Caminho Noturno

Ludwig Hohl é um autor suiço que viveu no século XX, e que em seu tempo foi completamente outsider. Viveu a maior parte de sua vida em extrema miséria, miséria suiça obviamente. Estudante problema, largou a escola e se bateu boa parte da vida contra o problema do alcoolismo. Consta que recebeu uma herança e casou cinco vezes, perdendo a herança e as cinco mulheres, gradualmente, no decorrer da vida. Na vida, deixou uma filha e ao que me consta pouco mais de meia dúzia de livros entre contos, poesia e aforismos.




Um desses livros é o ótimo Camino Nocturno, traduzido para o espanhol pela editorial minúscula. Um pequeno livro com nove contos enigmáticos, escritos entre 1931 e 1937, com temas que giram em torno ao desamparo do ser humano, os diversos graus de incomunicabilidade do dia-a-dia e, obviamente à miséria e o egoísmo humanos. Os seis primeiros contos, são uma espécie de parábola de difícil penetração em sua moralidade, algo que me deixou com a meditação sobre a condição da nossa miséria e dos nossos ao nosso redor. Como no conto El erizo, um animal meio mutante, que é criado com todo o carinho por um casal que o trata com todo o carinho como se tratara de um bebê, logo quando de sua chegada, e que aos poucos vai crescendo em formas disformes e bizarras, detido no sótão da casa, transformando-se numa espécie de javali ou fera que na mínima oportunidade é capaz de devorar os pais adotivos. O mesmo hermetismo encontra-se em La hoja, quando um homem se vê impedido ou adia voluntariamente uma decisão em virtude da contemplação de uma folha que se cai de uma àrvore. Proposital ou acidentalmente, a série de eventos em volta de um ponto de fuga, determina a procrastinação do protagonista desse conto que é brev[issimo mas de um profundo significado para aqueles que acreditam que acima de tudo há metafísica suficiente, mais em não fazer nada que em não pensar em nada! Já a partir do sétimo conto, Hohl deixa a contemplação de lado e parte para o lado prático da vida com protagonistas mais tangíveis como é o caso de La borracha, que em tradução para um português mais erudito poderia ser expressa por A Manguaça, uma mulher que trabalha com seu marido num pequeno bar, mas que em virtude das constantes crises e recaídas, torna a vida dos fregueses e do próprio marido um inferno com cheiro de gin e cebola.


Como deduzível, o trabalho de Hohl nunca foi comercial, e por vezes para um leitor brasileiro que confunde o Espírito hegeliano com os batuques de um cambono no fundo do terreiro, pode até sentir uma certa aversão à profundidade e à falta de humor. Mas é um escritor que de alguma maneira se torna necessário nos dias de hoje, quando tudo é tão prêt-à-porter.

Música do dia. Luar do Sertão. Catulo da Paixão Cearense.Paulo Tapajós e Coral do Joab da Turma do Sereno.

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