético, nele. Cético, pois não acredito na sua proposta de espalhar a riqueza aumentando o imposto dos mais ricos e distribuindo a riqueza aos pobres; não acredito que ele jacksonianamente terminará com a permissividade regulatória, cara a Greenspan e Bush; não acredito que assumindo a presidência - se de fato for eleito e vier a assumir – abandonará as idéias liberais e adotará algumas poucas idéias intervencionistas, tal como Roosevelt fez em 1932, pois quando chegou, este, de alguma maneira, herdou melhores condições que o próximo presidente herdará. Além do mais, há três dias das eleições, não acredito que uma campanha muito mais rica que a de John McCain sustente as promessas eleitorais feitas até agora. Acima de tudo, pelo pouco que vi até agora, não acredito que o desdentado-cristão-pseudo-fascista-conservador-branco-pro-life vote em Obama. Ainda assim, mesmo não tendo todos os dentes bons mas tendo um bom atestado de antecedentes Iluministas, se eu votasse, mesmo não acreditando nos políticos, votaria, cético, em Barack Obama.

Ladrões de Bicicletas



Eu rio, choro, e aperto os braços de minha poltona toda a vez que assisto o “Ladrões de Bicicleta” de Vittorio De Sica (1948), toda a vez que vejo o menino Bruno (Enzo Staiola). O filme é um clássico dos clássicos do cinema neorealista italiano, mas que possui um enredo bastante simples onde sobra realismo e emoção.

Antonio Ricci é um desempregado, que após meses sem trabalho consegue uma vaga como colador de cartazes. Para preencher a vaga plenamente necessita de uma bicicleta, que encontra-se empenhada a causa de uma avaria sem honra de caução. Maria tem a capacidade de antever as coisas. Possui um sentido prático, buscando uma solução imediata para os problemas.
Imagino que Maria pense, a bicicleta é o meio pelo qual Antonio sustentará sua familia, portanto decide empenhar os lençóis da cama e retira, na mesma loja de penhores, a bicicleta. Empenhando as fronhas pela bicicleta a pindaíba finalmente parece acabar e tudo parece esperançoso e positivo quando Antonio Ricci consegue o emprego onde começaria a trabalhar numa manhã de sábado. Tudo é tão impressionantemente bom que Maria, como boa cética, desconfia. Isso fica claro quando Maria, após retirarem a bicicleta do prego, pede a Antonio que a deixe fazer uma visita a um certo lugar antes de ruamrem para casa. Na parada Maria visita uma vidente (satirizada pelo Woody Alen num de seus filmes do qual não me lembro o nome agora).

Na primeira cena alguns homens se dirigem para um local de um conjunto habitacional em construção na periferia de Roma, onde um funcionário público da agencia de empregos, chama por nomes para o preenchimento de vagas. As vagas ofertadas exigem algum grau de qualificação. Ao ser chamado, Ricci está distante, sentado num canto, quase sem esperanças de conseguir uma vaga de emprego. Ele está desempregado há dois anos. A vaga é de colador de cartazes para os filmes de Hollywood e a condição para que seja preenchida é a de que Antônio tenha uma bicicleta.

Entretanto, enquanto colava cartazes, Ricci tem a sua bicicleta roubada, exatamente no momento em que esta colando o cartaz do filme Gilda, um sucesso em 1946. Este é um filme clássico de Charles Vidor que retrata da história de um jogador inveterado em Buenos Aires. Glenn Ford consegue ascender na vida indo trabalhar num cassino, tornando-se braço direito de um mega-investidor que administra negócios escusos, envolvendo-se com a única mulher que não podeira se envolver: a esposa do patrão, o pitel da Rita Hayworth, sua ex-namorada em tempos imemoriais. De Sica teve uma grande visão com essa cena. Enquanto sua estória falava de um drama real de uma familia rodeada pela miséria e a luta pela sobrevivência, o único trabalho disponível era exatamente o de reproduzir a ilusão de que a indústria do entretenimento podería salvá-los da penúria. Pode não ser uma idéia nova, e mesmo que já tenha sido aventada, nunca é demais lembrar que a restauraçâo da Itália, sob a égide do Plano Marshall, trazia junto o cinema de Hollywood, baseado em comédias e dramas de interiores, sofisticados e distantes das questões sociais, que De Sica retrata bem aqui.

Desesperado, busca apoio da policia e dos amigos e tenta de todas as formas encontrar a bicicleta. Quando chega a casa, sem saber o que fazer, derrotado, Antonio Ricci senta-se desalentado na cama e sem coragem de contar a verdade à esposa e ao filho, diz Bruno que a bicicleta quebrou. Apenas um adendo, de maneira nenhuma, ao menos para mim, o sentimentalismo do filme passa uma imagem de que os filhos e a casa sejam condição desumana para Maria. Ela é uma mulher forte. Há sim um detalhe interessante, quando Antonio diz que ha trabalho para Maria e lhe mostra uma janela na rua. Alguém fecha a janela, impedindo que Maria veja o interior do local de trabalho. Interessante essa metafora. A opressão feminina não estava na casa, mas nas condições sociais impostas – talvez o Paul Auster nao concorde.

Antônio é tomado pelo medo e o filho decide apoiá-lo. Precisa de uma bicicleta para seguir no emprego como colador de cartazes. A estória, acima de tudo, mostra o drama do homem comum, sua existência quase imperceptível, diluída na multidão, visível na indiferença protocolar da policia ao tratar do caso, no encontro fortuito com seminariastas falando alemão. Então a peregrinação em busca da magrela começa levando-o a caminhos e emoções irreconhecíveis até então. Procurando por conta própria, junto ao filho Bruno, Antonio Ricci encontrará o significado da dor, do egoísmo e da angústia pois ao perder a bicicleta, Ricci perdeu a chance de ter sua dignidade resgadada. Nesse momento, o filme envereda por uma espécie de jogo de paradoxos. Antonio busca o amigo Baiocco, chefe de uma trouppe de artistas, em meio a uma reunião de ativistas políticos. Os discursos inflamados por justiça social não o comovem. Seu objetivo é recuperar sua bicicleta. Dirigem-se então à Praça Vitório Emanuel, local da feira de bicicletas. Baioco, Antonio e o filho Bruno chegam na feira de bicicleta na Praça Vittorio. Procuram uma Fides ano 1935. Baiocco sabe que os ladrões desmontam a bicicleta para vendê-las por parte. Por isso devem procurar as partes da bicicleta. Trabalho ingrato este de encontrar e remontar fragmentos perdidos... Enquanto o pai procura pela bicicleta, o filho Bruno, sozinho, vasculha as bancas da feira de bicicletas pelos fragmentos. De repente, o menino é assediado por um homem com toda a pinta de pedófilo, que busca aliciá-lo e o pai repreende-o para que não se afaste dele, o pai.

