Contentemo-nos com a Ilusão da Semelhança, porém, em verdade lhe digo, senhor doutor, se me posso exprimir em estilo profético, que o interesse da vida onde sempre esteve foi nas diferenças,
La grande illusion
Ontem, Stella e eu assitimos o La Grande Illusion, um filme de 1937, dirigido por Jean Renoir. Durante a I Guerra Mundial, dois aviadores franceses, Capitão de Boeldieu e Maréchal, caem prisioneiros na Alemanha. Capitão de Boeldieu é um aristocrata enquanto Maréchal era um mecânico nos tempos de civil. Na prisão, encontram outros prisioneiros de diferentes patentes e estratos sociais, tais como Rosenthal, filho de um banqueiro judeu. Presos, Maréchal e Rosenthal só pensam numa coisa: escapar. Para isso, começam um túnel. No entanto antes de sua conclusão, os dois são transferidos de prisão e pelas barreirsa linguisticas não conseguem comunicar aos novos ocupantes britânicos da cela que havia ali um túnel a ser concluído. Alguns meses depois, reencontram Rosenthal, na prisão de Wintersborn admnistrada pelo Capitão von Rauffenstein (interpretado pelo grande Erich von Stroheim). Wintersborn é uma espécie de Bangu 25 – versão de máxima segurança de prisões de segurança máxima. Mas os três prisioneiros conspiram pela fuga.
O dilema dos prisioneiros passa longe da teoria dos jogos, pois todos os envolvidos são movidos pela Grande Ilusão dos grandes sentimentos. Boeldieu tem um plano que consiste em chamar a atenção dos guardas alemães, para que os outros dois Maréchal e Rosenthal escapem. Uma assembléia é organizada e uma espécie de rebelião, com todos tocando uma espécie de flautas doces improvisadas, começa uma baderna generalizada. Na contagem do presos, Boeldieu, que não está presente, começa chamar atenção no telhado. Os guardas se dirigem ao telhado enquanto Maréchal e Rosenthal escapam por uma corda confeccionada por meses.
A hombridade de Boeldieu não se deve especificamente a uma grandeza de ânimo metafísica acima do humano, ainda que haja uma boa dose de humanismo em sua personalidade. Boeldieu é humano, mas não é isso que o faz ser respeitado por von Rauffenstein. O que o faz ser respeitado por von Rauffenstein é sua natureza aristocrática, que o permitiu frequentar as mesmas mesas no Maxim's em Paris ou cortejando as mesmas mulheres, sorvendo os mesmos licores. Prova disso é que, enquanto todos usam uniformes, e muitas vezes possuem a mesma patente, o que os distingue dos demais militares é sua origem e o uso de diferentes idiomas. Para isso, ambos conversam tanto em alemão, quanto em francês e até mesmo em inglês quando não querem ter suas conversas ouvidas pela malta da caserna. O detalhe do que o Bourdieu chamaria um dos componentes do poder simbólico está aqui, talvez insignificante para muitos, mas está ali, firme e forte. Está na conversa de von Rauffenstein e Boeldieu, quando o primeiro lamenta-se da derrocada final da classe aristocrática – que o historiador Arno Mayer definirá brilhantemente seu grande livro The Persistence of the Old Regime: Europe to the Great War, sustenta que na Europa do século XIX.
Na sequência da fuga de Maréchal e Rosenthal, esse vínculo entre o Capitão von Rauffenstein e Boeldieu torna-se claro e dramático. Von Rauffenstein, vendo a resistência de Boeldieu em se render, é obrigado relutantemente a atirar no amigo.
A partir desse momento, o filme prova que, ao menos em termos de narrativa, é um dos melhores filmes de todos os tempos (com sequências que na minha modesta opinião, iriam influenciar Billy Wilder em Stalag 17 e até mesmo Tarkovsky. Como? Um filme de Guerra, sem sequências de batalhas).
Maréchal e Rosenthal escapam pelos cantões alemães enquanto Boeldieu definha ferido na prisão. Rosenthal, machucado, não consegue acompanhar o ritmo de Maréchal, apesar de persistirem na caminhada pela neve, enfrentando o frio, exaustos, tentando chegar à fronteira da França. Decidem então refigiarem-se numa casa. Chegam a casa de Elsa, uma das viúvas da guerra, que cuida dos dois por alguns dias de véspera de Natal. Em meio ao frio, a incerteza, à solidão de Elsa e sua filha, Rosenthal e Maréchal, então, preparam uma festa de natal para a filha de Elsa. Na mesma noite
Maréchal e Elsa inicia um romance, que duraria pouco, pois prontamente Maréchal e Rosenthal deveriam escapar pela fronteira da Suiça. Apesar de Maréchal prometer que se sobreviver voltará. A cena da despedida é triste, como todas as profundas e sem esperanças despedidas. Ele não olha para trás, pois sabe que se o fizer, não partirá. Na fronteira, ainda são alvejados por soldados alemães, mas que impotentes já não os podem capturar. Enquanto isso o Capitão von Rauffenstein acompanha com unção os últimos momentos de vida de Boeldieu, lamentando-se por ter atirado no amigo. Consternado, quando já não há mais nada a fazer, fecha os olhos de Boeldieu.
Para terminar, umas curiosidades cercam o filme que foi censurado por anos na Bélgica – que tem um aeroporto chamado Chaleroi - e foi terminantemente proibido por Goebbels na Alemanha. Outra curiosidade interessante é quando Elsa mostra as fotos do marido e dos irmãos, mortos nas batalhas de Verdun, Liège, Charleroi, e Tannenberg, exatamente as vitórias mais decisivas da Alemanha na I Guerra. O Jean Renoir escreveu em sua autobiografía, Ma Vie et mes films, que Erich von Stroheim, apesar de austríaco, não falava alemão, e teve de aprender o idioma como um menino de escola para interpretar o oficial de coluna esculhambada, Capitão von Rauffenstein.
Se eu pudesse definir esse filme em poucas palavras diria, sem incorrer em filosofia banca de jornal, que este é um filme que fala da esperança perdida nas relações humanas. Não é nada, não é nada, após assitir o filme, olhe para os lados, ponha a mão na consciência, e me diga, primeiro, se o mundo não está cheio de escrotidão, e segundo se o nome do filme não é perfeito? Stella, de emocionada que ficou, diz que ainda é cedo para falar. Acho que entendo o porquê.
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