Turner x Turner

Não poderia deixar de terminar este ano sem falar em duas grandes exibições que assisti nesses últimos meses.

A primeira sobre J. M. W. Turner. Movido muito pelo interesse que me despertou o documentario de Simon Schama, que a PBS exibiu ha meses atras e sobre o qual ja falei, fui assistir a essa exibição sobre o pintor da natureza.

Evidentemente, o que menos me chamou a atenção foram os quadros sobre natureza. Fui ansioso pra assitir a suas visões sobre as guerras napoleônicas e a seus trabalhos supostamente visionarios da senilidade. Pessoalmente, esse camadada era um desses tipos resolutos. Filho de um barbeiro e de uma peruqueira - ainda tenho dúvidas se essa palavra existe em português -, era um cara determinado, sem dúvida, e particularmente institucional. Disse certa vez que a Royal Academy of Arts era "institution to which I owe everything." Enfim, não apenas essas contradições ou complementos fizeram dele uma espécie de querido da Royal Academy. Havia também muita técnica sob as cenas que pintava. Ele criou uma linguagem visual rica em associações clássicas. Para isso, buscava suas cenas na História, passagens bíblicas e mesmo na mitologia greco-romana. Mas o que mais o aproximava do Sublime, segundo Schama era a sua colocação da luz em seus quadros.

Alguns quadros impressionam pela riqueza de detalhes. Um deles é o Snow Storm: Hannibal and His Army Crossing the Alps. A cena retratada remonta-se a um fato três séculos antes de Cristo, quando o general cartaginês marchou com suas tropas pelos Alpes, usando, talvez pela primeira vez na história, elefantes como armas de guerra. No quadro, vê-se alguns destes animais passando pelo horizontes. Impressiona o minimalismo.

Outro que me deixou meio sem palavras foi óleo The Temple of Jupiter. Evidentemente não pela grandiosidade do The Battle of Trafalgar - meu preferido -, mas pela perpicácia em perceber que os ingleses poderiam consumir aquele quadro com certa familiaridade. Afinal, os consumidores de arte britânicos na decada de 1810 tinha um gosto político. Se não político, anti-napoleônico, anti-ocupacionista. E nesse The Temple of Jupiter, o britânico médio, empafioso, cara rosada e blasê, sabia que em meio a uma guerra napoleônica, os gregos, ocupados pelos turcos por quatro séculos, eram a metáfora perfeita para que seus contemporâneos britânicos. Afinal, civilização por civilização, a de um francês ou turco, era inferior a de um britânico - para um britânico, obviamente. O mais curioso é que Turner nunca ha via estado na Grécia, e todas as suas imagens tinha sido baseadas em informações de Lord Eligam, que havia estado por lá numa viagem arqueológica.
Enfim, o Edmund Burke, ao introduzir a ideia de Sublime e Belo na obra de arte, poucos anos antes de Turner limpar seus pinceis com a sua tiberitina fedorenta, relacionou o objeto sublime com o poder. Ou seja, Sublime e Belo eram duas coisas completamente difentes, e mais, excludentes mutamente - como a luz e a escuridão. A busca pelo Sublime na obra de arte era, portanto, uma busca de emoções que o horror da escuridão ou a iluminação do incômodo podem trazer ao apreciador de um quadro. Turner sabia que esse tipo de exercício educava a condição da vida burguesa. E percebeu desde cedo que em seus quadros devia imprimir esse incômodo, fosse ele retratanto a atomização do homem frente à força da natureza, ou mostrando o lado obscuro, incerto e confuso da existência.


A segunda exibição, no mesmo National Galery, era sobre Edward Hopper. Mas dessa tenho que falar com calma, quando voltar, em janeiro.

Música do dia. I've got the world on a string. Frank Sinatra