Eles finalmente desistem de procurar na feira. Uma chuva torrencial cai. Pai e filho se abrigam da chuva repentina numa pequena cobertura de telhado numa casa de esquina. Ao correr para se abrigar, Bruno escorrega e cai. O pai não percebe e não se importar. Quando a chuva passa, o pai avista o ladrão. Pai e filho correm em direção ao mendigo que conversava com o ladrão. O mendigo se nega a revelar o paradeiro do ladrão e é seguido por Antonio e pelo filho. Chegam a uma igreja, onde voluntários prestam serviços aos mendigos: uma barba, dois pais-nossos; um corte de cabelo quarto salve-rainhas... Antonio insiste, mas o mendigo se nega a revelar o paradeiro.

Aos poucos Antonio se descontrola. Aos poucos, o homem normalmente pacato, calado e taciturno, torna-se alheio ao seu entorno. Grita com o filho. Bruno, passa a protagonizar esta alheação atraves de um sentimento de abandono. Mesmo tendo o pai o tempo todo ao seu lado, é uma criança esquecida. Certifica-se disso, quando da iminência da perda do filho - que pensa ter se afogado num rio. Tentando se reconciliar com o filho, e ainda com alguns tostões no bolso, leva-o a um restaurante. O pai mente, tenta ser trasparecer uma felicidade resignada alienando-se da tragédia pessoal. Mas não por muito tempo. Faz cálculos de quanto ganharia como colador de cartazes. Nas mesas ao lado, familias, com perdão da palavra, voilá, burguesas, caricatas. Detalhe: sua mesa é a única que não tem toalha. O filho percebe, mas o pai tenta dissuadi-lo de que o detalhe é inerente à suas condições de vida, às suas roupas, às suas maneiras de falar e comportar-se.

Ao deixarem o restaurante, Antonio decide procurar a vidente a qual criticava. A cena guarda algo de comicidade, mas serve apenas para encadear a cena seguite na qual Antonio finalmente encontra o ladrão. Segue-o até sua casa e envolve-se num imbróglio ao alienar-se do sentido de justiça e acusá-lo pelo crime. Vizinhos e amigos defendem o ladrão – que acaba tendo uma crise providencial e dostoievskiana de epilepsia. É mais uma vez o filho Bruno que introduz o ônus da razão ao chamar um policial que tenta intervir naquilo que poderia ficar pior. O policial indaga sobre as provas e testemunhas que sustentem a grave acusação. Ricci não tem provas de que o jovem de chapéu de alemão seja o criminoso e tenta agredí-lo. Aliás, na acusação e no ato insano, Antônio passou de vítima a culpado das circunstâncias.

É dia de jogo. Um Domingo qualquer. Uma tentativa frustrada. O estacionamento do estádio lotado de bicicletas. A tentação. O destino é cruel. A vida uma m... Fora do estádio. O filho Bruno presencia tudo e pode-se dizer que contribuiu para que ele não fosse preso. Talvez sensibilizado pelas lágrimas do filho, a vitima do furto é dissuadida. A vergonha demove a perda. A então quase perda do filho - quase assediado, quase atropelado, quase afogado – agora, insiste e aprofunda a perda. Bruno chora pela desgraça do pai. Os transeúntes desaprovam o exemplo do pai para o filho. Não entendem. Antônio parece perder o filho. Se perde de si. A derrota se consuma. E eu choro. Confesso: esse filme me emociona.

The Virgin Suicides

Desse camaradas novos, tais como Michel Chabon, Jeffrey Eugenides e Nathan Englander da nova narrativa americana, fico com o Eugenides e com o Englander. Chabon é uma das coisas mais chatas que ja li. O seu Wonder Boys é chato: aborrecidíssimo. É um dos pouquíssimos livros que largo pela metade sem arrependimento. Seus personagens são figuras chapadas, sem profundidade.

Bom, mas acabei assistindo com algum atraso o The Virgin Suicides com o James Woods e Kathleen Turner.... A Sofia Coppola é uma diretora de filmes irregulares e de escolhas históricas de tradição duvidosas, com a de fazer um filme sobre a Maria Antonieta pela ótica do mundo fashion e pueril. Neste The Virgin Suicides, por exemplo, ela transformou a ironia fina e o humor negro contidos no livro homônimo do Eugenides numa estória com cortes meio sem pé nem cabeça mas que vai sendo tocada com destreza. A estória gira em torno das filhas dos Lisbon – um casal católico que zela com a mão-de-ferro estóica pelo hímen de suas crias. Jurei para mim mesmo que não molestaria os valores puritanos (risos) fazendo comentários sujos sobre a beleza das ninfetas, e menos ainda da Kristen Dunst, mas um pai com filhas daquele calibre deve ser, tem que ser, tem que aceitar infelicidade como destino de maneira lacônica (gargalhadas). Pois afinal de contas, um homem tem as filhas mais desejadas pela molecadada onanista da vizinhança, deve sofrer inflexivelmente calado. Na minha opinião só dois atores poderiam encarnar esse papel trágico de maneira cômica: o James Wood e o Steve Buscemi. Deu Wood.

