O diretor Mitsuo Anagimachi mostrou sem dúvida o totem de uma experiência insular única que combina nuances das pequenas perversidades da vida acadêmica com a experiência individual dos que trabalham na industria cinematográfica. As experiências individuais acabam interferindo na dinâmica do filme. Matsukawa é um jovem diretor que respira cinema, mas sua doce e sufocante namorada, que não entende nada de cinema, apenas se preocupa com uma coisa: casar. Ele se nega, pois só se casaria depois de realizar uma grande obra. Yukari, a namorada obsessiva, diz que se o pegar com outra mulher o mata, e chega a aventar a hipótese de colocar seu esperma num banco – e ele diga-se de passagem aceita com a condição de que ela lhe dê o dinheiro para comprar um Final Cut Pro, um desses softwares de edição da vida. Os companheiros de filmagem não levam a relação a sério, primeiro por que vêem Matsukawa não como um exemplo maior de fidelidade, e segundo por que enxergam a Yukari como uma cópia xerox de Isabelle Adjani em The Story of Adele H.. O professor Najako, que presta orientação aos pupilos, é um personagem à parte. Fascinado por uma jovem estudante, a quem vê passar todos os dias, é apelidado de Aschenbach pelos alunos, o personagem de Morte em Veneza. Aliás o professor, em sua crise da meia idade, protagoniza uma cena da tão ou mais humilhante que a vivida por Aschenbach no filme de Visconti. Sabendo que um de seus estudantes pendurados por nota, é amigo da menina, manipula para que o rapaz propicie um almoço entre os dois, professor e aluna. No final do almoço, após ser sutilmente humilhado pelo casal – que sugere inclusive um ménage à trois, desde que pudessem ganahar uma bolsa de estudos para Paris - , volta para seu escritório dá pra beber.
O filme nos mostra como um filme de baixo orçamento é feito. Tudo começa pelo orçamento, pela seleção dos atores, pelo set mais barato de filmagem, pelo cenário mais barato...enfim, começa não da estória em si, mas das limitações materiais impostas à produção. É como passar a assistir filmes com essa dimensão que nos daria uma noção muito mais real de como se faz cinema – e que os americanos inverteram em nossas cabeças.
Cada cena do filme parece ter sido pensada cuidadosamente, de forma que nunca se sabe ao certo se uma sequência que começa é do filme em si ou do filme sobre o filme. A própria trilha sonora, dando contorno e impacto a determinadas cenas mais dramáticas, foi capaz de evidenciar o cunho emocional de determiandas cenas. No fundo, as estórias que se imbricam umas com as outras e com a própria estória do filme a ser filmado tornam todo o filme de Mitsuo Anagimachi uma grande tapeçaria de Robert Altman. O hiperrealismo do estranho é de grande importância, por exemplo no impacto emocional causado no protagonista após cada cena em que se entrega de corpo e alma ao papel do personagem encarnado, arriscando perder todo o senso de realidade – coisa pra lá de Stanislavski! É como se os personagens do filme - e do filme filmado – só pudessem sentir a partir do princípio que regia a razão de Meursault, a partir apenas de uma realidade física em si. Daí que nas últimas impressionantes sequências do filme, já não se sabe se estamos assistindo a cena final do filme filmado ou do filme narrado. Por isso, muito bem sacadaa última cena, onde todo o cast limpa o sangue do tapete da sala....
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