O filme se passa num subúrbio de Detroit nos anos 70. Cecilia, a filha mais nova, tenta o suicídio cortando os pulsos. Sua incompetência acaba transformando a famíla que tenta ser mais aberta. Após a primeira tentativa frustrada, seus pais tentam integrá-las à comunidade fazendo festas em seu basement, regadas a ponche de frutas, músicas chatas e vigilância constante. Porém, Cecilia consegue realizar seu desejo de suicídio com sucesso, se atirando na grade debaixo da janela do quarto, durante uma festa que acontecia no porão. A partir daí o filme vira uma crônica sociológica sobre o suicídio feita pela ótica durkheimninana de uns meninos patetas que circundam a vizinhança da casa dos Lisbon.

Mais adiante, Lux, a mais velha das filhas, se envolve com Trip Fontaine, durante o baile da primavera, perde a virgindade e é abandonada após a festa, no meio do campo de futebol. Ao chegar a casa a repressão dos Lisbon se intensifica. Nesse meio tempo em que, isoladas, sem poder sair, são observadas pelos inocentes garotos do bairro, que se comunicam com elas através de códigos morse de persianas e músicas tocadas pelo telefone, elas decidem se suicidar, cada uma à seu modo. Nesse momento, acabou a história e morreu a vitória.

Eu Apertei a Mão do Paul Auster, Portanto Ele é Real


Paul Auster esteve na Politics and Prose na quinta-feira passada para apresentar seu novo livro: Man in the Dark. Auster é um camarada simpático e bem humorado. Assim que chegou fez uma piada indagando, com a voz rascada por anos de nicotina, o que tanta gente fazia ali numa tarde tão ensolarada, perdendo seu tempo para escutar um escritor sombrio. E logo em seguida fez uma leitura de quase uma hora de algumas partes de seu novo livro.
Desta vez o protagonista não é o cão de Timbuktu que narra o definhamento de seu dono. Tampouco, Auster tenta reinventar aspectos da Trilogia de Nova Iorque e de seu protagonista Daniel Quinn. Na Trilogia, Quinn, se me lembro bem, era um homem interessado na vida do escritor Paul Auster e de sua mulher Siri - que na vida real se chama Siri Hustvedt. Sobre ele Auster escreve: " O que interessa sobre as estórias que escreve não tem relação com o mundo, mas com suas outras estórias." Essa confusão meio sacana, proposital e absolutamente atrativa de níveis, protagonistas, antagonistas, e realidade com ficção, também se viu em Leviathan quando Auster introduz as personagens Iris - anagrama de Siri - e o escritor apresentado apenas por P.A..
Desta vez, não. Desta vez, pelo menos que eu me lembre, os personagens não são reinvenções espelhadas. São novos. August Brill é um homem de 72 anos e como outros de seus personagens, um homem solitário, lacônico e ambivalente . O protagonista é um escritor e crítico literário premiado pelo Pulitzer. Sofre de insônias, e enquanto rola na cama, conta a si mesmo histórias tentando esquecer coisas que prefere não lembrar, tais como a perda da mulher. Ora é um velho mágico aposentado, ora um soldado, hora um homem que cresce dentro de um buraco. Interessante: o homem no buraco é Owen Brick, o filho de um mágico que é lançado de sua casa em NY para o meio de uma guerra civil ambientada após o colapso do sistema democrático decorrente da eleição fraudulenta que lançou os Estados Unidos numa guerra após a eleição de George Bush. Nesse cenário, o World Trade Center ainda está lá, as cidades americanas vão sendo abandonadas por uma crise econômica, e a guerra é inevitável.
August Brill, após um acidente que inutilizou uma de suas pernas, está se recuperando na casa da filha em Vermont. Tem por companhia a filha e a neta, uma estudante de cinema que também se recupera do trauma de ter deixado a Escola de cinema em NY, após o acidente do namorado. E tudo se passa numa noite de insônia. Aliás, diga-se de passagem, os diálogos entre o velho e a neta sobre os filmes de sua predileção são um capítulo à parte para quem gosta de cinema e literatura.... Brill e a neta assistem alguns clássicos - Ladrões de Bicicleta, de Vittorio De Sica; A Grande Ilusão, de Jean Renoir; O Mundo de Apu, de Satyajit Ray; e Era Uma Vez Em Tóquio, de Yasujiro Ozu. Auster então faz uma reflexão - a la Saramago em Objeto-Quase - de sobre como, em todos esses filmes, simples objetos inanimados servem para expressar as emoções humanas. Enquanto isso, Owen Brick é resgatado do buraco por um soldado e tem como missão, a partir de agora, assassinar o homem responsável pela perversidade de deixá-lo naquele claustro. O responsável? Se alguém ainda lembra: August Brill.
Nos últimos anos, Auster anda preocupadíssimo com a morte e parece que a temática, apenas a temática, deve girar em torno do Viagens no Scriptorium - um dos mais fraquinhos dele . Mas este, me parece que deve trazer de volta algo do A Trilogia de Nova Iorque".
Bem, de qualquer maneira, vai por mim: tenho quase certeza que Paul Auster existe.

Um trecho:

"Estou sozinho no escuro, o mundo dá voltas dentro da minha cabeça, enquanto enfrento mais um ataque de insônia, mais uma noite branca neste vasto deserto americano. No andar de cima, minha filha e minha neta estão dormindo em seus quartos, cada uma sozinha. Miriam, de quarenta e sete anos, minha filha única, dorme sozinha há cinco anos, e Katya, de vinte e três, filha única de Miriam, que antes dormia com um rapaz chamado Titus Small, mas Titus morreu e agora Katya dorme sozinha, com o coração partido."

Música do dia: Bachianas No. 5. Egberto Gismonti - Trem Caipira.


Pão e Sonhos


Sábado. Gabriel em Sad Diego. Manhã de Olimpíadas na tv e leitura preguiçosa, entre um cigarro e outro, dos jornais.


O Financial Times celebrava no caderno de artes os 50 anos de Vertigo – que realmente, é uma das melhores coisas feitas pelo Hitchcock. Na mesma reportagem Nigel Andrews, FT's chief film critic, faz um texto muito mal costurado ligando o lançamento de Vertigo com o lançamento nos EUA do Man on Wire, documentário que mostra a façanha de do francês Philippe Pettit, que cruzou as torres gêmeas do World Trade Center, em 1974, andando sobre uma corda. Na reportagem, o distinto cidadão, diz que o documentário é a imagem espelhada de um presente ao Vertigo.


Com tempo livre para assistir 3 bons docs. Fui assistir a dois documentários do Manuel de Oliveira ( O Pão e o Pintor e a Cidade), e o tal Man on Wire:


Em O Pão (1959, 29 minutos), Manuel de Oliveira mostra o esforço dignificado do homem para produzir o pão, num ciclo que se inicia com a semeação, fecundação, nascimento do trigo, a colheita, o “debulhar o trigo, recolher cada bago do trigo”, ensacamento, transporte do grão, moagem industrial, panificação moderna, distribuição e consumo do pão. Enfim, “forjar no trigo o milagre do pão, e se fartar de pão.” Oliveira, mostra o papel do homem em cada etapa do fabrico do pão, desde a semente até à distribuição. A idéia de que há uma comunicação entre indivíduos afastados no espaço e no tempo, mas que comungam, sem saber, de único elemento: um grão de trigo.


Um documentário que inicia com a imagem de um casamento, simples, sem pompa, de dois componeses. O foco - nas mão brutas e incultivadas do trabalho do cultivo da terra. O corte - para o arado, puxado por um cavalo, sulcando a terra e novamente o foco na mão esquerda do homem, já com a aliança e retornando ao trabalho. A narrativa – feita de imagens encantadoras, como as do moinho meditando àgua em grão e pó, a mulher velha escondendo as medidas de farinha na massa do pão que amassa, na cidade, o menino invejando a vitrine de sonhos, açúcares e cremes, e o padeiro vendendo o pão de porta em porta. Imagens que ainda faziam sentido nos anos 60 e 70 no Brasil.


Um documentário, apesar de extremamente etnográfico, mostrando pelo que indica o sotaque dos diálogos o norte de Portugal, um tratamento sensível, muito poético e com uma oblíqua crítica ao Salazarismo – mas posso estar enganado. Assisti a essa versão curta, predileta do diretor, que termina exatamente com o regresso da semente à terra. Um novo ciclo se inicia: “Afagar a terra, conhecer os desejos da terra, cio da terra, a propícia estação, e fecundar o chão”
Os filmes do Manuel de Oliveira mostram uma superação de nossa trivialidade, revelam que enquanto nos preocupamos em ter expectativas irreais sobre o Homem, enquanto tentamos nos armar de uma ilusão deslumbrante, carente de percepção, sobre o que nos rodeia, percebemos a assombrosa farsa da incompreensão. Por isso ele faz filmes simples, sobre gente simples.

Em O Pintor e a Cidade, (1956, 27 minutos), Oliveira mosta a cidade do Porto através das aguarelas do pintor António Cruz. O artista sai do seu atelier e percorre a cidade e ass imagens reais alternam com as impressões estéticas que o artista vai registando nas suas aquarelas. Supostamente, este é um documentário muito influenciado por Berlim, Sinfonia de uma Cidade de Walther Ruttman, o mesmo que trabalhou com Leni Reifenstahl no monumental Triunfo da Vontade. Oliveira, após assistir ao doc de Ruttman, decidiu fazer um filme desse género sobre a cidade do Porto.


O documentário mostra a actividade fluvial no Rio Douro, na zona ribeirinha da sua cidade natal. Este filme seria o primeiro documentário entre várias primeiras obras que abordariam, de um ponto de vista etnográfico, o tema da vida marítima da costa de Portugal. É especial pois é o primeiro feito em cores pelo diretor. Além disso o som e os ruídos da cidade – altísssimo, as vezes - são quase um elemento autônomo dentro do filme. Uma coisa quase que separada das imagens. Uma espécie de desdobramento, uma sucessiva divisão do olhar que o acto de filmar representa. Algo que encontramos muitas vezes no Win Wenders. Ou seja, repensar a origem daquele ruído e juntá-lo novamente, reconciliando som e imagem.

Por algumas razões pessoais, gostei imensamente do O Pão.

Man On Wire, muitíssimo diferente dos anteriores, é um doc ótimo. Um dos destaques do festival Sundance 2008, dirigido por James Marsh. É um documentário onde beleza e loucura giram em torno de um sonho que se tornou real. Friamente falando, Philippe Petit parece um lunático que encontrou um monte de outros divertidos maconheiros confessos, para realizar um sonho: caminhar na corda bamba, no topo dos 110 andares, que ligava as torres gêmeas World Trade Center nos idos de 1974.


Marsh vai pouco a pouco construindo a imagem de Philippe Petit como um homem obstinado pelas cordas, que após fazer caminhadas sobre corda na catedral de Notre Dame, em Paris e sobre uma ponte em Sidney, na Austrália, resolveu que World Trade Center seria o seu objetivo maior. Diga-se de passagem, o diretor, abusando de triangulações na narrativa, de idas e vindas ao passado, uso de imagens e jornais da época, consegue mantê-la firme até o final. Começa contando a infância de Philippe Petit e sua compulsão por escaladas, quando as torres se tornaram para ele um objeto de obsessão desde que viu pela primeira vez - ainda quando não haviam sido construídas - numa propaganda de revista na sala de espera do dentista. Passa ao encontro com as figuraças que o ajudariam a se infiltrar e introduzir as cordas e os cabos, no prédio. E termina mostrando que após uma noite insone, aconteceu finalmente a travessia: oito idas e vindas, policiais putos da vida não vendo a hora de pôr as mãos naquele francês maluco que os provocava, ajoelhando-se, deitando-se e fazendo sinais para deleite da patuléia que assistia petrificada lá embaixo. Acho que qualquer americano levemente instruido que assistir a esse filme, deixará por alguns momentos de pensar nos dias do fim do WTC - tema no qual o doc não toca em nenhum momento.
Tive a certeza de que a comparação entre Vertigo e Man on Wire foi de uma comparação infeliz do Nigel Andrews, pois em nada se tocam ou assemelham, mesmo espelhados.

Amamos a vida quando podemos

Também nós amamos a vida quando podemos
Dançamos entre dois mártires e no meio deles erguemos um minarete de violetas ou uma palmeira.
Também nós amamos a vida quando podemos.
Ao bicho- da - seda roubamos um fio para tecer o nosso céu e estancar este êxodo.
Abrimos a porta do jardim para que o jasmim saia para a rua como um dia bonito.
Também nós amamos a vida quando podemos.
Na morada que escolhemos, cultivamos plantas vivazes e recolhemos os mortos.
Sopramos na flauta a cor da distância
desenhamos um relincho no pó do caminho.
E escrevemos os nossos nomes
pedra a pedra.
Tu, ó raio, ilumina a nossa noite, ilumina-a um pouco.
Também nós amamos a vida quando podemos.

Mahmud Darwich, poeta palestino, morreu no Texas no último sábado, após uma cirurgia no coração.
http://www.nytimes.com/2008/08/11/world/middleeast/11darwish.html?_r=1&ref=books&oref=slogin

Dos àrabes ainda restam vivos.
Tahar Ben Jelloun. Leaving Tangier, The sand child, This blinding absence of light
Elias Khoury. Gates of the city, Little mountain, The kingdom of strangers

Murilo Mendes

Minha Orfã

Porque não quis te olhar, ficaste cega.
Sei que esperas por mim
Desde o tempo em que usavas tranças e brincavas com arcos.

Sei que esperas por mim
Como o caminheiro espera a fonte no deserto.
Eu não queria te olhar
Por que me debrucei sobre o mito de outras,
Por que não me sabes dar, ó pobre amiga,
O sofrimento e a angústia que formam as catástrofes.
[…]

Fragmento de poema de Murilo Mendes do livro As Metamorfoses de 1938.

Disgrace


David Lurie tem 52 anos, dois divórcios, uma filha que vive no interior, uma vida confortável de um homem de classe média e uma carreira de professor universitário na Technical University in Cape Town numa era pós-apartheid, entre mediana e medíocre. Suas aulas são um mero trâmite burocrático. Seus alunos desinteressados. Seus colegas de trabalho, figuras funcionais que cumprem atividades maquinais: incluindo o preenchimento de atas, presença nas reuniões de departamento, o lançamento de notas e mesmo as demonstrações de amizade. Dentro deste mundo isolado e vazio, Lurie administra sua vida e suas carências da melhor maneira possível. Frequenta uma prostituta todas as quintas-feiras e continua ensinando porque – segundo diz - é assim que ganha a vida; e também porque - com a maior das ironias diz que - aprende a ser humilde em meio à mediocridade.

Em meio a esse mundo artificial, Lurie termina mais um de seus relacionamentos descartáveis. Sua “desgraça” começa justamente quando se apaixona e seduz uma de suas estudantes, sem se proteger das consequências desastrosas desse tipo de relação. Sua perspectiva opaca sobre o mundo encontra nova razão na paixão que sente por Melanie Issaks. Em pouco tempo a relação é descoberta pelo namorado da moça e se torna um agravo. Nesse momento o então mundo de funcionalidade compartimentada, sexo hebdomadário e desinteresse metódico pelas circunstâncias à sua volta rui. O escândalo vem a tona e Lurie passa a ter sua reputação abalada preferindo renunciar a seu posto docente à indulgência.

Rechaçando a falsa moralidade de todos e rechaçado por todos pela sua suposta falta de conduta, após a comissão de ética kafkaniana, formada à guisa inquisitorial, Lurie decide visitar a filha Lucy que vive numa fazenda em Eastern Cape. Lurie ignora os valores e códigos de comportamento do interior pós-apartheid. Despreza a vida campestre. Subestima as opções de sua filha (a plantação, a criação de cães, a desproteção da vida na qual vive), não aprova sua relação homosexual com Helen que a abandonara naquele meio do nada, mas mesmo assim decide passar uma temporada com a filha numa tentativa de resgate de algo. É uma relação estranha. Distanciada. Lucy em momento algum o chama de pai e acrescenta à sua vontade de pai de permanecer ali com uma especie de grande 'whatever.' Mas isso ainda não é o fundo do poço da desgraça. Num certo dia, ele e sua filha são atacados por três homens quando retornam para casa com os cães. São violentados. Ainda que Coetzee omita a palavra 'rape', dá indícios que ambos foram estuprados, mas apenas ele queimado. Quando os bárbaros vão embora, Lurie finalmente descobre o que, tragicamente, aconteceu com sua filha. Pai e filha iniciam, então, um jogo de máscaras, ao omitir a violação de ambos na versão contada à polícia. Confuso, David se revolta, mas logo entende o que a filha quer dizer.

Nesse momento, tendo tendo sido reduzido a um algoz de cães, imagina que a desgraça o persegue, que será uma marca que ele carregará, que será uma punição para quem até então não se abalava por nada, nem mesmo quando viu sua reputação jogada na lama em função de um escândalo sexual. Esse é o momento quando descobre que um dos autores do ataque, Pollux, é do círculo de relações de Petrus, uma espécie de protetor da filha. Nesse momento, desesperado frente à passividade da filha grávida de um estupro, frente convicção da filha em permanecer no mesmo local dos algozes, frente a possibilidade de Lucy se tornar a terceira mulher de Petrus e passar automaticamente ao guarda-chuvas de sua proteção... David Lurie se certifica de que a desgraça talvez o persiga. Coetzee, por sua vez, insinua que ela existe para aqueles que se sentem punidos. De todas as formas, nunca se sabe.

John Constable

Não sei por que insisto, mas assisti a mais um documentário sobre arte. Não sei por que insisto na ideia de assistir documentarios mal produzidos.

John Constable foi um pintor de paisagens do século XIX. Desde os tempos de escola foi um aluno problemático, mas se deu conta bem jovem que, mesmo portando o temperamento irascível, não havia muitos em sua geração que pintassem a natureza. Persistiu na idéia. Em 1799 convenceu então seu pai a mandá-lo para a Royal Academy em Londres para estudar arte. Com a morte do pais, Constable conquistou sua segurança financeira. Com a sacola cheia de dinheiro, foi fácil casar-se com Maria Bicknell contra a vontade do avô da moça. Nesse tempo, uniu então o útilitário ao agradável. E escolheu, então, seu lugar de infância, Suffolk, para transformar sua obsessão em cores e cenários.

Os especialistas dizem que há algo de fresco em seu traço de juventude, mesmo que ao longo dos anos seus céus tenham adquirido um certo peso de realismo sentimental tornando-se mais escuros passando um ar de lamento – principalmente após a morte da esposa. De alguma forma, inovou ao descrever e manipular a pintura da natureza, muito mais que em celebrá-la. Ou seja, segundo a intelligentsia, transcendeu ao meramente pitoresco.

Duas de suas principais obras são Dedham Vale (1802) e The Hay Wain (1821) – com o qual recebeu de Delacroix o premio do Salon de Paris em 1824 - , mas delas não tirou o sustento para o bando de filhos que ia tendo todos os anos. Para sobreviver, pintava retratos, com a certeza de que a herança que o pai lhe deixaria seria suficiente para conseguir o casamento com a mulher que desejasse.

Uma diferença básica entre Constable e Turner, talvez resida no fato de que ao primeiro custou-lhe entender que precisava pintar o épico retratado numa tela imensa. O que se conclui é que foi um pintor irregular. Melancólico, isolado e explosivo com os críticos, criava inúmeros rascunhos. Deixava-os incompletos, sem nunca ter criado uma obra definitiva, de impacto.

Cemitério de Pianos


É curioso que o livro de Luis Peixoto sobre um tal cemitério de pianos me tenha sido dado a ler, faz pouco tempo, pelo meu chapa Carlos Quiroga. Ao contrário de outros, Carlos, em Santiago, parece não querer interferir nos nossos pensamentos. No máximo sugere. Ele mais funcionava como um amigo mais velhom, sem ceder à vaidade acadêmica de conduzir as opiniões. Com total despretensão, está sempre disposto a ouvir uma frase que um de nós tente construir, de modo a deixá-la fluir e captar-lhe dialética a simplicidade sucinta. No último papo que tivemos pelas ruas molhadas de Santiago, ele me presenteou o livro do Luis Peixoto. Disse-me apenas que era para ser lido com atenção. Achei por bem seguir seu conselho. Não me arrependi.

O cemitério de pianos é uma sala fechada dentro de uma carpintaria em Benfica. Um local onde descansam pianos e memórias de vários tipos, e de onde sairão as peças de reposição para que outros pianos sejam restaurados.

Ao redor do cemitério giram várias gerações de Lázaros. Francisco é o nome do pai e do filho. O filho corredor que vem a falecer na Olimpíada de Estocolmo de 1912. O pai, um restaurador de pianos, um homem austero, impassível, rígido, que tem o fantasma de um cigano a rondar sua casa, sua vida, seus próprios fantasmas e sua mulher. A narrativa confunde – a propósito, diga-se de passagem - a história do seu neto, que perde o pai no dia do nascimento e a história do seu filho Francisco Lázaro, corredor da maratona dos Jogos Olímpicos de 1912 (onde falece no decorrer da mesma), e dos seus outros três filhos, Marta, Maria e Simão. A saga de Francisco Lázaro e seu sofrimento ao longo da maratona que o levaria à morte é o leitmotif para narrar a história das filhas do patriarca, dos genros, dos netos que vivem num equilíbrio frágil, permeado pelo adultério, e que pode ser rompido a qualquer momento. Sobre esse contexto é narrado o cotidiano das relações familiares com o traço luminoso da vivência diária de várias gerações.
Usando das idas e vindas na história, da narração fragmentada – bem ao gosto pós-moderno -, do tema da morte, Peixoto, ao contrário do que se esperaria, não aponta para um fim. Com seus fragmentos, costura mais uma síntese que uma ruptura concentrando-se na quase banalidade do cotidiano. E a estratégia que usa para costurá-la está na voz que dá aos vários personagens que se reconstroem uns nos outros. Peixoto é hábil ao dar voz a cada personagem. A capacidade de narrar os fatos sob uma perspectiva plausível e dando um diferente ponto de vista para sua própria história, tendo denominador comum o amor idealizado por cada um deles aos Lázaros, pai e filho. Esse mesmo cotidiano é permeado pelos extremos da monotonia de uma terça-feira e dos ruídos familiares de uma manhã de domingo, com a família na casa, as crianças a correr e a matriarca a cozinhar. Tal como no neo-realismo italiano, ou melhor dizendo, numa tomada de Visconti, os acontecimentos narrados pelo Peixoto dosam o silêncio e a sonoridade de um piano. Dosam a delicadeza, por onde se equilibra, e a mecânica com que, muitas vezes, é conduzida uma relação familiar.
Um trecho...
[...]
nem sequer impossível. A verdade, como o silêncio, existe apenas onde não estou. O silêncio existe por trás das palavras que se animam no seu interior, que se combatem, se destroem e qye, nessa luta, abrem rasgões de sangue dentro de mim. Quando penso, o silêncio existe fora daquilo que penso. Quando paro de pensar e me fixo, por exemplo, nas ruinas de uma casa, há vento que agita as pedras abandonadas deste lugar, ha vento que traz sons distantes e, então o silêncio existe nos momentos de pensamento. Intocado e intocável. Quando volto a meus pensamentos, o silêncio regressa a essa casa morta. É também aí, nessa ausência de mim que existe a verdade.
[...]
[...]
o mais depressa que consigo, como se fugisse daquilo que mais me assusta, como se fosse possível fugir daquilo que levo no interior da minha pele e vai comigo para todos os lugares, corro
[...]
Música do dia. Noturno no. 2 em E maior, Op. 9 no.2

La Signora Senza Camelie

Filme de 1953. Anterior, portanto, à famosa trilogia, mas que guarda ainda alguma linearidade narrativa. A história se centra em Lucia Bose no papel de Clara Manni, uma jovem atriz sem muito talento mas que pelo charme, sensualidade e elegância, alcança um sucesso extraordinário com filmes de baixo custo e qualidade artistica duvidosa. Nessa circunstância de sucesso, aceita um casamento com o produtor de um de seus filmes, Ercole - Gino Cervi. Une então ao êxito profissional a oportunidade de ascensão social. Nesse momento, passa a fazer filmes menos populares e começa a se deprimir com a perda do sucesso e um casamento fustrado. Essa combinação de frustração profissional e um casamento de conveniências leva-a a procurar outras aventuras. É ai que se apresenta o diplomata Nardo Rusconi, uma mistura de elegancia e canastrice, que a seduz e a leva praticamente a separação. Clara então se torna o vértice de um triângulo amoroso que a levará a ruína emocional e profissional, pois enquanto Ercole produz cada vez mais filme de qualidade, Clara acaba por ter que vender seus dotes artiticos a filmes de qualidade cada vez mais duvidosa. Enfim, um filme sobre o cinema e seus bastidores com os ecos e talvez por isso mesmo sofrendo com a grandeza de um Sunset Boulevard – apenas três anos mais recente. No fundo, ambos tratam mais ou menos do mesmo tema: da vaidade, porém com enfoques distintos sobre as hybris, envelhecida, de Norma Desmond e, inocente e pueril, de Clara Manni.

Satiagraha

Fim de noite, depois de varias Brahmas, dois avatares perdidos, com a citara debaixo do braço, devem estar de lá olhando pra cá e entoando o mantra...

Falou, é isso aí malandro
Eu vou bate pá tú, pá tú
Bate pá tua patota
Vou batê pá tú
Bate pá tú
Pá tú batê
Vô batê pá tú, batê pá tú
Pá tú batê
Vô batê pá tú, batê pá tú
Pá tú batê
Vô batê pá tú, batê pá tú
Pá tú batê
Amanhã a pá não me dizer
Que eu não bati pá tú
Pá tú pode batê
O caso é esse
Dizem que falam que não sei o que
Tá pá pintá ou tá pá acontecer
É papo de altas transações
Deduração um cara louco
Que dançou com tudo
Entregação com dedo de veludo
Com quem não tenho grandes ligações.

Who's Afraid of the Big Bad Wolf?


Talvez “Who's Afraid of Virginia Woolf?” junto a “Sunset Boulevard,” "Street Car Named Desire" e “Cat on a Hot Tin Roof” sejam na minha opinião os quatro melhores filmes onde o cenário econômico e intensidade dramática levam à obra cinematográfica o poder e a riqueza que somente no palco poderiam traduzir.

Em Who's Afraid of Virginia Woolf?, George (Richard Burton) e Martha (Elizabeth Taylor) estão casados e, ao contrário ou igual a outros casais, se odeia mutuamente. Ele é um professor de história alcoólatra, e ela, uma mulher frustrada e dominante, é filha do president da universidade onde George leciona. Por tantos anos juntos, numa longa convivência diária, conhecem seus pontos fracos e os usam para esgaçar o resto que resta de uma relação que encontra o equilíbrio nessa mesma tumultuada e instável violência a que se expõem no cotidiano quase selvagem.

O filme começa com a saída de uma festa, a altas horas. Ambos bêbados retonando para casa, rindo alto e soltando frases desconexas na escuridão. Uma vez em casa Martha diz a George que convidara um jovem casal recém chegado à universidade, Nick (George Seagal) e Honey (Sandy Dennis), para o último drink em sua casa. Nick é um professor de biologia que Martha pensa se tratar de matemática. Nesse momento, ainda bebendo mais, inicam um jogo de sedução, perversidade e violência que torna esse filme intenso e impresionantemente teatral.

Tal jogo é permeado pelos “Fun and Games”. Através deles Martha descarga toda a sua ira contra a passividade doméstica e a falta de entusiasmo profissional de George. Ataca-o em seus pontos mais vulneráveis, na sua falta de ambição social, na sua inabilidade em usar as cartas que tinha disponiveis como genro do president para ter uma carreira ascendente e meteórica dentro da universidade onde leciona.

Martha: ...De fato, ele é leve ... FLOP! Não passa de um...grande...FLOP!
[Quebra! Imediatamente depois do FLOP! George quebra uma garrafa de uisque no bar...]
George [quase chorando]: Eu disse para parar, Martha.
Martha: Espero que esta garrafa estivesse vazia, George. Você não gostaria de disperdiçar uma boa garrafa de àlcool...não com o seu salário.




Esse diálogo levinho se dá na presença dos convidados.

Algo que dá muita dramaticidade ao filme é o fato de que durante todo o filme, não se sabe se em decorrência do efeito do àlcool, ambos dizem a verdade ou não, pois após essa crise, que se inicia com a confissão de Martha a Honey sobre o filho do casal que vive longe – um peça chave na trama - , George vai para fora sozinho. Nick o segue numa tentativa de consolá-lo. Então Nick confessa a George sobre a gravidez psicológica de Honey e sobre toda a dificuldade de Honey engravidar, enquanto George conta a história de um menino que atira e mata sua mãe acidentalmente e enquanto aprende a dirigir mata seu pai num acidente de carro - sendo internado num sanatório. Esse é outro ponto chave da história, pois para George esta era uma história real, enquanto para Martha essa era um história que seu pai lera quando George aoresentara-lhe os manûscritos e proibira a publicação caso quisesse se casar com sua filha e lecionar na universidade.

Numa das cenas seguintes, Martha descreve George como o jovem personagem de uma novela influenciado pela personalidade dominadora do pai. Martha sugere que seu pai é o pai morto carcaterizado na novela e imita a voz de George em falsete num suposto diálogo deste com seu pai que proibira a circulação dos manuscritos “....but Sir, it isn't a novel at all...this really happened...to me!"

Nesse momento Nick faz uma conexão entre a história contada no jardim por George e a realidade. Se fosse verdade a versão de Martha, então George mentira para Nick – após este em tom de confissão revelar detalhes sobre a gravidez histérica de sua mulher que seriam usados contra ele mais a frente. Se a versão de Martha fosse real, então talvez o sanatório fosse uma metáfora para a vida miserável que George levava ao lado de uma Martha desequilibrada e instável.

Numa das cenas seguintes, Martha descreve George como o jovem personagem de uma novela influenciado pela personalidade dominadora do pai. Martha sugere que seu pai é o pai morto carcaterizado na novela e imita a voz de George em falsete num suposto diálogo deste com seu pai que proibira a circulação dos manuscritos “....but Sir, it isn't a novel at all...this really happened...to me!"

Nesse momento Nick faz uma conexão entre a história contada no jardim por George e a realidade. Se fosse verdade a versão de Martha, então George mentira para Nick – após este em tom de confissão revelar detalhes sobre a gravidez histérica de sua mulher que seriam usados contra ele mais a frente. Se a versão de Martha fosse real, então talvez o sanatório fosse uma metáfora para a vida miserável que George levava ao lado de uma Martha desequilibrada e instável.

A cena não se resolve e George parte para o ataque a Nick. George começa a usar a metáfora de um rato que bebe brandy imodestamente e vomita constantemente ao se referir a Honey, uma mulher apagada, muito magra e sem atrativos físicos, o que leva a George questionar o interesse sexual de Nick por Honey. Ela, nauseada, sai de cena para vomitar. Então Martha seduz Nick em frente a George, humilhando-o. George reage de maneira branda, como se aquilo não fosse novo no jogo entre os dois, como se já estivesse no script, e diz, Estou na página cento e.... .

Saem, vao todos para um bar. Martha volta com Nick e Honey prostrada no banco de trás. George chega a casa, vê o carro vazio, Honey dormindo no banco de trás e vultos na janela do quarto: Nick e Martha na penumbra.

Martha concretiza, ou tenta concretizar o sexo com um jovem completamente bêbado. George arromba a porta, os sinos da porta badalam. Não tem coragem de subir. Chora do lado de fora da casa. George tem uma idéia. Instantes mais tarde, após Martha revelar a Nick que ama somente a George, este toca a porta e traz flores dizendo “flores para los muertos”, e desafiando Nick a trazer sua mulher para o jogo final... "Bringing Up Baby."

George e Martha supostamente tem um filho. Ambos contam histórias do filho. Martha centraliza a cena contando detalhes sobre o nascimento do filho, sobre sua maneira natural de nascer, enquanto George comeca a recitar o Requiem em latim e contradiz cada frase de Martha. Ela se desespera prevendo que a verdade sobre o filho pudesse ser revelada.


George então revela que o filho tinha sido morto naquela noite quando Martha começou a falar deles. Aparentemente este era um pacto entre eles: não falar do filho para estranhos. George e Martha criaram esse filho de maneira imaginária e George disse que matou o filho por Martha ter falado dele para outros. O filme termina com George cantando "Who's afraid of Virginia Woolf?" para Martha, enquanto esta responde, eu, George... eu tenho.....

Nota. Interessante. Esse filme que deu o segundo oscar a Elizabeth Taylor por uma interpretação magistral é de 1966. Taylor aparece na primeira cena da porta se abrindo, e focalizando os rostos de Burton e dela, quase que irreconhecivel. Burton com 41, aparece degradado já pelos sinais do alcool. Ela com apenas 34 anos está gorda e envelhecida aparentando pelos menos dez anos a mais. Para nos darmos conta da transformação, este filme foi lançado apenas três anos mais tarde de Cleopatra e seis de Buterfield 8 - se é que me faço ser entendido.

Musica do Dia. Me Acalmo Danando - Angela RoRo

Nota. Parece que Gabriel terá companhia...

Down by Law


Zack é um DJ desempregado. Jack um cafetão e proxeneta. Ambos são presos nas ruas de Nova Orleans por crimes não cometidos, e colocados na mesma cela. O crime de Zack foi o de simulação e intermediação de um Jaguar e o de Jack tentativa de prostituição de menores. Ao ser preso, Jack antecipou em 7 anos a antológica frase que seria dita pelo prefeito de DC, Marion Barry (Bitch set me up!) – ao ser preso com uma prostituta num hotel de viração nos arredores do Distrito.
Zack e Jack vão dividir cela com um italiano chamado Roberto. Roberto é um idiota. Desses idiotas que só podem ser represetnados por Roberto Benini. Apesar de representado por Roberto Benini, Roberto é um idiota diferente. Ele é o único que sabe escapar da prisão da Lousiana. Zack e Jack sabem disso e vão se unir ao surrealismo de Bob.

Na fuga, encontram uma cabana onde vive Nicoletta. Bob e Nicoletta apaixonam-se instantaneamente e este decide ficar, enquanto Zack e Jack se separam numa bifurcação do caminho.
Este filme do Jim Jarmusch foi o quarto da carreira. O ambiente humoristico e leve é atíptico. Down by Law, destoa dos primeiros filmes, principalmente do Permanet Vacations, um filme mais denso e pesado sobre um jovem sonhador e aparentemente desajustado. A atuação do Tom Waits é impagável por sua completa falta de naturalidade nas cenas de humor lorpa e pateta que Benini cria com seu inglês sergioleonico.
A Criterion Collection é ótima. Interessante como Jarmusch narra o encontro com Tom Waits em NY. Foi em 1984 numa festa de aniversario de Basquiat. Jarmusch não chega a dizer, mas a festa devia estar um saco pois segundo ele, ele e um grupo de amigos literalmente sequestraram Waits e sua companheira e andaram toda a noite por varios night clubs da cidade. Tornaram-se amigos deste então. Waits chegou a participar de outros filmes como o Coffee and Cigarretes e escrever algumas faixas para outros tantos.